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FAP - Benefício ou Sanção?<br />
24<br />
por Ênio De Biasi<br />
Para grande parte das empresas, o início<br />
de 2010 foi marcado por um aumento<br />
na carga tributária incidente sobre as contribuições<br />
previdenciárias, face à criação<br />
do Fator Acidentário de Prevenção – FAP.<br />
A majoração da carga impositiva veio,<br />
inicialmente, rotulada pela Previdência<br />
Social como um benefício fiscal que seria<br />
conc<strong>ed</strong>ido a determinadas atividades que<br />
diminuíram a quantidade de acidentes de<br />
trabalho. Em contrapartida, aquelas que<br />
não adotaram políticas ou mecanismos<br />
eficazes para r<strong>ed</strong>ução de acidentes, sofreriam<br />
uma “punição” m<strong>ed</strong>iante o aumento<br />
da contribuição previdenciária destinada à<br />
aposentadoria especial e aos demais benefícios<br />
conc<strong>ed</strong>idos em virtude do Grau de<br />
Incidência da Incapacidade Laborativa do<br />
Risco Ambiental do Trabalho – GILL/RAT –<br />
antigo Seguro Acidente do Trabalho – SAT,<br />
cuja previsão encontra-se no art. 22, inc. II,<br />
da Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991.<br />
Do ponto de vista social, a criação do<br />
FAP é espetacular! É o Estado criando instrumentos<br />
para proteger a vida e a saúde<br />
de muitos trabalhadores do nosso país.<br />
Entretanto, veremos a seguir que o FAP<br />
ultrapassa os limites da função social e<br />
torna-se um instrumento para aumentar a<br />
arrecadação aos cofres públicos.<br />
Como é sabido, o RAT é calculado m<strong>ed</strong>iante<br />
a aplicação da alíquota de 1%, 2% ou<br />
3% sobre o total das remunerações pagas<br />
ou cr<strong>ed</strong>itadas aos segurados (empregados<br />
e avulsos) em razão do risco - leve, médio<br />
ou grave – de acordo com a atividade laborativa<br />
preponderante da pessoa jurídica.<br />
O Fator Acidentário de Prevenção –<br />
FAP tem como base legal o artigo 10 da<br />
Lei 10.666/2003. O dispositivo estabelece<br />
que o Fisco, por meio de regulamento,<br />
pode dispor sobre a r<strong>ed</strong>ução ou majoração<br />
da alíquota destinada ao RAT.<br />
Neste panorama, o artigo 202-A do<br />
Decreto 3.048/1999 (alterações pelos<br />
Decretos 6.042/2007 e 6.957/2009), criou<br />
mecanismos para cálculo do FAP que consiste<br />
num multiplicador variável de 0,5000 a<br />
2,000 sobre as alíquotas do RAT e é composto<br />
pelos índices de frequência, gravidade e<br />
custo, cuja metodologia de implementação<br />
foi regulada nas Resoluções 1308/09<br />
e 1309/09, de competência do Conselho<br />
Nacional da Previdência Social – CNPS.<br />
A aferição do denominador para cada<br />
índice de frequência, gravidade e custo<br />
foi apurado pelo CNPS com base em seu<br />
banco de dados do período de abril de<br />
2007 a dezembro de 2008, m<strong>ed</strong>iante a verificação<br />
dos Registros de Comunicação<br />
de Acidentes de Trabalho – CAT, das concessões<br />
de benefícios acidentários, segundo<br />
o Nexo Técnico Epidemiológico<br />
Previdenciário – NTEP - além dos dados<br />
populacionais empregatícios constantes<br />
do Cadastro Nacional de Informações<br />
Sociais – CNIS, considerando o percentil<br />
de ordem para todas as pessoas jurídicas<br />
integrantes da mesma subclasse do CNAE.<br />
Todavia, em que pese a intenção de bonificação<br />
das empresas com menores índices<br />
de acidentalidade e que investiram em segurança<br />
e saúde do trabalho, o inusitado e complexo<br />
cálculo do FAP acabou por “generalizar<br />
e equiparar” todas as soci<strong>ed</strong>ades empresariais<br />
que integram a mesma subclasse do CNAE.<br />
Assim, a título exemplificativo, aquela<br />
empresa que implementou uma política<br />
preventiva de acidentes de trabalho e jamais<br />
teve um afastamento em seu quadro<br />
de funcionários é consideravelmente<br />
prejudicada por conta de outra empresa,<br />
componente de sua respectiva subclasse<br />
do CNAE, que nunca investiu em segurança<br />
e m<strong>ed</strong>icina do trabalho ou que manteve<br />
funcionários afastados em seu quadro.<br />
Além da falta de publicidade e transparência<br />
na apuração dos dados das empresas<br />
componentes de uma mesma subclasse<br />
do CNAE, a metodologia de cálculo do<br />
FAP imp<strong>ed</strong>e, efetivamente, que a empresa<br />
com índice zero de acidente possa ser beneficiada<br />
com a r<strong>ed</strong>ução inicialmente proposta<br />
no art. 10 da Lei 10.666/2003, que é<br />
de 50% da contribuição destinada ao RAT.<br />
Dentre outros pontos, é de se lamentar<br />
que a metodologia de cálculo do FAP englobe<br />
os acidentes de trajeto ocasionados<br />
durante o percurso do trabalhador à empresa<br />
e os decorrentes de culpa exclusiva do<br />
empregado (negligência, imprudência ou<br />
imperícia). Ora, não é justo ou razoável que a<br />
empresa seja punida por conta de acidentes<br />
que escapam por completo de seu controle.<br />
Em verdade, segundo estudo pormenorizado<br />
elaborado pela Conf<strong>ed</strong>eração<br />
Nacional das Indústrias – CNI – pelo menos<br />
60% das empresas que pagam o RAT<br />
não tem casos de acidentes ou doenças<br />
ocupacionais e pelo menos 85% não gerou<br />
qualquer custo à Previdência.<br />
Também é curioso o fato de as empresas<br />
optantes pelo SIMPLES estarem livres<br />
da aplicação do indexador FAP à alíquota<br />
do RAT, o que representa notória violação<br />
ao primado da isonomia.<br />
Pode-se afirmar que o enquadramento<br />
do grau de risco acidentário com<br />
fundamento na subclasse do CNAE da<br />
atividade econômica está em evidente<br />
descompasso com as manifestações do<br />
Poder Judiciário, notadamente a orientação<br />
do Superior Tribunal de Justiça que<br />
já sumulou o entendimento de que a alíquota<br />
do SAT deve ser estabelecida consoante<br />
a atividade desenvolvida em cada<br />
estabelecimento da empresa, de forma<br />
individualizada por meio de seu CNPJ.<br />
No apagar das luzes de 2009, o<br />
Ministério da Previdência divulgou, por<br />
meio da Portaria Interministerial n. <strong>32</strong>9,<br />
de 10 de dezembro de 2009, que o recurso<br />
administrativo cabível em face<br />
da metodologia aplicada ao cálculo do<br />
FAP deveria ser entregue no prazo de<br />
30 dias ao Departamento de Políticas<br />
de Saúde e Segurança Ocupacional em<br />
Brasília. Contrariamente à regra geral, a<br />
indigitada Portaria v<strong>ed</strong>ou a atribuição<br />
de efeito suspensivo à contestação e<br />
estabeleceu que a decisão proferida<br />
pelo órgão tem caráter definitivo, ou<br />
seja, é irrecorrível.<br />
Mesmo que a empresa tenha contestado<br />
administrativamente, a partir de janeiro<br />
de 2010, o recolhimento do RAT ajustado<br />
pelo indexador do FAP será obrigatório.<br />
Desta forma, resta-nos apenas o Poder<br />
Judiciário para evitar o recolhimento a maior!<br />
Entendemos que os contribuintes possuem<br />
elementos suficientes para discussão<br />
da inconstitucionalidade e ilegalidade<br />
do aumento do RAT, já que a aplicação<br />
do indexador FAP, ensejou efetivo aumento<br />
da carga tributária, implementado,<br />
abusivamente por meio de Resoluções e<br />
Decretos, totalmente em descompasso<br />
com o princípio da legalidade disposto no<br />
art. 150, inc. I, da Constituição F<strong>ed</strong>eral.<br />
Enfim, a intenção inicial das alterações<br />
promovidas nestas contribuições, a princípio<br />
voltadas ao fomento da diminuição<br />
dos acidentes de trabalho, em verdade,<br />
revelaram um evidente intuito arrecadatório,<br />
que majorou, de forma acachapante,<br />
a carga tributária da grande maioria<br />
das empresas. Não se perdendo de vista<br />
o ano eleitoral em que foi implementada,<br />
torna-se notória, e deve assolar o Poder<br />
Judiciário de novas ações para discutir a<br />
majoração na alíquota efetivamente recolhida<br />
pelas empresas destinadas ao Risco<br />
Ambiental do Trabalho – RAT (antigo SAT).