N.º 187 - Novembro 2007 - 2,00 euros - Inatel
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A CASA NA ÁRVORE | SUSANA NEVES<br />
A árvore do totem<br />
No Parque da Pena, em Sintra, há uma árvore que ninguém resiste fotografar:<br />
é uma Thuja Plicata gigante, cujas pernadas da base do tronco invadem o chão<br />
e depois fazendo cotovelo elevam-se vários metros no ar.<br />
Importada da costa oeste da América do Norte,<br />
por volta de <strong>187</strong>0, esta conífera centenária – à<br />
semelhança de outros espécimes exóticos, distribuídos<br />
pelos oitenta e cinco hectares do Parque<br />
– foi trazida para Portugal por desejo de D. Fernando II<br />
(1819-1885) e sua segunda esposa, a jovem cantora lírica<br />
Elise Hensler, Condessa D`Edla (1836-1929).<br />
Sobrevivente do violento ciclone de Fevereiro de<br />
1941, tal como o majestoso Eucalyptus Obliqua (plantado<br />
no dia do controverso casamento, a 10 de Junho de<br />
1869), esta Thuja Plicata não perdeu os ramos inferiores,<br />
como aconteceria no seu habitat natural, nem foi<br />
podada de forma a garantir o protagonismo do tronco<br />
central. Na realidade, graças a esta circunstância – bastante<br />
criticada nos anos 60, por Mário Azevedo Gomes,<br />
neto da Condessa e professor catedrático jubilado de<br />
silvicultura do Instituto Superior de Agronomia – a<br />
árvore ganhou em aparato o que perderia na sua<br />
“forma específica”, próxima dos estudos dendrológicos.<br />
Dir-se-ia que as árvores, tal como as pessoas, quanto<br />
mais excêntricas melhor.<br />
Apesar dos cerca de 137 anos e das suas admiráveis<br />
proporções, a Thuja Plicata – localizada junto à Feteira<br />
da Condessa, com vista sobre a Fonte dos Passarinhos –<br />
é ainda relativamente pequena, comparada com os<br />
exemplares que Thomas Pakenham fotografou, no<br />
Lago Quinault e em Kalaloch, no Estado de<br />
Washington. Segundo o autor de “A Volta ao Mundo em<br />
80 Árvores” (Le Tour du Monde en 80 Arbres, Éditions<br />
du Chêne, 2<strong>00</strong>2), se o primeiro espécime americano<br />
pesa cerca de 5<strong>00</strong> toneladas, no tronco do segundo é<br />
possível entrarem várias pessoas.<br />
Não tendo qualquer fissura, a Thuja Plicata do<br />
Parque da Pena (com uma altura superior a 30 metros)<br />
apresenta, no entanto, um aspecto igualmente possante,<br />
benéfico, alienígena e associativo, ou não fosse<br />
ela potencialmente um totem.<br />
Conhecida entre os índios da costa ocidental da<br />
América do Norte, de onde é nativa, por Western Red<br />
Cedar ou Arbore vitae (assim a designam os<br />
Kakawaka`wakw) esta árvore é a matéria prima na qual<br />
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os totens são esculpidos, veículo da comunicação com os<br />
espíritos dos antepassados e os animais que os protegeram.<br />
Emblema de grupo, colorido ou não, o totem<br />
atrai a comunidade festivamente, podendo a sua elevação<br />
ser acompanhada de um potlach, ou seja a cerimónia<br />
de dádiva e desperdício de bens acumulados.<br />
Segundo a sabedoria dos índios da América do Norte,<br />
mesmo sem ser transformada em totem, a Thuja Plicata<br />
emana um poder espiritual tão forte que é transmissível<br />
desde que alguém a ela se encoste. A designação de<br />
Arbore vitae ou árvore da vida tem ainda um significa-