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lhosas com quem trocava ideias, que sentiam prazer em dividir comigo,<br />

fazer solos enquanto eu cantava nos shows. Essa gente me rodeava e a<br />

troca se dava mais com os homens. Das mulheres era apenas uma amiguinha,<br />

sem muita intimidade. Já os homens comentavam minha atuação,<br />

aconselhavam, sugeriam repertório, davam mil dicas: pede para o Carlinhos<br />

te mostrar uma música dele com o Ronaldo Bôscoli, que diz Brinca no ar um<br />

resto de canção, um rosto tão sereno, tão quieto de paixão... você tem que<br />

cantar isso, e ia por aí...<br />

Meu primeiro dinheiro na noite foi ganho na boate Bacará. Eu revezava no<br />

palco com o Altemar Dutra, que já conhecia algumas coisas da Bossa Nova,<br />

desse corte moderno que estou tentando descrever com palavras. Ele<br />

misturava novas composições com alguns boleros do seu repertório.<br />

Precoce, eu já tinha naquela época consciência de que a minha voz fazia<br />

parte do conjunto dos músicos – era um instrumento. Acho que por isso<br />

sempre fui considerada como um músico. O meu número na Ordem dos<br />

Músicos é 722. Isso é impressionante. Acho que a minha mãe era 723, a<br />

Marlene, minha madrinha, era 721. Praticamente inauguramos a Ordem.<br />

Coisas da Dona Ruth. Porque quando a Ordem dos Músicos foi constituída,<br />

mamãe me obrigou a me inscrever. Era a maneira de aceitar o meu destino<br />

do seu jeito – já que não haveria volta, precisaria ser com seriedade. Tive<br />

que seguir o Conservatório de Música até receber o diploma de pianista,<br />

depois me sindicalizar, em seguida me emancipar, manter os papéis em<br />

ordem, atualizados – exigências que continuo cumprindo. Mamãe realmente<br />

me profissionalizou.<br />

Mas, nas andanças na noite, foi meu pai quem me acompanhou. Vivia a<br />

tiracolo e havia alguns rituais familiares a seguir. Após os shows, a gente<br />

saía para comer, geralmente fora do bar. Aconteceram lances engraçados.<br />

De vez em quando, a polícia chegava dando batidas nas boates e eu ia parar<br />

no banheiro. Era bom estar com meu pai, embora eu não tivesse medo de<br />

nada. Como boa aquariana, sempre fui destemida.<br />

Esta festa durou muitas e muitas noites. Saí do Bacará quando fui contratada<br />

pelo Alberico para tocar na casa do lado – no Bottle’s – com o Sergio Mendes,<br />

no final dos anos 1950. Foi o maior acontecimento da época. A fila ia da porta<br />

do Bottle’s até a Avenida Nossa Senhora de Copacabana. A casa era pequena,<br />

bastavam 150 pessoas para lotar. Todos fumando, menos eu, que só fui fumar<br />

com 21 anos. Só que onde eu andava tinha tanta fumaça que, aqui pra nós,<br />

não fazia diferença. Ai pensei: é guerra? Vou fumar também.<br />

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