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Há um novo Alain Platel à nossa espera - Fonoteca Municipal de ...

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Com “Out of Context - for Pina” é <strong>um</strong>outro <strong>Alain</strong> <strong>Platel</strong> que se apresenta.Não há efeitos coreográficos vorazes,nem <strong>um</strong>a arqui-estrutura que esmaga.Não há sequer <strong>um</strong> fio que nos conduza.Mas há, como sempre, corposque parecem vir <strong>de</strong> <strong>um</strong> outro mundoe, por virem <strong>de</strong> longe, nos surpreen<strong>de</strong>mpelo modo como se relevam,intensos, presentes, inteiros.Longe das pesadas máquinas cénicasque nos últimos tempos nos trouxe– “Vsprs” (2006), a partir <strong>de</strong> “Vespro<strong>de</strong>lla Beata Vergine” <strong>de</strong> Monteverdi,ou “Pitié!” (2009), a partir da“Paixão segundo <strong>de</strong> São Mateus” <strong>de</strong>Bach –, e antes <strong>de</strong> regressar com “Gardénia”(18 e 19 Fevereiro 2011), divertimentoseríssimo e agridoce sobre otravestismo, eis <strong>um</strong>a peça que, emjeito <strong>de</strong> homenagem a Pina Bausch,se apresenta sem outro mistério quenão seja o do movimento.São corpos praticamente nus, embrulhadosem cobertores, que falampouco e, quando o fazem, citam ridículascanções <strong>de</strong> amor. São corposmudos, ou quase mudos, que usamo movimento não como matéria paraa acção, mas como a própria acção.E, por isso, mais do que corpos, sãoespectros que <strong>de</strong>ambulam n<strong>um</strong> palcovazio, imersos n<strong>um</strong>a paisagem sonorahipnotizante, à <strong>espera</strong> <strong>de</strong> nada. À<strong>espera</strong> <strong>de</strong> nós.<strong>Alain</strong> <strong>Platel</strong>, 51 anos, coreógrafoque se reiventou <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> mais <strong>de</strong>vinte anos à procura <strong>de</strong> <strong>um</strong>a or<strong>de</strong>mpara o seu movimento, fala-nos hoje<strong>de</strong> <strong>um</strong> lugar mais sereno, on<strong>de</strong> a urgênciatem mais a ver com o presentedo que com o futuro. E, por isso,quando o questionamos, a respostasó po<strong>de</strong> ser a <strong>de</strong> <strong>um</strong> homem tranquilo.E inquieto, porque tranquilo.Pina Bausch dizia que a alegadaliberda<strong>de</strong> característica do se<strong>um</strong>ovimento vinha do imensotrabalho que nele colocava.A mesma i<strong>de</strong>ia parece estarpresente nesta peça.Existe diferença entre o que se vê e oque se sente porque o que se vê é sempretestemunhado a partir <strong>de</strong> <strong>um</strong> ponto<strong>de</strong> vista diferente. Estamos a falar<strong>de</strong> processos sentimentais e emotivosque ultrapassam as estruturas daspróprias peças. Hoje acho que <strong>um</strong> dosgran<strong>de</strong>s objectivos da dança é conseguirser-se ambicioso nesse sentido eencontrar <strong>um</strong> modo diferente <strong>de</strong> comunicar.Era isso que acontecia entremim e Pina. Das várias vezes em queestivemos juntos nunca falámos <strong>de</strong>dança ou <strong>de</strong> arte no geral. Falávamos<strong>de</strong> outras coisas. E isso é <strong>um</strong>a forma<strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r o que ela dizia sobre omovimento ter que ser auto-sustentado.Ele não existe por si só.“Out of context - for Pina”explora <strong>um</strong>a tensão entre <strong>um</strong>movimento interior, pertencenteao tempo do intérprete, e <strong>um</strong>movimento colectivo, que surgea partir do confronto entrebailarinos e espectadores...Ouço-o e isso parece lógico, mas nãotinha pensado nisso assim. Não trabalhocom esse género <strong>de</strong> jogos, ascoisas acontecem e vamos <strong>de</strong>scobrindoao longo do processo o que queremosfazer. Claro que me interessaencontrar não <strong>um</strong>a nova forma, mas<strong>um</strong>a forma diferente <strong>de</strong> fazer o quefaço. Mas seria muito difícil conseguilose isso fosse <strong>um</strong>a estratégia.Trabalha mais por intuição doque estratégia?É verda<strong>de</strong> que neste projecto fui maisinsistente, do que em outros, em termos<strong>de</strong> objectivos a traçar. Tentei sermuito menos aberto a compromissos,ainda que goste muito <strong>de</strong>les, porqueexercem influências e po<strong>de</strong>m enriquecertodos os elementos envolvidosna peça. Mas aqui era muito mais“sim” ou “não”, e muito mais “não”do que “sim”.De qualquer forma, é tudo sempremuito mais profundo. Há <strong>um</strong> tempo<strong>de</strong> <strong>de</strong>scoberta, e por vezes não soucapaz <strong>de</strong> falar disso, porque quandoas coisas parecem novas não há muitaspalavras que as possam <strong>de</strong>screver.Talvez por isso, no meu percurso, alinguagem corporal se torne tão forte,porque encontra o seu próprio caminho,faz o seu trabalho.E daí se sentir este diálogoentre o balanço e <strong>de</strong>sequilíbrioque percorre toda a peça e,<strong>de</strong> certa forma, contamina opróprio corpo e movimento dosintérpretes.Acho que foi o [bailarino português]Romeu Runa que disse que em “Outof context” estamos a criar <strong>um</strong> contextoe isso foi muito engraçado <strong>de</strong><strong>de</strong>scobrir, porque não se po<strong>de</strong> estarfora <strong>de</strong> contexto. Há sempre <strong>um</strong> contextoà <strong>nossa</strong> <strong>espera</strong>.Aqui foi <strong>um</strong>a homenagem a PinaBausch?Apesar <strong>de</strong> ter estreado em Outubro<strong>de</strong> 2009 a peça não mudou <strong>de</strong>pois damorte <strong>de</strong>la [três meses antes] porquejá estava a trabalhar antes. Inclusivamenteo subtítulo [“for Pina”] <strong>de</strong>sapareceudurante os ensaios, porquenão queríamos criar <strong>um</strong>a pressão <strong>de</strong>snecessária.Era, sobretudo, <strong>um</strong> presentepara Pina, em resposta ao modosempre tão generoso com que ela serelacionava com os outros. Queriaque se fizessem referências ao trabalho<strong>de</strong>la, mas nunca pensámos n<strong>um</strong>ahomenagem.O que prevaleceu então?Neste formato foi muito fácil aceitarque as coisas acontecessem e <strong>de</strong>ixarque encontrassem o seu lugar. Havia<strong>um</strong>a pré-disposição para fazer estaviagem e, ao mesmo tempo, para perceberaté on<strong>de</strong> se po<strong>de</strong> esticar a corda,e que cordas po<strong>de</strong>m ser esticadas.Quando a peça começa, e para voltarà pergunta inicial, há <strong>um</strong> tempoque se instala e que é com<strong>um</strong> aos espectadorese aos intérpretes. Elesaparecem em palco, <strong>de</strong>spem-se, enrolam-sen<strong>um</strong> cobertor, levam tempoaté conquistarem o espaço. Tudo issopodia ser mais curto, mas se o fosseseria muito artificial, acho. Depoisdisso tudo é possível, porque essetempo da acção, que é <strong>um</strong> tempo real,aproxima os intérpretes do público,que percebe <strong>de</strong> on<strong>de</strong> é que elesvêm. Não há outro contexto, comoem “Pitié!”, on<strong>de</strong> os bailarinos e osmúsicos se relacionavam com a músicaou o tema da peça. Aqui perguntamo-nosquem são estas pessoas quechegam <strong>de</strong>sta forma, formando estamassa, através dos cobertores. Percebemosque estão preparados para<strong>um</strong>a viagem. E se esta vai <strong>de</strong> A a Z,em vez <strong>de</strong> A a B, isso é aparentementepossível. Claro que o meu trabalhoé fazer as ligações, iludindo gran<strong>de</strong>scontrastes. E isso é muito difícil, mastambém muito precioso.Estreada em2009, a peçaexplora <strong>um</strong>movimentomais livre,com menosefeitos.<strong>Alain</strong> <strong>Platel</strong>quis saber atéon<strong>de</strong> podiaesticar a cordaFRANS BROOD8 • Sexta-feira 17 Dezembro 2010 • Ípsilon

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