Untitled - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFMG
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para a obtenção do efeito <strong>de</strong>sejado. Quando Duchamp comenta com Cabanne essas<br />
experiências que se <strong>de</strong>senvolvem entre 1921 e 1925, ele nos confia, com ou sem humor:<br />
O que me interessava é que era um fenômeno científico que existia <strong>de</strong> uma forma<br />
diversa <strong>da</strong> que eu havia <strong>de</strong>scoberto. Vi um opticista, naquela época, que me disse:<br />
“Esta coisa é emprega<strong>da</strong> para restituir a visão a pessoas caolhas, ou pelo menos a<br />
impressão <strong>da</strong> terceira dimensão”. Porque, pelo que parece, elas a per<strong>de</strong>m. 238<br />
Jean Clair i<strong>de</strong>ntificará essas diversas preocupações óticas duchampianas em diversas<br />
fotografias do livro <strong>de</strong> Étienne-Jules Marey, Le Mouvement, publicado em 1894, uma <strong>da</strong>s<br />
obras científicas que marcarão o final do século XIX também por suas inúmeras ilustrações e<br />
sua abertura a um público mais amplo. Várias experiências são realiza<strong>da</strong>s e fotografa<strong>da</strong>s<br />
estereoscopicamente para <strong>de</strong>monstrar, por exemplo, os aspectos paradoxais <strong>de</strong> uma “esfera<br />
gera<strong>da</strong> pela rotação <strong>de</strong> um fio <strong>de</strong> metal sob certas condições <strong>de</strong> iluminação.” 239 De modo<br />
geral, Clair fará a relação entre as investigações <strong>de</strong> Marey, o interesse crescente <strong>da</strong> topologia<br />
mo<strong>de</strong>rna pelos volumes estranhos, como a garrafa <strong>de</strong> Klein (que está para a quarta dimensão<br />
assim como o famoso anel <strong>de</strong> Möbius está para a terceira dimensão), e o próprio interesse <strong>de</strong><br />
Duchamp quanto à topologia, tal como testemunha François le Lionnais em Abécé<strong>da</strong>ire. 240<br />
Essas experiências mono e binoculares <strong>de</strong> Duchamp sobre a inversão incessante do<br />
côncavo em convexo e/ou do convexo em côncavo, a partir <strong>da</strong> espiral, forma em si mesma<br />
ambivalente (imóvel/móvel ou centrífuga/centrípeta), parecem se interromper com os<br />
Rotoreliefs (Rotorelevos), um brinquedo feito <strong>de</strong> litografias colori<strong>da</strong>s 241 para as quais<br />
Duchamp pe<strong>de</strong> a patente e tenta comercializar, primeiro na França, com a passagem<br />
<strong>de</strong>cepcionante pelo concurso Lépine em agosto <strong>de</strong> 1935, sem sucesso, em segui<strong>da</strong> nos<br />
Estados Unidos, sem sucesso tampouco. Como se tivesse terminado com essa problemática<br />
<strong>da</strong> percepção do relevo, após a tanto quanto séria realização <strong>da</strong> Rotative <strong>de</strong>mi-sphère<br />
(1925) 242 e, um pouco mais lúdico, com Anémic Cinéma (1926), o qual abor<strong>da</strong>remos no<br />
terceiro capítulo.<br />
238<br />
CABANNE. Marcel Duchamp: Engenheiro do tempo perdido, p. 126 (traduzimos novamente). Ver também<br />
OTTINGER. Marcel Duchamp <strong>da</strong>ns les collections du Centre Georges Pompidou, p. 92.<br />
239<br />
CLAIR. Duchamp et la photographie, p. 98-102.<br />
240<br />
CLAIR. Duchamp et la photographie, p. 102. São volumes que interessaram também Jacques Lacan.<br />
LE LYONNAIS. Échecs et Maths, p. 51.<br />
241<br />
Ver OTTINGER. Marcel Duchamp <strong>da</strong>ns les collections du Centre Georges Pompidou, p. 90-93. As<br />
litografias são ambivalentes na medi<strong>da</strong> em que não vemos <strong>de</strong> imediato do que se trata (uma taça <strong>de</strong> champanhe,<br />
uma bola, um peixe num aquário...), antes <strong>de</strong> perceber, após a rotação do disco, seu volume em relevo, com<br />
tendência à forma esférica.<br />
242<br />
Ver MARCADÉ. Marcel Duchamp. La vie à crédit, p. 265-266. Ao mesmo tempo um comprometimento<br />
ca<strong>da</strong> vez mais sério com o jogo <strong>de</strong> xadrez.<br />
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