Revista eMOBILIDADE+ Nº 5
A revista eMobilidade + Dedica-se, em exclusivo, à mobilidade de pessoas e bens, nos seus vários modos de transporte (rodoviário, ferroviário, aéreo, fluvial e marítimo), conferindo deste modo espaço aos mais proeminentes “stakeholders” do setor, sejam eles indivíduos, empresas, instituições ou entidades académicas.
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www.eurotransporte.pt/mobilidade-mais/<br />
N.º 5<br />
janeiro/fevereiro/março | 2024<br />
Trimestral | Continente<br />
Diretora: Cátia Mogo<br />
TEMA DE CAPA<br />
COMBUSTÍVEIS<br />
PARA A AVIAÇÃO<br />
COMERCIAL<br />
ASAS DE ESPERANÇA<br />
t<br />
INTERMODALIDADE<br />
Terminais europeus<br />
carecem de maior<br />
desenvolvimento<br />
GLOBAL MOBILITY CALL<br />
A III REVOLUÇÃO<br />
INDUSTRIAL JÁ<br />
ESTÁ EM CURSO<br />
DESCARBONIZAÇÃO<br />
Como a economia circular<br />
promove o retrofit<br />
elétrico nos camiões<br />
t<br />
TRANSIÇÃO ENERGÉTICA<br />
A transição para veículos elétricos<br />
tem sido uma das mudanças mais<br />
significativas no cenário global, mas<br />
para a maioria da população trocar<br />
o carro por um veículo elétrico<br />
exige um esforço considerável.<br />
RECICLAR<br />
Que fazer às centenas<br />
de milhões de veículos a<br />
combustão interna quando<br />
chegarem ao fim de vida,<br />
grande parte deles ainda em<br />
boas condições de operação?<br />
LOGÍSTICA<br />
As entregas de bens e mercadorias<br />
na última milha dos centros<br />
urbanos requerem soluções<br />
imaginativas. A Renault pensou<br />
em micro-utilitários algo radicais:<br />
os elétricos Bento e Freegones.
REVISTA <strong>Nº</strong>5<br />
JANEIRO/FEVEREIRO/MARÇO 2024<br />
EDIÇÃO TRIMESTRAL<br />
FALE CONNOSCO<br />
emobilidademais@invesporte.pt<br />
+351 215 914 293<br />
CARLOS BRANCO<br />
EDITORIAL<br />
Histórica! Assim se classifica a viagem aérea entre Londres e<br />
Nova Iorque realizada em 28 de novembro com recurso a<br />
combustível 100% sustentado. Sem uma gota de carburante<br />
com origem fóssil, aquele voo deu asas à esperança por um<br />
futuro mais limpo na mobilidade de longa distância. E é bem<br />
preciso, pois se as preocupações ambientais são cada vez mais prementes, a<br />
massificação turística não para de aumentar. Se há cada vez mais voos e maior<br />
pressão sobre as companhias aéreas e as infraestruturas é preciso fazer algo<br />
para que a economia - e apenas a famigerada economia - não seja a única a<br />
levar a melhor.<br />
No tema de capa que produzimos contamos como o voo foi operado, o que já<br />
regulamentou a Comissão Europeia, que desafios enfrentam agora as companhias<br />
aéreas e os custos envolvidos para desenvolver tal sustentabilidade. É<br />
que tal combustível (SAF) ainda é produzido em quantidade escassa, e é mais<br />
caro, o que pode originar o aumento do preço a pagar pelos viajantes. É o que<br />
também nos diz Carlos Paneiro, expert em aviação comercial, em texto de<br />
opinião.<br />
Como a aviação com recurso a energia elétrica e a hidrogénio também é contemplada<br />
pelos políticos recordamos como se fez uma viagem de circum-navegação<br />
com recurso único à energia solar, a mais poderosa de todas, inesgotável<br />
e não poluente. Em outro vetor, Acácio Pires, da Associação ZERO,<br />
adverte para algo raramente falado e igualmente preocupante: que custos tem<br />
o ruído provocado pela aviação comercial para a saúde dos cidadãos.<br />
Na mobilidade terrestre, em Madrid falou-se da transição energética e de<br />
como poderemos estar a entrar na terceira Revolução Industrial. Os atores<br />
da indústria multiplicam os esforços para de adaptarem às novas exigências,<br />
como a Renault, que através da marca Dacia, tem explorado como ninguém, e<br />
com grande sucesso, o GPL, um combustível alternativo, bastante mais barato<br />
e menos nocivo para o ambiente.<br />
--------------------------------------------------------------------------------------<br />
DIRETORA<br />
Cátia Mogo<br />
--------------------------------------------------------------------------------------<br />
EDITOR<br />
Eduardo de Carvalho<br />
----------------------------------------------------------------------------------------<br />
REDAÇÃO<br />
Ana Filipe<br />
Carlos Branco<br />
Márcia Dores<br />
--------------------------------------------------------------------------------------<br />
COLABORADORES<br />
António Macedo, Filipe Carvalho<br />
e Frederico Gomes<br />
--------------------------------------------------------------------------------------<br />
DIREÇÃO DE COMUNICAÇÃO E MARKETING<br />
Nuno Francisco<br />
---------------------------------------------------------------------------------------<br />
PUBLICIDADE<br />
Margarida Nascimento<br />
Rui Garrett<br />
--------------------------------------------------------------------------------------<br />
PAGINAÇÃO<br />
Rogério Grilho<br />
---------------------------------------------------------------------------------------<br />
ASSINATURAS<br />
Fernanda Teixeira<br />
--------------------------------------------------------------------------------------<br />
Registo ERC N.º 127896<br />
---------------------------------------------------------------------------------------<br />
PROPRIEDADE<br />
Eduardo de Carvalho<br />
--------------------------------------------------------------------------------------<br />
INVESPORTE<br />
EDITORA DE PUBLICAÇÕES, LDA<br />
Contribuinte N.º 505 500 086<br />
Edição, Redação e Administração<br />
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1600-259 Lisboa<br />
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dos artigos, fotografias, ilustrações e<br />
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autores, não reflectindo necessariamente<br />
os pontos de vista da Direção da <strong>Revista</strong>,<br />
do Conselho Editorial ou do Editor.<br />
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ESTATUTO EDITORIAL:<br />
https://www.eurotransporte.pt/noticia/38/5193/<br />
estatuto-editorial-e-lei-da-transparencia/<br />
www.emobilidademais.pt<br />
www.eurotransporte.pt/mobilidade-mais/
REVISTA <strong>Nº</strong> 5<br />
JAN/FEV/MAR 2024<br />
12<br />
O SAF SERÁ O COMBUSTÍVEL DE FUTURO<br />
PARA A AVIAÇÃO COMERCIAL<br />
28<br />
OS CONTRATOS DE SERVIÇO<br />
PÚBLICO DE PASSAGEIROS –<br />
1ª GERAÇÃO<br />
28<br />
32<br />
O DESENVOLVIMENTO DE<br />
TERMINAIS INTERMODAIS<br />
NA EUROPA<br />
38<br />
GLABAL MOBILITY CALL: EM<br />
MADRID AFIRMOU-SE QUE<br />
A III REVOLUÇÃO INDUSTRIAL<br />
ESTÁ EM CURSO<br />
38<br />
42<br />
DESCARBONIZAR: CHEGOU<br />
O RETROFIT ELÉTRICO PARA<br />
CAMIÕES<br />
52<br />
CONTACTO COM OS BYD<br />
HAN E TANG<br />
56<br />
COMBUSTÍVEL ALTERNATIVO:<br />
O GPL DOS DACIA<br />
56<br />
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4 e-MOBILIDADE<br />
+
Via Rápida<br />
Empresas preferem veículos elétricos devido<br />
aos custos de utilização mais baixos<br />
Ayvens, a nova marca de mobilidade global que resulta da união<br />
da LeasePlan e da ALD Automotive, acaba de publicar a nova<br />
edição do seu Mobility Guide, uma análise abrangente para melhor<br />
compreender o mundo dos veículos elétricos e a maturidade de<br />
cada país na transição para a sua adoção. A Ayvens tem atualmente<br />
a maior frota de veículos elétricos multimarca a nível mundial e<br />
pretende com este estudo contribuir para uma transição bem<br />
sucedida para a mobilidade elétrica por parte das empresas,<br />
fornecendo elementos essenciais para que os gestores de frota<br />
possam implementar esses processos em cada país. O estudo reúne<br />
indicadores de 46 países e visa apoiar o caminho da eletrificação,<br />
numa era de grandes transformações na indústria automóvel,<br />
partilhando conhecimento e estratégias que irão moldar o futuro<br />
da mobilidade. A análise é feita sobre a percentagem das vendas<br />
que os veículos elétricos representam em cada país, a dimensão e<br />
qualidade da infraestrutura de carregamento, os incentivos fiscais<br />
existentes, os custos totais de utilização comparados com os veículos<br />
a combustão e a diversidade de modelos disponíveis. Lideram a<br />
classificação a Noruega com 81 pontos, seguida da Áustria com 69 e<br />
dos Países Baixos com 68. Portugal ocupa a 11ª posição do ranking<br />
com 57 pontos e é o líder na categoria dos países “em transição”,<br />
a escassos 3 pontos do Reino Unido que ocupa a 10ª posição com<br />
60 pontos e fecha o lote dos países “desenvolvidos”. Portugal<br />
apresenta pontuação máxima no indicador paridade dos custos totais<br />
de utilização, ou seja, os veículos 100% elétricos para empresas em<br />
Portugal apresentam custos de utilização inferiores aos veículos a<br />
combustão de segmento equivalente.<br />
SU7 é o primeiro carro<br />
elétrico da Xiaomi<br />
A Xiaomi acaba de lançar globalmente a sua tecnologia<br />
Xiaomi EV (Electric Vehicle), concebida especificamente<br />
para revolucionar o segmento dos veículos elétricos,<br />
revelando oficialmente as suas cinco componentes principais<br />
– E-Motor, Bateria, Xiaomi Die-Casting, Xiaomi<br />
Pilot Autonomous Driving e Smart Cabin. A partir do desenvolvimento<br />
de raiz de soluções fundamentais, a Xiaomi<br />
pretende assim redefinir a tecnologia da indústria<br />
automóvel. O primeiro produto da Xiaomi EV, o Xiaomi<br />
SU7, foi “pré-lançado”, com o seu design, desempenho,<br />
autonomia, segurança e outros pormenores, posicionando-se<br />
como um “sedan ecológico de alto desempenho<br />
de tamanho normal”, com o objetivo de ultrapassar os<br />
limites da performance, do ecossistema e do espaço<br />
móvel inteligente. O fundador, presidente e CEO da<br />
Xiaomi Corporation, Lei Jun, afirmou que a entrada da<br />
Xiaomi na indústria automóvel marca um salto significativo<br />
em relação à indústria dos smartphones e um passo<br />
crucial para fechar o ciclo do ecossistema inteligente<br />
“Human x Car x Home”. Lei Jun expressou ainda que a<br />
indústria automóvel centenária oferece pouca margem<br />
de manobra atualmente: “A Xiaomi decidiu investir dez<br />
vezes mais e pretende tornar-se um dos cinco principais<br />
fabricantes de automóveis a nível mundial.”<br />
MUBi e FPC renovam cooperação pelo uso diário da bicicleta<br />
A Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta (MUBi) e a Federação Portuguesa de Ciclismo (FPC)<br />
renovaram em 2022 o protocolo de colaboração que visa fortalecer as condições de cooperação entre as<br />
duas entidades, procurando benefícios para todos os utilizadores de bicicleta. O protocolo permite aos<br />
associados da MUBi - que manifestem essa intenção - serem simultaneamente filiados na FPC, beneficiando<br />
das mesmas vantagens ao nível dos seguros de acidentes pessoais e de responsabilidade civil. Nas<br />
condições explicitadas em cada uma das apólices, qualquer dos seguros cobre o uso quotidiano da bicicleta<br />
como meio de transporte ou em viagem. Existem três tipos de seguro à disposição: CPT - CICLISMO PARA<br />
TODOS - 36,00€/39,50€ (se pretender receber cartão de federado) - Seguro de acidentes pessoais e seguro<br />
de responsabilidade civil sem franquia; PEDALA! - 27,00€ - Seguro de acidentes pessoais com franquia de<br />
€60, Seguro de responsabilidade civil com franquia de €100, limite de idade de 75 anos; PEDALA! FAMÍLIA<br />
- Desde 22,00€ (valor por pessoa - mínimo de três aderentes por família), Seguro de acidentes pessoais com<br />
franquia de €60, Seguro de responsabilidade civil com franquia de €100, limite de idade de 75 anos.<br />
6 e-MOBILIDADE
Transdev investe 4,5 milhões em dez autocarros elétricos<br />
A Transdev investiu 4,5 milhões de euros para reforçar a frota de<br />
autocarros elétricos da AveiroBus, com mais dez viaturas com<br />
zero emissões poluentes que vão permitir a redução da pegada<br />
de carbono de toda a operação da AveiroBus em 383 toneladas/<br />
ano. O investimento inclui uma infraestrutura de carregamento<br />
com características inovadoras em Portugal. Com os cinco<br />
carregadores duplos foram também instaladas câmaras térmicas<br />
para detetar possíveis focos iniciais de incêndio e criadas<br />
barreiras para evitar a propagação das chamas. A capacidade<br />
das baterias destes novos autocarros vai permitir realizar o dia<br />
completo de operação e efetuar os carregamentos nas horas de<br />
vazio, minimizando custos e a carga sobre a rede elétrica. Além<br />
de mais confortáveis, de não gerarem emissões poluentes e de<br />
permitirem poupanças energéticas significativas, as novas viaturas são também mais seguras. A partir de agora, 45% da frota<br />
da AveiroBus é elétrica e 60% dos quilómetros da operação vão ser realizados por viaturas com zero emissões.<br />
Mais duas ligações Alfa Pendular entre Lisboa e Porto<br />
A CP - Comboios de Portugal aumentou a oferta nos serviços Alfa Pendular, adicionando duas<br />
novas ligações entre Lisboa e Porto. Esta inovação responde às necessidades crescentes de mobilidade<br />
entre as duas maiores cidades do país, reforçando a missão da CP em oferecer opções<br />
de viagem flexíveis, rápidas e confortáveis. O Alfa Pendular 128, partindo de Porto-Campanhã<br />
às 7h32 e chegando a Lisboa-Santa Apolónia às 10h30, oferece uma solução prática tanto para<br />
profissionais quanto para quem viaja por lazer. Com esta nova opção, a CP proporciona aos seus<br />
passageiros uma alternativa menos madrugadora e igualmente eficiente ao Alfa Pendular 130. Já<br />
o Alfa Pendular 129, com partida de Lisboa-Santa Apolónia às 20h e chegada a Porto-Campanhã<br />
às 22h58, é a solução para quem precisa viajar no final do dia. Esta adição ao serviço garante<br />
maior flexibilidade quem procura opções mais convenientes. Estas ligações reafirmam o compromisso<br />
da CP em adaptar-se às exigências do mercado.<br />
Atomic Special Hotel melhorado<br />
Mantendo a sua promessa de constante inovação, a Irmãos Mota<br />
S.A. apresenta adições ao seu modelo Atomic Special Hotel. O autocarro<br />
foi encomendado pela empresa Pieter Smit (Holanda), especialista<br />
no transporte de clientes ligados ao mundo do entretenimento.<br />
O veículo pode ser personalizado para ter um ou dois pisos e é a<br />
viatura indicada para transportar os mais variados staffs ao longo dos<br />
mais longínquos percursos, prometendo-lhes conforto e bem-estar,<br />
como se estivessem realmente numa suite de hotel com dois pisos,<br />
sendo que, no piso inferior estão instaladas mesas com suporte de<br />
copos, tomadas 220V e tomadas para cabos USB. Dispõe também<br />
de kitchenette equipada com micro-ondas, máquina de café e arca<br />
frigorífica, prateleiras e armários para arrumação. Ao aceder ao piso<br />
superior, os passageiros encontram uma área que pode ser dedicada<br />
ao descanso ou ao trabalho. Aqui, os passageiros podem relaxar<br />
nos sofás, ver televisão, fazer uso de aparelhos como a PlayStation<br />
5, ou simplesmente desfrutar do wi-fi a bordo. Os sofás podem ser<br />
convertidos em cama, garantindo que a possibilidade de personalização<br />
está sempre disponível.<br />
Aveiro expande rede de carregamento<br />
de passes através da Pagaqui<br />
Os utilizadores da Busway, operadora de transportes da Comunidade<br />
Intermunicipal da Região de Aveiro (CIRA), podem agora<br />
utilizar os 89 pontos de venda da rede Pagaqui para carregar os<br />
seus passes de transporte, uma medida que visa melhorar o acesso<br />
à rede de transportes públicos da região. Anteriormente, os cerca<br />
de 4 mil assinantes dos passes da Busway tinham apenas um ponto<br />
de carregamento disponível por município. Com este acordo, a<br />
capacidade de carregamento de passes é estendida a todos os<br />
agentes da Pagaqui já presentes na região. A parceria implicou<br />
a abertura de novos pontos de venda na região, bem como a inclusão<br />
da funcionalidade de carregamento nos pontos já existentes.<br />
O CEO da fintech, João Bacalhau, estima que a rede da Pagaqui<br />
nos municípios da CIRA aumente em cerca de 20% durante este<br />
ano e também que a maior acessibilidade contribua para o aumento<br />
dos utilizadores dos transportes públicos da região.<br />
e-MOBILIDADE 7
8 e-MOBILIDADE
SAÚDE<br />
Quem paga os<br />
custos astronómicos<br />
do ruído produzido pelo<br />
setor dos transportes?<br />
Em Portugal não é conhecido nenhum estudo consistente que estime<br />
os custos globais dos danos provocados por este fenómeno<br />
O RUÍDO AMBIENTE TEM CUSTOS<br />
ECONÓMICOS?<br />
Recentemente a Comissão Técnica Independente,<br />
constituída pelas personalidades<br />
mais qualificadas para conduzir<br />
a mais extensa, completa e participada<br />
avaliação jamais realizada em Portugal<br />
sobre um das decisões mais complexas<br />
da história recente do país, apresentou<br />
o relatório preliminar que organiza e<br />
ordena a evidência científica disponível<br />
sobre as diferentes opções estratégicas<br />
consideradas viáveis durante a primeira<br />
fase da Avaliação Ambiental Estratégica.<br />
A propósito desta avaliação, tendo em<br />
conta que o impacto do transporte<br />
aéreo sobre a saúde de centenas de<br />
milhar de pessoas afetadas pelo ruído<br />
produzido pelas aeronaves que sobrevoam<br />
áreas densamente povoadas dos<br />
concelhos de Lisboa, Loures e Almada<br />
tem sido uma questão intensamente<br />
acompanhada pela ZERO dada a<br />
magnitude do fenómeno em causa, e<br />
considerando que está em preparação<br />
por parte da (APA) a Estratégia Nacional<br />
para o Ruído Ambiente, justifica-se<br />
que olhemos com atenção para este<br />
fenómeno de modo a reduzir os seus<br />
impactos sociais, ambientais e económicos.<br />
Os impactos económicos e na saúde<br />
humana do ruído ambiente, têm claramente<br />
sido negligenciados pela sociedade<br />
e pelos agentes políticos, sociais<br />
e económicos. O último grande estudo<br />
realizado num país da União Europeia<br />
talvez tenha sido aquele que foi conduzido,<br />
em 2021, pela Agência Francesa<br />
da Transição Ecológica (ADEME) e o<br />
Conselho Nacional do Ruído de França<br />
(CNB) e que estimou os custos deste<br />
fenómeno em cerca de 147 mil milhões<br />
de euros por ano. Em Portugal não é<br />
conhecido nenhum estudo consistente<br />
que estime os custos globais dos danos<br />
provocados por este fenómeno, o<br />
trabalho de maior dimensão realizado<br />
recentemente foi realizado pelo grupo<br />
de trabalho constituído pelo Ministério<br />
das Infraestruturas para avaliar quais<br />
as medidas mais custo-eficazes em<br />
relação à limitação dos voos noturnos<br />
ACÁCIO PIRES<br />
Policy Officer da ZERO - Associação Sistema<br />
Terrestre Sustentável<br />
e-MOBILIDADE 9
OPINIÃO<br />
Acácio Pires<br />
no Aeroporto Humberto Delgado e<br />
projetou que os custos para a saúde do<br />
ruído produzido pelos voos noturnos<br />
para a saúde e bem-estar da população<br />
podem atingir os 206 milhões num<br />
único ano, já a ZERO, usando uma<br />
metodologia mais próxima daquela<br />
que foi usada em França, estima que<br />
os custos globais do ruído produzido<br />
pelas aeronaves que aterram e descolam<br />
da Portela durante as 24 horas do<br />
dia para a saúde, a produtividade e o<br />
património das pessoas e instituições<br />
afetadas se situava em 2019 nos cerca<br />
de 1300 milhões de euros.<br />
TAXAS DE RUÍDO<br />
A aplicação de taxas de ruído decorre<br />
do princípio do poluidor-pagador presente<br />
na legislação nacional e europeia<br />
e é já uma prática, por exemplo nos<br />
aeroportos franceses. Em Portugal a<br />
sua introdução passaria, com elevada<br />
probabilidade, por uma alteração ao<br />
Regulamento Geral do Ruído que,<br />
entre outros aspectos, obrigasse os<br />
gestores de grandes infraestruturas de<br />
transporte, que neste momento são<br />
responsáveis por apresentar planos<br />
de redução e gestão de ruído, a medir<br />
anualmente o impacto económico do<br />
ruído produzido pela utilização dessas<br />
infraestruturas, que seria a base para<br />
a aplicação dessa taxa aos utilizadores<br />
em função do ruído que produzem.<br />
Voltando à análise realizada pela CTI,<br />
é interessante verificar que a diferença<br />
de custos entre as Opções Estratégicas<br />
que incluem a construção de uma pista<br />
na Base Aérea do Montijo, consideradas<br />
inviáveis por motivos económicos,<br />
ambientais e aeronáuticos, e as<br />
Opções Estratégicas que admitem que<br />
a primeira pista do futuro aeroporto<br />
único se faça em Alcochete ou Vendas<br />
Novas, se situam nos 2000 milhões<br />
de euros, e demoram entre 7 e 9 anos,<br />
é notável que a simples aplicação de<br />
taxas de ruído – proposta que tanto a<br />
ZERO como a administração executiva<br />
da ANA partilham – num valor global<br />
correspondente aos danos provocados<br />
pelos movimentos aéreos na região de<br />
Lisboa – de pelo menos 200 milhões<br />
de euros por ano – permitiria colmatar<br />
essa diferença de investimento eliminando<br />
num prazo relativamente curto<br />
uma das mais importantes fontes de<br />
ruído da região de Lisboa e ao mesmo<br />
tempo permitindo desenvolver<br />
uma das opções consideradas viáveis<br />
podendo reduzir, eventualmente, os<br />
obstáculos à negociação com a concessionária.<br />
O que fazer com as receitas das taxas?<br />
As receitas das taxas de ruído<br />
devem servir fundamentalmente três<br />
propósitos:<br />
1Eliminar ou reduzir fortemente a<br />
emissão de ruído na fonte;<br />
2Sempre que não é custo-eficaz<br />
eliminar a emissão na fonte, investir<br />
na redução do ruído com impacto junto<br />
dos recetores sensíveis;<br />
3Monitorização dos efeitos do ruído e<br />
tratamento das suas consequências<br />
junto das pessoas e instituições afetadas.<br />
Dada a enorme dimensão dos impactos<br />
económicos e sociais deste fenómeno,<br />
não é possível continuar a ignorá-lo e<br />
urge edif icar uma estratégia robusta<br />
e coerente que torne obrigatório<br />
considerá-lo transversalmente nas<br />
decisões a adotar pelos diferentes<br />
atores. Não podem continuar a ser<br />
apenas os cidadãos expostos a níveis<br />
insalubres de ruído ambiente a pagar os<br />
seus custos.<br />
Os impactos económicos<br />
e na saúde humana<br />
do ruído ambiente<br />
têm claramente sido<br />
negligenciados pela<br />
sociedade e pelos agentes<br />
políticos, sociais e<br />
económicos<br />
10 e-MOBILIDADE
a No<br />
TEMA DE CAPA<br />
De Londres<br />
12 e-MOBILIDADE
Em 28 de novembro, o voo 100 da Virgin Atlantic foi de Londres a Nova Iorque<br />
apenas com recurso a combustível 100 % sustentável (SAF), dispensando o<br />
tradicional jet-fuel, e demonstrou ser uma solução viável para substituir o carburante<br />
de aviação com origem fóssil. O problema é que ainda não é produzido em<br />
quantidade suficiente para se generalizar, e é mais caro, o que deverá fazer aumentar<br />
o preço das viagens.<br />
va Iorque<br />
sem uma gota de<br />
combustível fóssil<br />
Por Carlos Branco<br />
e-MOBILIDADE 13
TEMA DE CAPA<br />
Aviação Comercial Sustentável<br />
SAF é o futuro da<br />
aviação comercial?<br />
O<br />
voo 100 Londres-Nova<br />
Iorque, operado pela<br />
Virgin Atlantic com<br />
recurso a um Boeing 787<br />
equipado com motores<br />
Rolls-Royce Trent 1000, cruzou o Atlântico<br />
norte no dia 28 de novembro sem<br />
uma gota de jet-fuel a bordo, substituído<br />
por umas dezenas de toneladas de<br />
combustível de aviação sustentável, já<br />
conhecido por SAF, que mais não é que<br />
uma mistura de gorduras residuais, açucares<br />
e proteínas vegetais, óleos e fibras<br />
e querosene aromático sintético. Foi um<br />
voo e um dia históricos para a aviação<br />
comercial e para o ambiente.<br />
O SAF demonstrou que é um substituto<br />
seguro para o combustível de aviação<br />
derivado de fósseis e solução viável a<br />
médio prazo para descarbonizar a aviação<br />
de longo curso. O empreendimento<br />
foi antecedido de muita ponderação<br />
e testes, careceu de uma autorização<br />
especial e não transportou passageiros a<br />
bordo, mas apenas os tripulantes necessários<br />
e alguns convidados.<br />
Foi viabilizado após anos de colaboração<br />
radical entre as parte de um<br />
consórcio liderado pela Virgin Atlantic,<br />
incluindo a Boeing, Rolls-Royce,<br />
Imperial College London, Universidade<br />
de Sheffield, ICF e Rocky Mountain<br />
O SAF demonstrou que é<br />
um substituto seguro para<br />
o combustível de aviação<br />
derivado de fósseis e<br />
solução viável a médio<br />
prazo para descarbonizar<br />
a aviação de longo curso<br />
Institute, em parceria com o Departamento<br />
de Transportes do Reino Unido, a<br />
BP e a Virent, ambos fornecedores das 60<br />
toneladas de SAF necessários para os ensaios<br />
e o voo. O combustível alternativo<br />
foi considerado seguro e compatível com<br />
os motores, fuselagens e infraestrutura<br />
de combustível atuais, e que certamente<br />
desempenhará um papel relevante na<br />
descarbonização da aviação de longo<br />
curso e no caminho para o Net Zero<br />
2050, pois proporciona uma economia<br />
de emissões de CO 2<br />
de até 70%.<br />
ESCASSA PRODUÇÃO<br />
Enquanto outras tecnologias, como<br />
a elétrica e o hidrogénio, ou não se<br />
adequam à aviação de longo curso ou<br />
ainda não estão totalmente desenvolvidas,<br />
o SAF já é usado em mistura com o<br />
jet-fuel. De momento, representa menos<br />
de 0,2% dos volumes globais de produção<br />
de combustível de aviação e as<br />
normas internacionais permitem apenas<br />
uma mistura máxima de 50% SAF em<br />
motores de jatos comerciais. O voo 100<br />
demonstrou que o desafio de aumentar<br />
a produção cabe agora à política e ao<br />
investimento, e a indústria e os governos<br />
devem agir rapidamente para criar<br />
volumes suficientes para abastecimento,<br />
uma vez provadas as capacidades<br />
técnicas, a que se seguem as avaliações<br />
das emissões não carbónicas do voo. Tal<br />
estudo será feito com o apoio dos parceiros<br />
do consórcio ICF, o Rocky Mountain<br />
Institute (RMI), o Imperial College<br />
London e a Universidade de Sheffield.<br />
Sustenta a Virgin Atlantic que a pesquisa<br />
melhorará a compreensão científica<br />
dos efeitos do SAF quanto às emissões<br />
de partículas e ajudará a implementar<br />
previsões no processo de planeamento<br />
de futuros voos. Tais dados e pesquisas<br />
serão partilhados com a indústria em<br />
opensource.<br />
14 e-MOBILIDADE
“NÃO SE PODE FAZER?<br />
VAMOS FAZÊ-LO!”<br />
Sir Richard Branson, fundador da Virgin<br />
Atlantic, declarou no final do voo que<br />
“o mundo sempre assumirá que algo<br />
não pode ser feito, até que você o faça.<br />
O espírito de inovação é chegar lá e tentar<br />
provar que podemos fazer as coisas<br />
melhor para o benefício de todos.”<br />
“A Virgin Atlantic vem desafiando o status<br />
quo e pressionando a indústria da aviação<br />
a nunca se estabelecer e a fazer melhor<br />
desde 1984. Avançando quase 40 anos,<br />
esse espírito pioneiro continua a ser o<br />
coração da Virgin Atlantic, à medida que<br />
ultrapassa os limites das aeronaves de<br />
fibra de carbono e das atualizações da<br />
frota para combustíveis sustentáveis. Eu<br />
não poderia estar mais orgulhoso de estar<br />
a bordo do voo 100 ao lado das equipas<br />
da Virgin Atlantic e dos nossos parceiros,<br />
que têm trabalhado juntos para definir o<br />
caminho de voo para a descarbonização<br />
da aviação de longa distância”, acrescentou<br />
o empresário.<br />
Um dos que estavam a bordo, o secretário<br />
de Transportes, Mark Harper, manifestou-se<br />
otimista na possibilidade de<br />
descarbonizar o transporte agora e no<br />
futuro, reduzindo as emissões do ciclo<br />
de vida em 70% e inspirando a próxima<br />
geração de soluções, enquanto o<br />
primeiro-ministro Rishi Sunak disse que<br />
o voo foi “um marco importante para<br />
tornar as viagens aéreas mais ecológicas<br />
e descarbonizar os nossos céus”.<br />
Para Shai Weiss, presidente-executivo<br />
da Virgin Atlantic, “precisamos ir mais<br />
além, pois, simplesmente, não há SAF<br />
suficiente [o combustível usado para o<br />
voo foi importado dos EUA e da União<br />
Europeia] e está claro que, para chegar<br />
à produção em escala, precisamos ver<br />
significativamente mais investimentos.<br />
VOO 100<br />
Ficou evidente que o desafio de<br />
aumentar a produção cabe agora à<br />
política e ao investimento, e a indústria<br />
e os governos devem agir rapidamente<br />
para criar volumes suficientes para<br />
abastecimento, uma vez provadas<br />
as capacidades técnicas, a que se<br />
seguem as avaliações das emissões não<br />
carbónicas do voo<br />
Isso só acontecerá quando a segurança<br />
regulatória e os mecanismos de suporte<br />
de preços, apoiados pelos governos,<br />
estiverem em vigor. O voo 100 prova<br />
que, se você conseguir, nós voaremos.”<br />
Mark Harper disse também que o Governo<br />
“continuará a apoiar a emergente<br />
indústria SAF do Reino Unido à medida<br />
que cria empregos, cresce a economia e<br />
nos leva ao ‘jet zero’”.<br />
Para alcançar o Net Zero 2050, a inovação<br />
e o investimento necessários em todas as<br />
matérias-primas e tecnologias disponíveis<br />
devem ser aproveitados para maximizar<br />
os volumes de SAF, bem como continuar<br />
a investigação e o desenvolvimento<br />
necessários para colocar novas aeronaves<br />
com emissões zero no mercado. A Virgin<br />
Atlantic diz-se comprometida em encontrar<br />
maneiras mais sustentáveis de voar,<br />
mas será necessário criar uma indústria<br />
para cumprir a meta de 10% SAF da aviação<br />
até 2030, capitalizando os benefícios<br />
sociais e económicos significativos que<br />
trará – estima-se que na ordem de 1,8<br />
mil milhões de libras em Valor Adicionado<br />
Bruto para o Reino Unido e mais de<br />
10.000 empregos.<br />
Simon Burr, diretor do grupo de engenharia,<br />
tecnologia e segurança da Rolls-Royce<br />
manifestou-se orgulhoso pelo<br />
desempenho dos motores Trent 1000.<br />
“A Rolls-Royce concluiu recentemente<br />
testes de compatibilidade de 100% SAF<br />
em todos os tipos de motores aeronáuticos<br />
civis em produção e esta é mais uma<br />
prova de que não há barreiras tecnológicas<br />
de motor para o uso de 100% SAF.<br />
O voo representa um marco importante<br />
para toda a indústria da aviação em sua<br />
jornada rumo às emissões líquidas zero<br />
de carbono”, declarou.<br />
e-MOBILIDADE 15
Em vésperas da COP28, conferência das Nações Unidas<br />
HIST<br />
para as alterações climáticas, foi, pela primeira vez,<br />
operado por uma companhia aérea comercial, um voo<br />
transatlântico inteiramente alimentado por combustível<br />
sustentado para a aviação (SAF).<br />
VOO 16 e-MOBILIDADE
CARLOS PANEIRO<br />
SAF – Pela descarbonização<br />
da indústria da aviação<br />
ÓRICO<br />
Consultor em Aviação Comercial<br />
O<br />
voo 100 da Virgin<br />
Atlantic, operado por um<br />
Boeing 787 com motores<br />
Rolls-Royce Trent 1000,<br />
entre Londres e Nova<br />
Iorque, do passado dia 28 de Novembro,<br />
enquadra-se no âmbito de um<br />
vasto conjunto de iniciativas levadas<br />
a cabo por companhias aéreas com o<br />
intuito de acelerar o caminho que conduza<br />
ao concretizar do objetivo definido<br />
pela IATA (Associação Internacional de<br />
Transporte Aéreo) de emissões zero até<br />
2050 – Fly Net Zero.<br />
Entre outros, recorde-se que, recentemente,<br />
a 22 de Novembro, a Emirates<br />
realizou um voo de demonstração<br />
operado por um dos seus super jumbos,<br />
com um dos quatro motores do Airbus<br />
A380 a ser inteiramente alimentado<br />
por SAF. Antes, a 22 de Julho do ano<br />
passado, assinalando uma parceria entre<br />
a TAP, a GALP e a ANA, foi operado<br />
por um avião Airbus A321neo, entre<br />
Lisboa e Ponta Delgada, o primeiro voo<br />
da companhia aérea nacional abastecido<br />
com 39% de SAF, contribuindo para<br />
uma diminuição de 35% das emissões<br />
de CO 2<br />
. A Virgin Atlantic reclama que a<br />
redução de CO 2<br />
pela utilização de SAF<br />
é de até 70% quando se compara com o<br />
tradicional combustível fóssil.<br />
A atual regulamentação proíbe as<br />
companhias aéreas de realizarem<br />
voos comerciais com uma mistura de<br />
combustível que contenha mais do que<br />
50% de SAF. Por isso, quer o da Virgin<br />
Atlantic quer o da Emirates, foram voos<br />
de demonstração com o intuito de providenciarem<br />
dados técnicos concretos,<br />
e-MOBILIDADE 17
OPINIÃO<br />
Carlos Paneiro<br />
bem como para chamarem a atenção<br />
de fornecedores, clientes e reguladores<br />
para as ações que a indústria da aviação<br />
comercial, responsável por 2,5% do<br />
total das emissões de carbono (4% na<br />
Europa), está a desenvolver para mitigar<br />
o problema que mais aflige o nosso planeta,<br />
e para a necessidade de aumentar<br />
a produção de SAF a uma escala bem<br />
mais elevada.<br />
Para além do já referido objetivo de<br />
emissões zero até 2050, a indústria<br />
definiu um conjunto de objetivos<br />
intermédios, incluindo o de incorporar<br />
2% de SAF até 2025, aumentando para<br />
5% até 2030. Para se ter uma ideia em<br />
que ponto estamos neste processo, hoje,<br />
o SAF representa apenas cerca de 0,2%<br />
do total do jet fuel consumido.<br />
A CONTESTAÇÃO<br />
DOS AMBIENTALISTAS<br />
A crescente, apesar de ainda diminuta,<br />
incorporação de SAF no jet fuel<br />
aparenta ser uma auspiciosa notícia por<br />
parte de uma indústria que enfrenta um<br />
dos maiores desafios do processo de<br />
descarbonização.<br />
Apesar disso, nem todos estão de<br />
acordo. Há quem considere que estas<br />
ações não são mais do que “marketing<br />
gimmicks”, dado que o tipo de SAF<br />
presentemente utilizado no combustível<br />
para a aviação em pouco ou nada contribui<br />
para compensar a emissão de CO 2<br />
da indústria da aviação, que aumentou<br />
a uma taxa entre 4% e 5% durante a<br />
última década.<br />
As organizações ambientalistas têm defendido<br />
que SAF é um conceito umbrella<br />
que incorpora diferentes composições de<br />
combustível sustentado para a aviação.<br />
Há alguns tipos de SAF que podem, efetivamente,<br />
reduzir o impacto climático<br />
da aviação, enquanto outros podem ser<br />
curas piores do que a doença.<br />
Esse, defendem, é o caso do SAF atualmente<br />
utilizado na aviação, produzido<br />
a partir de matérias-primas, ditas<br />
sustentáveis, incluindo óleo de cozinha<br />
usado e gordura animal, e parcelas de<br />
resíduos de milho utilizados na produção<br />
de ração animal. Argumentam que a<br />
única opção verdadeiramente sustentável<br />
é produzir um combustível sintético<br />
utilizando carbono capturado<br />
combinado com hidrogénio verde.<br />
Porém, tais “e-fuels” são extremamente<br />
caros e consomem muitos recursos na<br />
sua produção, havendo a necessidade de<br />
aumentar significativamente o fornecimento<br />
de energia renovável de forma a<br />
produzir tal combustível em quantidades<br />
satisfatórias.<br />
Por isso, os ambientalistas afirmam que<br />
o mais relevante para a descarbonização<br />
não é a introdução das energias limpas,<br />
mas a diminuição drástica do consumo<br />
A 22 de Julho de 2022,<br />
assinalando uma parceria<br />
entre a TAP, a GALP e a<br />
ANA, foi operado por um<br />
avião Airbus A321neo,<br />
entre Lisboa e Ponta<br />
Delgada, o primeiro<br />
voo da companhia aérea<br />
nacional abastecido com<br />
39% de SAF<br />
do petróleo, carvão e gás natural, pois<br />
que, apesar dos aviões serem cada vez<br />
mais eficientes, há cada vez mais voos<br />
e, consequentemente, mais emissões<br />
de CO 2<br />
, com a procura de passageiros<br />
estimada para 2024, segundo as projeções<br />
da IATA, a ultrapassar os níveis<br />
pré-pandemia. No contexto atual, até<br />
que a tecnologia que permita emissões<br />
zero esteja disponível, defendem, voar<br />
menos é a única atitude que permite<br />
cortar as emissões de carbono.<br />
O FENÓMENO “FLIGHT SHAME”<br />
A Europa, em 2019, foi responsável<br />
por cerca de 22% do total das emissões<br />
globais de CO 2<br />
da indústria da aviação,<br />
numa lista encabeçada pela América<br />
do Norte com uma parcela de 27% das<br />
mesmas. Porém, é no velho continente<br />
que têm sido visíveis as ações mais<br />
firmes no sentido da descarbonização<br />
desta indústria com o intuito de o tornar<br />
“the first climate-neutral continent”.<br />
Entre essas ações, a mais significativa foi<br />
implementada no passado mês de Maio<br />
em França, onde foram banidos os voos<br />
domésticos entre cidades que estejam a<br />
menos de duas horas e meia de comboio,<br />
argumentando-se que, nesses<br />
percursos, o avião emite 77 vezes mais<br />
CO 2<br />
por passageiro do que o comboio.<br />
Ainda assim, os críticos afirmam que<br />
se trata de uma medida simbólica,<br />
18 e-MOBILIDADE
EMISSÕES<br />
A Europa, em 2019, foi responsável<br />
por cerca de 22% do total das<br />
emissões globais de CO 2<br />
da<br />
indústria da aviação.<br />
dado que os voos de ligação não foram<br />
afetados e que os voos domésticos são<br />
responsáveis por uma pequena percentagem<br />
das emissões de CO 2<br />
naquele<br />
país. Até agora, apenas três rotas foram<br />
alvo de redução de voos, contando-se<br />
cerca de 5.000 voos anuais num universo<br />
de 200.000 voos domésticos.<br />
Também na nossa vizinha Espanha<br />
o tema da eliminação dos voos<br />
domésticos entre cidades servidas<br />
a menos de duas horas e meia<br />
de comboio tem estado sob acesa<br />
discussão.<br />
A avançar, tal decisão colocará em<br />
causa a ponte aérea entre Madrid<br />
e Barcelona, que produz o dobro<br />
de CO 2<br />
por passageiro do que<br />
o mesmo percurso feito de<br />
comboio, embora, tal como<br />
em França, apenas os voos<br />
que não são de ligação<br />
sejam afetados.<br />
A companhia aérea espanhola<br />
Iberia deu a<br />
entender que tais<br />
argumentos são falaciosos, pois que,<br />
no caso de um passageiro que pretenda<br />
viajar, por exemplo, entre Valência e<br />
Nova Iorque, na falta de um voo para<br />
Madrid, poderá fazê-lo via outro hub<br />
europeu. Nessa situação, para além de<br />
se verificar um aumento da emissão de<br />
CO 2<br />
, haverá uma clara interferência no<br />
processo de concorrência no espaço<br />
aéreo europeu.<br />
Entretanto, na Dinamarca, o governo<br />
está a propor a criação de uma taxa<br />
de 100 coroas dinamarquesas (cerca<br />
de 13,41€) que ajude a financiar a<br />
transição verde da indústria da aviação<br />
permitindo que todos os voos domésticos,<br />
até 2030, usem jet fuel 100% SAF.<br />
Apesar dos incentivos à utilização<br />
cada vez menor do avião, substituindo-o<br />
pelo comboio, e do aumento da<br />
força do fenómeno “flight shame”,<br />
continuam a verificar-se recuos às<br />
intenções de implementar medidas<br />
DECISÃO UNIFICADA<br />
Parece óbvio que, enquanto não<br />
existir um plano global para limitar<br />
o transporte aéreo, qualquer<br />
medida local ou regional tornarse-á<br />
pouco eficaz<br />
que restrinjam o transporte aéreo.<br />
Foi isso o que aconteceu nos Países<br />
Baixos com o governo neerlandês a<br />
suspender o seu plano de limitar o<br />
número de movimentos no aeroporto<br />
de Amesterdão a partir do Verão do<br />
próximo ano, cedendo às pressões das<br />
autoridades dos EUA e do Canadá e ao<br />
lobby das companhias aéreas.<br />
Os críticos do plano neerlandês, que<br />
previa uma redução de 9% da capacidade<br />
atual e de 17% da prevista futura,<br />
afirmam que uma menor capacidade no<br />
aeroporto de Amesterdão iria prejudicar<br />
a economia desse país, não iria ter<br />
efeitos práticos nas emissões de CO 2<br />
,<br />
pois resultaria no redireccionamento de<br />
voos para outros hubs europeus, e no<br />
aumento das tarifas, prejudicando não<br />
só as companhias aéreas, mas também<br />
os consumidores.<br />
Parece óbvio que, enquanto não existir<br />
um plano global para limitar o transporte<br />
aéreo, qualquer medida local ou<br />
regional tornar-se-á pouco eficaz. E<br />
um plano global deverá incluir também<br />
limitações aos voos privados, que<br />
são bem mais inimigos do ambiente<br />
considerando uma base de emissões por<br />
passageiro, ao tipo de aviões comerciais,<br />
sabendo que a nova geração de aviões<br />
é cerca de 20% menos poluente, e na<br />
cobrança de taxas a reverter para o financiamento<br />
de projetos que permitam<br />
a transição verde.<br />
Em maio, em França, foram banidos os voos<br />
domésticos entre cidades que estejam a menos<br />
de duas horas e meia de comboio<br />
IMPORTÂNCIA DO CUSTO<br />
DO COMBUSTÍVEL<br />
Uma coisa parece certa, a limitação na<br />
oferta de transporte aéreo e a implementação<br />
de outras medidas que limitem<br />
a emissão de CO 2<br />
, tal como<br />
a incorporação de SAF no jet fuel,<br />
irá afetar negativamente os resultados<br />
das companhias aéreas.<br />
O jet fuel é, a par dos custos com<br />
pessoal, o principal custo das companhias<br />
aérea. Enquanto os custos com<br />
pessoal são quase inteiramente fixos, os<br />
de combustível são variáveis na parte em<br />
que não está controlada por uma política<br />
de gestão de risco (fuel hedging).<br />
Numa indústria de margens baixas,<br />
a flutuação no preço do combustível<br />
pode transformar um voo com lucro<br />
em prejuízo, dependendo do núme-<br />
e-MOBILIDADE 19
OPINIÃO<br />
Carlos Paneiro<br />
ro de passageiros a bordo e da tarifa<br />
média cobrada.<br />
O combustível sustentado para a aviação<br />
(SAF) é mais caro para as companhias<br />
aéreas. Para manterem o lucro ou<br />
margens aceitáveis, terão de aumentar<br />
os preços. Estarão os passageiros dispostos<br />
a pagarem tarifas mais elevadas?<br />
Qual será a redução da procura num<br />
cenário de aumento dos preços? Até<br />
que ponto os passageiros são sensíveis a<br />
pagar mais caro em prol de um ambiente<br />
menos poluído?<br />
Uma ideia da resposta a estas questões<br />
poderá ser dada pelo comportamento<br />
dos consumidores face aos programas<br />
de compensação de carbono (“carbon<br />
offset programs”) disponibilizados por<br />
muitas companhias aéreas. Tais programas<br />
permitem que os passageiros, voluntariamente,<br />
compensem as emissões<br />
de carbono associadas ao seu transporte<br />
para projetos ambientais que objetivam<br />
a redução de emissões de CO 2<br />
noutras<br />
áreas. Por exemplo, permitindo às<br />
companhias aéreas comprar créditos em<br />
projetos de energia renovável, reflorestação<br />
ou programas de sustentabilidade.<br />
Acontece que, conforme estimativa<br />
disponibilizada pela IATA, apenas entre<br />
1% e 3% dos passageiros contribuem<br />
para esses programas de compensação<br />
de carbono, demonstrando que também<br />
há muito trabalho a fazer no que respeita<br />
à sensibilização da população para<br />
O combustível sustentado para a aviação (SAF)<br />
é mais caro para as companhias aéreas.<br />
Para manterem o lucro ou margens aceitáveis,<br />
terão de aumentar os preços<br />
a necessidade imperiosa de reduzir ou<br />
compensar as suas emissões de carbono<br />
e que tal tarefa não se restringe apenas<br />
às companhias aéreas e aos reguladores.<br />
O FUTURO<br />
Enquanto o futuro não chega, as companhias<br />
aéreas continuam a trabalhar<br />
na sua agenda de sustentabilidade de<br />
forma a reduzir as emissões de carbono<br />
associadas à sua atividade. Para além<br />
dos seus investimentos em tecnologias<br />
sustentáveis, nomeadamente nos<br />
combustíveis alternativos, têm implementado<br />
políticas ambientais de forma<br />
a tornarem-se mais verdes tanto no ar<br />
como em terra, tais como a adoção de<br />
programas de reciclagem de resíduos,<br />
a redução do consumo de energia nos<br />
seus escritórios e edifícios e a utilização<br />
de material reciclável sempre que<br />
possível.<br />
No que respeita aos construtores de<br />
aviões, a Airbus anunciou planos para<br />
ter o primeiro avião com emissões zero,<br />
utilizando células de combustível de<br />
hidrogénio, até 2035.<br />
No que respeita a aviões elétricos e<br />
híbridos, quer a Airbus quer a Boeing<br />
continuam a desenvolver projetos<br />
que deverão entrar em operação nas<br />
próximas décadas. Trata-se de aviões<br />
que utilizam motores elétricos e baterias<br />
recarregáveis que reduzem significativamente<br />
as suas emissões.<br />
Embora seja uma opção muito atraente<br />
para a descarbonização da indústria,<br />
os aviões elétricos estarão limitados a<br />
aeronaves muito pequenas devido às<br />
limitações das tecnologias e capacidade<br />
das baterias existentes.<br />
Perante a jornada longa que ainda há<br />
a percorrer e face à urgência de salvarmos<br />
o planeta onde vivemos, resta-nos<br />
rezar para que a ciência disponibilize<br />
rapidamente as soluções inovadores que<br />
permitam um eficaz Fly Net Zero.<br />
20 e-MOBILIDADE
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O pacote<br />
“fit for 55”<br />
Uma visão geral<br />
do ReFuelEU<br />
para a aviação<br />
Os legisladores da União Europeia (UE) assinaram<br />
um regulamento para garantir condições<br />
equitativas para o transporte aéreo sustentável,<br />
também conhecido como Regulamento ReFuelEU<br />
Aviation, em 18 de outubro de 2023. Foi<br />
publicado no Jornal Oficial em 31 de outubro de 2023 e será<br />
aplicável a partir de 1 de janeiro de 2024.<br />
No Jornal Oficial da UE pode ler-se que o novo regulamento<br />
faz parte de um pacote legislativo destinado a tornar as<br />
políticas da UE em matéria de clima, energia, utilização dos<br />
solos, transportes e fiscalidade aptas a reduzir as emissões<br />
líquidas de gases com efeito de estufa em, pelo menos,<br />
55% até 2030, em comparação com os níveis<br />
de 1990 – o pacote “fit for 55”. Procura assegurar<br />
condições de concorrência equitativas<br />
para um transporte aéreo sustentável e obriga<br />
os fornecedores de combustíveis a distribuir<br />
combustíveis de aviação sustentáveis (SAF) e<br />
prevê uma quota crescente de SAF ao longo<br />
do tempo para aumentar a sua aceitação pelas<br />
companhias aéreas e, assim, reduzir as emissões<br />
da aviação.<br />
Também a eletricidade ou o hidrogénio são tecnologias<br />
promissoras, prevendo-se que contribuam progressivamente<br />
para a descarbonização do transporte aéreo, a<br />
começar por voos de curta distância. O presente regulamento<br />
tem potencial para acelerar ainda mais o desenvolvimento<br />
científico e a implantação dessas tecnologias, para permitir<br />
que os operadores económicos ponderem estas tecnologias<br />
quando atingirem a sua maturidade e estiverem disponíveis<br />
no mercado.<br />
A introdução gradual de combustíveis sustentáveis para avia-<br />
ALTERNATIVAS<br />
Também a eletricidade ou o<br />
hidrogénio são tecnologias<br />
promissoras, prevendo-se que<br />
contribuam progressivamente<br />
para a descarbonização do<br />
transporte aéreo<br />
ção no mercado do transporte aéreo da União<br />
representará custos adicionais com combustíveis<br />
para as companhias aéreas, pois essas tecnologias<br />
são atualmente mais dispendiosas de produzir do<br />
que os combustíveis convencionais para aviação.<br />
Embora sejam definidos incentivos e os combustíveis sustentáveis<br />
para aviação sejam considerados um pilar integrante do<br />
trabalho sobre a viabilidade de um objetivo mundial ambicioso<br />
a longo prazo para a aviação internacional de alcançar<br />
emissões líquidas nulas de carbono até 2050, não existe<br />
atualmente um sistema obrigatório sobre a utilização de combustíveis<br />
sustentáveis para aviação nos voos internacionais.<br />
22 e-MOBILIDADE
O que são<br />
combustíveis<br />
sustentáveis<br />
para a aviação?<br />
Os SAF são combustíveis líquidos de aviação com<br />
as mesmas propriedades do combustível de aviação<br />
convencional, mas com origem em recursos de<br />
energia renovável, seja bioenergia ou eletricidade<br />
renovável. A sua compatibilidade com a tecnologia<br />
de aeronaves existentes e a infraestrutura de reabastecimento<br />
torna-os chamados de “drop-in-fuels”.<br />
A vantagem de compatibilidade dos SAF com os<br />
aviões existentes significa que eles podem começar<br />
a reduzir as emissões do setor sem substituições de<br />
frota. As aeronaves têm um longo período de operação<br />
- mais de 20 anos, em média -, e os aviões que<br />
entram hoje na frota global ainda operarão em 2050,<br />
data-limite net-zero do setor (Banco Mundial, 2022).<br />
As emissões do ciclo de vida dos SAF determinam<br />
a sua pegada de carbono. Elas consistem no teor<br />
de carbono do combustível (emissões diretas) e<br />
nas emissões que ocorrem durante a produção do<br />
combustível (emissões a montante). As emissões<br />
diretas não diferem entre o combustível de aviação<br />
convencional e os vários tipos de SAF devido às<br />
suas características quase idênticas, incluindo o teor<br />
de carbono. No entanto, as emissões a montante<br />
variam entre os tipos de SAF e os combustíveis<br />
convencionais e determinam se um combustível<br />
pode obter poupanças líquidas. Os fatores que influenciam<br />
as emissões a montante são, por exemplo,<br />
emissões associadas à produção de matéria-prima e<br />
à intensidade carbónica da eletricidade utilizada nos<br />
processos produtivos.<br />
Há três grupos de tipos de SAF com propriedades<br />
drop-in:<br />
» biocombustíveis de primeira geração a partir<br />
de lípidos, incluindo querosene parafínico<br />
sintetizado a partir de ésteres hidroprocessados<br />
e ácidos gordos (HEFA)<br />
» biocombustíveis avançados de vias bioquímicas<br />
e vias termoquímicas<br />
» combustíveis power-to-liquid (PtL), ou e-querosene,<br />
que usam eletricidade verde para produzir<br />
hidrogénio por eletrólise e combiná-lo com<br />
carbono para hidrocarbonetos sintéticos.<br />
A utilização de motores mais eficientes em<br />
termos energéticos contribui para reduzir<br />
a pegada ambiental dos voos e também<br />
para uma utilização mais eficiente dos<br />
combustíveis sustentáveis para aviação em<br />
termos de recursos<br />
Esses tipos de SAF diferem não apenas na sua pegada<br />
de emissões, mas também no nível de prontidão<br />
tecnológica dos seus processos de produção e<br />
equipamentos, custos e disponibilidade de matéria-prima.<br />
O HEFA é o caminho de produção mais<br />
avançado e menos caro da atualidade e abastece<br />
quase todo o SAF do setor. O mercado de SAF ainda<br />
está em evolução e não existe um padrão global de<br />
preços. Os custos de produção do HEFA são duas<br />
vezes maiores do que os do combustível de aviação<br />
convencional, e a bioenergia avançada e o PtL são<br />
ainda menos competitivos em termos de custos.<br />
Fonte: The International Transport Forum, organização<br />
intergovernamental de 66 países membros.<br />
Atua como um think tank para as políticas de<br />
transportes e organiza anualmente uma cimeira que<br />
reúne os ministros dos Transportes.<br />
e-MOBILIDADE 23
O futuro<br />
TEMA DE CAPA<br />
é limpo<br />
Circum-navegação aérea<br />
apenas com energia solar
e-MOBILIDADE 25
TEMA DE CAPA<br />
Energias Renováveis<br />
Bertrand Piccard e André Borschberg celebraram, no dia<br />
26 de julho de 2016, uma proeza ímpar: completaram a sua<br />
volta ao mundo aos comandos do Solar Impulse 2, provando<br />
a eficiência das tecnologias sustentáveis.<br />
O<br />
regresso a Abu Dhabi<br />
(EAU), onde o Solar<br />
Impulse 2 (Si2) iniciara,<br />
em Março de 2015, a sua<br />
viagem, marca a superação<br />
de um desafio extraordinário e<br />
culmina uma aventura incrível. Mais de<br />
uma década depois de ter sido considerado<br />
um projeto impossível, o Si2<br />
acabou por percorrer 40 mil quilómetros,<br />
em 17 voos de mais de 500 horas.<br />
Em tempo efetivo de voo, foram 21 dias<br />
a sobrevoar o mar da Arábia, a Índia, a<br />
Birmânia, a China, os oceanos Pacífico<br />
e Atlântico, os EUA, o sul da Europa e o<br />
norte de África. Foi a maior viagem de<br />
sempre sem uma só gota de combustível<br />
e a primeira vez que se atravessou o<br />
Atlântico com energia renovável.<br />
O projecto pioneiro dos suíços Bertrand<br />
Piccard (médico psiquiatra) e André<br />
Borschberg (piloto de aviões) pretendeu<br />
consciencializar e convencer a respeito<br />
da necessidade e da possibilidade real<br />
de optar por soluções tecnológicas que<br />
preservem o ambiente.<br />
UM “LABORATÓRIO VOADOR”<br />
Uma vasta equipa de cientistas, engenheiros,<br />
sonhadores e inovadores<br />
juntou-se ao projeto Solar Impulse e<br />
desenvolveu novos produtos, aplicados<br />
em 6000 componentes, que tornaram o<br />
avião mais leve do que muitos automóveis.<br />
Rejeitando ideias pré-concebidas sobre<br />
materiais, os objetivos consistiram em<br />
melhorar o desempenho energético,<br />
aliviar a estrutura e reduzir o peso ao<br />
mínimo permitido pela tecnologia. O<br />
avião, construído em fibra de carbono,<br />
atingiu os 72 metros de envergadura,<br />
com apenas 2300 kg, ou seja – mais largo<br />
do que um Boeing 747 e do mesmo<br />
peso que um utilitário familiar.<br />
A volta ao mundo zero emissões inau-<br />
Bertrand Piccard<br />
26 e-MOBILIDADE
SEM EMISSÕES<br />
O sucesso do Si2 prova que os<br />
custos de arranque começam<br />
a ficar para trás, confirmandose<br />
a possibilidade concreta<br />
de generalizar as energias<br />
renováveis, com um crescimento<br />
sustentado e competitivo em<br />
relação às energias fósseis.<br />
Foi a maior viagem de sempre sem uma só gota de<br />
combustível e a primeira vez que se atravessou o<br />
Atlântico com energia renovável<br />
gurou um avião que, em teoria, pode<br />
voar ininterruptamente, apenas limitado<br />
pela resistência física do piloto.<br />
Pode voar dias, semanas ou meses sem<br />
paragem, alimentado pela energia do<br />
sol – 17 248 células solares aplicadas<br />
sobre as asas – que se acumula nas suas<br />
quatro baterias.<br />
E O FUTURO?<br />
A odisseia prova que as energias verdes<br />
são uma solução real. A inovação chegará<br />
a todos, porque os novos materiais<br />
ultraligeiros e as soluções químicas permitem<br />
avanços no campo da proteção<br />
dos painéis solares, mas também nas<br />
baterias de computador ou telemóvel,<br />
na otimização de compartimentos de<br />
bagagens em aviões ou, claro, nas soluções<br />
sustentáveis de mobilidade.<br />
Aliás, terminada a viagem do Si2,<br />
mantém-se a ambição do projecto:<br />
impulsionar o desenvolvimento de<br />
soluções energéticas eficientes à escala<br />
global, através do Comité Internacional<br />
de Energias Limpas entretanto criado.<br />
O sucesso do Si2 prova que os custos<br />
de arranque – desenvolvimento de<br />
tecnologia, experimentação – começam<br />
a ficar para trás, confirmando-se a<br />
possibilidade concreta de generalizar as<br />
energias renováveis, com um crescimento<br />
sustentado e competitivo em relação<br />
às energias fósseis.<br />
UMA QUESTÃO DE ATITUDE<br />
“O Solar Impulse traduz a forma de construir<br />
e fazer voar um avião, que há 13 anos<br />
não era possível. Primeiro, não acreditámos<br />
em quem dizia que era um projeto<br />
impossível; depois, procurámos quem nos<br />
indicasse outras maneiras de o construir,<br />
usando a imaginação e a abertura a soluções<br />
diferentes. Mais do que tecnologia,<br />
esta aventura é uma questão de ‘state of<br />
mind’, da atitude que temos e podemos<br />
desenvolver”.<br />
André Borschberg, presidente da Solar<br />
Impulse e piloto do Si2, a cujos comandos<br />
cruzou o Pacíf ico<br />
e-MOBILIDADE 27
CONFERÊNCIA<br />
Contratos de Serviço Público de Passageiros – 1ª Geração<br />
Atrair utentes<br />
para o transporte público será<br />
a melhor medida ambiental<br />
A ineficiência de alguns contratos, mas também a possibilidade de<br />
construir um modelo contratual de 2ª geração mais sustentado e<br />
sustentável e a necessidade de procurar fontes de financiamento<br />
alternativas e cadernos de encargos mais ajustados às diferentes<br />
realidades regionais foram dissecados por operadores, municípios,<br />
Comunidades Intermunicipais e reguladores envolvidos no<br />
processo do serviço público do transporte de passageiros.<br />
Sobraram alertas para as dificuldades financeiras dos operadores,<br />
e ouviu-se como a captação de mais utentes para o transporte<br />
público seria a melhor de todas as medidas ambientais.<br />
Frederico Rosa, autarca do<br />
Barreiro, município anfitrião<br />
da conferência organizada<br />
pela Autoridade da Mobilidade<br />
e dos Transportes<br />
(AMT) e pela ANTROP, sintetizou<br />
que a captação de mais utentes para<br />
a utilização dos transportes públicos<br />
resultaria na melhor medida ambiental<br />
exigível no caderno de encargos<br />
dos futuros concursos do serviço<br />
público de transporte. De pressuposta<br />
obrigatoriedade de incorporação, nas<br />
contratualizações de 2ª geração, de<br />
acordo com o que foi anunciado pela<br />
AMT, esta resulta de um conjunto de<br />
recomendações incluídas no estudo<br />
OST Verdes - Recomendações para a<br />
implementação de uma modalidade<br />
verdadeiramente sustentável” (ver<br />
outro texto).<br />
O que está a correr bem/mal nos<br />
contratos de 1ª geração de serviço<br />
público de transporte de passageiros?<br />
O resultado é misto. Se a AMT admite<br />
erros de juventude e dores de crescimento,<br />
que há necessidade de revisão<br />
de alguns contratos, e que os veículos<br />
mais eficientes e com zero emissões são<br />
mais caros, também diz que há mais<br />
passageiros transportados. A ANTROP<br />
(transportadores) adverte que o modelo<br />
seguinte deve ser sustentado e sustentável,<br />
que a AMT precisa estar mais<br />
atenta e firme e que salvaguarde os<br />
operadores e a sustentabilidade financeira<br />
dos contratos, bem assim como a<br />
auditoria dos cadernos de encargos.<br />
Mas que papel devem ter os municípios<br />
na gestão da mobilidade? João<br />
Caetano, presidente do IMT (Instituto<br />
da Mobilidade e dos Transportes),<br />
falou de um legado de mais de um<br />
século desde que surgiu o automóvel<br />
que é difícil de alterar. Trata-se de uma<br />
questão de mentalidade. Não se podem<br />
arrasar as cidades tal qual foram<br />
desenhadas, mas o ótimo planeamento<br />
urbano, se agora pudesse ser iniciado,<br />
privilegiaria, segundo uma ordem<br />
28 e-MOBILIDADE
prioritária, os seguintes elementos: os<br />
modos suaves, o transporte coletivo,<br />
o transporte partilhado e só depois o<br />
transporte individual.<br />
Foi difícil arrancar com os primeiros<br />
contratos de serviço público? Houve<br />
dificuldades: “A falta de conhecimento<br />
técnico do nosso pessoal levou-nos<br />
a contratar uma entidade externa”<br />
(Cristina Loreto, sub-diretora Regional<br />
dos Transportes Terrestres da Madeira);<br />
Inicialmente, o acesso a dados fidedignos,<br />
mas avaliámos bem os cadernos<br />
de encargos para que os concursos não<br />
ficassem desertos, e está em funcionamento<br />
e fomos bem sucedidos” (Ricardo<br />
Rio, presidente da CIM do Cávado);<br />
“Que o próximo Governo tenha a<br />
Que o próximo Governo tenha a audácia<br />
de o estender [o contrato] ao transporte<br />
ferroviário para obrigar os concessionários a<br />
interligarem-se<br />
audácia de o estender ao transporte<br />
ferroviário para obrigar os concessionários<br />
a interligarem-se” (António Pina,<br />
presidente da CIM Algarve); “Estamos<br />
prontos para o segundo, ainda que<br />
o processo tenha sido difícil, mas beneficiámos<br />
dos conhecimento da AML,<br />
da Carris, de Cascais” (Frederico Rosa,<br />
presidente da CM Barreiro).<br />
AMBIENTE E FINANCIAMENTO<br />
Ana Paula Vitorino explicou como a<br />
2ª geração de contratos ficará marcada<br />
pela OSP Verdes e de como será<br />
preciso encontrar outras formas de<br />
financiamento, para que não corramos<br />
o risco de alguém entrar em ‘pobreza<br />
de mobilidade’: “As recomendações<br />
são exequíveis, mas ao mesmo tempo<br />
que há novas exigências, teremos que<br />
pensar como encontrar novas formas<br />
de financiamento. Uma parte terão<br />
que ser os próprios operadores, outra<br />
o Estado, mas uma outra será a da<br />
própria economia que se apropria das<br />
mais-valias que proporcionam estes<br />
transportes, nomeadamente o imobiliário.<br />
O próprio IMI. Se viver no<br />
interior, onde há poucos transportes,<br />
por que razão terei que pagar o mesmo<br />
IMI que alguém que vive à boca<br />
da entrada do Metro, construída à<br />
porta da sua casa? Temos que começar<br />
a pensar nisto agora.”<br />
“Tais preocupações estarão na nossa visão<br />
para a próxima concessão. Por agora<br />
FINANCIAMENTO<br />
Uma parte terão que ser os<br />
próprios operadores, outra o<br />
Estado, mas uma outra será a da<br />
própria economia que se apropria<br />
das mais-valias que proporcionam<br />
estes transportes, nomeadamente<br />
o imobiliário<br />
focámo-nos na coesão territorial” (António<br />
Pina). “Para o Porto Santos e para o<br />
Aerobus apenas veículos elétricos, e no<br />
Funchal valorizámos veículos novos e<br />
da classe EuroVI” (Cristina Loreto).<br />
Martinho da Costa, administrador do<br />
Grupo Barraqueiro, é da opinião que<br />
os futuros contratos têm que passar de<br />
net-cost para gross-cost, pois se querem<br />
autocarros menos poluentes têm<br />
que colocar mais dinheiro no sistema.<br />
A situação atual é dramática, ninguém<br />
consegue equilibrar as contas, quanto<br />
mais ganhar dinheiro.”<br />
Sérgio Soares, administrador da Transdev,<br />
concordou com o concorrente da<br />
Barraqueiro: “Pedirem-nos autocarros<br />
elétricos com 0 km na próxima geração<br />
é acabarem com a iniciativa privada e<br />
passarem tudo para o Estado.”<br />
“O sucesso de qualquer geração de<br />
contrato depende do utilizador, se tem<br />
ou não confiança no mesmo”, disse Pedro<br />
Calado, presidente da CM Funchal.<br />
O colega de Aveiro, Ribau Esteves:<br />
“Foi-nos atirada uma competência e<br />
nada sabíamos sobre ela. Quanto aos<br />
próximos, que os Governos saibam e<br />
os contratos reflitam que isto é um investimento<br />
de todos, nacional e local.”<br />
Nuno Canta, autarca do Montijo, não<br />
esqueceu a sua formação agrícola: “Não<br />
deixemos ocupar os espaços agrícolas,<br />
pois se os ocuparmos teremos que ir<br />
mais longe procurar os alimentos e<br />
preencher ainda mais as estradas. Não<br />
podemos deixar ninguém para trás.”<br />
Pedro Bogas, administrador da Carris,<br />
acredita que o sucesso futuro é “melhorar<br />
a experiência de viagem, com boa<br />
oferta e regular. Vamos ter acessibilidade<br />
com o cartão bancário e através da<br />
Via Verde, vamos expandir a rede de<br />
elétricos rápidos a Oriente e a Ocidente,<br />
esta em colaboração com Oeiras.<br />
Precisamos de canais dedicados e precisamos<br />
de ter um plano de mobilidade<br />
sustentável, com urgência.”<br />
e-MOBILIDADE 29
CONFERÊNCIA<br />
Transportes Públicos<br />
AMT QUER OBRIGAÇÕES<br />
AMBIENTAIS<br />
A criação de portagens com base em<br />
emissões, o combate à “pobreza de<br />
mobilidade” e a procura de fontes alternativas<br />
de financiamento são algumas das<br />
recomendações que devem constar nas OSP<br />
Verdes da nova geração de contratos<br />
em contratos<br />
de transportes<br />
públicos<br />
Para apostar em políticas<br />
públicas que promovam a<br />
descarbonização e sustentabilidade<br />
neste setor, tendo<br />
em conta o Regime Jurídico<br />
do Serviço Público de Transporte de<br />
Passageiros [Lei 52/2015] – que está<br />
na base da 1.ª geração dos contratos<br />
de serviço público de transporte de<br />
passageiros, a AMT identificou as<br />
Obrigações de Serviço Público (OSP)<br />
Verdes que são de imprescindível<br />
implementação para que Portugal<br />
cumpra os objetivos e metas de desenvolvimento<br />
sustentável com as quais<br />
se comprometeu.<br />
AS SETE RECOMENDAÇÕES<br />
Implementação de indicadores<br />
comuns e rigorosos relativos a<br />
emissões de GEE<br />
A AMT constata que, apesar dos<br />
esforços da CE, ainda não existe um<br />
quadro comum para o cálculo das<br />
emissões de GEE, impedindo que empresas,<br />
clientes e passageiros possam<br />
monitorizar e comparar as diferentes<br />
opções de serviços de transportes no<br />
que respeita às suas emissões. A CE<br />
planeia implementar um quadro uniforme<br />
de medição de emissões para<br />
o setor dos Transportes e Logística,<br />
alinhado com os objetivos do Pacto<br />
Ecológico Europeu (Green Deal) e da<br />
Lei Climática, sendo que a AMT recomenda<br />
que a sua implementação seja<br />
obrigatória e abrangente.<br />
Criação de um Programa Nacional<br />
de Mobilidade Sustentável<br />
A AMT reconhece a necessidade de<br />
uma visão estratégica da mobilidade<br />
e do planeamento dos transportes,<br />
harmonizada com o ordenamento do<br />
território e os compromissos europeus.<br />
Neste sentido, recomenda a criação de<br />
um Programa Nacional de Mobilidade<br />
Sustentável, que articule todos os<br />
instrumentos de gestão e ordenamento<br />
do território e planos setoriais que<br />
incluam as áreas da habitação e todas as<br />
atividades económicas, infraestruturas<br />
OST VERDES<br />
A AMT identificou as Obrigações<br />
de Serviço Público Verdes<br />
que são de imprescindível<br />
implementação para que Portugal<br />
cumpra os objetivos e metas de<br />
desenvolvimento sustentável com<br />
as quais se comprometeu<br />
30 e-MOBILIDADE
e serviços. Este Programa deve ter um<br />
cronograma específico de implementação,<br />
fontes de financiamento e mecanismos<br />
de medição de impacto, incluindo<br />
indicadores de avaliação com planos<br />
obrigatórios de transporte sustentável<br />
para trabalho e escola, com incentivos<br />
fiscais. A AMT defende ainda que o<br />
conceito de “pobreza de mobilidade”<br />
deve ser reconhecido, considerando os<br />
baixos rendimentos, os elevados custos<br />
de combustível ou a falta de acesso a<br />
serviços essenciais, especialmente para<br />
pessoas e famílias vulneráveis.<br />
Implementação de indicadores<br />
da avaliação de investimentos<br />
e de desempenho de serviços e<br />
infraestruturas de transportes<br />
A AMT recomenda a implementação de<br />
um quadro de indicadores integrados<br />
para avaliar o valor e o desempenho dos<br />
investimentos em transportes, enfatizando<br />
a sustentabilidade e a inovação.<br />
Este quadro obrigatório deverá avaliar<br />
as contribuições dos projetos para os<br />
objetivos de transição e a qualidade<br />
e eficácia das políticas públicas e das<br />
estratégias empresariais que devem ser<br />
avaliadas. Este quadro único de indicadores<br />
deve ser vinculativo para todas as<br />
empresas, como requisito mínimo de<br />
acesso e permanência no mercado;<br />
Procedimentos de Contratação<br />
Pública<br />
Considerando que a contratação pública<br />
é vital para implementar a sustentabilidade<br />
ambiental nos serviços de mobilidade,<br />
a AMT recomenda a integração<br />
de obrigações ambientais em futuros<br />
contratos de transporte público, criando<br />
obrigações de serviço público “verdes”<br />
DESEMPENHO<br />
Este quadro único de indicadores<br />
deve ser vinculativo para todas as<br />
empresas, como requisito mínimo<br />
de acesso e permanência no<br />
mercado<br />
baseadas em avaliações minuciosas. Neste<br />
contexto, a AMT defende a existência<br />
de regras de contratação mais flexíveis,<br />
incentivos para investimentos em veículos<br />
limpos, utilização obrigatória do<br />
Manual de Compras Verdes da Comissão<br />
Europeia e avaliações de desempenho.<br />
Defende, também, o estabelecimento de<br />
uma idade máxima para os veículos e<br />
incentivar o abate dos veículos antigos.<br />
Fontes alternativas de<br />
financiamento<br />
A AMT identifica a necessidade de<br />
encontrar fontes alternativas de financiamento<br />
e recomenda uma aposta no<br />
financiamento sustentável, como a captura<br />
de mais-valias imobiliárias em áreas<br />
que beneficiam de infraestruturas de<br />
transportes públicos para reinvestimento<br />
no sistema de transportes e propondo<br />
a realocação de fundos provenientes<br />
de taxas rodoviárias sobre veículos<br />
poluentes para investir em combustíveis<br />
limpos. A integração de todos os modos<br />
de mobilidade no comércio de emissões<br />
e a conformidade com a taxonomia da<br />
EU são outras das recomendações da<br />
AMT. É ainda dado ênfase à defesa do<br />
financiamento social para a acessibilidade,<br />
à priorização de áreas de baixa<br />
densidade na distribuição das verbas<br />
do Orçamento do Estado e ao apoio a<br />
contratos de serviços ecológicos.<br />
Incentivos à utilização de transporte<br />
público e utilização de veículos<br />
limpos<br />
Impulsionar a utilização dos transportes<br />
públicos, incentivando o<br />
desenvolvimento económico e a<br />
sustentabilidade, como por exemplo<br />
a introdução de taxas dinâmicas<br />
em autoestradas, estradas urbanas e<br />
parques de estacionamento, de forma<br />
a reduzir a utilização de veículos<br />
individuais. É defendida a avaliação<br />
do potencial de transferência modal<br />
nos projetos financiados, alterações<br />
no sistema de portagens com base nas<br />
emissões, a criação de zonas de baixas<br />
emissões e incentivos para empresas<br />
que promovam o transporte público.<br />
A AMT recomenda ainda o reforço<br />
da infraestrutura de carregamento de<br />
veículos limpos, a adoção de sistemas<br />
de transporte inteligentes para uma<br />
gestão eficiente do tráfego e a avaliação<br />
do desempenho ambiental das<br />
empresas e frotas.<br />
Literacia e inovação na mobilidade<br />
sustentável<br />
Reforçar o conceito de “poluidor-pagador”<br />
através de uma implementação<br />
eficaz e de apoio público. Isto envolve<br />
uma ampla divulgação dos compromissos<br />
de descarbonização, a integração<br />
da educação sobre mobilidade<br />
sustentável e a oferta de formação<br />
para profissionais dos transportes.<br />
Recomenda-se também a divulgação<br />
transparente de externalidades em<br />
projetos de mobilidade, juntamente<br />
com o reforço das colaborações entre<br />
universidades, centros de inovação e<br />
empresas de mobilidade, de forma a<br />
acelerar a inovação no setor.<br />
e-MOBILIDADE 31
INTERMODALIDADE<br />
Desenvolvimento<br />
de terminais<br />
Intermodais na Europa<br />
A intermodalidade na Europa carece de maior desenvolvimento para poder ser<br />
uma verdadeira alternativa para as empresas.<br />
O<br />
desenvolvimento de<br />
redes de terminais hub-<br />
-and-spoke (HS) para<br />
o transporte ferroviário<br />
intermodal na Europa<br />
implica a criação de terminais hub,<br />
vantajosos relativamente aos terminais<br />
apenas gateway e satélite. Os terminais<br />
hub permitem o serviço de recolha e<br />
distribuição rodoviária no hinterland<br />
do terminal, mas também o cruzamento<br />
de cargas de diferentes comboios de<br />
longo curso, em trânsito sem saírem<br />
das plataformas (tipo cross-docking<br />
rodoviário), tal como sucede nos<br />
terminais de transhipment de navios.<br />
Mas existem vários fatores que têm<br />
contribuído para a lenta utilização dos<br />
terminais hub:<br />
1A falta de compreensão dos benefícios,<br />
pois muitos operadores ferroviários<br />
não compreendem plenamente<br />
os benefícios potenciais dos terminais<br />
hub, ou têm pouca afinidade com a<br />
complexidade das operações de HS.<br />
2Algumas empresas ferroviárias<br />
preferem investir em operações mais<br />
simples e nas suas próprias infraestruturas,<br />
em vez de complexas redes HS com<br />
terminais hub.<br />
3A construção e operação de terminais<br />
hub requer investimentos<br />
substanciais, e muitas vezes faltam<br />
VÍTOR CALDEIRINHA<br />
Assessor do Conselho de Administração da<br />
APSS, Professor, Investigador e Consultor<br />
portuário<br />
estruturas apropriadas para financiar e<br />
gerir esses projetos.<br />
Apesar dos seus benefícios teóricos e<br />
práticos, os terminais hub não têm sido<br />
amplamente adotados na Europa. Uma<br />
melhor compreensão dos benefícios,<br />
juntamente com políticas de transporte<br />
público de nível europeu e estratégias<br />
de investimento alinhadas, poderiam<br />
acelerar a adoção deste modelo. Existe<br />
um potencial significativo para redes<br />
HS com terminais hub ferroviários na<br />
Europa, mas é necessário um esforço<br />
coordenado entre diferentes stakeholders<br />
para realizar esse potencial. Vamos<br />
ver em detalhe cada questão.<br />
A FALTA DE COMPREENSÃO<br />
DOS BENEFÍCIOS<br />
Muitos operadores ferroviários e partes<br />
interessadas não estão plenamente<br />
cientes das vantagens operacionais e<br />
económicas dos terminais hub. Estes<br />
terminais oferecem maior eficiência na<br />
consolidação de cargas, otimização de<br />
rotas e redução de custos operacionais,<br />
mas tais benefícios nem sempre são<br />
claramente compreendidos ou comunicados.<br />
Os terminais hub e as redes HS são<br />
percebidos como operacionalmente<br />
complexos e isso desencoraja alguns<br />
operadores ferroviários, especialmente<br />
aqueles acostumados com operações<br />
mais simples, como serviços diretos ou<br />
redes menos integradas.<br />
A transição para um modelo baseado<br />
em terminais hub requer mudanças<br />
significativas na forma como as redes<br />
ferroviárias são operadas, incluindo a<br />
reestruturação de rotas, reorganização<br />
logística e adaptação de infraestruturas<br />
existentes. A resistência à mudança e a<br />
hesitação em adotar novas abordagens<br />
podem ser barreiras significativas.<br />
A eficácia dos terminais hub depende<br />
da colaboração entre diferentes<br />
32 e-MOBILIDADE
AVALIAÇÃO<br />
Existe uma tendência para focar<br />
nos custos e desafios de curto<br />
prazo associados à implementação<br />
de terminais hub, em vez de se<br />
reconhecerem os benefícios de longo<br />
prazo, como maior sustentabilidade,<br />
eficiência e capacidade para servir<br />
uma procura crescente<br />
no transporte<br />
e-MOBILIDADE 33
INTERMODALIDADE<br />
Vitor Caldeirinha<br />
operadores e da integração de várias<br />
partes da rede de transporte. A falta de<br />
coordenação e planeamento integrado<br />
de nível europeu limita a compreensão<br />
e, consequentemente, a implementação<br />
eficaz de tais sistemas.<br />
Existe uma tendência para focar nos<br />
custos e desafios de curto prazo associados<br />
à implementação de terminais<br />
hub, em vez de se reconhecerem os<br />
benefícios de longo prazo, como maior<br />
sustentabilidade, eficiência e capacidade<br />
para servir uma procura crescente no<br />
transporte.<br />
É necessária uma abordagem mais<br />
informativa e colaborativa, incluindo esforços<br />
de educação e consciencialização<br />
sobre os benefícios dos terminais hub,<br />
demonstrações de sucesso noutros continentes<br />
e modelos de cooperação entre<br />
operadores e stakeholders. Além disso,<br />
as políticas de transporte público e as<br />
estratégias de investimento que apoiam<br />
o desenvolvimento de redes intermodais<br />
integradas poderiam facilitar a transição<br />
para este modelo mais eficiente.<br />
ESTRATÉGIAS DE INVESTIMENTO<br />
CONCORRENTES<br />
Existe a tendência para os operadores<br />
ferroviários e outras entidades relevantes<br />
darem prioridade as investimentos<br />
em alternativas ao desenvolvimento de<br />
redes hub-and-spoke (HS) com terminais<br />
hub.<br />
Alguns operadores optam por investir<br />
em operações ferroviárias mais simples<br />
e diretas, como serviços ponto a<br />
ponto, que são percebidos como menos<br />
arriscados e mais fáceis de gerir. Esses<br />
modelos podem não oferecer as mesmas<br />
eficiências de escala que os terminais<br />
hub, mas são vistos como investimentos<br />
mais seguros e imediatos.<br />
Os operadores, especialmente os novos<br />
operadores do mercado, que surgiram<br />
desde a liberalização ferroviária,<br />
preferem manter a sua independência<br />
operacional. Investir nas suas próprias<br />
infraestruturas de terminais ou em<br />
modelos de gateway (portas de entrada<br />
regionais) permitindo-lhes manter<br />
o controlo sobre as suas operações<br />
sem depender de complexas redes<br />
colaborativas.<br />
A construção e operação de terminais<br />
hub são significativamente dispendiosas.<br />
Num contexto de restrições<br />
orçamentais, operadores e investidores<br />
preferem alocar recursos a projetos com<br />
menores requisitos de capital e retorno<br />
mais rápido sobre o investimento.<br />
Grandes projetos de infraestrutura,<br />
como a construção de terminais hub,<br />
estão frequentemente sujeitos a riscos<br />
significativos, incluindo atrasos, excesso<br />
de custos e incertezas regulatórias. Além<br />
disso, os operadores optam por concentrar<br />
investimentos na melhoria ou expansão<br />
de ativos e operações existentes,<br />
A resistência à mudança<br />
e a hesitação em adotar<br />
novas abordagens<br />
podem ser barreiras<br />
significativas<br />
em vez de investir em novas infraestruturas,<br />
que exigem uma reestruturação<br />
significativa das redes existentes.<br />
Para superar essas barreiras, seria<br />
necessário promover um maior entendimento<br />
das vantagens a longo prazo e da<br />
eficiência operacional dos terminais hub,<br />
incluindo incentivos financeiros ou regulatórios<br />
para projetos de infraestrutura<br />
que favoreçam a colaboração e integração<br />
intermodal. Além disso, poderiam<br />
ser desenvolvidas parcerias público-privadas<br />
para a partilha de riscos e benefícios<br />
de tais investimentos. Estimular uma<br />
visão mais estratégica e de longo prazo<br />
dentro do setor ferroviário também é<br />
crucial para ultrapassar a preferência por<br />
34 e-MOBILIDADE
estratégias de investimento mais conservadoras<br />
e imediatistas.<br />
QUADROS ORGANIZACIONAIS<br />
E FINANCEIROS INADEQUADOS<br />
O desenvolvimento de terminais hub<br />
requer investimentos significativos.<br />
A ausência de estruturas de financiamento<br />
adequadas no setor público e<br />
privado, impede a realização desses<br />
projetos, incluindo a dificuldade em<br />
obter capital inicial, bem como financiamento<br />
para operações contínuas e<br />
manutenção. Embora as PPPs possam<br />
ser uma solução para financiar grandes<br />
projetos de infraestrutura, a falta de<br />
modelos eficazes de PPP no setor ferroviário<br />
intermodal limita capacidade de<br />
atrair investimentos privados, partilhar<br />
riscos e garantir a sustentabilidade a<br />
longo prazo dos projetos.<br />
A gestão e operação de terminais hub<br />
envolve uma complexidade significativa,<br />
exigindo coordenação entre<br />
diferentes atores, operadores ferroviários,<br />
fornecedores de infraestrutura e<br />
autoridades reguladoras. A ausência<br />
de estruturas organizacionais eficientes<br />
que possam gerir essa complexidade é<br />
um obstáculo significativo. A eventual<br />
entrada dos armadores no panorama<br />
ferroviário, como é ocaso da MSC, pode<br />
trazer uma visão diferentes do mar.<br />
A prioridade de alocação de recursos<br />
para o desenvolvimento de terminais<br />
hub pode ser desafiadora, especialmente<br />
em contextos onde existem<br />
necessidades concorrentes ou onde<br />
a rentabilidade a curto prazo é uma<br />
preocupação primária. A falta de<br />
incentivos governamentais e europeus<br />
ou regulatórios para apoiar investimentos<br />
em infraestruturas de transporte<br />
intermodal pode desencorajar<br />
o desenvolvimento de terminais hub<br />
multiutilizadores.<br />
Seria importante, a nível europeu,<br />
realizar campanhas de informação e<br />
workshops educativos para os stakeholders,<br />
incluindo operadores ferroviários,<br />
investidores, autoridades locais<br />
e o público em geral, para destacar as<br />
vantagens dos terminais hub, como<br />
eficiência operacional, redução de<br />
custos e sustentabilidade. E apresentar<br />
estudos de caso e exemplos de sucesso<br />
de terminais hub e redes HS para<br />
ilustrar o potencial de melhoria na<br />
MULTIUTILIZADORES<br />
A gestão e operação de terminais<br />
hub envolve uma complexidade<br />
significativa, exigindo coordenação<br />
entre diferentes atores, operadores<br />
ferroviários, fornecedores de<br />
infraestrutura e autoridades<br />
reguladoras<br />
eficiência, capacidade e conectividade<br />
do transporte. Assim como incentivar a<br />
pesquisa focada nos benefícios económicos<br />
e ambientais dos terminais hub,<br />
incluindo estudos sobre o retorno do<br />
investimento e o impacto na redução<br />
das emissões.<br />
Será fundamental promover o planeamento<br />
de transporte integrado que<br />
considere todos os modos de transporte<br />
e a intermodalidade como parte essencial<br />
da infraestrutura de transporte<br />
e implementar incentivos, como subsídios<br />
ou benefícios fiscais, para projetos<br />
que promovam a intermodalidade e a<br />
criação de redes HS eficientes (intermodal<br />
Bono?), assim como desenvolver<br />
regulamentações que favoreçam o investimento<br />
em infraestruturas intermodais,<br />
incluindo terminais hub, e que<br />
facilitem a colaboração entre diferentes<br />
e-MOBILIDADE 35
INTERMODALIDADE<br />
Vitor Caldeirinha<br />
QUESTÕES RELEVANTES<br />
Qual é a localização estratégica ideal<br />
para os terminais hub and spoke na<br />
Europa, levando em consideração as<br />
rotas de transporte de carga existentes<br />
e as principais áreas de procura? Como<br />
dimensionar os terminais hub para<br />
acomodar eficientemente a transferência<br />
de carga entre modos de transporte e<br />
garantir uma operação contínua? Como<br />
integrar efetivamente os modos de<br />
transporte rodoviário e ferroviário nos<br />
terminais hub and spoke para otimizar<br />
a eficiência da rede de transporte inoperadores<br />
e stakeholders.<br />
A nível europeu, seria fundamental<br />
dar prioridade a recursos públicos e<br />
privados para projetos que promovam<br />
eficiências de rede e intermodalidade,<br />
reconhecendo os terminais hub como<br />
investimentos essenciais, investir em<br />
tecnologias inovadoras e em pesquisa<br />
e desenvolvimento para melhorar<br />
a eficiência e a colaboração entre<br />
operadores, bem como a capacidade<br />
dos terminais hub, e assim criar um<br />
ambiente mais favorável para a adoção<br />
das redes HS no transporte ferroviário<br />
intermodal europeu. Isso permitirá ter<br />
uma infraestrutura de transporte mais<br />
eficiente, sustentável e preparada para o<br />
futuro na Europa.<br />
BENEFÍCIOS DAS REDES HS<br />
A configuração de rede HS na ferrovia<br />
europeia melhora a relação custo/serviço,<br />
reduz perdas de eficiência e oferece<br />
várias vantagens para operadores de<br />
transporte. É importante uma maior<br />
aposta e análise das conexões ferroviárias<br />
para promover a intermodalidade,<br />
a avaliação do impacto na procura de<br />
transporte e na eficiência e eficácia dos<br />
nós de hub para operações de groupage/<br />
degroupage.<br />
A transição de uma configuração de<br />
rede P2P para uma rede H&S resulta<br />
numa redução significativa nas distâncias<br />
que os meios de transporte<br />
precisam de percorrer para conectar<br />
origens e destinos. Essa redução chega a<br />
É importante uma maior<br />
aposta e análise das<br />
conexões ferroviárias<br />
para promover a<br />
intermodalidade, a<br />
avaliação do impacto na<br />
procura de transporte e<br />
na eficiência e eficácia<br />
dos nós de hub para<br />
operações de groupage/<br />
degroupage<br />
65%, reduzindo os custos operacionais,<br />
o tempo de trânsito e o consumo de<br />
combustível, resultando em benefícios<br />
ambientais e económicos.<br />
Uma vantagem notável da configuração<br />
HS é a manutenção da capacidade do<br />
sistema em termos de transporte. Isso<br />
significa que, mesmo com uma configuração<br />
mais eficiente, a capacidade de<br />
transporte não é comprometida.<br />
A transição para uma rede HS reduz<br />
os custos incorridos pelo operador de<br />
transporte até 65%. Isso ocorre devido<br />
à redução das distâncias percorridas, à<br />
otimização das rotas e à necessidade de<br />
menos meios de transporte.<br />
A configuração H&S pode ser ainda<br />
mais atraente do ponto de vista do operador<br />
de transporte multimodal (MTO),<br />
pois a frequência de serviço em algumas<br />
rotas pode ser aumentada e melhorada<br />
com um aumento na frequência<br />
de serviço (+28%) e na capacidade de<br />
transporte (+28%).<br />
termodal? Como os terminais hub and<br />
spoke podem contribuir para a redução<br />
das emissões de carbono e promover a<br />
sustentabilidade ambiental na Europa?<br />
Os terminais hub and spoke melhoram<br />
a eficiência operacional ao permitir a<br />
transferência eficiente de carga entre<br />
modos de transporte, reduzindo tempos<br />
de trânsito e custos. Ao promover o<br />
transporte ferroviário, os terminais hub<br />
and spoke contribuiem para a redução<br />
do congestionamento nas estradas e melhorar<br />
a fluidez do tráfego. A integração<br />
do transporte ferroviário ajuda a reduzir<br />
as emissões de carbono e promover<br />
práticas mais sustentáveis no transporte<br />
de carga. Os terminais hub and spoke<br />
facilitam o acesso a mercados distantes<br />
na Europa e além, aumentando a competitividade<br />
das empresas.<br />
Será necessário investir em infraestrutura<br />
ferroviária e rodoviária para criar e<br />
manter os terminais hub and spoke. Um<br />
planeamento estratégico sólido será necessário<br />
para determinar as localizações<br />
ideais dos terminais e a conectividade<br />
da rede. Políticas e regulamentações<br />
adequadas devem ser estabelecidas para<br />
promover o transporte intermodal e<br />
garantir sua eficiência. A colaboração<br />
entre empresas de transporte, autoridades<br />
locais e outros stakeholders será<br />
essencial para o sucesso dos terminais<br />
hub and spoke.<br />
Fontes: https://doi.org/10.1016/j.<br />
rtbm.2016.05.003, https://doi.org/10.3390/<br />
su12030776, https://www.sciencedirect.<br />
com/science/article/pii/S1568494622009747<br />
e https://www.hindawi.com/journals/<br />
jat/2020/7570686/<br />
36 e-MOBILIDADE
GLOBAL MOBILITY CALL MADRID 2023<br />
A terceira<br />
Revolução Industrial<br />
está em curso<br />
Não contaminante, segura, acessível e sustentável, assente na eletrificação e nos combustíveis<br />
alternativos, na inovação, na multimodalidade dos transportes e em novas infraestruturas. São estes<br />
os impulsos do novo paradigma da mobilidade, uma terceira Revolução Industrial que foi exigida pela<br />
União Europeia aos 27 Estados-membros. A avaliar pela resposta da sociedade civil, pela multiplicação<br />
de fóruns de discussão e dos agentes envolvidos, tem tudo para ser próspera.<br />
Por Carlos Branco<br />
38 e-MOBILIDADE
Madrid, no final de outubro,<br />
reuniu uma boa<br />
parte dos agentes europeus<br />
interessados na<br />
mudança do paradigma<br />
da mobilidade, da transição energética,<br />
e muito mais que isso, aquela que se<br />
diz ser a terceira Revolução Industrial.<br />
A Global Mobility Call, sendo apenas<br />
um veículo de comunicação e montra<br />
do que se vai fazendo, faz-se também<br />
ouvir pela diferença de tons. E há vozes<br />
que nos cativam, que nos surpreendem<br />
(ou não). Foram os casos de Ge Jun,<br />
especialista em tecnologia, com mais<br />
de 25 anos de experiência em empresas<br />
como Apple, Intel ou NVIDIA e atual<br />
diretor executivo da Tojoy, também de<br />
Peggy Liu, da JUCCCE (Joint US China<br />
Collaboration on Clean Energy), Jeremy<br />
Rifkin, conselheiro da União Europeia,<br />
ou Bertrand Piccard, um aventureiro e<br />
o primeiro aeronauta a dar a volta ao<br />
mundo num avião solar sem combustível.<br />
Recolhemos algumas das suas<br />
alocuções impressivas.<br />
Para o ex-vice-presidente da Apple, o<br />
futuro da mobilidade está no céu. Isto é,<br />
será a inteligência artificial o principal<br />
vetor para desenvolver a mobilidade do<br />
futuro, cujo nicho de mercado está no<br />
espaço aéreo com aviões particulares<br />
e drones partilhados, para transporte<br />
de pessoas e de mercadorias, mas que<br />
para isso são necessárias plataformas<br />
baseadas em dados para conectar empreendedores<br />
e os cidadãos, o que não<br />
tem precedentes. “A mobilidade atual<br />
não é apenas sinónimo de transporte,<br />
é um conceito mais amplo que engloba<br />
diferentes aspetos e indústrias em<br />
favor de pessoas e serviços que requer a<br />
colaboração de múltiplos participantes,<br />
e a peça fundamental nesta relação é a<br />
inteligência artificial”, disse.<br />
MENOS DE CINCO DÓLARES<br />
POR DIA<br />
Jeremy Rifkin falou num tom mais<br />
grave, como que justificando o facto de<br />
“após 200 anos de Revolução Industrial<br />
baseada nos combustíveis fósseis, 54%<br />
da população ganha atualmente menos<br />
de cinco dólares por dia.” “Os ricos<br />
tiveram um desempenho muito bom<br />
durante essa civilização industrial, pois<br />
as oito pessoas mais ricas do mundo<br />
têm uma riqueza equivalente a metade<br />
da população do planeta e acumulam a<br />
mesma riqueza que metade da população<br />
dos Estados Unidos. Temos agora<br />
20 anos para mudar este estado de<br />
coisas”, sentenciou.<br />
Bertrand Piccard falou sobre as soluções<br />
existentes para enfrentar a crise ambiental<br />
em setores como a mobilidade,<br />
a energia, a agricultura, os resíduos, a<br />
água e a construção. A fundação a que<br />
preside identificou quase 1500 soluções<br />
que podem ajudar a passar do atual<br />
modelo de “economia qualitativa” para<br />
outro. E sintetizou: “O fundamental é<br />
fazer coisas muito eficientes com poucos<br />
recursos e dinheiro”.<br />
A Global Mobility<br />
Call, sendo apenas um<br />
veículo de comunicação<br />
e montra do que se vai<br />
fazendo, faz-se também<br />
ouvir pela diferença<br />
de tons e há vozes que<br />
nos cativam, que nos<br />
surpreendem (ou não)<br />
MOBILIDADE SUSTENTÁVEL PROSPERA<br />
Já Peggy Liu chocou a audiência, não por<br />
ter defendido o papel que a China pode<br />
desempenhar como parceiro fundamental<br />
em termos de infraestruturas para<br />
uma mobilidade com pegada zero. Ao<br />
abordar o papel das macrocidades chinesas,<br />
como Xangai, de onde é natural,<br />
embora resida nos EUA, disse estar a ser<br />
forjada com uma abordagem ambiental,<br />
para fazer face ao aumento da população<br />
nesses espaços, que requerem uma<br />
gestão mais eficiente da mobilidade.<br />
Peggy serviu-se de uma apresentação<br />
com vídeo, onde se ouvia a presidente da<br />
CE, Ursula von der Leyen, a questionar<br />
os processos da China, alegadamente por<br />
subsidiar as exportações de viaturas elétricas<br />
ali produzidas para a Europa, e que<br />
para tal iria iniciar uma investigação. Em<br />
dezembro, o Governo francês anunciou<br />
que os veículos elétricos não produzidos<br />
na Europa deixariam de ser elegíveis para<br />
incentivos à compra de carros elétricos.<br />
Segundo Peggy Liu “a concorrência<br />
no mercado chinês é inimaginável na<br />
Europa, pelo que os carros são vendidos<br />
a um preço inferior ao que é praticado<br />
na Europa. Os governos locais atribuem<br />
subsídios aos compradores para que<br />
adotem veículos elétricos. É essa a razão<br />
que leva os fabricantes a venderam mais<br />
caro na Europa que na China.”<br />
A eletrificação e os combustíveis alternativos, a multimodalidade dos transportes,<br />
as novas infra-estruturas e a inovação contribuirão para impulsionar um novo<br />
paradigma de mobilidade. O hidrogénio é o passo seguinte, também os biocombustíveis,<br />
e muitos expositores mostraram os seus argumentos, como os autocarros,<br />
um protótipo que vai correr as 24 Horas de Le Mans (Mission H24). E também<br />
a condução autónoma. Um protótipo da ONCE, entidade espanhola de serviço a<br />
cidadãos com deficiências visuais, esteve em grande destaque, pela capacidade de<br />
guiar o cidadão pelas ruas, conduzindo-o de forma autónoma, como um robô.<br />
Organizada pelo IFEMA Madrid e Smobhub, já tem edição garantida para 2024,<br />
entre 19 e 21 de novembro, e em 2023 aumentou para 8000 o número de profissionais<br />
presentes, reuniu 500 oradores – a EDP foi moderadora e patrocinou<br />
um palco de conferências, para além de ter mostrado um stand, onde evidenciou<br />
as suas capacidades de apoio à mobilidade elétrica –, realizaram-se 120 mesas<br />
redondas e conferências setoriais. Com mais de 104 organizações participantes, o<br />
número de expositores cresceu 76% em relação à edição anterior.<br />
As informações fornecidas pelos oradores e as discussões nas áreas do congresso<br />
serão compiladas no primeiro relatório de mobilidade sustentável do GMC, que os<br />
especialistas do Instituto Fraunhofer irão produzir. O objetivo deste documento é disponibilizar<br />
o conhecimento gerado durante o evento a todas as partes interessadas.<br />
e-MOBILIDADE 39
IMPULSANDO<br />
Este protótipo da ONCE ajuda os invisuais<br />
na sua mobilidade quaotidiana. Veículo<br />
autónomo, conectado, sabe onde está e<br />
para onde vai<br />
HIDROGÉNIO<br />
Os autocarros movidos a H2 já não<br />
são novidade, mas a sua proliferação<br />
é um sinal das mudanças que<br />
se operam na mobilidade<br />
GIROCOPTER<br />
Ainda com motorização térmica,<br />
mas menos poluidor que um<br />
automóvel, este girocopter é uma<br />
espécie de taxi aéreo para os<br />
novos tempos<br />
INCLUSÃO<br />
A mobilidade reduzida não foi esquecida<br />
nas conferência do GMC e os<br />
técnicos apontaram os caminhos<br />
para que não seja esquecida<br />
40 e-MOBILIDADE
MISSÃO H24<br />
Um protótipo para as corridas de Le<br />
Mans foi apresentado e captou as<br />
atenções. No próximo ano fará frente<br />
aos combustíveis fósseis<br />
e-MOBILIDADE 41
DESCARBONIZAÇÃO<br />
Chegou o<br />
retrofit elétrico<br />
Renault Trucks aposta na economia circular<br />
A construção de veículos ligeiros com recurso<br />
a materiais recicláveis já é uma realidade na<br />
Renault, da mesma forma que a série T Red é<br />
a imagem da sustentabilidade que a Renault<br />
Trucks quer levar a sério. O retrofit elétrico é o<br />
último grito da economia circular: pegar num<br />
camião com motor diesel e fazê-lo andar de novo<br />
com um motor elétrico.<br />
A<br />
Renault Trucks, pioneira na economia circular<br />
e na mobilidade elétrica, deu um passo significativo<br />
para a descarbonização ao converter um<br />
camião com motor diesel, de 12 toneladas, num<br />
camião elétrico movido a bateria. Este projeto de<br />
retrofit elétrico foi realizado em colaboração com a Novumtech,<br />
com apoio financeiro da ADEME, a Agência Francesa para<br />
a Transição Ecológica. A iniciativa é duplamente virtuosa,<br />
pois visa preservar os recursos naturais e reduzir o impacto<br />
ambiental dos veículos.<br />
A Renault Trucks não usa apenas o transporte sustentável<br />
como slogan! O fabricante francês está agora a dar mais<br />
uma prova disso, tendo acabado de concluir a conversão<br />
em oficina de um camião com motor de combustão num<br />
camião elétrico. O objetivo do projeto é avaliar a viabilidade<br />
ambiental, técnica e económica do retrofitting elétrico<br />
para veículos pesados de carga. O projeto foi viabilizado<br />
por meio da colaboração com a Novumtech, startup com<br />
expertise em design e produção de baterias, e com apoio<br />
financeiro da ADEME, a Agência Francesa para a Transição<br />
Ecológica.<br />
A circularidade é, de facto, uma das áreas estratégicas de<br />
foco da Renault Truck para descarbonizar o transporte de<br />
mercadorias. As atividades industriais do fabricante, que<br />
está empenhado em prolongar a vida útil dos veículos<br />
que produz, fazem parte de uma abordagem de economia<br />
circular assente em três pilares: regenerar, reaproveitar e<br />
reutilizar.<br />
42 e-MOBILIDADE
Sob esta abordagem, a Renault Trucks introduziu uma série<br />
de iniciativas, incluindo a duplicação da vida útil dos camiões<br />
para os transportadores, incentivando o recondicionamento<br />
em vez da renovação. Além disso, o fabricante oferece uma<br />
segunda vida aos seus camiões usados através de reaproveitamento,<br />
usando rigorosos processos industriais. Até ao<br />
momento, mais de 1.500 caminhões foram reaproveitados<br />
na Fábrica de Bourg-en-Bresse e 700 foram recondicionados<br />
no Centro de Camiões Usados<br />
em Lyon, economizando mais de<br />
5.000 toneladas de CO 2<br />
.<br />
AS ETAPAS DE CONVERSÃO<br />
A conversão elétrica do Renault<br />
Trucks D de 12 toneladas foi<br />
ECONOMIA CIRCULAR<br />
Este projeto de retrofit, alcançado graças à<br />
parceria com a Novumtech, foi realizado nas<br />
instalações do CampX by Volvo Group na<br />
unidade da Renault Trucks em Lyon<br />
conseguida modificando apenas o estritamente necessário,<br />
nomeadamente o motor, a caixa de velocidades, o depósito<br />
de combustível e o depósito de AdBlue, enquanto os<br />
componentes associados ao motor de combustão, como a<br />
bomba hidráulica para a direção hidráulica, o compressor<br />
de ar para suspensão e travagem e o compressor do ar condicionado,<br />
foram todos removidos.<br />
Esses componentes foram substituídos por um motor<br />
elétrico ligado diretamente ao<br />
eixo de transmissão, uma bateria<br />
de iões de lítio de 210 kWh, um<br />
carregador de bordo de 22 kW,<br />
um compressor de ar elétrico<br />
para suspensão e travagem, uma<br />
bomba hidráulica elétrica para<br />
direção hidráulica, um compressor<br />
de ar condicionado elétrico e um<br />
sistema de aquecimento elétrico<br />
para a cabina.<br />
O próximo marco para este projeto<br />
é a certificação do camião convertido, a<br />
fim de validar a conformidade com as<br />
regulamentações atuais. Uma vez obtida<br />
essa aprovação, a Renault Trucks iniciará<br />
uma fase de testes em condições reais<br />
de operação em parceria com o Clovis<br />
Grand Paris, na França.<br />
Este projeto de retrofit, alcançado graças<br />
à parceria com a Novumtech, foi realizado<br />
nas instalações do CampX by Volvo<br />
Group na unidade da Renault Trucks em<br />
Lyon. O objetivo do CampX é acelerar a<br />
inovação tecnológica e comercial, criando<br />
sinergias entre os funcionários da Renault<br />
Trucks (a equipe de engenharia de Lyon)<br />
e as startups.<br />
A Renault Trucks não<br />
usa apenas o transporte<br />
sustentável como slogan!<br />
O fabricante francês<br />
está agora a dar mais<br />
uma prova disso, tendo<br />
acabado de concluir a<br />
conversão em oficina de<br />
um camião com motor de<br />
combustão num camião<br />
elétrico<br />
e-MOBILIDADE 43
Reduzir, reutilizar,<br />
OPINIÃO<br />
reciclar<br />
ANTÓNIO GONÇALVES PEREIRA<br />
Presidente do Ecomood Portugal, Associação<br />
para a Promoção Solidária da Sustentabilidade<br />
na Mobilidade Humana; Embaixador<br />
do Pacto Climático Europeu<br />
Portugal está a perder uma<br />
excelente oportunidade.<br />
Mais um ano passou, mais<br />
um Orçamento de Estado,<br />
e a conversão de veículos<br />
a combustão para elétricos<br />
continua a não ser uma aposta.<br />
Nem, tão pouco, uma realidade.<br />
Isto enquanto noutros países<br />
não só há muito que esta<br />
solução é praticada, como,<br />
até, já se começa a atribuir<br />
subsídios, tal como para a<br />
aquisição de novos veículos<br />
elétricos. E em Portugal, onde<br />
quase nem produzimos veículos<br />
novos, mas temos tudo o que é<br />
necessário para as conversões,<br />
continuamos parados.<br />
Se em tudo o<br />
resto, porque<br />
não também<br />
nos veículos?<br />
Pense nas muitas centenas de milhões de veículos a<br />
combustão que existem a circular, tanto rodoviariamente,<br />
como nos céus e nos mares. Já todos sabemos<br />
que, mais cedo do que tarde, terão de ser substituídos<br />
por outros, menos poluentes. Muito menos<br />
poluentes. Mas… e porquê substituídos? Muitos deles estão<br />
ainda em perfeitas condições de operação, são bons veículos,<br />
com a excepção de se locomoverem a combustíveis fósseis. E<br />
muitos outros estão, ainda hoje e nos próximos tempos, a ser<br />
produzidos e comercializados. Porque não convertê-los? Ou<br />
seja, RECICLAR motores e peças desnecessárias, REUTILIZAR<br />
o restante veículo, montando-lhe um sistema de propulsão<br />
elétrico e as respectivas baterias e, assim, REDUZIR o abate de<br />
veículos em boas condições e a produção de novos veículos,<br />
com toda a toda a pegada daí inerente.<br />
Este será um mercado gigantesco nos próximos anos. A solução<br />
é já praticada há mais de 30 anos, com maior incidência nos<br />
últimos 15, sobretudo no que diz respeito a automóveis clássicos,<br />
em países como Holanda, Inglaterra ou Estados Unidos. Por cá,<br />
em ambiente académico, também se tem feito sistematicamente,<br />
em Institutos de ensino superior, como o ISEL ou os Politécnicos<br />
de Setúbal, Leiria ou Tomar. Não é, portanto, uma novidade,<br />
nem, tão pouco, particularmente complicado.<br />
Há mais de dez anos que existem sites na internet em que<br />
pode escolher e comprar os diversos componentes para fazer<br />
a sua própria conversão. E também vai havendo fabricantes de<br />
viaturas, como a Aston Martin, a Toyota, a Ford, a Jaguar ou a<br />
44 e-MOBILIDADE
ASTRA<br />
Renault que já anunciaram este modelo de negócio ou que até<br />
já estão mesmo a fornecer kits de conversão para modelos seus.<br />
Em Portugal, além do know-how acima mencionado, temos<br />
tudo o resto: a produção de motores elétricos e respectivos<br />
controladores, a fabricação de baterias, as suas matérias-primas<br />
e componentes. E temos uma forte indústria de empresas<br />
transformadoras de veículos. Porque não, então, apostar-se de<br />
forma clara e incisiva nesta solução de sustentabilidade para<br />
reduzir mais rápida, eficaz e democraticamente a pegada da<br />
mobilidade?<br />
DEMOCRATIZAR E ACELERAR A DESCARBONIZAÇÃO<br />
Converter um veículo implica uma redução de praticamente<br />
dois terços das emissões, se comparado com o seu abate e a<br />
produção de um novo. E este deve ser o número prioritário.<br />
Mas incluamos também a importante vertente económica,<br />
até porque esta está ligada também com a sustentabilidade<br />
social. O valor de uma conversão estará sempre dependente<br />
da autonomia que se pretender, ou seja, das dimensões das<br />
baterias. Quando se começar a aplicar a economia de escala,<br />
ou seja, quando esta for uma solução industrializada e<br />
sistematizada, os valores vão baixar muito substancialmente.<br />
Mas, mesmo nesta fase, a melhor imagem para a conversão de<br />
um automóvel é: pelo preço da compra de um citadino novo<br />
pode converter um SUV ou topo de gama. Portanto, assim<br />
se conseguirá que muitos mais cidadãos consigam passar a<br />
circular com veículos sem emissões.<br />
Mas é nos veículos profissionais que esta solução é ainda mais<br />
importante e urgente, dada a sua grande circulação e pegada.<br />
Autocarros (pelo preço de um elétrico novo pode converter-<br />
-se 3), veículos de distribuição, de logística e limpeza urbana,<br />
táxis e tvde, etc. E barcos,<br />
de turismo, de recreio ou de<br />
transporte coletivo.<br />
Opel Astra convertido<br />
em 2010 pelo Engº. José<br />
Loureiro no Politécnico<br />
de Setúbal, que é o seu<br />
veículo do dia-a-dia<br />
O QUE FALTA FAZER?<br />
Esta é também a fórmula financeiramente<br />
mais sustentável para Portugal,<br />
que produz poucos veículos. As conversões podem constituir<br />
uma indústria de referência no nosso país, uma vez que já<br />
temos tudo o necessário. Em vez de importar, convertemos.<br />
Criamos emprego e riqueza. Aumentamos receita fiscal em<br />
vez de deixar sair divisas. E, claro, baixamos drasticamente<br />
emissões.<br />
Temos, portanto, tudo. Falta vontade política, visão e<br />
aposta. Há que evoluir a legislação existente e criar regulamentação,<br />
como aconteceu com o GPL. Há que certificar<br />
empresas do sector (devendo até atribuir-se-lhes estatuto de<br />
interesse público) e homologar kits de conversão, para que,<br />
nesses casos, baste uma inspeção B para rapidamente se devolver<br />
esses veículos à circulação. E falta criar os incentivos<br />
adequados, tanto ao nível da produção, como das instituições<br />
ou do cidadão consumidor final.<br />
E o Estado, central e local, pode e deve dar o exemplo, começando<br />
a converter, a reutilizar, as suas gigantescas frotas. Se<br />
esta solução é mais sustentável do que o abate e produção de<br />
veículos novos, porque não? Portugal pode ainda entrar na<br />
linha da frente, criando uma indústria de referência nacional,<br />
com empresas de todas as dimensões, incluindo exportadoras.<br />
Sustentável, ambiental, social e financeiramente, não é deitar<br />
fora e produzir novo, é reutilizar o que temos. Nas viaturas<br />
como em tudo o resto.<br />
AUTOCARRO<br />
O Engº. Tiago Octício<br />
mostra a Elisabete Jacinto<br />
o autocarro convertido na<br />
Barraqueiro, em parceria<br />
com o ISEL<br />
e-MOBILIDADE 45
TRANSIÇÃO ENERGÉTICA<br />
O futuro realista<br />
da mobilidade<br />
A mobilidade é uma das atividades mais inerentes ao ser humano, mas a sua complexidade tem<br />
aumentado devido aos desafios ambientais e populacionais que fazem parte do século XXI.<br />
GUSTAVO MAGALHÃES<br />
Senior Innovation Consultant na Beta-i<br />
A<br />
realidade é que os<br />
condicionamentos<br />
exteriores que enfrentamos<br />
perturbam o que<br />
consideramos ser o nosso<br />
fluxo natural de movimentação, mas,<br />
por outro lado, são simultaneamente<br />
estes mesmos entraves que também<br />
impulsionam o próprio repensar das<br />
diferentes maneiras como nos deslocamos<br />
– resultando, frequentemente, na<br />
inovação necessária para as sociedades<br />
progredirem.<br />
Deste processo surge, inevitavelmente,<br />
a questão: o que se segue, então, em<br />
termos de mobilidade?<br />
A transição para veículos elétricos tem<br />
sido uma das mudanças mais significativas<br />
no cenário global nos últimos<br />
tempos. Não obstante, tem de existir<br />
um equilíbrio entre a introdução de<br />
novos modelos elétricos e a preservação<br />
sustentável dos veículos de combustão<br />
já existentes. Uma abordagem<br />
abrangente requer por isso a implementação<br />
de incentivos apropriados<br />
para uma mudança gradual e inclusiva.<br />
Não conseguiremos consolidar<br />
um futuro sustentável sem ponderar<br />
o impacto socioeconómico que esta<br />
transição pode ter em comunidades<br />
que dependem predominantemente de<br />
tecnologias tradicionais de combustão.<br />
Devemos ter em conta que, para<br />
a maioria da população, trocar o seu<br />
carro atual por outro modelo elétrico<br />
ou mais sustentável exige um esforço<br />
financeiro significativo, pelo que as<br />
soluções que impulsionem a adoção<br />
destes mesmos veículos deve ser fortalecida<br />
com apoios, económicos e de<br />
outra natureza, a essa transição.<br />
Adicionalmente, os conceitos de<br />
mobilidade partilhada e micromobilidade<br />
têm desempenhado um papel<br />
significativo no facilitar as deslocações<br />
urbanas, contribuindo para a redução<br />
do congestionamento urbano e para<br />
a mitigação das emissões de carbono.<br />
As deslocações devem continuar a ser<br />
pensadas de forma comunitária para<br />
organizar o fluxo das cidades, mas<br />
também oferecer oportunidades diversificadas<br />
e personalizadas às necessidades<br />
de cada indivíduo. O equilíbrio<br />
entre estas duas modalidades é desafiante,<br />
requerendo esforços significativos<br />
no fortalecimento das redes de<br />
transportes coletivos e um planeamento<br />
minucioso da intermodalidade entre<br />
46 e-MOBILIDADE
Devemos ter em conta<br />
que, para a maioria da<br />
população, trocar o seu<br />
carro atual por outro<br />
modelo elétrico ou<br />
mais sustentável exige<br />
um esforço financeiro<br />
significativo<br />
diferentes tipos de viaturas. A aposta<br />
numa mobilidade mais flexível e ramificada<br />
é, certamente, um dos caminhos a<br />
seguir para desbloquear a acessibilidade<br />
das cidades. Ao considerar o futuro da<br />
mobilidade, não podemos ignorar também<br />
a ascensão iminente dos veículos<br />
autónomos. A convergência da inteligência<br />
artificial e da automação está<br />
paulatinamente a abrir portas para um<br />
novo paradigma de deslocações, onde<br />
os veículos autónomos têm o potencial<br />
de redefinir radicalmente a forma<br />
como nos movemos. Esta revolução<br />
não se limita apenas à conveniência<br />
pessoal, proporcionando igualmente<br />
oportunidades para otimizar processos<br />
de transporte e logística, bem como do<br />
uso de infraestruturas inteligentes. Não<br />
obstante, a integração bem-sucedida<br />
desses veículos exigirá não apenas progresso<br />
tecnológico, como também uma<br />
reflexão profunda sobre as implicações<br />
éticas e sociais dessa transição.<br />
A inovação é chave para o futuro da<br />
mobilidade, pois está intrinsecamente<br />
ligada ao desenvolvimento de uma<br />
abordagem holística que busque a<br />
melhoria tanto dos veículos como das<br />
infraestruturas existentes no quotidiano.<br />
Neste caminho, é necessário saber<br />
conjugar os avanços tecnológicos com<br />
as implicações sociais, económicas e<br />
ambientais que estes possam trazer,<br />
procurando aumentar o potencial da<br />
mobilidade para que esta se adeque às<br />
vidas das pessoas – e não o contrário.<br />
e-MOBILIDADE 47
48 e-MOBILIDADE
RESPOSTA RADICAL<br />
Bento e<br />
Freegones<br />
Micro-utilitários da Renault<br />
para a última milha<br />
Chegou a vez do Bento, um micro carro, também elétrico, com<br />
uma caixa de carga de 1 m 3 para entregas urbanas da última milha.<br />
Tem a assinatura da Mobilize, empresa do universo Renault. Mas<br />
também chegou a hora do Freegones, um triciclo elétrico, que<br />
dobra aquela capacidade de carga<br />
A<br />
Renault encontrou<br />
respostas algo radicais<br />
para as entregas da<br />
última milha. Conhecidas<br />
as dificuldades de<br />
estacionamento, dos congestionamentos<br />
dos grandes centros urbanos<br />
e das restrições à circulação que as<br />
autoridades municipais irão impor, a<br />
resposta da Mobilize/Renault chegou<br />
e ela chama-se Bento. Porquê Bento?<br />
Ninguém soube responder. Também<br />
não se sabe ainda o preço. É elétrico,<br />
naturalmente. E ainda surgiu o<br />
Freegones, uma “tricicleta” elétrica,<br />
com 80 km de autonomia, com a assinatura<br />
da Kleuster/Renault, esta da<br />
responsabilidade da Renault Trucks.<br />
Vá lá saber-se porquê.<br />
O Bento tem uma imagem impressiva,<br />
pelo menos na imagem que transmite,<br />
e a que ninguém ficará indiferente. É<br />
monolugar, bem centrado na carlinga,<br />
tem duas portas, tipo elytral (vertical)<br />
e uma caixa de carga com 1 m 3 de<br />
e-MOBILIDADE 49
MICRO-UTILITÁRIOS<br />
Bento e Freegones<br />
O Bento tem uma<br />
imagem impressiva,<br />
pelo menos na<br />
imagem que<br />
transmite, e a que<br />
ninguém ficará<br />
indiferente<br />
capacidade. Para volumes pequenos,<br />
naturalmente, e para corresponder aos<br />
cada vez mais pedidos de última hora,<br />
super necessários e super urgentes.<br />
A Renault foi de extremos: em ato contínuo<br />
à apresentação da sua van de maior<br />
capacidade, a Master, na Solutrans de<br />
Lyon, bem ali ao lado o Bento dava sinal<br />
de vida, o mais pequeno dos comerciais.<br />
Aparentemente derivado do Duo,<br />
a pequena máquina que substituiria<br />
o Renault Twizy, a sua caixa de carga<br />
poderá carregar 80 kg de carga útil, mas<br />
pode ser apetrechada com ferramentas<br />
para pequenas reparações e manutenção.<br />
A Mobilize vai propor layouts para<br />
a caixa, podendo ter um visual personalizado.<br />
Dotado de airbag e ar-condicionado, o<br />
Bento foi projetado para empresas, mas<br />
o transporte particular também é viável.<br />
Possui um sistema de acesso e arranque<br />
por meio de uma chave digital acessível<br />
a partir de um smartphone. Para a<br />
gestão da frota, o veículo é conectado.<br />
Alguns dados do veículo são transmitidos<br />
em tempo real para um servidor online<br />
seguro. Pode circular até 80 km/h<br />
e dispõe de autonomia de 140 km. O<br />
cabo de carregamento, ligado ao veículo,<br />
é de tipo padrão (uso doméstico)<br />
ou tipo 2 (compatível com postos de<br />
carregamento públicos, em empresas ou<br />
parques de estacionamento). O Bento<br />
estará disponível no primeiro semestre<br />
de 2024.<br />
FREEGONES, SEM DAR<br />
AOS PEDAIS<br />
O Freegones parece um carrinho de<br />
gelados – e a verdade é que também<br />
pode ter essa configuração e capacidade<br />
frigorífica –, mas a sua caixa de<br />
carga tem capacidade para 2m 3 e 300<br />
kg de carga útil, com várias portas<br />
para acesso à mesma. Diz a marca que<br />
acolherá 16 caixas com dimensões de<br />
600x400x300mm, ou uma europalete.<br />
E se tem uma pedaleira de auxílio para<br />
os primeiros metros, ou para uma subida<br />
– pode trepar pendentes a 16% –, a<br />
sua bateria garante autonomia para 80<br />
km, ou um dia inteiro de trabalho. Está<br />
conectada à base.<br />
50 e-MOBILIDADE
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BERLINA BYD HAN E SUV BYD TANG<br />
Dois formatos<br />
para o<br />
almirantado<br />
A Europa ainda não se habituou aos carros elétricos chineses? Há<br />
quem olhe para o lado, com desdém, por desconfiança, outros que<br />
fingem não ligar importância. Mas é bom que se habituem, pois eles<br />
continuam a chegar e a ganhar posições nos rankings. Andam a par<br />
com a dianteira tecnológica, têm design moderno – também algum<br />
kitsch –, performance, qualidade de construção e de materiais e<br />
acabamento cuidado. A autonomia é ao nível dos melhores e o preço<br />
continua a surpreender. Experimentámos dois dos seus topo de<br />
gama, a berlina Han e o SUV Tang.<br />
Por Carlos Branco<br />
Tem sido fulgurante a trajetória<br />
industrial da BYD,<br />
fundada em Shenzhen, na<br />
China, em 1995, por Wang<br />
Chuanfu, engenheiro químico,<br />
a quem já chamam de Elon Musk<br />
chinês. Os pontos de ligação entre<br />
ambos: empreendedores e multimilionários.<br />
O que já os distingue: a BYD já<br />
ultrapassou a Tesla como líder mundial<br />
na venda, a nível global, de veículos<br />
elétricos, no final do ano passado.<br />
A BYD - Build Your Dreams é a fabricante<br />
número um de veículos elétricos<br />
na China, começou a sua ascensão<br />
como produtora de baterias para telemóveis<br />
e inovou na experiência energética<br />
ao desenvolver as baterias de fosfato<br />
de ferro-lítio (LFP), com o formato de<br />
lâminas, mais finas e resistentes que as<br />
convencionais.<br />
Começou por fabricar autocarros,<br />
produz as suas próprias baterias e<br />
chegou aos veículos de passageiros,<br />
tendo começado a assolar a Europa com<br />
uma vaga de produtos mais baratos e<br />
que têm cativado muitos adeptos. Já<br />
anunciou a construção de uma fábrica<br />
de automóveis elétricos na Hungria,<br />
para assim contornar as restrições de alguns<br />
países, que anunciaram o final de<br />
incentivos à compra de carros de zero<br />
emissões se estes não forem produzidos<br />
no espaço da UE.<br />
A BYD chegou a Portugal em maio<br />
último, pela mão da Salvador Caetano.<br />
Primeiro com o Atto 3, um SUV para o<br />
segmento C, e com a berlina Han, um<br />
topo de gama para o segmento E, pró-<br />
-executivo. E mais o Tang, um SUV premium<br />
de sete lugares. E agora já tem no<br />
mercado um comercial ligeiro, o ETP3,<br />
mais o Dolphin e o Seal, pontas-de-lança<br />
para os segmentos C e D. Ora, desde<br />
maio, mês de arranque da comercialização,<br />
e até ao final de dezembro, a BYD<br />
TANG<br />
É tudo digital nos<br />
quadrantes, talvez até<br />
demais, havendo já quem<br />
sinta saudades de alguns<br />
interruptores físicos<br />
52 e-MOBILIDADE
e-MOBILIDADE 53
LIGEIROS<br />
BYD Han e BYD Tang<br />
já matriculou 462 veículos em Portugal<br />
(dados da ACAP).<br />
3,9 SEGUNDOS!<br />
Vem agora ao caso o contacto com dois<br />
dos primeiros “realizadores de sonhos”.<br />
O Han e o Tang. Partilham a mesma<br />
plataforma, o preço – 72.500 euros – e<br />
a motorização, que neste caso é dupla,<br />
com um motor para cada eixo, sendo<br />
assim ambos All Wheel Drive. A soma<br />
perfaz 517 cv, com uma bateria de 85,4<br />
kWh e um elevado binário. Já se sabe<br />
quão rápida é a disponibilização de<br />
energia nos carros elétricos, e em modo<br />
de condução Sport colam-nos às costas<br />
dos assentos - bem ergonómicos, em<br />
pele vegan, aquecidos e refrigerados –<br />
mas sem sobressaltos, natural em carros<br />
com quase cinco metros de comprimento<br />
e boa distância entre eixos.<br />
O Han causou surpresa pela designação<br />
secundária afixada no painel traseiro<br />
da mala – 3,9s. Anuncia assim que é o<br />
tempo que leva a atingir os 100 km/h.<br />
O Tang faz 4,6s, pois é bem mais pesado,<br />
mas disso não faz ostentação.<br />
As linhas de ambas são fluidas, o Han,<br />
naturalmente mais baixo e esguio, com<br />
design europeu, tal como o Tang, este<br />
de “salto alto” e com a metade traseira<br />
apenas ligeiramente mais baixa que<br />
o pilar central, pois tem que acolher<br />
dois lugares suplementares. Que são<br />
de acesso difícil, quase só acessível a<br />
jovens passageiros.<br />
A vida a bordo é luxuosa (acabamentos<br />
Executive e Flagship, no Han e<br />
no Tang). Os materiais são agradáveis<br />
ao toque e não se notam desencontros<br />
nos remates. É tudo digital<br />
nos quadrantes, talvez até demais,<br />
havendo já quem sinta saudades de<br />
alguns interruptores físicos – há um<br />
head display no Han. O ecrã de info é<br />
gigante e pode ser disposto, ao gosto<br />
do condutor, em modo panorama ou<br />
retrato. As centenas de funções não<br />
são de escolha muito intuitiva.<br />
As costas do banco central traseiro<br />
rebatem e aí encontra-se outro display,<br />
onde os passageiros podem manipular<br />
várias funções, como climatização ou<br />
sistema áudio. À noite há luzes no<br />
tablier que podem bailar consoante o<br />
ritmo da música. Naturalmente, um<br />
kitsch nada a propósito em viaturas<br />
de segmento avançado.<br />
Em andamento quase nulo há um<br />
zumbido de funcionamento algo<br />
irritante, mas inaudível com o incremento<br />
da marcha. Há suavidade<br />
na disponibilização da potência – o<br />
modo Eco é mais que suficiente –, o<br />
comportamento em estrada é preciso,<br />
a travagem, com a chancela Brembo,<br />
é reconfortante.<br />
No capítulo da segurança têm tudo o<br />
que já existe no mercado, detetam e<br />
alertam para tudo e mais alguma coisa<br />
e dispõem de câmaras que nos revelam<br />
ângulos-mortos laterais. A BYD também<br />
tem os seus “navios de almirantado”.<br />
54 e-MOBILIDADE
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS<br />
BYD Han<br />
BYD Tang<br />
Motor<br />
Elétrico Dual 180 Kw (245 cv)+200 Kw (272 cv)<br />
Transmissão<br />
Integral (AWD)<br />
Bateria<br />
85,4 KWh<br />
Binário<br />
700 Nm<br />
Vel. Max.<br />
180 km/h<br />
Ac. 0/100 km/h 3,9s 4,6s<br />
Autonomia<br />
521 km (comb.) 400 km (comb.)<br />
662 km (urbano) 528 km (urbano)<br />
Travões<br />
Discos perfurados, ventilados com pinças desportivas Brembo<br />
Suspensão<br />
McPherson (ft), eletr. ajustável<br />
McPherson (ft)<br />
Multibraços (tr.) eletr. Ajustável<br />
Multibraços (tr)<br />
Peso 2250 kg 2489 kg<br />
Dimensões (CxLxA) 4995x2134x1495 mm 4870x1950x1725 mm<br />
Já se sabe quão rápida é a<br />
disponibilização de energia nos carros<br />
elétricos, e em modo de condução Sport<br />
colam-nos às costas dos assentos<br />
e-MOBILIDADE 55
COMBUSTÍVEL<br />
Menos poluente<br />
que a gasolina<br />
e (muito) mais<br />
GPL,<br />
barato, o GPL tem<br />
feito da Dacia um<br />
sucesso comercial<br />
o ás da Dacia<br />
O propano e o butano são obtidos através do petróleo ou do gás<br />
natural e quando misturados dão origem ao GPL (gás de petróleo<br />
liquefeito), também chamado de autogás, se aplicado como<br />
combustível automóvel. Ora, para a Dacia, este consumível tem<br />
sido um ás de trunfo por toda a Europa e particularmente em<br />
Portugal, onde os automobilistas vivem deprimidos pelo elevado<br />
custo dos carburantes tradicionais. A Renault dedicou à nova<br />
marca-coqueluche um “Dacia Talks”.<br />
A<br />
Dacia, construtor automóvel<br />
romeno, chegou<br />
a Portugal há 15 anos, e<br />
em 1999 passou a orbitar<br />
na esfera empresarial da<br />
Renault. Esta tirou-lhe a rusticidade,<br />
proporcionou-lhe modernidade tecnológica,<br />
mas manteve-lhe o aspeto robusto<br />
e deu-lhe um ar confiável. E um preço<br />
baixo. Tanto assim foi que a Dacia cavalgou<br />
jornadas de sucesso desde 2017,<br />
quando passou a ser um best seller entre<br />
as viaturas particulares na Europa – o<br />
Sandero tem essa aura. Em Portugal poderia<br />
mesmo ser um caso de estudo, pois<br />
um em cada cinco veículos vendidos a<br />
particulares é um Dacia Sandero.<br />
Os números mais recentes divulgados<br />
pela ACAP dizem-nos que a Dacia foi a<br />
terceira marca mais vendida no mercado<br />
nacional nos primeiros nove meses<br />
do ano entre os ligeiros de passageiros.<br />
Lá está, o preço também ajuda. Mas<br />
não é só. Quatro dos cinco modelos da<br />
Dacia já dispõem do motor TCe 100<br />
ECO-G, lançado em 2020, um três cilindros<br />
turbo, com 100 cv de potência.<br />
Principal característica: é bi-fuel. Quer<br />
com isto dizer que tanto pode consumir<br />
gasolina como GPL, em depósitos autónomos,<br />
preparado para tal de origem<br />
56 e-MOBILIDADE
e suficientemente testado para se poder<br />
assegurar que é confiável e seguro,<br />
derrubando alguns mitos de estrada que<br />
dele diziam ser suscetível a explosões.<br />
Sendo um bi-fuel com GPL assim concebido<br />
de fábrica, também pode aceder<br />
a estacionamentos subterrâneos (tem<br />
selo de certificação).<br />
PREFERIDO POR PARTICULARES,<br />
ATRATIVO PARA EMPRESAS<br />
José Pedro Neves, diretor geral da Dacia<br />
para Portugal, fez o enquadramento da<br />
marca em Portugal: “O grande objetivo<br />
inicial sempre foi o de conquistar os<br />
clientes particulares e nessa matéria somos<br />
líderes incontestados de vendas, com 18%<br />
de quota de mercado. Os portugueses<br />
gostam de comprar um automóvel com o<br />
seu próprio dinheiro e um em cada cinco<br />
adquirem um Dacia, o que é um motivo<br />
Também é bem mais<br />
económico e mais rentável.<br />
A preços de outubro, o<br />
GPL custava -55% por litro<br />
que a gasolina<br />
de orgulho para todos nós. O Sandero é o<br />
mais vendido em Portugal a particulares,<br />
o segundo mais vendido no mercado<br />
total, o Duster é o segundo na lista dos<br />
particulares. Já o Spring é o líder de vendas<br />
dos elétricos a particulares.”<br />
Sem deixar de enfatizar a importância<br />
do GPL no mercado português, ao mesmo<br />
tempo que expunha o declínio de<br />
outros combustíveis e o crescente interesse<br />
do cliente empresarial, José Pedro<br />
Neves revelou como outros potenciais<br />
utilizadores têm despertado para este<br />
combustível alternativo: “O mix do<br />
GPL é apenas de 5% no mercado, mas<br />
o diesel está em declínio, já desceu 40<br />
pontos nos últimos cinco anos, e está a<br />
perder para o green market. O mercado<br />
do GPL está a crescer, e praticamente<br />
ele é todo preenchido pela Dacia. Ao<br />
mesmo tempo, o GPL começa também<br />
a ser uma verdadeira alternativa para as<br />
empresas, porque um carro a GPL deduz<br />
50% do IVA na aquisição e deduz<br />
outros 50% do GPL na utilização.”<br />
Mas então, e os gases com efeito de<br />
estufa? Então, a Renault, que está em<br />
sequência interminável de lançamentos<br />
de motorizações E-Tech, anda a promover<br />
a combustão interna? É verdade.<br />
Mas, assegura, que por boas razões. E,<br />
de resto é para uma motorização bi-fuel.<br />
É preciso que se diga que o GPL é<br />
um combustível alternativo com uma<br />
combustão mais limpa/menos nociva,<br />
com emissões poluentes inferiores às<br />
que resultam da combustão de gasolina<br />
e gasóleo. A sua queima produz menos<br />
monóxido de carbono, emite menos<br />
hidrocarbonetos não queimados, menos<br />
óxido de azoto e dióxido de carbono.<br />
Também é bem mais económico e mais<br />
rentável. A preços de outubro, o GPL<br />
custava -55% por litro que a gasolina. É<br />
verdade que a combustão de GPL queima<br />
mais dois litros aos 100 km que a de<br />
a gasolina. No entanto, as vantagens ao<br />
fim dos primeiros 156 mil km percorridos<br />
são significativas. Dizem os gestores<br />
da marca que os ECO-G da Dacia<br />
reduzem em 40% os custos de operação<br />
– em combustível e em manutenção.<br />
Resta dizer que todos os Dacia com motor<br />
ECO-G têm 1200 km de autonomia<br />
(quando atestados os dois depósitos de<br />
50 litros, de GPL e gasolina). Estudos<br />
da marca revelam que os utilizadores<br />
utilizam maioritariamente o GPL como<br />
combustível prioritário nas duas deslocações.<br />
A combustão a gasolina funcionará<br />
sempre que o condutor desejar,<br />
mediante a pressão de um botão.<br />
e-MOBILIDADE 57
SETRA 500<br />
Daimler Buses já entregou<br />
10 mil unidades<br />
Os primeiros modelos Setra ComfortClass e TopClass da série de modelos 300<br />
saíram da linha de produção em Neu-Ulm em 1991. A série 400 seguiu em<br />
2001 e a produção em série da série 500 foi lançada em 2012.<br />
58 e-MOBILIDADE
LANÇADO EM 2012<br />
A última geração da série<br />
500 é fabricada em Neu-Ulm<br />
desde 2022 e começou a ser<br />
produzida em 2012<br />
A<br />
operadora de autocarros<br />
Unser Roter Bus GmbH,<br />
com sede no estado federal<br />
de Mecklemburgo-Pomerânia<br />
Ocidental, na Alemanha,<br />
adquiriu um Setra S 516 HD muito<br />
especial. Trata-se da unidade 10.000<br />
de turismo da série ComfortClass/<br />
TopClass 500 produzido<br />
na fábrica em Neu-Ulm.<br />
Equipado com 48 lugares,<br />
o veículo de três eixos de<br />
13,1 m de comprimento da<br />
série de modelos facelifted<br />
tem todos os mais recentes<br />
sistemas de assistência ao<br />
motorista e de segurança a<br />
bordo que a Daimler Buses<br />
oferece atualmente.<br />
O seu novo proprietário,<br />
René Riechert, manifesta-se<br />
impressionado. “Ao fazer<br />
ajustes aparentemente pequenos<br />
em muitos detalhes,<br />
quem desenvolveu o veículo conseguiu<br />
dar um front-end completamente<br />
novo à linha de autocarros de turismo<br />
ComfortClass”, diz o empresário, que<br />
colocou outro S 516 HD e mais um S<br />
511 HD em operação, além da unidade<br />
comemorativa de aniversário.<br />
A fábrica de Neu-Ulm é o centro de<br />
competência para autocarros de turismo<br />
de todos os tipos da Daimler Buses. A<br />
empresa produz veículos de turismo e<br />
intermunicipais das marcas Mercedes-<br />
-Benz e Setra. Os primeiros modelos<br />
Setra ComfortClass e TopClass da série<br />
de modelos 300 saíram da linha de produção<br />
em Neu-Ulm em 1991. A série<br />
400 seguiu em 2001 e a produção em<br />
série da série 500 foi lançada em 2012.<br />
A última geração dos dois modelos também<br />
é produzida no local desde 2022.<br />
A fábrica conta com métodos de produção<br />
de última geração, como a produção<br />
digital de autocarros de turismo.<br />
Todos os componentes para veículos de<br />
turismo são pré-montados digitalmente<br />
na sequência de montagem e as etapas<br />
individuais do processo são analisadas<br />
no computador. Isso possibilita otimizar<br />
o processo de montagem com antecedência<br />
e minimiza a necessidade de<br />
ajustes posteriores no processo.<br />
A fábrica de Neu-Ulm também abriga o<br />
Centro de Desenvolvimento de Sistemas de<br />
Segurança e Assistência, onde os veículos<br />
são testados, bem como o Centro de Competência<br />
para peças impressas em 3D.<br />
e-MOBILIDADE 59
SEMINÁRIO MOBILIDADE MAIS<br />
O transporte público<br />
É UMA URGÊNCIA<br />
Os problemas da mobilidade há muito estão identificados e as<br />
soluções estão à vista de todos os intervenientes, governantes,<br />
autoridades, operadores e técnicos. Só o mindset ainda não<br />
atingiu os utentes, por não parecerem, por ora, predispostos para<br />
abraçarem o caminho da mudança, para serem também atores da<br />
transição e da tal sustentabilidade, mas por também não estarem<br />
satisfeitos com a oferta atual. O seminário Mobilidade Mais<br />
acrescentou contributos à discussão, que está longe de terminar,<br />
sobre a sustentabilidade que desejamos. Ainda há obstáculos ao<br />
transporte público, mas há cada vez mais uma urgência para a sua<br />
evolução, que será igualmente a da própria sociedade.<br />
Por Carlos Branco<br />
O<br />
que querem as pessoas<br />
quando se fala de mobilidade?<br />
Tomemos como<br />
exemplo os transportes<br />
públicos: querem boa<br />
acessibilidade, carreiras, horários e<br />
frequências adequados, veículos confortáveis,<br />
seguros e modernos, bilhética<br />
e formas de pagamento simplificados.<br />
E, preferencialmente, que os levem do<br />
ponto A ao B rapidamente e por um<br />
preço justo. E isso está a acontecer?<br />
Não. Mas há sinais de mudança. Foi<br />
isso que ouvimos no seminário Mobilidade<br />
Mais, realizado em 19 de outubro,<br />
em Lisboa, iniciativa da Invesporte, editora<br />
das revistas EUROTRANSPORTE<br />
e <strong>eMOBILIDADE+</strong>, com quatro painéis<br />
de discussão dedicados à mobilidade<br />
urbana e interurbana, ao transporte expresso,<br />
à alta velocidade e aos sistemas<br />
de pagamento de transportes.<br />
Ouvimos de membros do Governo o<br />
diagnóstico e a urgência da melhoria do<br />
serviço público da transporte, de muitos<br />
líderes de empresas que participam<br />
neste processo a necessidade do reforço<br />
das medidas financeiras de apoio às<br />
operações e de melhor monitorização<br />
pelas autoridades das necessidades dos<br />
utentes. Escutámos dos técnicos que<br />
as mais adequadas soluções digitais<br />
para otimizarem estes sistemas estão ao<br />
alcance, mas que as decisões, mormente<br />
as políticas, tal como a execução<br />
60 e-MOBILIDADE
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e-MOBILIDADE 61
EVENTO<br />
Seminário Mobilidade Mais<br />
Foram quatro painéis de discussão dedicados à<br />
mobilidade urbana e interurbana, ao transporte<br />
expresso, à alta velocidade e aos sistemas de<br />
pagamento de transportes<br />
das mesmas, devem ser tomadas mais<br />
rapidamente. “Temas desafiantes”,<br />
chamou-lhes Eduardo Carvalho, administrador<br />
da Invesporte, promotora<br />
do evento, na alocução de boas-vindas,<br />
para quem “minimizar os impactos no<br />
meio ambiente e na qualidade de vida<br />
dos cidadãos” constituem desafios que<br />
importa continuar a discutir.<br />
Aqui deixamos uma súmula dos debates,<br />
sem prejuízo de tudo o que foi<br />
dito na íntegra, com recurso à gravação<br />
vídeo, que pode ser acedida no Youtube<br />
(clicar nas imagens).<br />
PEDRO BOGAS<br />
A Carris, com a procura atual,<br />
retira diariamente entre 120 a<br />
130 mil carros da cidade<br />
MAIS MOBILIDADE NO<br />
TRANSPORTE URBANO<br />
E INTERURBANO<br />
Em mesa redonda composta por Sónia<br />
Ferreira (Rodoviária do Tejo), Sérgio<br />
Soares (Transdev), Pedro Bogas (CAR-<br />
RIS) e António Torres (CIM Lezíria do<br />
Tejo), moderada por Susana Castelo<br />
(TIS), Luís Cabaço Martins (ANTROP)<br />
introduziu o tema e explicou como está<br />
tudo a mudar com a chegada dos reguladores<br />
da atividade, que ainda cometem<br />
erros por estarem a aprender, mas<br />
que têm as competências legais para<br />
intervir e devem ser proativos na análise<br />
dos contratos de serviço público.<br />
Com os contratos de serviço público,<br />
quais têm sido as conquistas dos<br />
passageiros?, lançou a moderadora.<br />
“Fora das áreas metropolitanas não há<br />
transporte. Apenas o transporte escolar<br />
e é ineficiente. E ao fim-de-semana também<br />
não há transporte”, criticou Sérgio<br />
Soares, questionando por que razão os<br />
outros territórios têm menos acesso ao<br />
transporte público que as áreas metropolitanas.<br />
Para Sónia Ferreira, a sustentabilidade é<br />
a chave: “Como podemos ter operadores<br />
que a integrem bem nas suas operações<br />
diárias, com qualidade, com bom serviço,<br />
com melhor frota, como boa tipologia<br />
de títulos, se essa atividade não for<br />
economicamente sustentável? Por que<br />
não fasear esta transição energética, sem<br />
ser do 8 ao 80? Através de combustíveis<br />
menos poluentes e não apenas com<br />
elétricos ou a hidrogénio, que frequentemente<br />
dizem-nos não existir, ou essas<br />
unidades são sujeitas a rateio”.<br />
Pedro Bogas disse quem é o adversário:<br />
o transporte individual. A Carris,<br />
com a procura atual, retira diariamente<br />
entre 120 a 130 mil carros diariamente<br />
da cidade. Com as metas definidas,<br />
crê que esse número poderá aumentar<br />
para 150/170 mil. “Acreditamos poder<br />
chegar a meados de 2024 com praticamente<br />
metade da frota sustentável, e<br />
com 80% até 2026”.<br />
“Como se explica a uma pessoa de<br />
Samora Correia, que fica mais perto<br />
de Lisboa que Mafra ou Setúbal, que<br />
o seu passe seja mais caro. São arestas<br />
que deveriam ser limadas e o Governo<br />
tem que ter a noção que há transportes<br />
62 e-MOBILIDADE
públicos para além das áreas metropolitanas”,<br />
sublinhou António Torres, para<br />
quem transferir dinheiro para onde já<br />
existem transportes e não transferir para<br />
onde eles não existem, não deixará de<br />
fazer aumentar as assimetrias.<br />
SISTEMAS INTEGRADOS<br />
DE PAGAMENTO DE TRANSPORTES<br />
Nesta conversa, moderada por Nuno<br />
Soares Ribeiro (VTM), participaram<br />
Vítor Santos (Metro Lisboa), Eduardo<br />
Ramos (Via Verde), Miguel Gaspar<br />
(SIBS) e Rui Martins (IMT). E coube a<br />
este apresentar o projeto 1Bilhete.pt,<br />
que tem por objetivo promover a interoperacionalidade<br />
técnica dos sistemas<br />
de bilhética. Não se trata de um bilhete<br />
para utilizar em todo o território, mas<br />
para ser lido em qualquer sistema regional<br />
de transportes. “É o momento para<br />
os operadores e para as autoridades<br />
trazerem ideias novas para o sistema”,<br />
disse.<br />
Vítor Santos disse entender esta evolução<br />
tecnológica nos sistema de pagamento<br />
como mais um motivo de atração<br />
para a utilização do transporte público,<br />
mas...: “Ainda há muita gente que<br />
passa horas para renovar cartões-passe.<br />
Há atrofias, como todos os estudantes<br />
terem que apresentar documento em<br />
como são estudantes, quando o ensino<br />
é obrigatório. Isto não é fomentar o<br />
transporte.”<br />
Eduardo Ramos: “Na Via Verde queremos<br />
proporcionar uma visão universal nos<br />
transportes coletivos, como um acrescento<br />
à nossa oferta, como já fazemos fora de<br />
Portugal, onde tudo é mais lento do que<br />
gostaríamos, pois pensamos em novos<br />
NUNO SOARES RIBEIRO<br />
É o momento para os<br />
operadores e para as<br />
autoridades trazerem ideias<br />
novas para o sistema<br />
modelos, em inovar, mas o problema,<br />
depois é a capacidade de executar.”<br />
Miguel Gaspar acrescentou-lhe algo:<br />
“Uma grande inovação aconteceu em<br />
2004, quando passou a ser possível<br />
carregar os passes no Multibanco.<br />
Desde então, as pessoas querem uma<br />
via verde nos transportes, que ainda não<br />
existe. Só em 2015 se voltou a falar na<br />
bilhética, mas o Metro só a conseguiu<br />
inaugurar no ano passado [pagar título<br />
de ingresso com o cartão bancário].”<br />
MAIS MOBILIDADE<br />
NO TRANSPORTE EXPRESSO<br />
Com o advogado José Luís Esquível<br />
no papel de key speaker e João Sousa<br />
(Figueira de Sousa) como moderador,<br />
a mesa foi composta por Tiago Alves<br />
(Flixbus), Juan Piña (ALSA), Nuno Oliveira<br />
(Gipsyy) e Martinho Costa (Rede<br />
Expressos).<br />
José Luís Esquível historiou o processo<br />
de liberalização do serviço expresso,<br />
que já tem 40 anos, e a abertura, em<br />
2015, ao regime da concorrência, mas<br />
só regulamentado a partir de 2019.<br />
Lançada a discussão, João Sousa pediu<br />
uma primeira reflexão sobre o impacto<br />
da liberalização que trouxe novo<br />
operadores ao setor. Martinho Costa:<br />
“A história é cíclica e agora começamos<br />
a ter alguma proteção aos caminho<br />
de ferro com a eliminação de alguns<br />
viagens aéreas de curta distância e antes<br />
de 1983 tínhamos um protecionismo à<br />
CP feito pelo próprio Estado. Mas nós<br />
sempre defendemos que o mercado deveria<br />
ser aberto, mas essa liberalização<br />
deixou-nos felizes.”<br />
Para um desses operadores, a ALSA,<br />
com vasta experiência em Espanha,<br />
onde ele não está liberalizado, ainda<br />
que haja concorrência, quem desenha a<br />
rede é a própria autoridade, que leva o<br />
transporte onde ele não existe.<br />
Nuno Oliveira está há pouco no mercado,<br />
a trabalhar em segmentos diferente,<br />
dito como de nicho. A sua visão:<br />
“Comecei com a área urbana, e como no<br />
retalho, de onde derivo, este mercado<br />
todos os dias é diferente, daí os preços<br />
diferentes, todos os dias. Fomos os primeiro,<br />
em 2019, a lançar algo diferente<br />
- Cascais-Sintra-Porto. Começámos com<br />
cinco autocarros e o preço dinâmico<br />
atraiu as pessoas. A nível ambiental somos<br />
a solução, o inimigo é o transporte<br />
e-MOBILIDADE 63
EVENTO<br />
Seminário Mobilidade Mais<br />
privado, que coloca 50 mil veículos na<br />
A1 entre Lisboa e o Porto.”<br />
Cavaco Alves, pela Flixbus, da qualidade<br />
do serviço prestado, o preço e a sua<br />
satisfação e pela diferenciação de rotas,<br />
“o grande vencedor tem sido o passageiro,<br />
pelo que o mercado é saudável, com<br />
procura crescente, e grande parte tem<br />
origem no transporte individual.”<br />
PEDRO MOREIRA<br />
O presidente da CP acha<br />
que esta terá um papel muito<br />
relevante na mobilidade em alta<br />
velocidade. “Mas este tem que<br />
ter preço competitivo face aos<br />
outros modos e uma redução<br />
efetiva do tempo de viagem<br />
MAIS MOBILIDADE NA ALTA<br />
VELOCIDADE FERROVIÁRIA<br />
Moderado por Alexandre Portugal<br />
(COBA), a mesa foi ocupada por Alberto<br />
Ribeiro (B-Rail), Acúrcio Santos<br />
(ADFERSIT), David Torres (Alstom),<br />
Miguel Cruz (IP), Paulo Duarte (PFP) e<br />
Pedro Moreira (CP).<br />
O Plano Ferroviário Nacional está aprovado,<br />
há consenso público no investimento<br />
na ferrovia, pelo que as bases estão<br />
lançadas. Face ao novo paradigma,<br />
na necessidade de descarbonização, o<br />
que deve ser feito? A primeiro resposta<br />
foi de Miguel Cruz: “É uma mudança<br />
do nosso sistema de mobilidade e sem<br />
este investimento dificilmente Portugal<br />
alcançará os objetivos da descarbonização<br />
a que se comprometeu.”<br />
“A alta velocidade é um movimento transformador<br />
de um país, estruturante, não<br />
só da economia, mas também para a sociedade.<br />
O avião tem um custo em emissões<br />
de CO 2<br />
dez vezes superior. Quanto<br />
à sustentabilidade, não há comparação.<br />
Mas a alta velocidade tem que ter redes<br />
conectadas até às redes de Metro.”<br />
O presidente da CP acha que esta terá<br />
um papel muito relevante na mobilidade<br />
em alta velocidade. “Mas este<br />
tem que ter preço competitivo face aos<br />
outros modos e uma redução efetiva do<br />
tempo de viagem”, sublinhou.<br />
A Castanho Ribeiro, como operador<br />
privado, foi questionado se teremos<br />
comboios privados a operar em Portugal:<br />
“O cliente é o objetivo final, é preciso<br />
dizê-lo. Mas não temos um plano<br />
de mobilidade em Portugal. O cliente<br />
quer mais que um preço competitivo,<br />
mas como privado ainda não nos deram<br />
direito de acesso. Espanha está mais<br />
à frente, mas em Portugal o Governo<br />
obstaculiza os privados.”<br />
Acúrcio Santos acha que o desafio que<br />
temos pela frente, ter até 2030, um serviço<br />
Lisboa-Porto em 1h15m é, de facto,<br />
estruturante: “Mas é preciso que esse<br />
tempo seja visível. Nos anos 80 pediram-me<br />
para estudar um serviço direto<br />
Lisboa-Porto em 3h e concluímos que<br />
era possível. Foi uma lição. As pessoas<br />
acorreram, mas depois disseram que era<br />
muito tempo. Pediram-nos novo desafio<br />
- 2h15m - e modernização da linha.<br />
Comprámos os Alfa Pendular. Por variadas<br />
razões e inúmeros problemas, sinalização,<br />
passagens de nível, as 300 curvas<br />
do percurso, os pedidos das autarquias.<br />
Chegámos a 2023 e a modernização da<br />
linha não está concluída, nem o Alfa<br />
Pendular realiza o percurso em 2h15m.<br />
Finalmente, este é o desafio. Mas não nos<br />
deixemos envevenar com sub-objetivos.”<br />
Paulo Duarte sintetizou o desejo de<br />
todos os que o antecederam: “É preciso<br />
fazer. Estamos a viver uma janela de<br />
oportunidade absolutamente única.”<br />
64 e-MOBILIDADE
e-MOBILIDADE 65
EVENTO<br />
Seminário Mobilidade Mais<br />
Transporte público<br />
é a espinha dorsal<br />
têm um valor económico enorme, que<br />
desperdiçamos. Perdemos demasiado<br />
tempo para realizar um pequeno trajeto.<br />
Tudo isto tem custos, pelo que, no seu<br />
todo, é insustentável. Também socialmente<br />
é insustentável. Não nos podemos<br />
orgulhar da forma como ocupamos<br />
o espaço urbano, e de como os cidadãos<br />
vivem aprisionados dentro dos seus<br />
carros. Aprisionados é mesmo o termo,<br />
isolados como numa cela. Temos de<br />
construir a liberdade de chegar a horas<br />
e rapidamente onde quer que necessitemos<br />
ir.”<br />
Frederico Francisco manifestou-se<br />
muito animado pelo desenvolvimento<br />
futuro da ferrovia, “pois o domínio do<br />
transporte individual esmaga todos os<br />
outros modos de mobilidade. Foi o<br />
que consentimos nos últimos 50 anos<br />
e Portugal está muito atrasado nesse<br />
caminho.”<br />
Admitiu as culpas do Estado na degradação<br />
do serviço público ferroviário e<br />
destacou dois casos notórios: “Sendo<br />
essencial em todas as escalas metropolitanas,<br />
falta ainda uma boa integração<br />
entre os modos pesado e ligeiro. E<br />
faltam as linhas interiores, ou a linha do<br />
Oeste, que não tenho pejo em dizer que<br />
é um serviço vergonhoso. Estamos a<br />
fazer um investimento grande para podermos<br />
dizer que é um serviço decenda<br />
mobilidade<br />
orge Delgado e Frederico Francisco,<br />
respetivamente secretários<br />
de Estado da Mobilidade Urbana<br />
e das Infraestruturas, abriram e<br />
fecharam o seminário, manifestando-se<br />
ambos férreos adeptos<br />
do modelo de transformação da sociedade<br />
assente nos critérios da sustentabilidade<br />
e da transição energética.<br />
Jorge Delgado escusou-se a enumerar<br />
os factos e os números que impõem<br />
tal mudança, optando por frisar que<br />
“fazemos excessivos movimentos, são<br />
demasiados os veículos individuais e,<br />
destes, é excessivo o número dos que<br />
se fazem mover por fontes poluentes.<br />
Temos, portanto, de agir, e de transformar.”<br />
Em outra passagem da sua<br />
alocução explicou os custos associados<br />
ao atual panorama: “Não só ambientalmente,<br />
como do ponto de vista<br />
económico, pois o tempo perdido nas<br />
deslocações, nos congestionamentos,<br />
Não nos podemos<br />
orgulhar da forma<br />
como ocupamos o<br />
espaço urbano, e de<br />
como os cidadãos<br />
vivem aprisionados<br />
dentro dos seus carros<br />
te.” A terminar, disse à assistência que<br />
“a alta velocidade é incontornável, que<br />
permita fazer aumentar a capacidade e<br />
que contrarie o fraco desempenho que<br />
a ferrovia tem face às linhas aéreas entre<br />
Lisboa e o Porto. Há consenso para investir<br />
na ferrovia e a ordem de grandeza<br />
para tal investimento estimar-se-á em<br />
mil milhões de euros por ano.”<br />
Jorge Delgado acredita que “teremos<br />
melhor mobilidade quando se conseguir<br />
atrair cada vez mais pessoas para<br />
o transporte público. É essa a espinha<br />
dorsal da mobilidade, uma alteração<br />
que não se faz por decreto, obrigando<br />
as pessoas a fazê-lo como nós queremos.<br />
Faz-se através de uma boa oferta,<br />
com boas infraestruturas, com transportes<br />
regulares, pontuais, de qualidade,<br />
com segurança e conforto e com preços<br />
acessíveis.”<br />
Há consenso para investir<br />
na ferrovia e a ordem<br />
de grandeza para tal<br />
investimento estimar-se-á<br />
em mil milhões de euros<br />
por ano<br />
66 e-MOBILIDADE
Preparados para um futuro<br />
multitecnológico e sustentável<br />
FOR A<br />
BETTER<br />
LIFE<br />
Descubra<br />
o mundo<br />
e-MOBILIDADE 67<br />
da Irizar