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Untitled - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFMG

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Voltemos ao passado. O que po<strong>de</strong>ria facilmente caracterizar essa quarta dimensão<br />

inapreensível que atravessa não apenas as reflexões <strong>de</strong> Duchamp mas, certamente, o discurso<br />

científico e filosófico dos anos 1900-1910, é, <strong>de</strong> fato, o movimento. Em outros termos, a<br />

inscrição, a evolução (qual seria a palavra certa?) do espaço no tempo, dissociados outrora<br />

pelo pensamento teórico prece<strong>de</strong>ndo as teorias <strong>da</strong> relativi<strong>da</strong><strong>de</strong>. A tela, o vidro sobretudo,<br />

como suporte também <strong>da</strong> química fotográfica, tiveram a pretensão, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua concepção<br />

enquanto pariete di vetro (e po<strong>de</strong>ríamos retornar até os mitos fun<strong>da</strong>dores do <strong>de</strong>senho), <strong>de</strong><br />

fixar não somente o que está imóvel, uma paisagem por exemplo, uma arquitetura e, por que<br />

não, um rosto, mas quiseram também captar, ain<strong>da</strong> que com mais dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s – com ou sem<br />

a “vibração”, a “irradiação” <strong>da</strong> qual nos fala Merleau-Ponty —, a mesma paisagem com a<br />

passagem <strong>da</strong>s nuvens ou sob a tempesta<strong>de</strong>, personagens e animais passando diante <strong>de</strong>ssa<br />

arquitetura, um rosto prestes a sorrir. Em suma, a mobili<strong>da</strong><strong>de</strong> do contínuo espaço-tempo. A<br />

fotografia passou por essas dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s experimenta<strong>da</strong>s pela pintura <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sempre,<br />

confronta<strong>da</strong> em suas premissas a intermináveis tempos <strong>de</strong> pose. A imobili<strong>da</strong><strong>de</strong> era a<br />

condição <strong>de</strong> uma toma<strong>da</strong> capaz <strong>de</strong> restituir o que “estava lá”. Merleau-Ponty constestará,<br />

entretanto, na esteira <strong>de</strong> Rodin, essa capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> fotografia a <strong>da</strong>r conta <strong>da</strong> duração:<br />

A fotografia mantém abertos os instantes que o avanço do tempo logo fecha, ela<br />

<strong>de</strong>strói a superação, a ultrapassagem, a ‘metamorfose’ do tempo, que a pintura<br />

torna ao contrário visíveis, pois os cavalos têm em si o ‘quitter ici, aller lá’ [um<br />

pé aqui, outro lá] (Henri Michaux), pois eles têm um pé em ca<strong>da</strong> instante. 273<br />

Da mesma maneira que Bergson, como nos lembra Hubert Damisch, “reprochava ao<br />

cinema criar movimento com imagens fixas, com vistas instantâneas, assim como as do<br />

fenakistoscópio”. E citando Gilles Deleuze: “Sem dúvi<strong>da</strong> não po<strong>de</strong>ríamos concluir pela<br />

artificiali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos meios pela artificiali<strong>da</strong><strong>de</strong> do resultado”. 274 O filósofo Clément Rosset,<br />

pensando em torno <strong>de</strong>ssas questões <strong>da</strong>s “reproduções do real”, sugere (essa citação seria<br />

na<strong>da</strong> mais do que uma fotografia do seu pensamento profundo, tingido as vezes <strong>de</strong> muito<br />

humor): “Se tudo está em movimento, é impossível captar alguma coisa, ou, antes,<br />

impossível captar algo tal qual, captar algo sem alterá-lo.” 275<br />

273<br />

MERLEAU-PONTY. L’Œil et l’Esprit, p.80. “La photographie maintient ouverts les instants que la poussée<br />

du temps referme aussitôt, elle détruit le dépassement, l’empiètement, la “métamorphose” du temps, que la<br />

peinture rend visibles au contraire, parce que les chevaux ont en eux le “quitter ici, aller là (Henri Michaux)”,<br />

parce qu’ils ont un pied <strong>da</strong>ns chaque instant.”<br />

274<br />

DELEUZE apud DAMISCH. La Dénivelée. À l’épreuve <strong>de</strong> la photographie, p. 45. Damisch compara o<br />

paradoxo estático/em movimento, do cinema, ao paradoxo plano/relevo <strong>da</strong> estereoscopia.<br />

275<br />

ROSSET. Fantasmagories, p. 45. “Si tout bouge il est impossible <strong>de</strong> rien attraper, ou plutôt impossible <strong>de</strong><br />

rien saisir tel quel, <strong>de</strong> rien saisir sans le changer”.<br />

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