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O que fizemos à memória do século XX? - Fonoteca Municipal de ...

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aquilo <strong>que</strong> os une. Um é umaexperiência absolutamentesingular num contexto também eleúnico: o “perío<strong>do</strong> revolucionário”<strong>do</strong> pós-25 <strong>de</strong> Abril; o outro, umprojecto especulativo numaInglaterra a reerguer-se dareconstrução <strong>do</strong> pós-guerra.A<strong>que</strong>le, é uma experiência plena<strong>de</strong> i<strong>de</strong>alismo, mas traduzidanuma acção prática, complexa eplural, para a resolução imediata<strong>de</strong> problemas habitacionais <strong>de</strong>comunida<strong>de</strong>s locais, cujo exemploperdura; este, um ensaio optimistasem tradução prática nas casas <strong>de</strong>hoje. Porém, po<strong>de</strong> talvez encontrarsena natureza e materialida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s<strong>do</strong>is acontecimentos algo sobrea dicotomia Norte/Sul em <strong>que</strong>assenta a exposição. De facto, se aHOF é (mais) um ensaio <strong>do</strong> sonhomo<strong>de</strong>rno <strong>de</strong> articular arquitecturae processos industriais,relacionan<strong>do</strong>-se assim com o Norteindustrializa<strong>do</strong> e tecnologicamenteevoluí<strong>do</strong>, o SAAL é um processoúnico na Europa e <strong>que</strong>, <strong>de</strong> certaforma, antecipa alguns <strong>do</strong>sprojectos mais mediáticos daarquitectura actual “<strong>do</strong> Sul”, <strong>de</strong><strong>que</strong> o exemplo mais evi<strong>de</strong>nte é otão cita<strong>do</strong> projecto (empresarial)Elemental, <strong>do</strong> arquitecto chilenoAlejandro Aravena. É a natureza<strong>do</strong>s problemas habitacionais,sociais e urbanos <strong>de</strong>sse “Sul” (dasAméricas, <strong>de</strong> África e <strong>de</strong> certaÁsia) <strong>que</strong> tem progressivamenteinvadi<strong>do</strong> o centro <strong>do</strong> <strong>de</strong>batearquitectónico.Um pedaço <strong>de</strong> chãoNo mesmo ano em <strong>que</strong> fizeram aHOF, os Smithson participaramnuma outra exposição em Londres<strong>que</strong> se revelaria fundamental paraa cena cultural em Inglaterra,nomeadamente para a explosãoda Pop Art. Nessa exposição, “Thisis Tomorrow”, apresentariam aDANIEL ROCHAinstalação “Patio and Pavilion”em co-autoria com o artistaplástico Eduar<strong>do</strong> Paolozzi eo fotógrafo Nigel Hen<strong>de</strong>rson,to<strong>do</strong>s membros <strong>do</strong> In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntGroup. A instalação — “umaespécie <strong>de</strong> habitat simbólico noqual se encontram respostasàs necessida<strong>de</strong>s humanasbásicas - uma vista <strong>do</strong> céu, umpedaço <strong>de</strong> terra, privacida<strong>de</strong>e a presença da natureza e <strong>de</strong>animais quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>les precisamos(…)“ — era, ao contrário da HOF,uma reflexão sobre a essênciaar<strong>que</strong>típica da casa ou daquilo<strong>que</strong> eles <strong>de</strong>signavam por “art ofinhabitation”.É também essa dimensão <strong>que</strong>está contida no concurso “A housein Luanda: Patio and Pavilion”,patente noutro núcleo da Trienal,no Museu da Electricida<strong>de</strong>. Umexercício sobre a essencialida<strong>de</strong>e a escassez visan<strong>do</strong> umaresposta prototípica para umasituação específica <strong>do</strong> habitar(uma família angolana, uma casa<strong>de</strong> 100m2, um orçamento <strong>de</strong> 25mil euros), e conten<strong>do</strong> a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong>reprodutibilida<strong>de</strong> da solução,no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> constituir umteci<strong>do</strong> urbano. E, curiosamente,algumas das soluções propostasremetem para <strong>de</strong>senhos em<strong>que</strong> os Smithson ensaiavama associação <strong>de</strong> múltiplosexemplares da HOF, ou <strong>de</strong> outrosprojectos subse<strong>que</strong>ntes como as“Appliance Houses”. Certamente<strong>que</strong> a natureza <strong>do</strong> programa, aobjectivida<strong>de</strong> <strong>do</strong> enuncia<strong>do</strong>, ospoucos meios necessários paralhe dar resposta e, finalmente,a visibilida<strong>de</strong> da Trienal nãoserão alheios à participação semprece<strong>de</strong>ntes neste concurso.Mas a mesma também po<strong>de</strong>indiciar uma mudança <strong>de</strong> foconas mais novas geração <strong>de</strong>arquitectos, na sequência <strong>do</strong>referi<strong>do</strong> recentramento da funçãosocial <strong>do</strong> arquitecto. Estes jovensarquitectos, seguramente maisangustia<strong>do</strong>s com as crises locaise globais <strong>do</strong> <strong>que</strong> algumas dasgerações <strong>que</strong> os prece<strong>de</strong>ram,e eventualmente nostálgicos<strong>de</strong> tempos <strong>de</strong> activismo eintervenção social — comoa<strong>que</strong>les <strong>do</strong> SAAL — <strong>que</strong> nuncaconheceram, procuram numaarquitectura mais programáticae política uma viabilida<strong>de</strong> parasi mesmos e talvez um novosenti<strong>do</strong> para a disciplina. Terási<strong>do</strong> <strong>de</strong>sse tipo, também, amotivação <strong>do</strong>s estudantes <strong>que</strong>participam no concurso “ProjectoCova da Moura”, cujos resulta<strong>do</strong>stambém aqui se expõem. Claro<strong>que</strong> o <strong>de</strong>sencanto ou, até, ocinismo <strong>que</strong> às vezes vêm coma experiência po<strong>de</strong>m reduzir talexpectativa a uma ilusão. Afinal,os arquitectos trabalham com ocapital, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m da encomendapública e privada, <strong>do</strong> dinheiro <strong>que</strong>é sempre <strong>de</strong> outrem. A realização<strong>do</strong>s seus sonhos, eventualmenteintermedia<strong>do</strong>s pelos sonhos<strong>de</strong> outros (ou vice-versa),estará sempre essencialmente<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>s <strong>de</strong>terceiros. Mas também é verda<strong>de</strong><strong>que</strong> o futuro está sempre a mudar.E <strong>que</strong> os homens continuam aprecisar <strong>de</strong> uma vista <strong>do</strong> céu.Arquitecto e professor nas licenciaturasem Design da Universida<strong>de</strong> Lusíadae da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Arquitectura <strong>de</strong>LisboaA dinamar<strong>que</strong>saMetteThomsen (emcima) trouxe aLisboa umapare<strong>de</strong> “viva”;foram mais <strong>de</strong>600 osconcorrentesao concursopara uma casaem Luanda(foto <strong>de</strong> baixo)“O <strong>que</strong> é <strong>que</strong> essedinheiro pormetro quadra<strong>do</strong> [noprojecto da Novartis]faz à arquitectura<strong>de</strong> Siza e <strong>de</strong> SoutoMoura?”Diogo Seixas Lopesdiferentes, e isso torna a universalida<strong>de</strong><strong>de</strong> soluções impossível”, afirmaAna Vaz Milheiro. Por isso, ela eManuel Graça Dias encararam Áfricae o Brasil como duas realida<strong>de</strong>s comproblemas muito específicos: o crescimentoincontrolável <strong>de</strong> certas zonas,através das favelas, <strong>do</strong>s musse<strong>que</strong>se <strong>do</strong>s caniços; o encerramento<strong>do</strong>s ricos em con<strong>do</strong>mínios fecha<strong>do</strong>s;e a <strong>de</strong>cadência <strong>de</strong> uma importanteherança colonial mo<strong>de</strong>rnista.Aqui mudamos <strong>de</strong> escala, já não falamos<strong>de</strong> uma casa, falamos <strong>de</strong> muitas,e <strong>de</strong> como se po<strong>de</strong> intervir num conjuntoimenso <strong>de</strong> casas <strong>que</strong> foram crescen<strong>do</strong><strong>de</strong> forma espontânea e muitasvezes caótica. Os <strong>do</strong>is comissários pedirama três ateliers <strong>de</strong> arquitectos, umem cada cida<strong>de</strong> ( José Forjaz em Maputo,Maria João Teles Grilo em Luanda,e Una Arquitectos, em São Paulo),para fazerem, respectivamente, umprojecto <strong>de</strong> intervenção num caniço,num musse<strong>que</strong> e numa favela.“Sou muito crítica <strong>do</strong> discurso <strong>que</strong>se faz em relação a esses bairros espontâneos,<strong>que</strong> parece dizer <strong>que</strong> aarquitectura é uma coisa dispensávele <strong>que</strong> as pessoas sabem construir asua cida<strong>de</strong>. Não é assim”, diz Milheiro.“Os arquitectos têm uma reflexão afazer sobre estes lugares. E é importante<strong>que</strong> não se <strong>de</strong>mitam <strong>de</strong> fazerpropostas <strong>de</strong>ntro da cultura arquitectónica.As gran<strong>de</strong>s conquistas <strong>do</strong> século<strong>XX</strong> são noções mínimas <strong>de</strong> conforto,<strong>de</strong> infra-estruturas, <strong>de</strong> saneamento.”No Sul, a discussão sobre obásico continua a conduzir-nos aqui– ao ponto em <strong>que</strong> estávamos no Portugal<strong>de</strong> 74.Para falar <strong>de</strong> con<strong>do</strong>mínios fecha<strong>do</strong>s(numa sala em <strong>que</strong> nos sentimos nessa“cida<strong>de</strong> sitiada”), três escritoresforam convida<strong>do</strong>s a escrever contos– uma i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Graça Dias <strong>que</strong>, sublinhaMilheiro, permite “convocar outrasáreas para a reflexão arquitectónica”.Por fim, a herança mo<strong>de</strong>rnista surgeatravés <strong>de</strong> três obras – Delfim Amorim(Recife), Fernão Simões <strong>de</strong> Carvalho(Luanda) e Pancho Gue<strong>de</strong>s (Maputo)– e <strong>do</strong>s discursos <strong>do</strong>s seusarquitectos (no caso <strong>de</strong> Amorim, umaconversa com o filho) e <strong>de</strong> filmes emsuper 8 filma<strong>do</strong>s por pessoas em cadaDANIEL ROCHADANIEL ROCHAuma das cida<strong>de</strong>s. “São todas elas cida<strong>de</strong>scom um património mo<strong>de</strong>rno fortíssimo.A nossa [portuguesa] arquitecturacolonial em África é a arquitecturamo<strong>de</strong>rna, e temos tendência paraes<strong>que</strong>cer isso.” “Back to basics” po<strong>de</strong>também ser um regresso a tu<strong>do</strong> o <strong>que</strong>já tínhamos aprendi<strong>do</strong> no passa<strong>do</strong>.SuíçaChegamos assim ao outro extremo <strong>do</strong>mun<strong>do</strong> – a Suíça, o país on<strong>de</strong> a discussãosobre o básico está ultrapassada.Por isso, o universo <strong>que</strong> Diogo SeixasLopes nos traz (através <strong>do</strong>s projectose das fotografias <strong>de</strong> Daniel Malhão) éo <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> fecha<strong>do</strong> da farmacêuticaNovartis, em Basileia. Uma grelhabase,um conjunto impressionante<strong>do</strong>s melhores arquitectos mundiais –<strong>de</strong> Frank Gehry a Álvaro Siza, passan<strong>do</strong>por Rafael Moneo e Kazuyo Sejima–, muito dinheiro, e uma imensa preocupaçãocom o controlo.O comissário escolheu três edifícios<strong>que</strong> se encontram numa mesma fiada:<strong>do</strong>is laboratórios, um <strong>de</strong> Álvaro Siza(“vai ser uma surpresa, por<strong>que</strong> não éum edifício típico <strong>de</strong>le”) e outro <strong>de</strong>Eduar<strong>do</strong> Souto Moura, e um edifício<strong>de</strong> representação <strong>do</strong> suíço PeterMärkli. “Interessava-me perceber o<strong>que</strong> é a arquitectura na<strong>que</strong>las condiçõesextremas – e são extremas pelocontrolo e pelo dinheiro. O <strong>que</strong> é <strong>que</strong>esse dinheiro por metro quadra<strong>do</strong> fazà arquitectura <strong>de</strong> Siza e <strong>de</strong> Souto Moura?E quan<strong>do</strong> a arquitectura <strong>de</strong> Märklichega a Portugal [on<strong>de</strong> está a construircasas num ‘resort’] e tem <strong>que</strong> construirpor 800 euros o metro quadra<strong>do</strong>, comoé <strong>que</strong> aguenta esse embate? É essarelação entre o Norte e o Sul <strong>que</strong> meinteressava <strong>que</strong>stionar através <strong>de</strong> umaconversa muda <strong>do</strong>s três arquitectos e<strong>do</strong>s seus edifícios.”O básico aqui po<strong>de</strong> ser ter a maiseficaz das fronteiras entre o público eo priva<strong>do</strong>. Uma fronteira impenetrável.Resolver os problemasDepois da reflexão, a prática. A Trienal<strong>de</strong>safiou as universida<strong>de</strong>s portuguesasa fazerem um projecto para o bairroda Cova da Moura, em Lisboa, e lançouum concurso internacional (com mais<strong>de</strong> 600 participantes) para uma casaem Luanda (os vence<strong>do</strong>res <strong>de</strong> ambosserão anuncia<strong>do</strong>s na inauguração, hoje,no Museu da Electricida<strong>de</strong>).Trata-se <strong>de</strong> uma casa básica: umterreno <strong>de</strong> 250 metros quadra<strong>do</strong>s parauma casa <strong>de</strong> 100, e um espaço exterior,tu<strong>do</strong> por um custo máximo <strong>de</strong>25 mil euros. Chamaram ao concurso“Patio and Pavilion”. O <strong>que</strong> se pediaera um espaço coberto para ter intimida<strong>de</strong>,e um espaço aberto para sever o céu.[A Trienal prossegue em Novembro coma exposição “Falemos <strong>de</strong> (7) Casas” emCascais e, com a conferência internacional“Arquitectura [in] ]out[Política”,dias 19 e 20 na Aula Magna da Reitoriada Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Lisboa]Ver agenda <strong>de</strong> exposições na pág. 46CML | DPDC | Rute FigueiraÍpsilon • Sexta-feira 15 Outubro 2010 • 19

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