Fatores associados à hipertensão arterial <strong>em</strong> populações ruraisINTRODUÇÃOA hipertensão arterial é, atualmente, um importanteprobl<strong>em</strong>a <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> pública. 1,2 Estima-se que, no Brasil,a prevalência para a população com mais <strong>de</strong> 20 anos <strong>de</strong>ida<strong>de</strong> seja <strong>em</strong> torno <strong>de</strong> 20% a 30% e para as pessoas quetêm mais 40 anos, 35%. 3 A prevalência da hipertensãoestá associada a uma série <strong>de</strong> fatores, como ida<strong>de</strong>, sexo,antece<strong>de</strong>ntes familiares, raça, obesida<strong>de</strong>, estresse, vidase<strong>de</strong>ntária, álcool, tabaco, alimentação rica <strong>em</strong> sódio egorduras. 4Estudos d<strong>em</strong>onstram que existe uma relação direta entrea hipertensão e o excesso <strong>de</strong> peso, <strong>de</strong> forma que o risco<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> hipertensão arterial aumentacom o ganho <strong>de</strong> peso e diminui com a redução do índice<strong>de</strong> massa corporal. 5 Além disso, o aumento da gorduracorpórea resulta <strong>em</strong> aumento pela d<strong>em</strong>anda <strong>de</strong> insulina,tendo como consequência a hiperinsulin<strong>em</strong>ia. 6A hiperinsulin<strong>em</strong>ia po<strong>de</strong> causar hipertensão pordiferentes mecanismos. A insulina estimula o sist<strong>em</strong>anervoso simpático, causando vasoconstrição e aumentono débito cardíaco. A insulina retém sódio/água nostúbulos renais distais, contribuindo para expansão <strong>de</strong>volume. Além disso, também estimula a proliferaçãoda musculatura lisa da pare<strong>de</strong> arterial. Estima-se queaproximadamente 50% dos pacientes hipertensosapresent<strong>em</strong> hiperinsulin<strong>em</strong>ia. 7A hipótese <strong>de</strong> que a obesida<strong>de</strong> contribuiria para aelevação da pressão arterial dada a diminuição dasensibilida<strong>de</strong> periférica à insulina e hiperinsulin<strong>em</strong>iacompensatória também está sendo d<strong>em</strong>onstrada <strong>em</strong>alguns estudos, pois, quando presente, a obesida<strong>de</strong>contribui para a ocorrência da HA, sendo consi<strong>de</strong>radaum dos seus principais fatores <strong>de</strong> risco. 8,9Diante do exposto, estudos que vis<strong>em</strong> avaliar arelação entre o excesso <strong>de</strong> peso, a hiperinsulin<strong>em</strong>ia e ahipertensão arterial <strong>em</strong> áreas rurais se faz<strong>em</strong> necessários,uma vez que no Brasil são poucos os trabalhos realizadosnas áreas rurais sobre tais associações.MATERIAL E MÉTODOTrata-se <strong>de</strong> um estudo epid<strong>em</strong>iológico <strong>de</strong> <strong>de</strong>lineamentotransversal, realizado <strong>em</strong> Virg<strong>em</strong> das Graças e Caju,duas comunida<strong>de</strong>s rurais localizadas no Vale doJequitinhonha, nor<strong>de</strong>ste <strong>de</strong> Minas Gerais.A população-alvo <strong>de</strong>ste estudo constituiu-se <strong>de</strong>indivíduos com ida<strong>de</strong> maior ou igual a 18 anos, <strong>de</strong> ambosos sexos, e com, pelo menos, dois anos <strong>de</strong> residênciano local. A população resi<strong>de</strong>nte nessas comunida<strong>de</strong>sera constituída por 272 famílias, totalizando 1.216indivíduos.Desse total <strong>de</strong> indivíduos, 522 eram menores <strong>de</strong> 18 anos,restando 694 indivíduos para o estudo. Entre esses,houve perda <strong>de</strong> 100 indivíduos (14,4%), reduzindo aamostra para 594 (85,6% do total <strong>de</strong> indivíduos adultoscadastrados inicialmente), porque 47 não se encontravamno local na época da coleta, 33 mudaram-se para outraslocalida<strong>de</strong>s e 20 não permitiram a coleta dos dados. Aamostra total, portanto, foi <strong>de</strong> 594 indivíduos adultos,<strong>de</strong>ntre os quais foram excluídos, ainda, 8 pacientesdiabéticos e 9 mulheres grávidas. Com isso, a amostrafinal para este estudo se constituiu <strong>de</strong> 567 pessoas coma ida<strong>de</strong> entre 18 e 94 anos.A coleta <strong>de</strong> dados incluiu variáveis h<strong>em</strong>odinâmicas,antropométricas, bioquímicas, d<strong>em</strong>ográficas – taiscomo ida<strong>de</strong>, cor da pele, estado marital e escolarida<strong>de</strong>– e <strong>de</strong> estilo <strong>de</strong> vida – tabagismo e consumo <strong>de</strong> bebidaalcoólica. Os participantes do estudo respon<strong>de</strong>ram a umquestionário com perguntas relativas às duas últimasvariáveis e, ao término da entrevista, foi realizado umexame clínico que consistia na aferição <strong>de</strong> medidasantropométricas e clínico-laboratoriais.O peso foi aferido por meio <strong>de</strong> uma balança digital comaproximação <strong>de</strong> 0,1 kg, com os participantes trajadoscom roupas leves e s<strong>em</strong> sapatos. A altura foi mensuradacom uma fita métrica inextensível, colocada <strong>em</strong> umapare<strong>de</strong> s<strong>em</strong> rodapé a uma distância <strong>de</strong> 50 centímetros dochão, com aproximação <strong>de</strong> 0,1 cm. Os indivíduos foramposicionados <strong>de</strong> pé, <strong>de</strong>scalços, olhando para frente, <strong>em</strong>posição <strong>de</strong> Frankfurt – arco orbital inferior alinhado <strong>em</strong>um plano horizontal com o pavilhão auricular –, com ospés juntos. A circunferência da cintura (CC) foi medidacom uma fita métrica inelástica, posicionando-a noponto médio entre a última costela e a parte superior dacrista ilíaca. A circunferência do quadril foi mensurada nolocal <strong>de</strong> maior pro<strong>em</strong>inência da região glútea.A medição da pressão arterial foi realizada seguindotodos os passos preconizados no VI Relatório da JointNational Committee (JNC) 10 e também citados nas IVDiretrizes Brasileiras <strong>de</strong> Hipertensão Arterial (SBH), 11que <strong>de</strong>fin<strong>em</strong> a forma correta <strong>de</strong> aferição indireta <strong>de</strong>sseparâmetro diagnóstico. Foram realizadas três aferições,todas no braço direito, sendo a média das três a <strong>de</strong>finitiva.Os examinadores foram treinados sist<strong>em</strong>aticamenteantes da realização das aferições. Foram consi<strong>de</strong>radoshipertensos os indivíduos com pressão arterial sistólica≥ 140 mmHg e/ou pressão arterial diastólica ≥ 90 mmHge/ou <strong>em</strong> uso <strong>de</strong> medicação anti-hipertensiva.Amostras <strong>de</strong> sangue, <strong>de</strong> aproximadamente 5 ml, foramobtidas por meio <strong>de</strong> punção venosa com o paciente<strong>em</strong> jejum <strong>de</strong> 12 horas. As concentrações do colesteroltotal, triglicéri<strong>de</strong>s e glicose foram <strong>de</strong>terminadasusando um teste enzimático colorimétrico utilizando oanalisador Cobas Mira Plus (Roche Diagnostics, Suíça).A concentração da lipoproteína <strong>de</strong> alta <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> –HDL-c – também foi medida por um teste enzimáticocolorimétrico, após precipitação das frações LDL-c eVLDL-c pelo ácido fosfotungstico e cloreto <strong>de</strong> magnésio.Níveis <strong>de</strong> LDL-c foram calculados por aplicação da equação<strong>de</strong> Friedwald. 12 A glic<strong>em</strong>ia <strong>de</strong> jejum foi caracterizada<strong>de</strong> acordo com as recomendações da AmericanDiabetes Association 13 e os níveis <strong>de</strong> triglicéri<strong>de</strong>s,colesterol total, HDL-c e LDL-c foram classificadas <strong>de</strong>acordo com critérios da III Diretrizes Brasileiras sobreDislipid<strong>em</strong>ias e Diretriz <strong>de</strong> Prevenção da Aterosclerose. 14As concentrações <strong>de</strong> PCR <strong>de</strong> alta sensibilida<strong>de</strong> e insulina334 r<strong>em</strong>E – Rev. Min. Enferm.;15(3): 333-347, jul./set., 2011
foram <strong>de</strong>terminadas por um método imunométrico <strong>em</strong>fase sólida quimioluminescente usando o analisadorImmulite 2000 (EURO/DPC Ltda., Reino Unido). Para PCRe insulin<strong>em</strong>ia <strong>de</strong> jejum, consi<strong>de</strong>raram-se elevados osvalores, <strong>de</strong>ssas variáveis, categorizados, no 4º quartil dadistribuição e normais os valores no 1º, 2º e 3º quartis. Ovalor do 4º quartil da insulina para a população estudadafoi <strong>de</strong> 5,06 µU/ml e o da PCR foi <strong>de</strong> 0,41 mg/dl.A resistência à insulina foi avaliada pelo métodoHomeostasis Mo<strong>de</strong>l Assessment (HOMA-IR) 15 , combase na seguinte equação: HOMA-IR = insulin<strong>em</strong>ia<strong>de</strong> jejum (mU/L) x glic<strong>em</strong>ia <strong>de</strong> jejum (mmol/L) ÷ 22,5.Foram consi<strong>de</strong>radas resistentes à insulina as pessoascom valores <strong>de</strong> HOMA-IR no 4° quartil. Como não háconsenso <strong>em</strong> relação a um valor <strong>de</strong> corte estabelecidocomo referência para classificar os resultados do índiceHOMA-IR, para essas comunida<strong>de</strong>s, foram consi<strong>de</strong>radasresistentes à insulina as pessoas com os valores <strong>de</strong>HOMA-IR no 4° quartil da distribuição <strong>de</strong>ssa variável,sendo que o valor <strong>de</strong> corte do quarto quartil <strong>de</strong>ssapopulação foi <strong>de</strong> 1,13. Assim, as pessoas com valoresno 1°, 2° e 3° quartis foram consi<strong>de</strong>radas normais; s<strong>em</strong>alterações na RI; e pessoas com valores no 4° quartil,como resistentes à ação da insulina.Os dados foram processados e analisados por meio doprograma Statistical Software for Professionals (Stata)versão 9.0 e, para efeito <strong>de</strong> interpretação, o limite <strong>de</strong>erro tipo I foi <strong>de</strong> até 5% (p≤0,05). Para a caracterizaçãoda amostra, foram apresentadas tabelas <strong>de</strong> frequênciae tabelas <strong>de</strong> medidas <strong>de</strong> tendência central e dispersãodas variáveis, segundo o sexo. As variáveis que nãoapresentavam distribuição simétrica foram <strong>de</strong>scritaspor meio da mediana (intervalo interquartílico) e as queapresentavam distribuição simétrica foram <strong>de</strong>scritaspor meio da média e do <strong>de</strong>svio-padrão. Para compararas diferenças entre as frequências, medianas e médias,foram utilizados os testes Qui-quadrado, Mann-whitneye Teste t-stu<strong>de</strong>nt, respectivamente.Para a estimativa das razões <strong>de</strong> prevalência (RP),foi utilizada a técnica <strong>de</strong> regressão <strong>de</strong> Poisson comvariâncias robustas. Na construção do mo<strong>de</strong>lo, utilizousea hipertensão arterial como variável <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte.Inicialmente; as variáveis que não mantinham significância<strong>em</strong> nível <strong>de</strong> p 60 59 20,6 64 22,8 123 21,7Cor <strong>de</strong> pele *Branca 51 17,8 87 31,0 138 24,3Não branca 235 82,2 194 69,0 429 75,7Estado maritalCom cônjuge 194 67,8 199 70,8 393 69,4S<strong>em</strong> cônjuge 92 32,1 82 29,3 174 30,6<strong>Escola</strong>rida<strong>de</strong> (anos)0 112 39,2 94 33,5 206 36,31 a 4 115 40,2 113 40,2 228 40,2> 5 59 20,6 74 26,3 133 23,5Tabagismo**Sim 123 43,0 49 17,4 172 30,3Ex-fumante 67 23,4 25 8,9 92 16,2Não 96 33,6 207 73,7 303 53,4Consumo <strong>de</strong> álcool*Sim 100 35,0 34 12,1 134 24,0Não 186 65,0 247 87,9 433 76,0Nota: * p