BAR EM BAR: ATÉ O DIA 18, UM FESTIVAL DE ... - Roteiro Brasília
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Hitchcock criou seus próprios recursos<br />
visuais, numa época sem os truques<br />
eletrônicos hoje banalizados pela tecnologia<br />
digital nos computadores. A vertigem<br />
do personagem de James Stewart<br />
permite mostrar alguns desses truques<br />
com a tecnologia de 1958, mas com uma<br />
criatividade sem data.<br />
A votação da Sight&Sound recolheu<br />
opiniões de críticos, curadores, programadores,<br />
exibidores e outros especialistas<br />
em cinema pelo mundo, além de cineastas<br />
como Martin Scorcese, Woody<br />
Allen, Quentin Tarantino, Francis Ford<br />
Coppola e Guillermo del Toro. Segundo<br />
o editor da revista, Um corpo que cai é um<br />
filme que cresce à medida que o revemos.<br />
O curador da retrospectiva no BFI,<br />
Robin Baker, complementou essa observação<br />
em entrevista que nos deu em Londres:<br />
“O fato de um filme feito há bem<br />
mais de 50 anos ainda ser considerado o<br />
melhor de todas as épocas comprova que<br />
o julgamento crítico não precisa se dar necessariamente<br />
no momento de produção<br />
ou lançamento da obra. É importante ver<br />
como ela passa à posteridade. E é esse o<br />
caso da premiação de Um corpo que cai”.<br />
Na época, esse filme não foi necessariamente<br />
aclamado por todos. “Não é<br />
um filme confortável ou fácil de ver”, explicou<br />
Baker. “Tem várias camadas. É o<br />
tipo de filme que me surpreende sempre<br />
que o revejo. Há momentos em que fico<br />
impressionado, chocado, pelas mudanças<br />
no tom do filme, por ver James<br />
Stewart agindo de maneira tão horrível.<br />
Estaria tendo um colapso nervoso? Por<br />
que age daquela maneira?” Ele se diz surpreso<br />
com a mágica e o brilhantismo de<br />
Hitchcock ao construir uma narrativa,<br />
com o que faz com a câmera. “É tudo<br />
muito rico. É o tipo de filme sobre o<br />
qual podemos falar sem parar, escrever<br />
sem parar. E, para mim, é esse desejo de<br />
vê-lo de novo e de novo”.<br />
Por certo, a vitória de Hitchcock com<br />
o melhor filme de todos os tempos não<br />
tem a unanimidade dos 846 especialistas<br />
que responderam à consulta da<br />
Sigh&Sound, nem terá concordância geral<br />
do público ou de outros cinéfilos. Compor<br />
uma lista dos melhores filmes exige<br />
considerar a importância histórica da<br />
obra, seu impacto a longo prazo, a capacidade<br />
de resistir a uma segunda, terceira,<br />
décima sessão repetida. Quem não<br />
concorda com a escolha pode esbravejar<br />
Divulgação<br />
e até chamar de imbecis os eleitores da<br />
revista. Esse tipo de indignação revela a<br />
paixão que o cinema desperta. No mínimo,<br />
gera calorosa discussão em bar.<br />
Nem mesmo os aficionados de Hitch-<br />
cock concordam na escolha do que seria<br />
seu melhor filme. Muitos preferem, por<br />
exemplo, Psicose, obra marcante na capacidade<br />
de espantar o espectador. Inclui uma<br />
das cenas mais reverenciadas na história do<br />
cinema: o esfaqueamento de Janet Leigh no<br />
chuveiro, com maestria na edição dos vários<br />
cortes (97), nos closes reveladores. Nos<br />
iludimos a ponto de perceber o vermelho<br />
do sangue num filme preto e branco. Sem<br />
esquecer do uso dramático da trilha sonora<br />
de Bernard Hermann.<br />
Outros preferem como melhor filme<br />
Os pássaros, que nos surpreende com o<br />
mistério das aves que atacam humanos<br />
sem motivo aparente, com alvo especial<br />
numa das habituais louras frias de Hitch-<br />
cock. No caso, a loura se encarna em Tippi<br />
Hedren, de visita a uma pequena cidade<br />
de beira-mar para resolver uma pendência<br />
antiga. Seria uma metáfora de explosão<br />
sexual contida, que a mulher de<br />
aparência impecável traz e a história insi-<br />
nua? Hitchcock não explica. Não pretende<br />
explicar. Deixa obscuro e não resolvido<br />
de propósito, para que o espectador perplexo<br />
preencha o conteúdo. Ou passe o<br />
resto da vida com medo de pássaros...<br />
Há quem prefira Janela Indiscreta, com<br />
um James Stewart de perna engessada convencido<br />
de que ocorreu um homicídio no<br />
prédio em frente, que ele observa de binóculos.<br />
Difícil convencer os outros, inclusive<br />
sua própria namorada, Grace Kelly em fase<br />
de beleza inigualável, em 1954, fazendo outra<br />
loura hitchcockiana.<br />
Quando o assunto é cinema, cada<br />
um tem sua escolha pessoal, muitas vezes<br />
inspirada pelo que a obra representou na<br />
vida pessoal ou na primeira vez que viu o<br />
filme, em companhia de quem, com que<br />
idade, visto no cinema escuro ou no vídeo<br />
em casa.<br />
Além da votação ampla, que gerou a<br />
vitória de Um corpo que cai, a revista promoveu<br />
também uma votação mais restrita,<br />
só entre 358 diretores, escolhidos em vários<br />
países para evitar um predomínio anglo-americano.<br />
Nessa lista extra, só de diretores,<br />
o filme de Hitchcock ficou apenas<br />
no oitavo lugar.<br />
os dez mais<br />
1. Vertigem ou Um corpo que cai, de alfredo Hitchcock (1958)<br />
2. Cidadão Kane, de orson Welles (1941)<br />
3. Era uma vez em Tóquio, de Yasugiro ozu (1953)<br />
4. A regra do jogo, de Jean Renoir (1939)<br />
5. Aurora, de F.W. Murnau (1927)<br />
6. 2001: Uma odisséia no espaço, de Stanley Kubrick (1968)<br />
7. Rastros de ódio, de John Ford (1956)<br />
8. Um homem com uma câmera, de Dziga Vertov (1929)<br />
9. The passion of Joan of Arc, de carl Dreyer (1927)<br />
10. 8 ½, de Federico Fellini (1963)<br />
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