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EXAME Abril 2020

Nesta edição analisamos o impacto da crise provocada pelo Covid 19 a nível global, no continente africano e em Moçambique, recorrendo à opinião de diversos especialistas. Mas não só. Procuramos também opiniões de como sair dela. A secção Inovação apresenta um conjunto de iniciativas que se estão a desenvolver para o ataque a este vírus. E a resposta só pode vir da inovação.

Nesta edição analisamos o impacto da crise provocada pelo Covid 19 a nível global, no continente africano e em Moçambique, recorrendo à opinião de diversos especialistas. Mas não só. Procuramos também opiniões de como sair dela.
A secção Inovação apresenta um conjunto de iniciativas que se estão a desenvolver para o ataque a este vírus. E a resposta só pode vir da inovação.

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O surto de coronavírus está a alimentar uma reacção<br />

contra a globalização? Quais são as possíveis<br />

consequências?<br />

Estamos, de facto, a assistir a um recuo no processo<br />

de globalização, o qual já ocorre há algum tempo.<br />

É óbvio para todos que a propagação do vírus está<br />

ligada à mobilidade, e os esforços iniciais de contenção<br />

limitam a mobilidade, com proibições de<br />

viagens nos países e entre países. Com o surto, acredito<br />

que esse movimento antiglobalização se intensifique.<br />

Mas os principais efeitos no longo prazo<br />

estão principalmente relacionados com a psicologia<br />

política: a epidemia já gerou uma discussão sobre<br />

se pode ter sido causada pelos governos. Circulam<br />

rumores de que os chineses — ou, noutra versão, os<br />

norte-americanos — estão a utilizar a doença para<br />

enfraquecer ou destruir os seus rivais. Não acredito<br />

que exista base factual para nenhuma dessas<br />

reivindicações, mas, quanto mais o vírus se espalhar,<br />

mais interpretações estranhas proliferarão.<br />

Agora que o coronavírus ganhou proporções verdadeiramente<br />

globais, como analisa o momento<br />

actual?<br />

A fase mais aguda da crise destacou a extensão da<br />

competição entre sistemas políticos rivais. A China,<br />

com uma abordagem mais autoritária, pode lidar<br />

melhor com a pandemia? Portanto, a resposta mais<br />

emblemática para os regimes democráticos é a da<br />

Coreia do Sul.<br />

Outros países, nomeadamente a Itália, mas também<br />

o Reino Unido e os Estados Unidos, têm visivelmente<br />

falhado na tentativa de fornecer simples<br />

testes, os quais, é cada vez mais evidente, constituem<br />

uma ferramenta importante para gerir a contenção<br />

e o isolamento.<br />

A estratégia da China para conter o surto de coronavírus<br />

impôs um forte controlo sobre a sociedade,<br />

fechando cidades e colocando cidadãos em<br />

quarentena. O mundo passou a ver a China como<br />

um poder organizado para enfrentar qualquer<br />

tipo de crise ou continua a vê-la como o mesmo<br />

velho país comunista e autoritário?<br />

As evidências dos últimos dias sugerem que a<br />

China teve bastante sucesso em conter o avanço da<br />

doença. Os extensos controlos e o sistema de monitorização<br />

da população (que cruza dados do histórico<br />

de saúde do cidadão e verifica se há infectados<br />

entre os seus conhecimentos) são notavelmente<br />

sofisticados e bem-sucedidos. Se mesmo assim a<br />

China for seriamente atingida a longo prazo e se<br />

houver a percepção de que as autoridades não responderam<br />

adequadamente, não é irrealista prever<br />

desafios muito maiores para o regime e a sua legitimidade.<br />

Mas até agora, pelo menos, os controlos<br />

sociais da China parecem mais eficazes do que os<br />

sistemas de saúde bastante caóticos e visivelmente<br />

sobrecarregados de outros países. Isto quase certamente<br />

levará muitos outros países a quererem<br />

imitar a China — embora, provavelmente, não na<br />

Europa, onde há preocupações muito maiores com<br />

a privacidade. Mas espero que a crise produza um<br />

debate bastante amplo sobre a recolha (e a utilização<br />

e disseminação) de dados respeitantes à saúde<br />

e outros dados pelos governos.<br />

As contracções da actividade industrial na China<br />

estão a ser sentidas em todo o mundo, reflectindo<br />

o papel crescente da China nas cadeias de<br />

fornecimento e commodities. A China pode perder<br />

a participação no comércio global devido à<br />

crise de saúde pública?<br />

O efeito do vírus é perturbador, mas de curta duração.<br />

No entanto, muitos fabricantes terão consequências:<br />

com o receio de aumentar a probabilidade de<br />

eventos semelhantes no futuro não querem depender<br />

de cadeias de fornecimento longas e distantes.<br />

Os danos no turismo podem ser de longo prazo<br />

— imagino que muitas pessoas não desejem correr<br />

o risco de serem confinadas obrigatoriamente<br />

em navios de cruzeiro de alto risco. Mas os hotéis<br />

e companhias aéreas também podem sofrer um<br />

longo impacto, porque o vírus muda a percepção<br />

de longo prazo do que é um risco aceitável.<br />

Já antes da crise do coronavírus o Presidente<br />

Donald Trump exigia que as empresas multinacionais<br />

abandonassem a China e produzissem<br />

os seus produtos em fábricas norte-americanas.<br />

Este movimento aumentará e mais países<br />

adoptarão a mesma iniciativa?<br />

Sim, os argumentos para encurtar as cadeias de<br />

fornecimento já existiam antes de Trump — o que<br />

também representa as possibilidades tecnológicas<br />

de processos de produção difusos. Admito que a<br />

tendência prossiga e se intensifique.<br />

Espera que os políticos e partidos populistas<br />

dêem mais ênfase aos argumentos contra a<br />

imigração?<br />

Certamente farão esse apelo. Até que ponto é politicamente<br />

atraente e bem-sucedido? Isso dependerá<br />

da bondade, maior ou menor, do julgamento que<br />

se fizer sobre o modo como as autoridades geriram<br />

a crise. b<br />

abril <strong>2020</strong> | 43

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