Untitled - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFMG
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P r e â m b u l o<br />
Por que Duchamp? Essa primeira pergunta vem logo no início <strong>da</strong> terceira parte do<br />
livro <strong>de</strong> Georges Didi-Huberman, La ressemblance par contact (A semelhança por contato),<br />
<strong>de</strong>dica<strong>da</strong> a Marcel Duchamp. O autor precisa: “será que vale a pena voltar, mais uma vez, a<br />
essa obra que tanto polarizou o discurso crítico sobre a arte contemporânea a ponto <strong>de</strong><br />
acabar, seja por insensibilizá-lo, seja por exasperá-lo?” Didi-Huberman respon<strong>de</strong>rá com os<br />
seus argumentos, contextualizando essa irritação do início dos anos noventa, em que começa,<br />
na França, uma forte polêmica a respeito do “valor” <strong>da</strong> arte contemporânea. A fonte <strong>de</strong> todos<br />
os males seria Duchamp, reduzido por seus <strong>de</strong>tratores ao “homem do urinol”, o inventor do<br />
readyma<strong>de</strong>. E Didi-Huberman explicita uma série <strong>de</strong> mal-entendidos sobre o homem e a<br />
obra, caracteriza<strong>da</strong> por uma “obscura recusa <strong>de</strong> olhar”. 1<br />
Nossa intenção neste estudo sobre Marcel Duchamp e a estereoscopia não é a <strong>de</strong><br />
acompanhar sur le tard esses <strong>de</strong>bates, e tomar partido por uma obra cujos aspectos<br />
paradoxais nunca cessaram <strong>de</strong> interessar a crítica. Se Didi-Huberman <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> se confrontar à<br />
“complexi<strong>da</strong><strong>de</strong> visual e processual” <strong>da</strong>s obras <strong>de</strong> Duchamp para extrair <strong>de</strong>la as questões, não<br />
apenas teóricas, mas também estéticas, em um contexto <strong>de</strong> crise, optaremos, <strong>de</strong> nosso lado,<br />
bem mais mo<strong>de</strong>stamente e distantes do epicentro <strong>de</strong>ssa crise, por abor<strong>da</strong>r certos aspectos <strong>da</strong><br />
obra duchampiana a partir do dispositivo estereoscópico, e por razões também menos<br />
ambiciosas. De fato, retomamos uma reflexão que não foi concluí<strong>da</strong>, há aproxima<strong>da</strong>mente<br />
trinta anos, em projeto <strong>de</strong> dissertação <strong>de</strong> mestrado sobre os anáglifos e a percepção <strong>da</strong><br />
profundi<strong>da</strong><strong>de</strong>, principalmente na obra <strong>de</strong> Marcel Duchamp. 2 Vale precisar que iniciamos os<br />
nossos estudos <strong>de</strong> artes plásticas numa época <strong>de</strong> interesse redobrado por Marcel Duchamp na<br />
França. A respeito <strong>de</strong>sse contexto cultural <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1970, Thierry <strong>de</strong> Duve evoca: “na<br />
teoria (e na edição): febre duchampiana nos intelectuais <strong>de</strong>s<strong>de</strong> em torno <strong>de</strong> 1975, <strong>de</strong>ntro e<br />
fora dos círculos especializados <strong>da</strong> crítica ou <strong>da</strong> história <strong>da</strong> arte. Enfim, na vi<strong>da</strong> cultural:<br />
inauguração <strong>de</strong> Beaubourg com uma gran<strong>de</strong> retrospectiva Duchamp em 1977.” 3<br />
1 DIDI-HUBERMAN. La ressemblance par contact, p. 175. As traduções dos textos em francês são do autor<br />
<strong>de</strong>sta dissertação, exceto quando explicitamente referido na referência bibliográfica.<br />
2 Tendo concluído na ENSAD (Escola Nacional Superior <strong>da</strong>s Artes Decorativas), em Paris, em 1982, uma<br />
monografia sobre a sombra na obra <strong>de</strong> Marcel Duchamp, intitula<strong>da</strong> “Étant donnée l’ombre…”, tínhamos o<br />
projeto <strong>de</strong> prosseguir, <strong>de</strong>sta vez na Facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Artes Plásticas Paris I Saint Charles, refletindo sobre torno <strong>de</strong><br />
Étant donnés… (1946-1966), a última gran<strong>de</strong> obra <strong>de</strong> Marcel Duchamp, a partir do dispositivo estereoscópico<br />
ao qual a obra se refere.<br />
3 DUVE. Résonances du readyma<strong>de</strong>, p. 11.<br />
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