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Sete Visões: Ambição - rtavares consultoria & treinamento

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[SE7E VISÕES - AMBIÇÃO] Página | 45<br />

― Eu queria saber uma coisa... ― o garoto perguntou, enquanto lixava a mesa de<br />

centro com o pai, que ficou em silêncio. ― É sobre o Papai Noel.<br />

A reação do homem foi imediata: esmurrou a mesa e levou a mão à testa logo depois,<br />

como se refletisse.<br />

― Desculpe-me, filho ― ele olhou diretamente para Kär, que naquele instante teve<br />

coragem de fitá-lo também. Seus olhos azuis estavam desejosos por uma resposta, e os do<br />

velho pareciam arrependidos pela grosseria. ― Diga o que é!<br />

― Onde ele mora? Como as pessoas fazem para chegar até ele?<br />

Os dois, após a pergunta, voltaram a lixar a mesa. O homem, perdido em lembranças,<br />

deu um suspiro.<br />

― Boa pergunta ― um riso se formou no rosto do pai, que olhou para cima e disse,<br />

contemplando algo que parecia estar além do teto: ― Sabe, seu avô dizia que para chegar<br />

até ele, não é preciso saber o endereço, é só ir na direção que o seu coração mandar e desejar<br />

encontrá-lo com todas as suas forças.<br />

Kär notou que o pai estava sendo sincero dessa vez, e sorriu. Estava mais do que satisfeito<br />

com a resposta.<br />

΅<br />

Kär resmungou para si mesmo, em tom de escárnio. Não se perdoava por ainda acreditar<br />

em seres como esse tal de Papai Noel. Mas não podia simplesmente fugir da realidade:<br />

desde bebê, fora condicionado a crer em sua existência ― não só por lendas, mas<br />

por experiências pessoais. Ele sempre recebeu presentes, por mais pobres que os pais fossem;<br />

e, por mais miséria que estivessem passando, os presentes sempre eram exatamente o<br />

que ele queria na época ― e, mesmo que nunca dissesse a ninguém quais eram, Kär sempre<br />

os recebia.<br />

Era isso que o fazia acreditar cegamente na existência daquele ser fantástico, e manter<br />

essa crença que era tão execrada pelos outros de sua idade. Se ele ao menos nunca tivesse<br />

tido provas de que era realmente verdade... Seus pedidos infantis, infelizmente,<br />

nunca ajudaram a derrubar a incredulidade dos outros: eram brinquedos, doces caros e<br />

outras “coisinhas efêmeras”.<br />

Kär voltou a se concentrar no trajeto. Queria poder se livrar daqueles pensamentos<br />

para, de uma vez por todas, esquecer o tal Papai Noel e voltar pra casa a salvo. Ele sabia<br />

que, deixando de acreditar, nem adiantaria procurar a residência do bom velhinho ― e,<br />

assim, só lhe restaria dar meia-volta e tomar o caminho para Rovaniemi. Mas sabia, também,<br />

que deixaria de lado tudo o que não podia ser esquecido (e isso seria inadmissível<br />

para alguém que já havia sofrido até ali por culpa dessa crença). Se tudo havia dado errado,<br />

não seria certo jogar tudo para trás antes que o ciclo se completasse. Seria injusto com<br />

ele mesmo.<br />

E ele tomou essa decisão sabendo que sua crença fora sua ruína.<br />

΅<br />

Os habitantes de Rovaniemi nunca simpatizaram com os métodos pedagógicos da<br />

família de Kär. O pai, mesmo que sempre estivesse exausto do trabalho, conferia ao filho<br />

único uma educação exemplar, ao contrário de muitos outros que impediam as crianças de<br />

frequentarem a escola para ajudarem nos ofícios. E é por isso que, dentre todas as famílias<br />

da cidade, a única que se aproximava do modelo de “lar feliz” era a de Kär ― justamente<br />

o garoto mais infeliz de todos.

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