Untitled - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFMG
Untitled - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFMG
Untitled - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFMG
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Verre uma obra única: a ironia e o erotismo, a complexi<strong>da</strong><strong>de</strong> intelectual reuni<strong>da</strong> à<br />
simplici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> execução, o quadro filosófico, a economia verbal. Em uma palavra, essa<br />
‘beleza <strong>de</strong> indiferença’ cujo outro nome é liber<strong>da</strong><strong>de</strong>. 112<br />
Como acreditar, com efeito, que a curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Duchamp tenha se contentado<br />
simplesmente com uma única referência, embora um nome <strong>de</strong> autor ou <strong>de</strong> obra lhe tenha<br />
vindo naturalmente à mente na ocasião <strong>de</strong> uma entrevista? Ao fazer o resumo <strong>da</strong>s fontes do<br />
Grand Verre, a lista <strong>da</strong>s referências po<strong>de</strong>ria se tornar longa. Como introdução ao Grand<br />
Verre, à ironia e ao erotismo duchampianos, Gestes et Opinions du Docteur Faustroll<br />
(Gestos e opiniões do Doutor Faustroll) prometia, aliás, uma bela navegação (a bordo <strong>de</strong><br />
uma barca chama<strong>da</strong> “as”) nas n dimensões do espírito. Faustroll que <strong>de</strong>sejava legar aos mais<br />
sábios, diga-se <strong>de</strong> passagem, uma lista <strong>de</strong> 27 obras capitais, <strong>de</strong> Rabelais (tout court) a Vers et<br />
Prose <strong>de</strong> Mallarmé…<br />
De maneira menos patafísica, Marcadé nos lembra ain<strong>da</strong> o fascínio <strong>de</strong> Duchamp<br />
pelas cronofotografias <strong>de</strong> Marey, <strong>de</strong> Eakins e <strong>de</strong> Muybridge cujas reproduções ele <strong>de</strong>scobre<br />
no hebdomadário L’Illustration, que não <strong>de</strong>ixavam <strong>de</strong> ter relação com a quarta dimensão:<br />
“As cronofotografias <strong>de</strong>sembocavam essencialmente na conclusão um tanto ingênua que a<br />
quarta dimensão po<strong>de</strong>ria ser o ‘prolongamento’ do objeto nessas fotos estroboscópicas.” 113<br />
Jean Clair já havia mostrado precisamente a ligação <strong>de</strong> Marcel Duchamp à cronofotografia e<br />
como certas investigações <strong>de</strong> Étienne-Jules Marey po<strong>de</strong>riam estar relaciona<strong>da</strong>s às opticeries<br />
que suce<strong>de</strong>m ao Grand Verre. Da mesma forma que Jean Clair havia insistido sobre a<br />
importância <strong>de</strong> Voyage au Pays <strong>de</strong> la Quatrième Dimension, ele publica, com efeito,<br />
paralelamente à exposição Duchamp no Beaubourg, <strong>da</strong> qual ele é o organizador, Duchamp et<br />
la photographie, 114 ensaio <strong>de</strong> referência sobre a presença constante do primat técnico — a<br />
fotografia — sobre o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> obra <strong>de</strong> Duchamp em geral. Ao mesmo tempo, era<br />
publicado nos Estados Unidos o ensaio <strong>de</strong> Rosalind Krauss que colocava, <strong>da</strong> mesma maneira<br />
que o ensaio <strong>de</strong> Jean Clair o ambicionava, “to<strong>da</strong> a obra <strong>de</strong> Duchamp sob a autori<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
paradigma fotográfico”. 115 Raúl Antelo também nos lembra o triunfo <strong>da</strong> lógica indiciária,<br />
112 PAZ. Marcel Duchamp : l’apparence mise à nu…, p. 133. “Il serait inutile <strong>de</strong> chercher <strong>da</strong>ns le Voyage <strong>da</strong>ns<br />
la quatrième dimension tout ce qui fait du Grand Verre une œuvre unique: l’ironie et l’érotisme, la complexité<br />
intellectuelle jointe à la simplicité <strong>de</strong> la facture, le cadre philosophique, l’économie verbale. En un mot cette<br />
“beauté d’indifférence” dont l’autre nom est liberté.”<br />
113 DUCHAMP apud MARCADÉ. Marcel Duchamp. La vie à crédit, p. 55. “Les chronophotographies<br />
débouchaient essentiellement sur la conclusion quelque peu naïve que la quatrième dimension pouvait être<br />
‘l’allongement’ <strong>de</strong> l’objet <strong>da</strong>ns ces photos stroboscopiques”<br />
114 CLAIR, Duchamp et la photographie. Paris: Éditions du Chêne, 1977.<br />
115 ver DIDI-HUBERMAN. La ressemblance par contact, p. 187-190. Curioso observar em Duchamp ou le<br />
champ imaginaire (New York, 1980, Degrés, números 26-27, primavera 1981), num artigo posterior ao artigo<br />
63