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As Ultimas Quatro Coisas

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levara de dois guardas que ouviram e não gostaram de sua opinião de que a<br />

donzela de Blackbird Leys era uma mulher bem-intencionada e não deveria ser<br />

sujeitada aos horrores de um Auto de Fé. Por outro lado, o erro de Cale<br />

certamente dera um claro recado aos outros Purgadores.<br />

Era uma peculiaridade dos Redentores ter pouca ou nenhuma imaginação,<br />

muito embora acreditassem em várias ideias fantásticas. E isso era verdade até<br />

mesmo para um homem inteligente como Bosco. Capaz de acreditar em sete<br />

coisas impossíveis antes do café da manhã, desde que envolvessem milagres,<br />

castigos divinos bizarros, pedras da vesícula e prepúcios preservados dos<br />

mártires, ele ficou intrigado pelo plano elaborado de Cale para retirar Guido<br />

Hooke da prisão.<br />

— Eu posso simplesmente mandar alguns guardas para retirá-lo.<br />

— Mas o que acontecerá quando houver uma investigação do Gabinete de<br />

Propagação da Fé e eles descobrirem que, antes de morrer misteriosamente,<br />

Hooke estava em perfeitas condições de saúde e foi retirado da cela sem<br />

motivo aparente, contra todos os protocolos e procedimentos?<br />

Bosco, que na juventude foi um fiel convencional e fervoroso, passou a<br />

mentir muito tarde na vida. Agora ele inventava mentiras plausíveis, com<br />

certeza, mas as coisas que dizia não eram muito contestadas, porque, quando<br />

finalmente passou a enganar seus colegas Redentores, já era muito poderoso.<br />

Ele tinha inimigos desconfiados, mas havia um limite na pressão que eles<br />

podiam exercer, pouco espaço para fazer perguntas incômodas. Por outro<br />

lado, Cale, Henri Embromador e Kleist vinham enganando, trapaceando e<br />

mentindo para pessoas que podiam fazer o que quisessem com eles se<br />

tivessem a mínima suspeita de qualquer engodo, trapaça ou mentira. Uma cara<br />

de culpa era prova de pecado, assim como a expressão de inocência era prova<br />

do pecado revoltante do orgulho. O resultado foi que todos eles, eternos<br />

mentirosos, aprenderam a faltar com a verdade da mesma maneira que<br />

aprenderam a andar ― a princípio de maneira hesitante, mas depois de forma<br />

tão espontânea que eles nem sequer pensavam a respeito. Um mentiroso sem<br />

nenhum poder tem que saber o que está fazendo para não ser descoberto. L<br />

ma mentira tinha que estar viva e se parecer tanto com a verdade a ponto de<br />

não dar espaço aos cem erros que os maus mentirosos cometem, se revelando

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