Culpa e graça – Paul Tournier – Cap
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mesmo quando os pais evitam comentários deste tipo, as crianças, ainda<br />
assim, atribuem a eles esta ideia e sentem que só serão amadas sob a<br />
condição de serem boazinhas.<br />
O homem, em todas as épocas, projetou em Deus precisamente esta ideia.<br />
Imagina que Deus vai amá-lo somente se for bom e que irá recusar o seu<br />
amor se for culpado. O medo de perder o amor de Deus <strong>–</strong> esta é a essência<br />
do problema da humanidade e da psicologia. Mesmo aquele que não<br />
acredita em Deus teme perder o Seu amor. Foi exatamente dessa falsa ideia<br />
de Deus, tão difundida ainda hoje pelo Seu povo, que Jesus veio nos<br />
libertar. Jesus nos mostra que Deus nos ama incondicionalmente. Nos ama,<br />
não pela nossa espiritualidade ou pelas nossas virtudes, mas sim pela nossa<br />
miséria e nossa culpa.<br />
Apesar disso, quantos permanecem sobrecarregados e oprimidos na própria<br />
igreja cristã: “Que solidão”, escreve <strong>Paul</strong> Ricoeur (33), “ou melhor, que<br />
castelo de Kafka torna-se a vida do cristão que perde a noção do perdão e<br />
mantém a noção do pecado”. Nenhum psicólogo irá contradizer estas<br />
palavras do filósofo. Ah! Precisamos admitir, com toda franqueza, que é<br />
esta situação em que a maioria dos cristãos parece estar hoje em dia.<br />
E na sua mente, leitor, lendo estas palavras não surgem reservas? Você<br />
aceita sem qualquer reserva esta afirmação do amor incondicional de Deus<br />
e de Seu perdão incondicional? Será que o arrependimento não é uma<br />
condição?<br />
Não me parece que nas palavras de Jesus Cristo o arrependimento tenha a<br />
força de condição, mas sim de um caminho. Jesus me parece ser um<br />
observador penetrante e realístico do homem, descrevendo as coisas<br />
conforme vão acontecendo. Certamente, na parábola do Filho Pródigo, o<br />
que aconteceu foi que o filho se arrependeu e, como consequência do seu<br />
arrependimento, voltou para casa; descobriu então que seu pai já o havia<br />
perdoado antecipadamente e sem qualquer condição. Aí está a diferença! O<br />
pai não fez do arrependimento do filho uma condição para o seu amor. Ele<br />
não disse que o havia perdoado porque a condição do perdão havia sido<br />
satisfeita, que tinha merecido o perdão por causa do arrependimento. O<br />
perdão brota espontaneamente do coração do pai porque nunca deixou de<br />
estar lá.<br />
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