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Mano - Unama

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www.nead.unama.br<br />

Dolorida, ainda que tudo se lhe balde, revoa em volta da árvore em que teve o<br />

pouso e a prole, até que, de todo desanimada, abala, fugindo ao sítio da desventura.<br />

Longe, porém, em verdes silvas, cantando aqui, ali palhiço e folhas, tece<br />

outro ninho, reinstala-se em tépido aconchego e dorme até que rompe a madrugada,<br />

e ei-la desperta, pronta para voar de novo, cantar ao sol, feliz.<br />

Teu nome!<br />

Anda de boca em boca como, de ramo em ramo, voa e revoa a ave<br />

desditosa. Ouço, a todo o instante, o doce nome ao qual dantes respondias. Mas o<br />

ninho em que ele vivia foi-se levado pela tempestade, caiu da árvore do amor,<br />

desfez-se em pó no chão.<br />

Debalde soas, pobre nome! Não és mais que som. Andas nas falas, voas<br />

nos suspiros, sinto-te nas lágrimas.<br />

Isso, porém, que monta se não assentas, porque o corpo, que era o teu<br />

pousadouro, desapareceu para sempre.<br />

O desespero da ave cessa desde que ela refaz o ninho em outro sítio. Teu<br />

nome, esse... ai! De nós! Nunca mais se firmará na vida, andará de boca em boca,<br />

de lembrança em lembrança em nossa saudade, como a ave, de ramo em ramo, nas<br />

árvores da floresta, mas sem poder fazer de novo o ninho, reinstalar-se e<br />

adormecer, para sair com a luz da manhã, reentrar na vida alegremente, ao sol.<br />

Pobre nome! E é tudo que resta do que se foi na tormenta.<br />

CONSOLAÇÃO<br />

Já entrando no gabinete, detive-me, porém, à porta, comovido com aquele<br />

culto suave vendo-a escolher no ramo que, todas as manhã, lhe é levado pelo<br />

florista, as mais belas rosas, de preferência os botões com que ornamenta o retrato<br />

do filho amado, posto entre o grande tinteiro de bronze e a caixa dos cigarros.<br />

Deixei-me estar quieto como se assistisse a uma cerimônia religiosa. E outra<br />

coisa não era aquele ofício de saudade, diante da mesa que fora o altar em que ele<br />

estivera exposto toda uma noite, entre as colunas flamejantes dos ciriais, com um<br />

crucifixo sobre o peito, e cercado de flores.<br />

Com que enlevo ela colocava uma a uma no vaso, as rosas escolhidas!<br />

Inclinava a cabeça para contemplá-las, a ver se estavam bem. Endireitava<br />

uma, chegava outra mais ao centro, punha os botões às bordas para que<br />

desabrochassem livremente, sem empeço.<br />

Por fim, tomou o retrato delicadamente, a mãos ambas, chegou-o aos lábios e<br />

reteve-o, muito tempo num beijo. Depô-lo no lugar próprio e pôs-se a falar baixinho.<br />

De repente, em ímpeto de desespero, ajoelhando-se, com os braços<br />

estendidos sobre a mesa, de mãos postas, suplicava... O que? E, por entre lágrimas,<br />

agitada por soluços, a voz saía-lhe humilde, entrecortada e aflita.<br />

Que diria a pobre mãe naquela ascese dolorosa?<br />

Adiantei-me pé ante pé. O alto tapete abafava-me o rumor dos passos e<br />

assim, sem ser sentido, pude chegar até junto dela, e ouvi-la.<br />

Rezava. A Deus? Não, ao espírito do filho. Rezava diante da imagem da sua<br />

grande, infinita saudade, pedindo-lhe o milagre da sua presença, um aceno, que<br />

fosse, do Além, para consolo da sua alma vazia.<br />

Senti com ela, e, docemente, para não assustá-la, chamei-a.<br />

Apesar da meiguice com que a tirei do arroubo, sobressaltou-se,<br />

estremecendo assustada. Ajudei-a a levantar-se, passei-lhe um braço pela cinta e,<br />

beijando-a na fronte, disse-lhe compadecido:<br />

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