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Há um novo Alain Platel à nossa espera - Fonoteca Municipal de ...

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O mo<strong>de</strong>lo para “Paint Me” foramos “Contos <strong>de</strong> Canterbury”, coma diferença <strong>de</strong> que os viajantes<strong>de</strong> “Paint Me” não sãoperegrinos com <strong>um</strong> objectivocom<strong>um</strong>, mas estranhosagrupados em virtu<strong>de</strong> daaleatorieda<strong>de</strong> da forma <strong>de</strong>viajar mo<strong>de</strong>rnaViajar <strong>de</strong> comboio po<strong>de</strong> ser <strong>um</strong> exercíciovoyeurista, facilitado pela observaçãodo reflexo do outro no vidro dajanela, sobretudo nos percursos nocturnos.Imaginam-se as vidas das pessoasque estão ali mesmo ao lado casualmentee fantasia-se com elas. Estefoi o ponto <strong>de</strong> partida para “Paint Me”,a primeira ópera <strong>de</strong> Luís Tinoco, escritaa partir <strong>de</strong> <strong>um</strong> libreto <strong>de</strong> StephenPlaice, autor <strong>de</strong> textos para teatro,musicais e óperas <strong>de</strong> compositorescomo Harrison Birtwistle, RichardTaylor ou Jonathan Gill. O mo<strong>de</strong>lo formalforam os “Contos <strong>de</strong> Canterbury”,escritos por Geoffrey Chaucer no séculoXIV, com a diferença <strong>de</strong> que osviajantes <strong>de</strong> “Paint Me” não são peregrinoscom <strong>um</strong> objectivo com<strong>um</strong>, masestranhos que foram agrupados emvirtu<strong>de</strong> da aleatorieda<strong>de</strong> da forma <strong>de</strong>viajar mo<strong>de</strong>rna. Os seus contos sãonarrados para si próprios, nas suaspróprias fantasias. Luís Tinoco já tinhafeito experiências no teatro musical,com <strong>de</strong>staque para “Evil Machines”,com libreto <strong>de</strong> Terry Jones (<strong>um</strong> doselementos dos Monty Python), masesta é a sua primeira ópera no sentidotradicional, “<strong>um</strong> <strong>de</strong>safio aliciante”, noqual projectou técnicas cinematográficas.Resultante <strong>de</strong> <strong>um</strong>a encomendada Culturgest, o espectáculo estará emcena nos dias 17 e 18 e tem encenação<strong>de</strong> Rui Horta, direcção musical <strong>de</strong> JoanaCarneiro e <strong>um</strong> elenco <strong>de</strong> seis jovenscantores: Raquel Camarinha(Tula), Eduarda Melo (Ruth), PatriciaQuinta (Stephanie), Hugo Oliveira (Howard),Job Tomé (Padre) e João Rodrigues(Lee).Como surgiu a colaboração como libretista Stephen Plaice?Po<strong>de</strong>mos comparar o papel do libretistaao do guionista no cinema. É <strong>um</strong>trabalho muito específico. Queria <strong>um</strong>libretista com “métier”, alguém quepu<strong>de</strong>sse construir <strong>um</strong> drama e <strong>um</strong>alinha narrativa com <strong>um</strong>a direcçãocontemporânea, mas que fizesse aomesmo <strong>um</strong>a ponte com a história e atradição do género operático. Passei<strong>um</strong> período à procura <strong>de</strong> autores e limuita coisa, até que <strong>um</strong>a amiga mefalou do Stephen Plaice. Ópera é músicae teatro ao mesmo tempo. Umlibretista tem <strong>de</strong> ter intuição musical,mas também intuição <strong>de</strong> palco. O Stephentem essa experiência, escreve<strong>um</strong>uitas peças <strong>de</strong> teatro, é casado com<strong>um</strong>a cantora <strong>de</strong> ópera e canta n<strong>um</strong>coro. Tem <strong>um</strong> enorme conhecimentoda história da música e da ópera, oque lhe permite brincar e ironizarcom o género operático. Li os seuslibretos e em todos os casos senti quegostava <strong>de</strong> fazer música para eles.A i<strong>de</strong>ia do conteúdo da históriafoi <strong>de</strong>le?Antes <strong>de</strong> iniciar o trabalho conversámossobre temáticas e também sobreproblemas práticos da técnica <strong>de</strong> escrita.Depois houve <strong>um</strong> aspecto quepartilhámos a título <strong>de</strong> curiosida<strong>de</strong>.Tratava-se daquela situação que játodos experienciámos quando viajamos<strong>de</strong> comboio e observamos osoutros passageiros através do reflexono vidro. É <strong>um</strong>a forma voyeurista <strong>de</strong>observar as pessoas, <strong>de</strong> fantasiar oque será a vida <strong>de</strong>las ou mesmo <strong>de</strong>imaginar <strong>um</strong>a possível relação comelas. Esse foi <strong>um</strong> ponto <strong>de</strong> partida.Em termos literários há <strong>um</strong>a referênciaaos “Contos <strong>de</strong> Canterbury”, <strong>de</strong>Geoffrey Chaucer. Neste caso, em vez<strong>de</strong> <strong>um</strong>a viagem <strong>de</strong> peregrinos que se“[Andar <strong>de</strong> comboio]É <strong>um</strong>a formavoyeurista<strong>de</strong> observaras pessoas,<strong>de</strong> fantasiar o queserá a vida <strong>de</strong>lasou mesmo<strong>de</strong> imaginar <strong>um</strong>apossível relaçãocom elas. Esse foi <strong>um</strong>ponto <strong>de</strong> partida[para a ópera]entretêm a contar histórias para otempo passar, temos <strong>um</strong>a relação casualentre as pessoas que entram naquelacarruagem.Como geriram a oposição entrea acção real e imaginada?Esse foi <strong>um</strong> aspecto aliciante que mepermitiu trabalhar musicalmente oespaço interior da carruagem e o espaçoda fantasia e também cruzá-los.Há aspectos das fantasias que passampara o som real e sons da vida realque entram no espaço da fantasia.Esse processo tem <strong>um</strong>a componentecinematográfica apelativa. O que acabapor ser importante em termos narrativosé o espaço da fantasia. Seriamais fácil adaptar o texto para cinemapois aí temos o corte, a montagem,os saltos <strong>de</strong> elipse temporal e espacial.Em palco é mais fácil resolver os saltosno tempo do que no espaço. Comonão podíamos ter <strong>um</strong> elenco <strong>de</strong> 12cantores em vez <strong>de</strong> seis, tivemos <strong>de</strong>encontrar soluções musicais, dramatúrgicase <strong>de</strong> cena para conseguirmosque a mesma pessoa tenha tempo <strong>de</strong>andar aos saltos do espaço físico realpara o espaço imaginado.Como fez o tratamento musicaldas personagens?Usar a música para ajudar a caracterizaras personagens é <strong>um</strong> bom princípioque não morreu historicamente.Há materiais musicais recorrentes aolongo da ópera associados a situações,espaços e personagens. Por outro lado,nesta ópera <strong>um</strong>a personagem com<strong>de</strong>terminado tipo <strong>de</strong> comportamentopo<strong>de</strong> a certa altura passar a ser nãoessa pessoa mas outra que está a serimaginada pelo próprio ou por <strong>um</strong>outro passageiro. Temos, por exemplo,<strong>um</strong>a senhora <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> que tem<strong>um</strong> comportamento muito britânicoe convencional mas a dada alturatransforma-se n<strong>um</strong>a mulher que aolongo da vida andou a <strong>de</strong>struir obras<strong>de</strong> arte em museus e galerias sempreque via pinturas com mulheres nuas!Isso é muito engraçado, posso trabalharmusicalmente esse personagemdurante dois terços da ópera <strong>de</strong> <strong>um</strong>aforma e <strong>de</strong>pois mudar radicalmenteesse tratamento.Que outras histórias nos trazemos restantes passageiros?A primeira passageira a entrar na carruagemé Tula, <strong>um</strong>a rapariga bonitae ingénua, que leva <strong>um</strong> quadro <strong>de</strong>baixodo braço. Como ela traz esse quadromuitas das fantasias giram emtorno das artes plásticas, há <strong>um</strong>a fantasian<strong>um</strong> leilão, outra no atelier <strong>de</strong><strong>um</strong> pintor.Temos <strong>um</strong>a mulher <strong>de</strong> meia ida<strong>de</strong>que teve <strong>um</strong>a casamento falhado eanda à procura <strong>de</strong> <strong>um</strong>a realizaçãoafectiva que ainda não encontrou eque vai projectar noutra passageira,e a tal velhinha que é muito religiosae contida e que tem <strong>um</strong> problema porresolver com a representação do corponu e com a sexualida<strong>de</strong> em geral.Existe também <strong>um</strong> Padre com <strong>um</strong>afantasia <strong>de</strong> exorcismo, que imaginaque está a tirar o Diabo do corpo <strong>de</strong><strong>um</strong>a das passageiras enquanto lê <strong>um</strong>apassagem do Evangelho São Lucas emque se fala <strong>de</strong> porcos que estão possessose <strong>de</strong>pois se afogam...O Revisor é <strong>um</strong> indivíduo gingãocom <strong>um</strong>a fantasia <strong>de</strong>tectivesca — a <strong>de</strong><strong>de</strong>smascarar <strong>um</strong> noivo que passa avida a somar casamentos e apaixonapor mulheres que vê em catálogos <strong>de</strong>moda... — e o Howard, outro passageiro,é cínico, prepotente e dominador.Logo no início tenta convencer a jovemestudante <strong>de</strong> pintura a oferecerlheos seus favores sexuais em troca<strong>de</strong> projecção profissional, fazendo-sepassar por <strong>um</strong> curador <strong>de</strong> <strong>um</strong>a galeria<strong>de</strong> arte. Depois tenta projectar estafantasia <strong>de</strong> prepotência nos outrospassageiros e é muito engraçado porquelhe sai tudo trocado.É <strong>um</strong> compositor português,mas a ópera será cantada eminglês. A escolha da línguatem apenas a ver com anacionalida<strong>de</strong> do libretista ouhá outras razões?Várias vezes me perguntam se tenhoalg<strong>um</strong> problema com a língua portuguesaou com os autores portugueses.Não tenho problema nenh<strong>um</strong>, jáadaptei Camilo Pessanha, FernandoPessoa e vou fazer <strong>um</strong> projecto comAlmeida Faria. Não acho que seja maisou menos português pelo facto <strong>de</strong>trabalhar noutras línguas. Às vezeshá <strong>um</strong> certo bairrismo, <strong>um</strong> certo provincianismona forma como as pessoaslidam com estas questões. Sepensarmos no universo da músicacontemporânea nunca vejo ninguémlevantar esse problema quando ocompositor opta pelo alemão ou pelofrancês. Eu gosto muito do inglês cantado,mas neste caso mais importantedo que saber em que língua ia fazera ópera era encontrar o libretista. Calhouser inglês, se fosse espanhol fariaa ópera em castelhano. Também vejoa questão do ponto <strong>de</strong> vista do “métier”.Só me atrevo a escrever músicae adaptar textos em línguas que consigodominar musicalmente no planoda prosódia ou <strong>de</strong> aspectos como oENCENAÇÃO e REALIZAÇÃO VÍDEOJOÃO LOURENÇOMÚSICAMAZGANICENÁRIOANTÓNIO CASIMIROJOÃO LOURENÇOBERTOLT BRECHTESTRUTURA PATROCINADA PELOQUARTA A SÁBADO 21H30registo vocal e a cor. Teria dificulda<strong>de</strong>em fazer <strong>um</strong>a ópera em alemão.Além dos instr<strong>um</strong>entosacústicos recorre à electrónica,<strong>um</strong>a componente poucopresente noutros trabalhos...É <strong>um</strong>a área que nunca <strong>de</strong>senvolvi individualmente,embora tenha recorridoa ela em colaboração com colegasespecializados. Neste caso recorriao Carlos Caíres. Queria ter o apoioda electrónica não só como elemento<strong>de</strong> sonoplastia (em que pu<strong>de</strong>sse metersons <strong>de</strong> comboios, carris, apitos...),mas também para captar aorquestra em tempo real e interagircom ela através <strong>de</strong> software informático.É outra orquestra em cima daorquestra, outras fronteiras que po<strong>de</strong>mser ultrapassadas. Do ponto <strong>de</strong>vista da instr<strong>um</strong>entação acústica usomuita percussão, <strong>um</strong>a das característicasda minha linguagem em termos<strong>de</strong> <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> cor e <strong>de</strong> pulsação.Já fez outras incursões noteatro musical mas esta é a suaprimeira ópera. Colocou-lhe<strong>de</strong>safios diferentes?Se pensar na forma como trabalhei avoz h<strong>um</strong>ana nas composições dos últimosanos, as minhas opções estilísticasforam mais <strong>de</strong>finidas pelo texto doque pelo género que ia abordar. A primeirapeça que fiz que me começou apreparar para a ópera foi outra encomendada Culturgest, <strong>um</strong> projecto <strong>de</strong>homenagem aos gran<strong>de</strong>s bailados.Calhou-ne “Le Jeune Homme et laMort”, com texto do Cocteau, e na alturao António Pinto Ribeiro pediu-meque fosse <strong>um</strong>a homenagem puramentemusical, sem coreografia. Enviou-me<strong>um</strong> artigo que o Jean Cocteau tinha escritono dia a seguir à estreia e eu fiz<strong>um</strong> melodrama a partir <strong>de</strong>sse textousando <strong>um</strong> narrador. Depois fiz os“Contos Fanstáticos” e as “Evil Machines”,obra a meio caminho entre a ópera,o musical e a música para cinema.Sabia que esses trabalhos eram <strong>um</strong>aaprendizagem para <strong>um</strong>a futura ópera,mas não fiquei <strong>de</strong>masiado ansioso.Acho que os compositores não <strong>de</strong>vemter pressa para chegar à ópera.FIGURINOSBERNARDO MONTEIROCOREOGRAFIACLÁUDIA NÓVOASUPERVISÃO AUDIOVISUALAURÉLIO VASQUESLUZMELIM TEIXEIRA[ m/12 ]DOMINGO-MATINÉE 16H00VERSÃO JOÃO LOURENÇO | VERA SAN PAYO DE LEMOSDRAMATURGIA VERA SAN PAYO DE LEMOSCOMANTÓNIO PEDRO LIMA | CÁTIA RIBEIROCARLOS MALVAREZ | CRISTÓVÃO CAMPOSFRANCISCO PESTANA | JOÃO FERNANDEZLUIS BARROS | MAFALDA LENCASTREMAFALDA LUÍS DE CASTRO | MARTA DIASMIGUEL GUILHERME | MIGUEL TAPADASPATRÍCIA ANDRÉ | RUI MORISSONSARA CIPRIANO | SÉRGIO PRAIASOFIA DE PORTUGALVASCO SOUSAÍpsilon • Sexta-feira 17 Dezembro 2010 • 29

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