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Baixe em PDF - Página de Ideias

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MARCUS, o imortal<br />

ter <strong>de</strong> me separar da família que a própria vida passou a ser mera dor para mim. Viu<br />

seus pobres filhos presos na re<strong>de</strong> e à beira da morte.<br />

Vendo-os a lutar pateticamente para se libertar, sua mente <strong>de</strong>sorientou-se e, ao<br />

observá-los <strong>em</strong> <strong>de</strong>sespero, ele próprio caiu na re<strong>de</strong> do caçador. O caçador, tendo assim<br />

capturado o pombo, a pomba e a ninhada, satisfez seu <strong>de</strong>sejo e partiu para sua casa.<br />

Ante nosso olhar atento o avadhuta concluiu: - As portas da liberação estão<br />

inteiramente abertas para qu<strong>em</strong> alcançou a vida humana. Apesar <strong>de</strong> tal oportunida<strong>de</strong>, se<br />

um ser humano simplesmente consagra seu t<strong>em</strong>po à vida familiar, ou a vida entre<br />

amigos, ou a vida <strong>em</strong> grupos e socieda<strong>de</strong>s, como a tola ave <strong>de</strong>sta história, então ele<br />

<strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rado como alguém que sobe até um lugar b<strong>em</strong> alto apenas para<br />

tropeçar e cair. Tal é a história <strong>de</strong> seu amigo. Tal me parece a história <strong>de</strong> vocês, se não<br />

tomar<strong>em</strong> atenção e se advertir<strong>em</strong> dos perigos a que estão expostos.<br />

Eu e Pietro <strong>de</strong> Ferrara olhamos um para o outro.<br />

É inevitável que o ser vivo experimente misérias s<strong>em</strong> as ter <strong>de</strong>sejado, pensei.<br />

Tanto o avadhuta quanto Alexandrino po<strong>de</strong>riam passar por momentos <strong>de</strong>sse tipo...<br />

momentos <strong>de</strong> duração muito variável... N<strong>em</strong> se po<strong>de</strong> provar que o avadhuta não<br />

estivesse se escon<strong>de</strong>ndo por <strong>de</strong> trás daquela teoria toda, retirando <strong>de</strong> si as<br />

responsabilida<strong>de</strong>s da solidarieda<strong>de</strong> como Pietro já dissera. Do mesmo modo, eles<br />

po<strong>de</strong>rão experimentar felicida<strong>de</strong> mesmo que a não busque. Caindo, por assim dizer, do<br />

céu, sobre suas cabeças absortas. Assim, uma pessoa <strong>de</strong> discriminação inteligente não<br />

faz esforço algum para obter a felicida<strong>de</strong> material. Tolos pod<strong>em</strong> ir para o céu. Padres<br />

pod<strong>em</strong> ir para o céu... seja lá o que isso signifique.<br />

Na caminhada <strong>de</strong> volta, provavelmente uma píton fugira do acampamento on<strong>de</strong><br />

o hindu avadhuta se encontrava, nas cavernas, por assim dizer. E ela estava à nossa<br />

frente. A esperança é que tal cobra tenha sido alimentada periodicamente e esteja no<br />

seu processo <strong>de</strong> domesticação.<br />

- Se observarmos o que o avadhuta falou talvez <strong>de</strong>vêss<strong>em</strong>os seguir os esforços <strong>de</strong>ssa<br />

cobra e abandonar os esforços materiais e aceitarmos nos manter com o alimento que a<br />

providência proporcione, quer este alimento seja <strong>de</strong>licioso ou insípido, quer muito, quer<br />

pouco...<br />

- Quer sejam professores <strong>de</strong> filosofia perdidos na floresta ou representantes <strong>de</strong> qualquer<br />

seita oculta... – falei mais por brinca<strong>de</strong>ira.<br />

- É – Pietro se resumiu a <strong>em</strong>itir, mas continuou, olhando para a píton - Se <strong>em</strong> dado<br />

momento não conseguirmos saber mais sobre Alexandrino, resta que nos mantenhamos<br />

<strong>em</strong> termos pacíficos, com muita paciência. Pacíficos e materialmente inativos, mantendo<br />

o corpo material s<strong>em</strong> fazer muito esforço, <strong>em</strong> compasso <strong>de</strong> espera, enfim, foi ele qu<strong>em</strong><br />

saiu <strong>de</strong> on<strong>de</strong> estava....<br />

- E se foi carregado contra a própria vonta<strong>de</strong>? – perguntei.<br />

- Olha a píton escorregando pela pedra, <strong>em</strong> movimento movediço e lento. Mesmo que<br />

goze <strong>de</strong> plenas forças, não <strong>de</strong>v<strong>em</strong>os ativar nossa ansieda<strong>de</strong> e angústia, mas <strong>de</strong>v<strong>em</strong>os<br />

permanecer s<strong>em</strong>pre atentos aos verda<strong>de</strong>iros interesses da pessoa. Talvez Alexandrino<br />

estivesse farto <strong>de</strong> nós e da comunida<strong>de</strong>...<br />

- Talvez ele estivesse s<strong>em</strong> po<strong>de</strong>res para <strong>de</strong>cidir... Já que o havíamos <strong>de</strong>ixado doente.<br />

- Concordo – Pietro disse – Esper<strong>em</strong>os então que o Senhor o esteja protegendo sob<br />

todos os aspectos. O ex<strong>em</strong>plo da píton é dado para que aprendamos a não <strong>de</strong>sperdiçar<br />

nosso t<strong>em</strong>po inutilmente.<br />

- Contudo – eu falei, enquanto tomávamos a estrada novamente, já que a cobra saiu <strong>de</strong><br />

nossa frente, <strong>em</strong>brenhando-se na mata - não <strong>de</strong>v<strong>em</strong>os enten<strong>de</strong>r erroneamente que o<br />

objetivo da vida é ficar <strong>de</strong>itado no chão como a píton, ou fazer um espetáculo <strong>de</strong><br />

autoflagelação. A mera renúncia é uma fase imatura <strong>de</strong> compreensão espiritual, por isso<br />

não acredito que o avadhuta vá muito longe com sua teoria, principalmente quando<br />

perceber que a cobra sumiu e ele não t<strong>em</strong> mais espetáculo para fazer no burgo... pelo<br />

menos não com ela.<br />

- Certo. Assim, o ex<strong>em</strong>plo da píton não <strong>de</strong>ve nos estimular a nos tornarmos totalmente<br />

inativos, mas sim a nos tornarmos ativos espiritualmente, e consequent<strong>em</strong>ente inativos<br />

no que diz respeito ao gozo material dos sentidos.<br />

- Apenas para po<strong>de</strong>rmos, naquele momento, pensarmos melhor e tomar a melhor<br />

atitu<strong>de</strong>. Nada mais do que isso – completei.<br />

Coelho De Moraes 56

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