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— Que horas são?<br />
www.nead.unama.br<br />
Alguém respondeu baixinho, entanto a resposta soou forte no silêncio, como<br />
pancada em lâmina metálica: “Sete!”<br />
Ia-se a tarde em desmaio melancólico, já agasalhada em sombras.<br />
Por que teria ele feito tal pergunta? Que teria visto? Os prenúncios, talvez,<br />
da noite primitiva, a noite que se fecha para o sempre, noite vazia, silente, sem<br />
astros, sepultura da luz.<br />
O coração retransiu-se-me apertando, o fôlego sustou-se-me na garganta e<br />
meus olhos, como atraídos, voltaram-se para o oratório buscando a cruz de bronze,<br />
relíquia de Jerusalém, sacrossanto sinete que tem selado para a Eternidade todos<br />
os mortos da minha família.<br />
E as lágrimas borbulharam-me no coração, senti-as subirem-me aos olhos, a<br />
jorros violentos, e tive forças para contê-las.<br />
Súbito o silêncio estalou em pranto como um vaso hermeticamente fechado<br />
que se fizesse pedaços derramando todo o líquido contido.<br />
Tombei de joelhos junto do leito agarrando-me desesperadamente ao corpo<br />
que se imobilizava.<br />
Tudo cessara e o olhar, que ele ainda mantinha fito em nós, extático, não<br />
tinha luz: era como o morrão que fica ardendo nos círios e que, pouco a pouco,<br />
envolto em fumo, vai-se extinguindo, até de todo se apagar.<br />
Alguém chamou por ele, em pranto.<br />
Ai! De nós...<br />
Às pedras deu-lhes Deus o eco para responderem a quem lhes brada e ao<br />
que morre tudo se vai, não fica, sequer, um pouco de som para a suprema palavra<br />
de um adeus.<br />
É um caixão que se fecha. Nada mais.<br />
CONSUMMATUM...<br />
Onde estaria eu quando o desceram para a minha sala de trabalho?<br />
Onde estaria eu que não dei pelo trânsito cruciante?<br />
Quando entrei no quarto e vi a cama deserta foi tal o alvoroço no meu<br />
coração que estaquei suspenso, entendo um grito. Seria possível!? Olhei em volta...<br />
Mas toda aquela desordem — velas ainda acesas, o silêncio, o lúgubre vazio...<br />
Se o corpo sai com vida deixa um misterioso sinal de si: o ausente afigurase-nos<br />
presente; o morto, não!<br />
A morte arrasta tudo consigo e ali nada mais havia, mais nada senão um<br />
sulco revolto como o que fica nas águas à passagem de um barco — fundo, mas de<br />
breve duração; agitado, mas só em efêmeras espumas.<br />
Onde estaria eu quando o desceram?<br />
E foi diante daquele vazio que senti toda a grandeza do meu amor. É pelo<br />
diâmetro e profundidade da cova que se pode avaliar a extensão das raízes da<br />
árvore derrubada.<br />
Onde estaria eu quando o desceram? Afastaram-me, decerto, para<br />
transportá-lo. Foi melhor assim.<br />
Não há hora mais triste que a do ocaso, hora do descer da luz. A noite é o<br />
irremediável, com a consolação das estrelas, que são lágrimas.<br />
Fizeram bem em poupar-me à cena triste do descimento do corpo frio. Foi<br />
como se me adormecessem para uma operação dolorosa.<br />
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