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MARCUS, o imortal<br />
- Sim. A Lua é minha referência para hoje. A lua dos sabás, a lua satélite, a lua das<br />
esferas celestes, a lua das gran<strong>de</strong>s noites... De forma s<strong>em</strong>elhante, a Lua parece crescer,<br />
diminuir e <strong>de</strong>saparecer. Ora, como o luar é um reflexo lunar da luz do Sol, a Lua não<br />
cresce n<strong>em</strong> diminui; perceb<strong>em</strong>os o reflexo da Lua <strong>em</strong> diversas fases. Quero usar essa<br />
analogia que me parece boa... a alma eterna não nasce, n<strong>em</strong> morre... o corpo material é<br />
certamente uma manifestação efêmera e fantasmagórica da potência externa do Senhor.<br />
- O que é agora... um encontro filosófico se transforma <strong>em</strong> encontro <strong>de</strong> ocultistas... –<br />
disse o monge.<br />
- É mais um dos t<strong>em</strong>as que tratar<strong>em</strong>os nesse encontro.<br />
Vi que ao lado do monge <strong>de</strong> Cister outros pensadores e professores, clérigos ou<br />
não, se agruparam , como uma reação contra o t<strong>em</strong>a obscuro. Parece que tomavam seus<br />
lados para um possível <strong>em</strong>bate terrível.<br />
- A questão da Lua... a questão do hom<strong>em</strong>... os sabás... a alquimia... são caminhos <strong>de</strong><br />
estudos que uma parte gran<strong>de</strong> <strong>de</strong> nós todos estamos seguindo, se não para usar, pelo<br />
menos para conhecer e po<strong>de</strong>r refletir sobre a matéria, já que povos inúmeros <strong>de</strong> todos os<br />
t<strong>em</strong>pos são <strong>de</strong>positários <strong>de</strong> saberes e ciências similares... Não é por que critico<br />
averroístas e árabes que não vou buscar saber sobre eles. Saber para <strong>de</strong>bater e<br />
argumentar... – falou Tomás.<br />
- Contra inimigos <strong>de</strong> Deus e dos homens...<br />
- Também não me interessam valores preconcebidos... não acredito que o monge <strong>de</strong><br />
Cister venha ao nosso encontro para se vestir <strong>de</strong> uma mente fechada... - replicou Tomás<br />
com certa tranqüilida<strong>de</strong>...<br />
- Sendo a alquimia uma obra do d<strong>em</strong>ônio, ou ao menos um <strong>de</strong>preciável sonho, um gênio,<br />
um doutor, um mestre como Tomás não lhe po<strong>de</strong> dar crédito – disse Vermont, enfiando<br />
as mãos para <strong>de</strong>ntro da bata.<br />
- Tal é, <strong>em</strong> efeito, o fundo pueril e especial das argumentação que vimos recebendo<br />
nesse campo: <strong>em</strong> rigor, eu digo, não se po<strong>de</strong> contestar nada a um autor que quer<br />
d<strong>em</strong>onstrar na mesma obra que n<strong>em</strong> Zoroastro, n<strong>em</strong> Pitágoras, n<strong>em</strong> Plotino, n<strong>em</strong><br />
Porfírio, n<strong>em</strong> Jâmblico, n<strong>em</strong> Jerônimo Cardan, n<strong>em</strong> Geber, n<strong>em</strong> Arnaldo <strong>de</strong> Vilanova,<br />
n<strong>em</strong> o nosso excelso e forte amigo Roger Bacon aqui presente, muito menos Tritêmio,<br />
n<strong>em</strong> se quer... os Reis Magos... nunca haviam sido iniciados <strong>em</strong> qualquer aspecto da<br />
Magia. E o senhor monge <strong>de</strong> Cister, Vermont e estudiosos quer<strong>em</strong> afirmar que tais<br />
homens não serviram para nada, ao longo das nossas histórias e da história do mundo?<br />
- Há um texto <strong>em</strong> que trabalho agora – dizia Tomás - on<strong>de</strong> combato formalmente a<br />
possibilida<strong>de</strong> da transmutação metálica. Mas <strong>de</strong>ixo claro e <strong>em</strong> aberto que aceito discutir<br />
essa possibilida<strong>de</strong>. Aceito a transmutação, <strong>em</strong> si... o fenômeno <strong>em</strong> si... ou não po<strong>de</strong>ria<br />
aceitar a carne no pão, n<strong>em</strong> o sangue no vinho... Tanto que comento a possibilida<strong>de</strong> da<br />
feitura <strong>de</strong> ouro, não como a maioria dos alquimistas aceita, por ação do fogo, mas<br />
acredito, por ação do calor do Sol e nesse caso, não digo do calor do Sol do céu, mas do<br />
enxofre – o Sol na Terra. Não há uma simples transmutação... como se propaga<br />
popularmente... mas há uma complexa transmutação. E é necessária muita paciência<br />
para se chegar ao intento.<br />
- Muita coisa não se <strong>de</strong>ve esquecer – falei – como, por ex<strong>em</strong>plo, um ponto incontestado<br />
e incontestável que é o fato <strong>de</strong> Tomás <strong>de</strong> Aquino ser o mais ilustre discípulo <strong>de</strong> Alberto<br />
Magno. Seria muito difícil e paradoxal querer eximir ao Gran<strong>de</strong> Alberto <strong>de</strong> haver<br />
praticado a Magia e a Alquimia, e seria mais incrível ainda preten<strong>de</strong>r que um mestre do<br />
gabarito <strong>de</strong> Alberto, respeitado por todos, que dá uma importância tão gran<strong>de</strong> à ciência<br />
do mistério, não tivesse ensinado a seu discípulo ao menos umas noções <strong>de</strong>sta mesma<br />
ciência.<br />
- Mas, senhores, - falou Tomás – qual é o verda<strong>de</strong>iro papel da alquimia na nossa época?<br />
Em geral se acredita que é objeto <strong>de</strong> horror, <strong>de</strong> anát<strong>em</strong>a e <strong>de</strong> maldição, <strong>em</strong> mesmo nível<br />
dos malefícios, dos envenenamentos e dos homicídios – Tomás <strong>de</strong> Aquino olhava a todos<br />
com ar professoral e manifestações corporais intensas. Nesse momento a porta se abriu<br />
e Pietro <strong>de</strong> Ferrara entrou, s<strong>em</strong> interromper, vindo para meu lado, dizendo que<br />
Alexandrino estava pior. Tinha <strong>de</strong>lírios e sonambulismos, mas assentou-se para escutar e<br />
fazer o seu papel <strong>de</strong> escriba. Tomás continuava - Nada menos – ele dizia - nada menos<br />
exato. O Tratado da Pedra Filosofal, como cita o comentarista Boaventura Des Periers é<br />
quase um artigo <strong>de</strong> fé <strong>em</strong> nossa era. Somos cont<strong>em</strong>porâneos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s torpezas e<br />
gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>scobertas, senhores.<br />
Coelho De Moraes 53