a teoria ferencziana do trauma - Instituto de Psicologia da UFRJ
a teoria ferencziana do trauma - Instituto de Psicologia da UFRJ
a teoria ferencziana do trauma - Instituto de Psicologia da UFRJ
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
experimenta ain<strong>da</strong> assim sensações voluptuosas em seus órgãos genitais, e que, em sua<br />
vi<strong>da</strong> psíquica, flutuam fantasias lúdicas e brinca<strong>de</strong>iras cujos conteú<strong>do</strong>s têm a ver com o<br />
afeto e amor que nutrem em relação às figuras parentais (FERENCZI, 1933/1992).<br />
Assim, a linguagem <strong>da</strong> ternura, anterior que é à inscrição edípica, tem o seu palco no<br />
mun<strong>do</strong> interno <strong>da</strong> criança, encena<strong>da</strong> para fora através <strong>de</strong> brinca<strong>de</strong>iras ingênuas que<br />
tentam mimetizar a vi<strong>da</strong> sexual adulta. Esta língua tem a particular característica <strong>de</strong> ser<br />
um “amor objetal passivo” (FERENCZI, 1933/1992, p. 103), isto é, caracteriza<strong>do</strong><br />
“pelo <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> ser o objeto, <strong>de</strong> tomar seu lugar, <strong>de</strong> cui<strong>da</strong>r <strong>de</strong>le” (VERZTMAN, 2002,<br />
p. 67). Enfim, <strong>de</strong> “ser ama<strong>do</strong> enquanto objeto, sem amor recíproco” (FERENCZI,<br />
1932/1990, p. 153).<br />
A linguagem <strong>da</strong> paixão refere-se à sexuali<strong>da</strong><strong>de</strong> tal como classicamente<br />
compreendi<strong>da</strong> pela psicanálise, o que implica dizer que ela está organiza<strong>da</strong> pelo Édipo e<br />
liga<strong>da</strong> à genitali<strong>da</strong><strong>de</strong> (PINHEIRO, 1995). Neste senti<strong>do</strong>, o adulto que se inscreve na<br />
linguagem <strong>da</strong> paixão passou pela castração e é, portanto, “um sujeito cliva<strong>do</strong> com seus<br />
sentimentos e recalcamentos” (PINHEIRO, 1995, p. 72). Como sabemos, o erotismo<br />
adulto é ambivalente, no senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> amor e <strong>do</strong> ódio serem complementares entre si,<br />
operan<strong>do</strong> nas relações com o objeto e produzin<strong>do</strong> o sentimento <strong>de</strong> culpa. Esta<br />
ambivalência e esta culpa são enigmáticas para a criança, uma vez que a linguagem <strong>da</strong><br />
ternura não consegue <strong>de</strong>preendê-las, já que está em um nível anterior à consoli<strong>da</strong>ção <strong>do</strong><br />
Édipo. Assim, o “aniquilamento <strong>do</strong> orgasmo” (FERENCZI, 1933/1992, p. 106), que<br />
constitui o ápice <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> erótica <strong>do</strong> adulto, é completamente incompreensível para a<br />
criança, que “só conhece satisfações no senti<strong>do</strong> <strong>da</strong> sacie<strong>da</strong><strong>de</strong>” (FERENCZI,<br />
1933/1992, p. 106).<br />
De um la<strong>do</strong>, a criança ain<strong>da</strong> não passou pelas experiências necessárias – isto é,<br />
não atingiu um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> nível maturacional – que lhe forneça subsídios para<br />
compreen<strong>de</strong>r a vi<strong>da</strong> sexual <strong>do</strong> adulto, com to<strong>da</strong> sua carga <strong>de</strong> violência e complexi<strong>da</strong><strong>de</strong> 5 .<br />
É neste senti<strong>do</strong> que Ferenczi inúmeras vezes aponta que a ternura correspon<strong>de</strong> à<br />
inocência e ingenui<strong>da</strong><strong>de</strong>: apesar <strong>da</strong> criança sentir <strong>de</strong>sejo, é insondável para sua<br />
arquitetura psíquica compreen<strong>de</strong>r as consequências <strong>de</strong>ste <strong>de</strong>sejo, caso fosse realiza<strong>do</strong>.<br />
5 “Impor prematuramente mo<strong>do</strong>s <strong>de</strong> satisfação inoportunos perturba o <strong>de</strong>senvolvimento normal <strong>do</strong> Ego,<br />
que se vê assim coloca<strong>do</strong> diante <strong>de</strong> tarefas para as quais ain<strong>da</strong> não está suficientemente maduro. (...)<br />
Naturalmente, um esforço ain<strong>da</strong> mais consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong>ve ser forneci<strong>do</strong> por um Ego ain<strong>da</strong> não<br />
<strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> tem que suportar a violência e o choque, assim como as emoções <strong>de</strong> uma relação<br />
sexual real” (FERENCZI, 1932/1990, p. 236).<br />
12