Há um novo Alain Platel à nossa espera - Fonoteca Municipal de ...
Há um novo Alain Platel à nossa espera - Fonoteca Municipal de ...
Há um novo Alain Platel à nossa espera - Fonoteca Municipal de ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
sa transformação. Há <strong>de</strong>z anos vendiam-semuitos discos e agora ven<strong>de</strong>m-semuito poucos. O po<strong>de</strong>r queas gravadoras tinham não existe mais.Hoje, no Brasil, o cara que mais ven<strong>de</strong>discos é <strong>um</strong> padre. É estranho. Opaís já foi o quinto maior mercado dodisco do mundo, nos anos 80. Agoraninguém ven<strong>de</strong> nada, <strong>um</strong> padre ven<strong>de</strong>mais do que os próprios músicos.É triste.”A par <strong>de</strong> <strong>um</strong>a enorme ironia surgeneste romance, on<strong>de</strong> alguém <strong>de</strong>ixa acarreira musical porque ficou careca,<strong>um</strong> tom amargo. Reflecte-se sobre ofracasso e o sucesso, como se nãohouvesse muita diferença entre <strong>um</strong>acoisa e outra. “Na minha carreira <strong>de</strong>músico percebi que o sucesso é muitomais <strong>um</strong>a visão que os outros têm<strong>de</strong> quem está fazendo sucesso do queda própria pessoa. Claro que a pessoase ilu<strong>de</strong>, se inebria, em alguns momentoscom aquela situação mas avida pessoal é muito parecida com a<strong>de</strong> qualquer outro.”E <strong>de</strong>pois, <strong>de</strong>ntro do que se cost<strong>um</strong>achamar sucesso existem sempre ospequenos fracassos. “Você se propõefazer <strong>um</strong>a coisa, não consegue e senteque fracassou. E aos olhos dos outrosvocê está fazendo sucesso ainda.Tudo isso é relativo, dividir as pessoasentre os que vencem, os que fazemsucesso, os que fracassam... Era essaa i<strong>de</strong>ia que estava na minha cabeça”durante a escrita do livro.Aos 50 anos, o narrador começa aolhar para todos “esses processos dosucesso como ilusões”, vê aproximarseo fim da vida e percebe que, afinal,tudo aquilo não significa tanto assim.É o olhar <strong>de</strong> quem avalia, <strong>de</strong> quem jávê a finitu<strong>de</strong> como <strong>um</strong> facto real, <strong>de</strong>quem per<strong>de</strong>u as ilusões da juventu<strong>de</strong>.“Quando se chega nesta ida<strong>de</strong> vocêpercebe que as possibilida<strong>de</strong>s não sãoinfinitas, se vão fechando e que otempo é finito.”Tony Belloto fez 50 anos em Junhoe a personagem Teo Zanquis apresenta-secomo “guitarrista escritor” eescreve contos que têm o rock comotema. Nada disto será por acaso, “NoBuraco” tem referências autobiográficas.Basta ler a epígrafe retirada <strong>de</strong>“Matadouro 5” <strong>de</strong> Kurt Vonnegut:“Tudo isto aconteceu, mais ao menos.”Lá para a página cento e tal é <strong>de</strong>scrito<strong>um</strong> episódio inspirado na vidareal: n<strong>um</strong>a noite fatídica, Teo é presocom <strong>um</strong> saquinho plástico cheio <strong>de</strong>cocaína. O mesmo acontece ao amigoque lhe <strong>de</strong>u a droga mas a este é aplicada<strong>um</strong>a pena mais pesada. O episódiofaz parte da história da música doBrasil. Em 1985, Tony Bellotto e o cantorArnaldo Antunes, dos Titãs, forampresos por posse <strong>de</strong> heroína. O discoque o grupo gravou e lançou a seguira esse episódio, “Cabeça Di<strong>nossa</strong>uro”,transformou-se no primeiro disco <strong>de</strong>ouro da banda.“Foi <strong>um</strong>a coisa tra<strong>um</strong>ática e sempretive vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>um</strong> dia falar sobre isson<strong>um</strong> livro. Fiz nesse aí. Foi <strong>um</strong>acoisa difícil porque estava lembrando<strong>um</strong>a situação chata pela qual passei”,recorda Bellotto.Naquela época, por causa do escândalo,muitos shows foram canceladose houve pessoas que não quiseramficar atreladas à imagem dabanda. “Ficámos presos <strong>um</strong> tempo.Eu fiquei menos, o Arnaldo fico<strong>um</strong>ais. Isso é que me doeu mais porqueda maneira como a situaçãoaconteceu o <strong>de</strong>legado acabou me enquadrandoa mim como a <strong>um</strong> usuárioe a ele como <strong>um</strong> traficante. Foi injustaa situação que ele viveu. Depois agente respon<strong>de</strong>u o processo em liberda<strong>de</strong>.Enfim.”“Na época foi muito difícil, cadavez que eu ia viajar tinha que pedirautorização e tinha <strong>um</strong> promotor queme perseguia e não queria dar. Esempre que saíamos para o exteriorera <strong>um</strong> problema passar na PolíciaFe<strong>de</strong>ral, os policiais diziam que euficava fazendo músicas contra a polícia...”Também é verda<strong>de</strong>ira a história daguitarra Rickenbacker contada peloprotagonista (os nomes é que são fictícios).“Eu e o Marcello Fromer – ooutro guitarrista da banda, que morreu– comprámos <strong>um</strong>a guitarra queera muito boa, <strong>um</strong>a Rickenbacker.Estávamos fazendo <strong>um</strong> show lá nacida<strong>de</strong> Pru<strong>de</strong>nte, fomos comprardrogas a <strong>um</strong> traficante japonês e elechegou com <strong>um</strong>a guitarra. A gentecomprou e uns dias <strong>de</strong>pois, chegandono aeroporto, encontrámos OsParalamas do Sucesso. Começámosa mostrar e eles disseram que era aguitarra do Lobão [cantor <strong>de</strong> rockdos anos 80] que tinha sido roubada.Será que é? No fim essa guitarra tambémacabou <strong>de</strong>saparecendo, roubaramela da gente em alg<strong>um</strong> momento.Não foi daquela maneira que está<strong>de</strong>scrita no livro, mas s<strong>um</strong>iu.”Brincar com a línguaEntre os jovens Tony Bellotto tambémé conhecido pelo programa “Afinandoa Língua”, no Canal Futura(educativo), que tenta atrair a atençãodos que gostam <strong>de</strong> música paraos livros.A i<strong>de</strong>ia é pegar letras <strong>de</strong> música efazer <strong>um</strong>a ligação com textos <strong>de</strong> literatura,poesia e prosa. E em termos<strong>de</strong> linguagem “No Buraco” está cheio<strong>de</strong> brinca<strong>de</strong>iras, referências e gíria.“Interesso-me por essas coisas engraçadasque a língua proporciona.Nos meus livros gosto <strong>de</strong> falar sobreas diferenças regionais, como o cariocafala, o gaúcho, o paulista...”Neste livro, quase do princípio aofim, também teve que <strong>de</strong>screver muitascenas <strong>de</strong> sexo. A <strong>de</strong>terminada alturao protagonista apaixonado diz:“Nos tornamos amigos. Até parece.Como se fosse possível <strong>um</strong> homemmaduro (eu) no <strong>de</strong>sabrochar – semtrocadilhos, por favor – <strong>de</strong> seus cinquentaanos ficar amiguinho <strong>de</strong> <strong>um</strong>aninfetoi<strong>de</strong> coreana <strong>de</strong> <strong>de</strong>zenove. Meengana que eu gosto.”É assim o h<strong>um</strong>or <strong>de</strong> Bellotto. “Escreversobre sexo é difícil. Ou vocêcai n<strong>um</strong>a coisa vulgar ou n<strong>um</strong>a coisacafona. Acho que ficou legal. Deu trabalhomas fui inspirando-me nos escritoresque fazem isso bem, como oHenry Miller, o Bukowski. Isso tambémé <strong>um</strong>a coisa que acontece muito,essa coisa casual, essa coisa com fã.Está bem representado no livro.”Durante os últimos meses, Bellottotem andado a promover o livro peloBrasil afora e apareceram-lhe “o fantasmada livraria vazia” (“Realmenteeu pego, como a gente diz por aqui,<strong>um</strong>as roubadas. O lançamento do livroem Porto Alegre foi péssimo, foitriste. Cheguei na livraria e não tinhaninguém. Fiquei sentado, n<strong>um</strong>a mesa,com <strong>um</strong>a pilha <strong>de</strong> livros e não tinhaninguém. É muito confrangedor.”)e “o fantasma do esqueci o teunome” na altura <strong>de</strong> assinar o autógrafo.“Esse é pior que o da livrariavazia. Sempre me acontece, eu estouolhando a pessoa e não vem o nome.‘Qual é seu nome mesmo?’” É esta avida <strong>de</strong> <strong>um</strong> guitarrista escritor.FestivalEscrita na PaisagemapresentaMais informações brevemente em:www.escritanapaisagem.netrvalente@escritanapaisagem.netSiga-nos no facebook!Um projecto:Estrutura financiada por:Ípsilon • Sexta-feira 17 Dezembro 2010 • 15