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Culpa e graça – Paul Tournier – Cap

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Em um dos círculos intelectuais católicos, um teólogo, Jean Guitton, afirma<br />

que “uma das implicações da doutrina cristã da <strong>graça</strong> é a natureza gratuita<br />

dos dons que são oferecidos a nós”. Fico agradavelmente surpreso ao vê-lo<br />

acrescentar que “esta é uma implicação sobre a qual os protestantes<br />

pensam, talvez com mais frequência do que nós”. Infelizmente, tenho a<br />

impressão que esta homenagem ao protestantismo seja imprecisa. Hoje, na<br />

verdade, esta não é mais uma questão confessional, mas sim psicológica.<br />

No coração de todas as igrejas existem homens de mentalidade normalista<br />

que querem impor aos outros as condições para a salvação e há outros que<br />

vivem alegremente com a maravilhosa certeza da salvação gratuita.<br />

Esta é uma questão psicológica que diz respeito a uma tendência inerente à<br />

mente humana, um mecanismo para encobrir a culpa, tal como descrevi,<br />

que faz a extinção de seus méritos, virtude, abstinências, visando a auto<br />

justificação e as mostra avidamente para os outros como a condição para<br />

alcançar a <strong>graça</strong>.<br />

Tenho uma paciente que me visita semanalmente há alguns anos. Ao<br />

cumprimentá-la na entrada do consultório eu disse, de maneira brincalhona:<br />

“Aqui está você em sua pequena peregrinação a Genebra. Seu prêmio<br />

semanal.” Ela respondeu imediatamente: “Um prêmio que não mereci”.<br />

“Mas não merecemos nada neste mundo”, repliquei. É precisamente isto<br />

que nos deixa perplexos <strong>–</strong> que Deus nos concede bênçãos que não<br />

merecemos. E se as merecêssemos, onde estaria nossa alegria, nossa<br />

felicidade?<br />

Minha paciente continua sua reflexão: “Em última análise”, me diz ela após<br />

um momento, “isto fere nosso amor próprio <strong>–</strong> o fato de recebermos o que<br />

não merecemos. É por isto que temos dificuldade de aceitar. Preferiríamos<br />

ter merecido. Nós disputamos com Deus pelo mérito”. Sim, não podemos<br />

esconder de nós mesmos que esta extraordinária afirmação da salvação<br />

gratuita encontra fortes resistências dentro de cada um de nós. É paradoxal<br />

porque a desejamos com todo nosso coração <strong>–</strong> Deus a oferece a nós <strong>–</strong> e<br />

somos relutantes em aceitá-la! Até mesmo com os crentes, que a<br />

proclamam em seus hinos, liturgias e missas, há íntimos protestos, mais ou<br />

menos inconscientes, mais ou menos declarados. Porque esta afirmação<br />

ofende nossa concepção lógica de justiça.<br />

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