Em síntese, humanização, centralização no doente e eficiência ‒ value for money ‒ seriam as caraterísticas que entendo serem essenciais à organização hospitalar do século XXI. um qualquer programa de governo, porque esse está feito e é da autoria do governo e não do grupo, pelo que não compete ao grupo dizer a reforma deve ser feita desta maneira, compete ao grupo dizer que há uma determinada liderança constituída por um governo que está em funções legitimamente e o grupo tem a missão de, nas áreas que até estão definidas de forma muito clara no despacho, propor modos, processos que permitam a implementação ou a instituição no terreno dos objetivos previsto no programa, sabendo que o fundamental é garantir melhoria no acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde, encarados neste caso como a parte curativa dos cuidados de saúde, porque a saúde é algo completamente diferente, ou melhor, muito mais abrangente, por um lado, e por outro lado, conseguir fazer isto de um modo que seja comportável pelo orçamento disponível no país para o SNS. GH: Por último, quais as duas caraterísticas que entende serem essenciais à organização hospitalar do século XXI, por forma a maximizar a eficiência, efetividade e eficácia da mesma, num contexto de custos controlados, qualidade e equidade? AF: Duas é difícil… GH: Duas, três caraterísticas… AF: No século XXI eu atrevia-me a dizer que a primeira questão que é um desafio para os hospitais é a humanização. É a primeira questão. Num século de supremacia tecnológica quer do ponto de vista factual, quer do ponto de vista cultural, onde as pessoas cada vez mais almejam a imortalidade física e não só a espiritual e, portanto, criam essa utopia. Onde a morte se deslocaliza da família, do acompanhamento do grupo e do núcleo, que é a razão de viver de cada um de nós, para o hospital e para as unidades de cuidados paliativos. Perante esta nova dimensão da abordagem da doença, infelizmente cada vez mais centrada na tecnocracia ‒ na superioridade da téc- nica ‒ e cada vez menos centrada na dimensão humana do ser doente, o objetivo fundamental para um hospital poder responder cabalmente àqueles que o procuram, os doentes, é a humanização. E esse é o primeiro, o segundo e o terceiro, na minha opinião. E depois são os processos de gestão centrados exatamente naquilo que é o fluxo do doente, o processo do doente desde que entra até que sai. Esses processos de gestão implicam que nenhum serviço ou especialidade se deve centrar em si mesmo, mas no doente. Significa que um hospital não deve ser constituído por um conjunto de quintas que estão dispostas em justaposição, paralelas, umas em cima das outras num edifício de vários andares mas, bem pelo contrário, deve ter as portas abertas no sentido que o que interessa é levar o conhecimento e a tecnologia ao serviço do doente e isso não significa ou justifica que o doente tenha de estar atrás de uma porta fechada (que é da especialidade A ou da especialidade B), significa que o doente tem de estar no local mais adequado para poder estar o mais confortável possível, o mais integrado e sentir-se o mais próximo do seu lugar, e é o conhecimento, as especialidades que vão ao doente, sempre respeitando naturalmente que há questões de ordem técnica que obrigam a que haja algumas áreas específicas ‒ cuidados intensivos, etc. O terceiro aspeto tem a ver com o value for the money, tem a ver com a nossa capacidade de utilizar o dinheiro que é de todos, porque depende dos nossos impostos, e maximizar o valor desse dinheiro investido. Isso significa por um lado respeitar o princípio da economia, garantir que compramos ao mais baixo preço possível tudo, tudo o que é necessário para que o hospital funcione ‒ o que for, e não pode haver nenhum complexo relativamente a isso. Segundo ponto, que a maneira como organizamos o hospital, o processo, seja de tal maneira eficaz que permita que este produto que adquirimos, seja ele qual for, até conhecimento, tenha um output que é o melhor possível e depois este output tenha um impacto social e que esse impacto social seja positivo. Portanto, nós só temos o valor para o dinheiro, só conseguimos ter isto, se o que é impacto social justificar o dinheiro que se gasta em investimento e se não fizermos isso estamos condenados a deixar de ter SNS. A caldear tudo isto tem que haver o conceito de equidade,porque há coisas que em determinada região se conseguem a um preço mais barato, mas noutras exigem uma maior despesa e, deste modo, a equidade tem a ver com respeitar a interioridade sem cairmos no absurdo de que vamos poder ter um Otorrinolaringologista em cada esquina ou em cada terra, mas caldear este modelo com equidade. Em síntese, humanização, centralização no doente e eficiência ‒ value for money ‒ seriam as caraterísticas que entendo serem essenciais à organização hospitalar do século XXI. 32
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