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última página<br />
Divulgação<br />
a árvore<br />
claudia penteado<br />
Ela voltou. Sempre foi controversa. Foi,<br />
possivelmente, na visão <strong>de</strong> muitos,<br />
mais vilã do que heroína. Ficou 20 anos<br />
tomando porrada, durante pelo menos 35<br />
dias dos 365 do ano. Entrou para a paisagem<br />
do Rio <strong>de</strong> Janeiro encantando uns, irritando<br />
outros. Em 2015, foi <strong>de</strong>rrubada por<br />
uma ventania, mas foi recuperada a tempo<br />
<strong>de</strong> completar seu vigésimo aniversário, patrocinada<br />
ininterruptamente pela Bra<strong>de</strong>sco<br />
Seguros. No ano seguinte, não voltou<br />
mais. Saiu <strong>de</strong> cena e sua ausência se transformou<br />
em símbolo da crise <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong>.<br />
Na era da polarização, do preto ou do<br />
branco, da ausência <strong>de</strong> tons<br />
<strong>de</strong> cinza, a Árvore da Lagoa<br />
ou é linda ou é foco <strong>de</strong> raiva,<br />
em especial <strong>de</strong> muitos<br />
moradores próximos, que<br />
não curtem o aumento do<br />
trânsito e as limitações <strong>de</strong><br />
vagas <strong>de</strong> estacionamento<br />
no dia a dia. Até grupos no<br />
Facebook em protesto à árvore foram formados,<br />
mas andaram esvaziados <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />
2016. Não moro por perto, e reconheço que,<br />
nos dias em que ela se acen<strong>de</strong> por volta das<br />
18h, a própria circulação a pé no entorno da<br />
Lagoa se torna um <strong>de</strong>safio. Corredores precisam<br />
correr <strong>de</strong> manhã, ciclistas precisam<br />
rever seus circuitos e, obviamente, motoristas<br />
precisam pensar duas vezes na hora<br />
<strong>de</strong> planejar suas passagens pelo local.<br />
A Árvore dA LAgoA<br />
é um símboLo<br />
<strong>de</strong> empAtiA, <strong>de</strong><br />
pertencimento,<br />
<strong>de</strong> toLerânciA<br />
O que ocorre, como sempre, é certa confusão<br />
entre público e privado, entre papel<br />
do po<strong>de</strong>r público e das empresas. Algumas<br />
pessoas acreditam que priorida<strong>de</strong> são obras<br />
no entorno da Lagoa, a segurança e assim<br />
por diante. Pesquisas mostram cada vez<br />
mais o quanto as pessoas esperam que empresas<br />
privadas resolvam seus problemas,<br />
já que o po<strong>de</strong>r público não resolve e anda<br />
cada vez mais <strong>de</strong>sacreditado. Investir numa<br />
árvore parece supérfluo diante <strong>de</strong> tantos<br />
problemas. Só que não. Po<strong>de</strong>mos ter a árvore,<br />
e <strong>de</strong>vemos também cobrar dos nossos<br />
governantes que resolvam os problemas da<br />
cida<strong>de</strong> - votando melhor, sendo melhores<br />
cidadãos e participando mais do dia a dia<br />
da política da cida<strong>de</strong> e do estado.<br />
Árvore da Lagoa é a maior árvore flutuante<br />
do mundo, feita por um time <strong>de</strong> craques<br />
como o Abel Gomes e não há uma tar<strong>de</strong><br />
quente <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro em que eu não vire<br />
o olhar ao passar por perto, nem que seja<br />
por alguns segundos, para procurar aquele<br />
objeto reluzente e pontiagudo no espelho<br />
d’água mais bonito do Rio. Embasbacada,<br />
pensando em como é possível que um ícone<br />
<strong>de</strong> Natal promova tanta discórdia e ao<br />
mesmo tempo alegre tanta gente. Gente<br />
que mora perto, e também<br />
muitos que saem <strong>de</strong> bairros<br />
distantes do Rio para<br />
ter aquela mesma visão que<br />
eu, comendo pipoca, milho<br />
e cachorro quente e ajudando<br />
a vida dos ven<strong>de</strong>dores<br />
ambulantes e quiosques<br />
naquele período. São centenas<br />
<strong>de</strong> famílias filmando, fotografando,<br />
curtindo, passeando e se apropriando daquele<br />
espaço e pensando “sim, esta cida<strong>de</strong><br />
também é minha, tem lugar pra mim e não<br />
custa uma fortuna”.<br />
A Árvore da Lagoa é um símbolo <strong>de</strong> empatia,<br />
<strong>de</strong> pertencimento, <strong>de</strong> tolerância. Há<br />
problemas na Lagoa que <strong>de</strong>vem ser resolvidos?<br />
Claro. E também em Copacabana,<br />
Queimados, na Penha, em Santa Cruz, em<br />
Bangu, em Realengo, na Taquara. A Árvore<br />
da Lagoa era uma bola quicando que a Petrobras<br />
Distribuidora resolveu pegar, marcando<br />
um golaço em termos <strong>de</strong> timing. Ela<br />
agora se chama Árvore do Rio Petrobras. A<br />
empresa está interessada em se associar a<br />
uma i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> resgate da autoestima da cida<strong>de</strong><br />
e dos cariocas. É um investimento em<br />
um propósito, que transcen<strong>de</strong> promoções<br />
em postos (embora elas também sejam importantes).<br />
Com a coragem <strong>de</strong> não ser uma<br />
unanimida<strong>de</strong>. Como não achar isso bacana?<br />
58 <strong>12</strong> <strong>de</strong> <strong>novembro</strong> <strong>de</strong> <strong>2018</strong> - jornal propmark