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MARCUS, o imortal<br />
e do quente, nada mais do que isso – ele me falou enquanto se limpava do óleo <strong>em</strong><br />
excesso.<br />
Um sinal <strong>de</strong> badalo ecoou pelos aposentos e eu estava atônito.<br />
- Vamos. Pega a túnica.<br />
O farto aroma <strong>de</strong> café se esparramava pela nave. Todos bebiam o líquido escuro,<br />
b<strong>em</strong> quente, distribuído à gran<strong>de</strong> por torneiras douradas que saiam das pare<strong>de</strong>s<br />
marmóreas. Por efeito do líquido muitos gritavam e batiam contra o peito. Muita gente<br />
não tinha estofo para beber aquele elixir <strong>de</strong> potência e vigor.<br />
- Durante as s<strong>em</strong>anas que anteced<strong>em</strong> o drama no t<strong>em</strong>plo – Lesahor explicava - era<br />
comum a venda <strong>de</strong> café pelas irmãs-sacerdotisas, às portas da cida<strong>de</strong>. As crianças não<br />
saiam às ruas, pois se tratava da preparação para a s<strong>em</strong>ana da fertilida<strong>de</strong>... a tônica da<br />
nossa cultura. O espírito brota espontâneo como ele realmente é. N<strong>em</strong> todos gostam<br />
disso.<br />
No entanto, um leve amargor me tomou. Um sintoma diferente e novo me<br />
atingia. Meu coração batia como se se precipitasse para explodir.<br />
Enquanto cantavam hinos eu corri dali e cheguei numa espécie <strong>de</strong> sala para<br />
receber água <strong>de</strong> chuvas, uma sala que se abria para os aposentos das mulheres. N<strong>em</strong><br />
sei o que é que faria, ainda, mas a hora chegava. Os corredores eram sinuosos e as<br />
tochas <strong>de</strong> pouco valiam. De sala <strong>em</strong> sala eu tentava vê-las. Em uma sala os<br />
<strong>em</strong>brutecidos pelo tabaco se pegavam <strong>em</strong> tapas no rosto. Noutra sala os idosos se<br />
banhavam <strong>em</strong> rapé – na verda<strong>de</strong> uma mistura <strong>de</strong> ópio e gergelim, – in<strong>de</strong>fesos <strong>em</strong><br />
relação ao ridículo. Mais além, barris <strong>de</strong> vinho e raparigas conturbavam o ambiente com<br />
gritos e danças. Alguns padres vinham se <strong>de</strong>liciar entre coxas jovens, pagas a preço <strong>de</strong><br />
turmalinas.<br />
De repente, eu me vi <strong>em</strong> uma sala abobadada e, ao entrar, estava ao lado <strong>de</strong><br />
Virgínia que achou tudo aquilo muito estranho, mas sorriu.<br />
- Você per<strong>de</strong>u alguma coisa? Encontrou-se com os outros dois? Ou per<strong>de</strong>u a si mesmo,<br />
que é o mais comum? – e riu com as outras.<br />
- Não quero per<strong>de</strong>r você. Vamos <strong>em</strong>bora daqui.<br />
- O que foi? Está diferente. Nunca vi essa dobra <strong>em</strong> sua testa. Você exagerou no café?<br />
Está mais sóbrio.<br />
- Meu discernimento está mais amplo. Mas não quero per<strong>de</strong>r você. A história vai mudar<br />
seus caminhos.<br />
- Tolice, meu querido. Tolice. Estamos prestes a aumentar, a ampliar a consciência local<br />
com a exposição do nosso drama.<br />
- Esqueça isso.<br />
- N<strong>em</strong> me fale uma coisa <strong>de</strong>ssas... é algum enigma?.<br />
- Não há enigmas!! O que há é a prática!! Tudo mentira! – as mulheres que nos<br />
escutavam começaram a rir outra vez, mas eu continuei a puxar Virgínia. Tentei tomar da<br />
sua mão para sairmos, trazendo-a para fora do t<strong>em</strong>plo. Ela não queria. Fez força<br />
contrária e escapuliu com certa violência.<br />
- Ouça como a turba urra, – Virgínia falava tranqüilamente. - Eles nos esperam – o<br />
badalo soou novamente e a gritaria ficou maior. Eu suava. Faltava-me a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
argumentar a<strong>de</strong>quadamente. As mulheres retiravam suas roupas e passavam para outro<br />
aposento, <strong>em</strong> direção à nave central do t<strong>em</strong>plo.<br />
- V<strong>em</strong> comigo, Virgínia, fica comigo somente. A coisa vai esquentar por aqui. – Mas, ela<br />
se limitou a passar o dorso da mão entre as suas próprias pernas e levantar, na minha<br />
direção, <strong>de</strong>dos molhados, quase os esfregando no meu rosto<br />
- Vai esquentar mesmo. Egoísta. Não vê que somos belas damas, hoje representando<br />
meretrizes sagradas?... a mais subida honra! e você quer que eu vá com você. Ficar<br />
somente com você?<br />
- Sim. Mas não é só isso.<br />
- Louco! Lá estar<strong>em</strong>os <strong>em</strong>bebidas <strong>em</strong> café Árabe... o líquido morno das bacias douradas<br />
nos banhando, – Virgínia <strong>de</strong>scalçou as sandálias – discursar<strong>em</strong>os sobre o Serralho, o<br />
penteado à sultana que levamos para ser <strong>de</strong>sfeito nas orgias – ela, negligent<strong>em</strong>ente,<br />
<strong>de</strong>ixou cair uma das alças, que escorregou sobre o ombro. – Qu<strong>em</strong> sabe não falar<strong>em</strong>os<br />
sobre as Mil e Uma Noites? Nós, as huris mo<strong>de</strong>rnas, que dar<strong>em</strong>os seios fartos aos nossos<br />
irmãos sacerdotes e <strong>de</strong>pois nos fartar<strong>em</strong>os com a platéia enlouquecida. Você está é<br />
muito louco!!<br />
Coelho De Moraes 79