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Escritoras Mineiras: Poesia, Ficção e Memória - FALE - UFMG

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Desde cedo começou a escrever resenhas de livros para o jornal de<br />

sua cidade, já demonstrando também interesse pela crítica, enquanto sua<br />

paixão pela literatura e desejo de ser escritora amadureciam. Através da<br />

poesia de Altino Caixeta de Castro, um poeta de Patos de Minas, foi introduzida<br />

no mundo poético de Octavio Paz, Rilke, Baudelaire, entre outros.<br />

Na prosa, Maria Esther destaca Gustave Flaubert, Jorge Luis Borges, Italo<br />

Calvino e Clarice Lispector como seus preferidos.<br />

A poesia de Maria Esther tem, como uma de suas marcas, certa<br />

subjetividade oblíqua que consiste no jogo de aparecimento e desaparecimento<br />

de um “eu”. Em entrevista concedida a Floriano Martins para o<br />

Jornal Rascunho, ela afirma que:<br />

106 Estilo, poética e vida<br />

esse exercício da primeira pessoa não está a serviço da confissão<br />

ou de um pacto com a autobiografia. É, antes, uma subjetividade<br />

povoada de vários “eus”: os que me constituem, os que imagino e<br />

os que forjo a partir da relação com o outro, os outros. 1<br />

A subjetividade, a concisão, o despojamento da linguagem e o<br />

ritmo melódico são também marcas da poética de Maria Esther, cujo<br />

estilo literário está sempre em construção, e no decorrer do tempo toma<br />

dicções diferentes.<br />

Maria Esther aponta que suas referências teóricas e poéticas não<br />

se limitam ao cânone formalista, porém, há momentos de sua trajetória<br />

que ela identifica a essa vertente. Sua referência na criação poética se<br />

insere na lógica do paradoxo, do experimentalismo, do lógos e do pathos,<br />

da lucidez e da vertigem, práticas bastante visíveis em sua escrita.<br />

Quanto à estética de sua atual produção poética, ela afirma:<br />

Hoje, estou cada vez mais tendendo ao exercício de uma poesia livre<br />

de coerções teóricas e racionais. Tento me desvencilhar da tirania<br />

da metalinguagem e da intertextualidade – práticas já exauridas,<br />

debilitadas – e buscar outras possibilidades poéticas para o meu<br />

trabalho, abrir-me às impurezas da experiência, à força do trágico<br />

e ao êxtase do sublime. 2<br />

A poeta faz parte de uma poderosa lista de escritoras mineiras que<br />

trabalham em conjunto o ensaísmo, a poesia, a psicanálise, a ficção e a<br />

teoria literária. Com relação ao exercício do magistério e o de ser escritora,<br />

1 MACIEL. Entrevista concedida a Floriano Martins.<br />

2 MACIEL. Entrevista concedida a Luiz Alberto Machado.<br />

Maria Esther confessa que são duas práticas que caminham juntas. Não<br />

vê uma separação, pois o trabalho acadêmico ajuda a pensar algumas<br />

estratégias de escrita, enquanto a abertura à criatividade contribui no<br />

espaço acadêmico à medida que uma ilumina a outra.<br />

Dentre seus trabalhos, gostaria de ressaltar três obras em particular:<br />

Dos haveres do corpo, publicado em 1984; Triz, publicado em 1998; e O<br />

livro de Zenóbia, publicado em 2004.<br />

Em seu primeiro livro de poesia, Dos haveres do corpo, de 1984,<br />

aborda o tema do corpo e seus possíveis mistérios, provocando um certo<br />

espanto nos leitores e na crítica de então. E não era para menos. A delicadeza<br />

erótica de certas imagens, a habilidade com que a jovem poeta<br />

dispunha o jogo amoroso, e o seu domínio da linguagem, que ao mesmo<br />

tempo revelava e encobria os mistérios do ser, evidenciaram para todos<br />

que ali estava uma autêntica vocação literária. Segundo Maria Esther, esse<br />

foi um livro “organizado à luz de alguns excertos do livro Fragmentos de<br />

um discurso amoroso, de Roland Barthes”. 3<br />

Em Triz, de 1998, por exemplo, a linguagem poética surge ainda<br />

mais elaborada e densa. A figura do pai recentemente falecido é homenageada<br />

no livro, especialmente nos poemas agrupados em “Ponto de fuga”.<br />

O uso de um poema visual, na metade do livro, não fez da morte do pai<br />

um sentimentalismo na poesia. Maria Esther encontrou uma escrita nas<br />

tiras de papel do eletrocardiograma de seu pai e explorou esse tipo de<br />

linguagem. Ela traça o pai em linhas de um texto-eletrocardiograma que<br />

ao final compõe-se em um todo pela fala da filha, que termina por realizar<br />

um inusitado diálogo com os poemas que aí estão:<br />

O coração do pai fala<br />

O coração do pai falha<br />

O coração do pai cala<br />

O coração do pai pára<br />

O coração do pai<br />

a limpo o coração<br />

da filha que fala<br />

passa<br />

por um fio. 4<br />

3 MACIEL. Entrevista concedida a Luiz Alberto Machado.<br />

4 MACIEL. Triz, p. 43.<br />

107

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