RELATO DE CASO111Úlcera <strong>de</strong> córnea por Pseudomonas stutzeriPseudomonas stutzeri corneal ulcerFellipe Berno Mattos 1 , Fernanda Spinassé Agostini 2 , <strong>Mar</strong>celo Berno Mattos 2 , Diusete <strong>Mar</strong>ia Pavan Batista 3RESUMOEste relato aborda um caso atípico <strong>de</strong> úlcera <strong>de</strong> córnea em uma criança <strong>de</strong> 09 anos, causado pela bactériaPseudomonas stutzeri, um micro-organismo oportunista cujo isolamento em olhos é extremamente raro.Descritores: Pseudomonas stutzeri, doenças da córnea, úlcera da córnea, terapêuticaABSTRACTThis report discusses an unusual case of corneal ulcer in a child of 09 years old, caused by the bacteriaPseudomonas stutzeri, an opportunistic organism whose isolation in the eyes is extremely rare.Keywords: Pseudomonas stutzeri, corneal disease, corneal ulcer, therapeutics1Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Espírito Santo (UFES) - Vitória (ES) - Brasil;2Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Espírito Santo (UFES) - Vitória (ES) - Brasil;3Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Espírito Santo (UFES) - Vitória (ES) - Brasil.Trabalho realizado no Departamento <strong>de</strong> <strong>Oftalmologia</strong> da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Espírito Santo (UFES) - Vitória (ES) - BrasilOs autores <strong>de</strong>claram inexistir conflitos <strong>de</strong> interesseRecebido para publicação em 5/11/2011 - Aceito para publicação em 29/8/2011Rev Bras Oftalmol. 2012; 71 (2): 111-14
112Mattos FB, Agostini FS, Mattos MB, Batista DMPFigura 1: Iluminação difusa à biomicroscopia no segundo dia <strong>de</strong>atendimento em que é possível visualizar uma úlcera central rasa(seta branca) com infiltrado estromal anterior perilesional (setaver<strong>de</strong>), cercada perifericamente por triplo infiltrado em anel tipoimunológico (setas vermelhas), intensa hiperemia conjuntival emidríase farmacológica (após evidência <strong>de</strong> reação <strong>de</strong> câmaraanterior ao exame)INTRODUÇÃOPseudomonas stutzeri é um bastonete Gram-negativomóvel por possuir um único flagelo polar.É um organismo ubíquo na natureza, encontradodifusamente em ambientes hospitalares (1) , estando geralmenteassociado à infecção oportunista, embora oacometimento ocular seja raro (2) .Em 1973, o primeiro caso bem documentado <strong>de</strong>infecção por este agente foi <strong>de</strong>scrito na literatura, relacionadocom uma fratura <strong>de</strong> tíbia (3) . Des<strong>de</strong> então, algunscasos foram relatados, com gran<strong>de</strong> espectro <strong>de</strong> acometimento(septicemia, osteomielite e artrite, endocardite,meningite, pneumonia e/ou empiema, ectimagangrenosa, ventriculite, infecção <strong>de</strong> aparelho urinárioe ocular) (1-8) .Neste estudo, reportamos os aspectos clínicos <strong>de</strong>steraro caso <strong>de</strong> ceratite por P. stutzeri, cuja <strong>de</strong>scrição é aprimeira na literatura nacional. A sensibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>steagente aos antibióticos, as similarida<strong>de</strong>s clínicas comoutras ceratites causadas por patógenos mais inci<strong>de</strong>ntesna população e a importância do exame laboratorial nodiagnóstico e tratamento das ceratites são também discutidos.Figura 2: Iluminação difusa à biomicroscopia ao final do tratamento,evi<strong>de</strong>nciando-se leucoma central residualRelato do casoPaciente do sexo masculino, 09 anos, natural e proce<strong>de</strong>nte<strong>de</strong> Domingos <strong>Mar</strong>tins-ES, previamente hígido,atendido no Serviço <strong>de</strong> <strong>Oftalmologia</strong> do HUCAM/UFES<strong>de</strong>vido ao quadro iniciado 20 dias antes da primeira consulta<strong>de</strong> hiperemia conjuntival e redução <strong>de</strong> acuida<strong>de</strong>visual (AV) em olho esquerdo (OE), evoluindo com pioraprogressiva. Os sintomas surgiram após contato <strong>de</strong> pó<strong>de</strong> giz com a superfície ocular. Mãe relata que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> oprincípio vinha lavando o olho diariamente com sorofisiológico, mantido aberto em gela<strong>de</strong>ira há meses. Emnenhum momento a criança relatou dor, apenas leve<strong>de</strong>sconforto ocular.A AV não corrigida era <strong>de</strong> 20/25 no olho direito(OD) e 20/400 no OE. O OD era normal àbiomicroscopia. Já o OE apresentava pequena úlceracentral rasa medindo aproximadamente 2.2x1.2 mm,com infiltrado estromal anterior perilesional, cercadaperifericamente por triplo infiltrado em anel tipoimunológico, hiperemia conjuntival leve, sem reação <strong>de</strong>câmara anterior. À palpação bidigital a pressão dos olhosparecia normal.Com base na história da doença atual e nos achadosclínicos evi<strong>de</strong>nciados, foram aventadas as seguintespossibilida<strong>de</strong>s etiológicas para o caso: fungo, herpessimples e Acanthamoeba. Para o auxílio diagnósticorealizou-se a coleta <strong>de</strong> material através do raspado <strong>de</strong>córnea, com a amostra sendo enviada para o Laboratório<strong>de</strong> Microbiologia do próprio hospital. O materialcolhido do paciente foi semeado nos seguintes meios<strong>de</strong> cultivo: ágar sangue, ágar chocolate e ágarSabouraud, sendo também imersa em tioglicolato.Bacterioscopia corada pelo método <strong>de</strong> Gram realizada<strong>de</strong> imediato teve resultado negativo. Foi solicitadotambém o antibiograma. Foram então prescritos colíriosRev Bras Oftalmol. 2012; 71 (2): 111-14