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Sonia Bloomfield<br />
VISÃO JUDAICA agosto de 2007 Elul 5767 / Tishrei 5768<br />
Terrorismo: o que devemos saber<br />
Sonia Bloomfield *<br />
o dia 15 de agosto a televisão<br />
norte-americana noticiou<br />
que o Departamento<br />
de Polícia da cidade de<br />
Nova York divulgou um relatório<br />
que mostra que a idade<br />
média dos jovens islâmicos<br />
que se radicalizam está cada vez<br />
mais baixa. O fenômeno não é apenas<br />
americano, o mesmo acontece na<br />
Europa, no Canadá, Austrália, no<br />
Oriente Médio, etc.<br />
Mas, afinal, o que significa a radicalização<br />
de um jovem islâmico?<br />
Vamos por etapas. Em primeiro lugar,<br />
devemos ter em mente que nem<br />
sempre a radicalização religiosa desemboca<br />
na criação de um terrorista.<br />
Muitos radicais são apenas estudiosos<br />
e seguidores estritos do<br />
islã em suas vidas pessoais, isolando-se<br />
da sociedade ocidental envolvente,<br />
mas existem aqueles outros<br />
que enveredam pelos caminhos do<br />
terrorismo. É sobre estes últimos que<br />
iremos escrever.<br />
A radicalização toma muitas formas,<br />
levando à questão “o que é “radicalizar”?<br />
Na botânica, radicalização<br />
quer dizer: ”porção do eixo das<br />
plantas superiores que cresce para baixo,<br />
em geral dentro do solo, e cuja<br />
função fundamental é fixar o organismo<br />
vegetal e retirar do substrato os<br />
nutrientes e a água necessários à vida<br />
da planta”. Usando esta definição<br />
como analogia, podemos dizer que<br />
estes jovens buscam dentro do substrato<br />
que sustenta o islã o que há de<br />
mais extremo para “fixá-los” e “alimentá-los”,<br />
criando uma identidade<br />
islâmica, em oposição à ocidental,<br />
nutrida e fixada por valores básicos<br />
do islã extremista.<br />
Quais são os valores básicos do<br />
islã? Eles são cinco, “os 5 pilares do<br />
islã”: (1) O primeiro é a crença em<br />
um D-us único; (2) obrigação de rezar<br />
as cinco orações diárias prescritas;<br />
(3) jejuar no mês de Ramadan;<br />
(4) fazer caridade; e (5) fazer pelo<br />
menos uma peregrinação a Meca durante<br />
sua vida. As pessoas, os povos,<br />
que se unem na observância dos<br />
pilares do islamismo formam o que<br />
se denomina “Umma”, que significa<br />
comunidade. A “Umma” é a base do<br />
“Da’ar el-islam”, casa do islã, que existe<br />
em oposição ao “Da’ar el-harb”, o<br />
mundo da guerra, o mundo dos nãoislâmicos.<br />
É no confronto entre os<br />
dois mundos que encontramos a<br />
idéia de “Jihad”, a guerra santa”.<br />
O que é a “Jihad”? A Jihad é uma<br />
luta, interna e externa: A luta interna<br />
é contra as más inclinações de<br />
pessoais, e a externa é contra o “Da’ar<br />
el-harb”, o mundo da guerra, um<br />
mundo que deve ser derrotado pelo<br />
“Da’ar el-islam”, seja através da conversão<br />
de seus membros ao islã, seja<br />
por sua eliminação física. É a busca<br />
do fim-dos-tempos, o retorno glorioso<br />
ao Califado através da Jihad, que<br />
cria atos de terrorismo islâmico.<br />
Até a segunda metade do século<br />
20, o mundo conhecia um tipo tradicional<br />
de terrorismo, aquele que<br />
buscava derrubar um governo ou alterar<br />
alguma política de cunho social,<br />
como ainda fazem os Tigres de<br />
Tamil, as Farc, e outros grupos revolucionários.<br />
Nas últimas décadas<br />
do século passado, o mundo viu<br />
surgir uma nova forma de terrorismo,<br />
especificamente islâmico, que<br />
é denominado “terrorismo aleatório”,<br />
que não tem mais o objetivo<br />
de mudar um governo por outro, que<br />
ataca principalmente a população<br />
civil, e que tem como objetivo chamar<br />
a atenção para uma demanda<br />
particular, criando pressão e medo<br />
na opinião pública.<br />
No século 21, culminando no<br />
atentado de 11 de setembro de<br />
2001, aparece em cena o “terrorismo<br />
pós-moderno”, aquele que ataca<br />
civis em grande escala, e busca uma<br />
mudança da realidade através de<br />
sua destruição. É um tipo não-convencional,<br />
que também usa, e usará<br />
cada vez em maior escala, armas químicas,<br />
biológicas e nucleares, e que<br />
se utiliza cada vez mais dos meios<br />
de comunicação de massa para gerar<br />
medo e divulgar sua mensagem, e que<br />
também usa a internet para recrutar<br />
e treinar novos aderentes. No momento,<br />
esta luta desenvolve-se principalmente<br />
dentro do mundo islâmico,<br />
através de tentativas de desestabilizar<br />
e derrubar os governos do<br />
Egito, Arábia Saudita, Iraque, Jordânia,<br />
etc., mas ela não busca apenas<br />
derrubar governos, mas sim outros<br />
valores civilizacionais, principalmente<br />
a ocidental, através da<br />
destruição do “Da’ar el-harb” que os<br />
ameaça culturalmente ao pregar uma<br />
sociedade civil dissociada do componente<br />
religioso tradicional.<br />
O terrorismo necessita de dois<br />
fatores para existir: (1) a motivação<br />
e (2) os meios necessários para<br />
implementá-lo. Esta é a razão pela<br />
qual este artigo começou com a referência<br />
aos jovens, cada vez mais<br />
jovens, que aderem a uma linha radical<br />
do islã, que cria neles a motivação.<br />
Mas a motivação sem os<br />
meios não permite a existência do<br />
terrorismo, e é com a motivação que<br />
a semente é plantada. Os meios são<br />
vários, tais como o apoio econômico,<br />
político, militar, ideológico,<br />
e operacional de governos, como a<br />
Arábia Saudita e o Irã entre outros,<br />
de indústrias, negócios, e doações<br />
(da’wa, i.e. caridade) magnatas e<br />
pessoas comuns, etc.<br />
Nem todos os países definem o<br />
terrorismo da mesma maneira, o que<br />
torna difícil atacá-lo de forma global.<br />
No entanto, de acordo com o<br />
dr. Boaz Ganor, diretor do Instituto<br />
de Contra-Terrorismo, em Israel, “o<br />
terrorismo é o uso intencional, ou<br />
ameaça, de violência contra civis para<br />
alcançar objetivos políticos. Ele é uma<br />
tática, não um objetivo em si, que usa<br />
a violência para atacar populações civis.<br />
O terrorista não é um criminoso<br />
comum, ele é um criminoso de guerra.<br />
Ele pode ser aquele que perpetra<br />
um ataque, aquele que ajuda na logística,<br />
aquele que financia, e aquele<br />
que o acolhe”.<br />
O modus-operandi da Jihad global<br />
é desenvolvido através de comunidades<br />
islâmicas em todo o<br />
mundo, e também através da mídia<br />
e do uso do ciberespaço, ou seja,<br />
contato direto e contato virtual. A<br />
estratégia é a de cooptar mentes e<br />
corações das populações islâmicas,<br />
principalmente entre os jovens,<br />
através da identificação e uso de<br />
um sentimento de discriminação<br />
para criar a motivação. É oferecida<br />
uma nova identidade, “superior” às<br />
demais, com sentido de pertinência<br />
à Umma, alterando o status de<br />
seus membros de minorias a maioria.<br />
De acordo com o dr. Ganor, 99%<br />
das pessoas atingidas pela propaganda<br />
não estarão interessadas ou<br />
prontas a integrar-se à Jihad global,<br />
mas há 1% com as características<br />
específicas procuradas pelas organizações<br />
terroristas, e dentre eles<br />
sairão vários tipos de agentes do<br />
terror. Dentre o 1% de pessoas que<br />
se envolvem diretamente em ataques<br />
terroristas, encontram-se dois tipos:<br />
(1) aqueles que agem por iniciativa<br />
pessoal, muitas vezes sem o<br />
conhecimento da organização da<br />
qual fazem parte, e (2) aqueles que<br />
agem como parte de ataques organizados<br />
por uma organização terrorista<br />
específica ou de seus elementos<br />
“terceirizados”.<br />
A identidade criada pela Jihad<br />
global baseia-se em vários elementos:<br />
(1) na glorificação da história<br />
do islã (da época do Califado), (2)<br />
na apresentação de soluções extremas,<br />
onde o bem (islã) e o mal (nãoislã)<br />
são absolutos; (3) através da<br />
criação de um inimigo comum, por<br />
intermédio de teorias de conspiração<br />
(por isto os “Protocolos” são<br />
tão divulgados no mundo islâmico),<br />
(4) alimentando o sentimento de<br />
humilhação islâmica frente ao Ocidente,<br />
e a conseqüente necessidade<br />
de vingança (a honra é um conceito<br />
básico para entender-se o<br />
islã), (5) na ênfase sobre a obrigação<br />
religiosa, um comando divino,<br />
para a Jihad, e (6) através da indução<br />
de um senso de urgência para<br />
salvar o islã antes que ele seja destruído<br />
pelo “grande” (EUA) e pelo<br />
“pequeno” (Israel) satãs.<br />
Desta maneira, mais e mais pessoas,<br />
principalmente jovens influenciáveis,<br />
são atraídas ao extremismo<br />
islâmico, tornando-se terroristas em<br />
potencial, e o fato de serem cada vez<br />
mais jovens mostra o quão são facilmente<br />
influenciáveis pela propaganda<br />
da Jihad global. O mundo ocidental<br />
tem uma visão de infância e juventude<br />
muito diferenciada da do<br />
islã radical, e não está preparado para<br />
lidar com o que os especialistas indicam<br />
será a próxima onda de terror:<br />
o uso de crianças e adolescentes<br />
em ataques.<br />
Nenhum país ou área do globo<br />
estará isento. Por isto, é importante<br />
que aprendamos cada vez mais<br />
sobre o fenômeno do terror para que<br />
possamos tentar neutralizá-lo.<br />
* Sonia Bloomfield é licenciada em Geografia, mestre e pH.D. em<br />
Antropologia e professora da Universidade de Brasília. Foi a primeira<br />
brasileira a participar do Programa Executivo dos Estudos Contra-<br />
Terroristas, do Institute for Counter-Terrorism em Herzliya, Israel, entre 1º a<br />
20 de julho de 2007. Do curso participaram muitos estudantes de Relações<br />
Internacionais, mas a maioria era composta de pessoas de alta patente nos<br />
serviços de inteligência (contra-espionagem) das polícias e de forças<br />
armadas de Israel, Espanha, El salvador, Austrália, Alemanha, Estônia,<br />
Polônia, EUA, Turquia, etc. Bloomfield sugeriu a oferta do curso em<br />
espanhol, ou português, mas há falta de pessoal adequado que saiba estas<br />
línguas. Para contatos com o Instituto, escrever para ctstudies@idc.ac.il, e<br />
com a autora para sonia_bloomfield@yahoo.com