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última página<br />
Sebastian Herrmann/Unsplash<br />
a zona da<br />
virtualida<strong>de</strong><br />
Stalimir Vieira<br />
comunicação virou uma enxurrada <strong>de</strong><br />
A entulhos. A menos que você tenha objetivos<br />
muito claros em sua busca, ao acionar<br />
seus meios <strong>de</strong> acesso à informação, será virtualmente<br />
atropelado por uma avalanche <strong>de</strong><br />
mensagens, em que já não se distingue claramente<br />
o que é notícia e o que é propaganda.<br />
Tudo ocupa o mesmo espaço ao mesmo<br />
tempo. Paralelamente, com o acirramento<br />
do <strong>de</strong>bate político, a recorrência a <strong>de</strong>terminados<br />
temas, <strong>de</strong> preferência polêmicos,<br />
transforma a mensagem informativa<br />
em doutrinação com<br />
objetivos eleitorais, gerando um<br />
permanente estado <strong>de</strong> instigação<br />
emocional.<br />
Trata-se sempre <strong>de</strong> algum conceito<br />
a contestar ou a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r. A<br />
propaganda, por sua vez, vê-se na<br />
obrigação <strong>de</strong> algum engajamento,<br />
a fim <strong>de</strong> conquistar nichos, engrossando<br />
o caldo propício a enfrentamentos<br />
i<strong>de</strong>ológicos.<br />
A <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m com que esse conteúdo circula,<br />
ainda que, em tese, obe<strong>de</strong>cendo a algum<br />
tipo <strong>de</strong> pre<strong>de</strong>terminação, ao ingressar<br />
no espaço acessível à nossa percepção, per<strong>de</strong><br />
essa característica, e se torna mais um<br />
item a correr pela tela, entre tantos outros,<br />
menos ou mais interessantes, ou absolutamente<br />
<strong>de</strong>sinteressantes.<br />
“A<br />
propAgAndA,<br />
por suA vez,<br />
vê-se nA<br />
obrigAção<br />
<strong>de</strong> Algum<br />
engAjAmento”<br />
Tudo se nivela, <strong>de</strong> um relato científico a<br />
uma piada homofóbica; <strong>de</strong> um comercial<br />
para o Dia das Mães a uma abordagem policial;<br />
<strong>de</strong> uma sugestão <strong>de</strong> viagem a um ato <strong>de</strong><br />
racismo; <strong>de</strong> um gol <strong>de</strong> bicicleta a um avião<br />
arremetendo; <strong>de</strong> uma receita <strong>de</strong> comida a<br />
um flagrante <strong>de</strong> infi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong>. O mundo da<br />
comunicação virtual, percorrido aleatoriamente,<br />
principalmente por quem tem interesses<br />
ecléticos, é uma verda<strong>de</strong>ira zona.<br />
Talvez aí resida o segredo do seu fascínio,<br />
essa oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ter um apanhado geral<br />
do que, na média, estamos nos transformando.<br />
Nesse mundo, tudo é revelado, sem<br />
disfarce, porque é um mundo à feição para<br />
uma exposição inescrupulosa da socieda<strong>de</strong>.<br />
Se no mundo real, há um certo pudor, no<br />
mundo virtual não há nenhum, seja <strong>de</strong> comportamento,<br />
seja <strong>de</strong> opinião. Se no mundo<br />
real há um certo compromisso com a realida<strong>de</strong>,<br />
no mundo virtual, o caminho é livre para<br />
o <strong>de</strong>senho da vida que se <strong>de</strong>sejar.<br />
É um mundo on<strong>de</strong> compromisso<br />
e <strong>de</strong>scompromisso têm o<br />
mesmo espaço e o mesmo tempo,<br />
o mesmo po<strong>de</strong>r e a mesma<br />
tolerância. Fico me perguntando,<br />
certamente como muitos outros,<br />
sobremaneira gente mais<br />
velha, a que diabo <strong>de</strong> situação<br />
isso vai nos levar.<br />
Porque se nós, os mais adultos<br />
e preparados, somos treinados,<br />
com a ida<strong>de</strong>, a separar o joio do trigo, mesmo<br />
aquele joio a que técnicas apuradíssimas<br />
<strong>de</strong>ram forma <strong>de</strong> trigo, o que ocorrerá com as<br />
novas gerações, que se formam sob a tutela<br />
<strong>de</strong>sse permanente estado <strong>de</strong> manipulação e<br />
toda sorte <strong>de</strong> estímulos contraditórios?<br />
Sem contar o fato <strong>de</strong> permanecerem, horas<br />
e dias, plugados a jogos e <strong>de</strong>safios, extensões<br />
humanas <strong>de</strong> seus aparelhos, fazendo<br />
literalmente da virtualida<strong>de</strong> a sua vida.<br />
Para além das questões psíquicas, é preocupante<br />
o que esse <strong>de</strong>sligamento po<strong>de</strong> provocar<br />
no comportamento relativo à vida real.<br />
Hoje, fala-se muito em engajamento. Mas<br />
há muito pouco <strong>de</strong> mobilização. Está todo<br />
mundo ocupado virtualmente, inclusive em<br />
discutir o assunto. Como eu, nesse texto.<br />
Stalimir Vieira é diretor da Base <strong>de</strong> Marketing<br />
stalimircom@gmail.com<br />
34 <strong>25</strong> <strong>de</strong> <strong>abril</strong> <strong>de</strong> <strong>2022</strong> - jornal propmark