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Epigenética e nutrição - Nestlé

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Publicação destinada aos Profissionais de Saúde • ano 5 • nº 13 • janeiro 2011 • São Paulo • ISSN 2176-8463<br />

<strong>Epigenética</strong> e<br />

13<br />

Escolhas que influenciam nossos genes<br />

<strong>nutrição</strong><br />

e os genes de nossos filhos também<br />

Nutrição e disfagia em idosos hospitalizados primeiro consenso brasileiro<br />

Flores comestíveis beleza, simbolismo e <strong>nutrição</strong><br />

Vegetable Orchestra de Viena música universal de sabor local


Presidente da <strong>Nestlé</strong> Brasil<br />

nestlé Ivan F. Zurita<br />

editorial<br />

Macroeconomia, pesquisa e<br />

<strong>nutrição</strong> personalizada<br />

A crise econômica que vivemos atualmente expõe, cada vez mais, as fraturas do enorme e crescente endividamento<br />

público de governos em todo o mundo.<br />

Ao mesmo tempo, desloca parcialmente do centro das atenções um problema de proporções ainda maiores relacionado<br />

com o envelhecimento da população e os custos decorrentes de pensões e do sistema de saúde.<br />

Atualmente, doenças crônicas como diabetes, obesidade, Alzheimer e cardiovasculares são responsáveis por 60%<br />

de todos os óbitos no mundo, com uma projeção de aumento de 17% nos próximos anos. E, segundo dados recentes<br />

da consultoria PricewaterhouseCoopers, 3% de todo o Produto Interno Bruto (PIB) do mundo já é perdido em<br />

consequência delas.<br />

Levando tudo isso em consideração, nos parece evidente que a estratégia atual de cuidado à saude, concentrada<br />

em tratar indivíduos doentes, não é sustentável e terá de ser redesenhada drasticamente.<br />

É nossa convicção, na <strong>Nestlé</strong>, que a prevenção deverá desempenhar um papel muito maior e, nesse sentido, investimento<br />

em <strong>nutrição</strong> personalizada será o primeiro e mais eficiente passo para uma política de prevenção ativa<br />

que contribua para a saúde e o bem-estar.<br />

Respondendo a este cenário, a <strong>Nestlé</strong> inaugurou, no dia primeiro de janeiro de 2011, na Suíça, o <strong>Nestlé</strong> Institute<br />

of Health Sciences e a <strong>Nestlé</strong> Health Science Company — com o objetivo de melhor investigar mecanismos envolvidos<br />

com doenças crônicas em nível molecular e, a partir desse conhecimento, conceber estratégias e produtos<br />

nutricionais para a prevenção dessas doenças.<br />

Nesta edição da <strong>Nestlé</strong>.Bio, a nossa matéria de Capa sobre o excitante novo ramo da epigenética traz pistas concretas<br />

sobre como a <strong>nutrição</strong> pode contribuir para a prevenção de doenças crônicas que hoje representam um fardo<br />

insustentável para os sistemas da saúde de todo o mundo. E de que forma a <strong>Nestlé</strong> pode contribuir para isso.<br />

A todos, uma boa leitura!<br />

Direção Editorial: Ivan F. Zurita, Izael Sinem Jr. e Célia Suzuki<br />

Consultor Editorial: Claudio Galperin<br />

Conselho Consultivo: Pedro Simão<br />

Colaboradores: Juliana Lofrese, Maria Helena Sato, Fernanda Tartarella, Marie-Françoise Rütimeyer, Roberta Portes<br />

Editor: Claudio Galperin Jornalista-responsável: MTb 12.834 Assistente Editorial: Maria Fernanda Elias Llanos Assistente de Redação: Betina Galperin<br />

Edição de Arte, Produção Gráfica e Pré-Media: D’Lippi Design+Print — (11) 3031.2900 — www.dlippi.com.br Edição de Arte: Paulo Primati<br />

Arte-final: Ricardo Lugo Fotografia: Fernanda Preto e Shutterstock Ilustração: Gustavo Rodrigues Capa: Shutterstock Revisão: Eliete Soares<br />

Impressão: Nova Página Tiragem: 40.000 exemplares<br />

A revista <strong>Nestlé</strong>.Bio é um produto informativo da <strong>Nestlé</strong> Brasil destinado a promover pesquisas e práticas no campo da ciência da <strong>nutrição</strong> realizadas no país e no exterior, sob os cuidados de um criterioso processo editorial.<br />

Alinhada ao histórico papel da <strong>Nestlé</strong> no apoio à difusão da informação científica, a revista abre espaço para a diversidade de opiniões, que consideramos ser essencial para o intercâmbio de ideias e conceitos inovadores.<br />

As declarações expressas na revista não refletem necessariamente o posicionamento institucional da companhia com relação aos temas tratados.


intercâmbio nestlé<br />

Sou professor da Universidade Federal<br />

de São Paulo (Unifesp-Santos) e<br />

realizo pesquisas na área de atividade<br />

física, alimento e saúde. Fiquei<br />

muito contente com a qualidade da<br />

<strong>Nestlé</strong>.Bio e recebê-la será de grande<br />

relevância às discussões e ao ensino<br />

dentro da Universidade.<br />

Prof. Dr. José Rodrigo Pauli,<br />

Departamento de Biociências,<br />

Unifesp, Santos. Santos-SP.<br />

Sou nutricionista e adoro a <strong>Nestlé</strong>.Bio.<br />

Ela me ajuda muito quando o assunto<br />

é atualização. Meus alunos gostam<br />

bastante também.<br />

Bruna de Andrade Braga, Faculdade<br />

de Tecnologia e Ciências-Câmpus<br />

de Vitória da Conquista. Vitória da<br />

Conquista, BA.<br />

Gostaria de parabenizá-los pelas edições<br />

da revista <strong>Nestlé</strong>.Bio. Todas as<br />

matérias têm contribuído para a minha<br />

atualização profisisonal.<br />

Profa. Msc. Juliany Piazzon Gomes.<br />

Universidade Tecnológica Federal do<br />

Paraná-UTFPR. Londrina-PR<br />

Sou enfermeiro e tenho certeza de que,<br />

com o acesso aos artigos e reportagens<br />

da <strong>Nestlé</strong>.Bio, poderei aprimorar<br />

meus conhecimentos e colaborar para<br />

a melhora da qualidade de vida dos pacientes<br />

com quem trabalho. Parabéns<br />

pela qualidade e confiabilidade.<br />

Leone Ricardo Vargas Pinto.<br />

Porto Alegre-RS<br />

Aguardamos seus comentários<br />

e sugestões para o e-mail<br />

nestlebio@nestle.com.br ou para a<br />

caixa postal 11.177, CEP 05422-970,<br />

São Paulo (SP), com seu nome<br />

completo, registro profissional, local de<br />

trabalho e cidade de origem.<br />

04<br />

palavra<br />

A nutricionista Myrian Najas,<br />

coordenadora-geral do<br />

I Consenso de Nutrição e Disfagia<br />

em Idosos Hospitalizados, fala<br />

sobre os principais aspectos e<br />

desafios do projeto.<br />

10<br />

calendário<br />

Confira os próximos encontros,<br />

congressos e simpósios voltados<br />

para temas ligados à <strong>nutrição</strong>.<br />

11<br />

ponto de vista<br />

Acadêmicos de Universidades<br />

do Rio Grande do Sul discutem<br />

possíveis associações entre<br />

consumo e reserva de ferro com<br />

dano ao DNA.<br />

12<br />

foco<br />

A beleza, o simbolismo<br />

e a biologia das flores<br />

comestíveis, que ganham, a<br />

cada dia, mais espaço no prato.<br />

18<br />

capa<br />

<strong>Epigenética</strong>: como a alimentação<br />

e outras influências do meio<br />

ambiente podem promover<br />

mudanças funcionais em nosso<br />

genoma e serem herdadas por<br />

nossos descendentes.<br />

24<br />

<strong>nutrição</strong> e cultura<br />

A Vegetable Orchestra de<br />

Viena completa 12 anos, colhe<br />

instrumentos em feiras locais e<br />

reconhecimento global.<br />

29<br />

dossiê bio<br />

As nutricionistas Flavia Baria e<br />

Lilian Cuppari publicam a segunda<br />

parte do artigo Terapia Nutricional<br />

na doença renal crônica.<br />

35<br />

qualidade<br />

Desenvolvido pela <strong>Nestlé</strong>,<br />

Resource® Thicken Up é um<br />

produto que auxilia o tratamento<br />

nutricional de pacientes<br />

disfágicos, permitindo uma<br />

deglutição mais segura<br />

e minimizando os riscos<br />

de aspiração.<br />

A partir desta edição, será<br />

38<br />

resultado<br />

Instituto Girassol: pesquisa,<br />

educação e assistência jurídica<br />

para portadores de necessidades<br />

nutricionais específicas.<br />

42<br />

ÍNDICE<br />

possível navegar por conteúdos<br />

extras, disponíveis online.<br />

Procure o ícone<br />

Ele indicará o caminho para<br />

vídeos, podcasts e documentos<br />

que transformarão sua leitura em<br />

uma experiência mais rica ainda.<br />

sabor e saúde<br />

Sagrada para as civilizações<br />

Inca e Pré-inca, a quinoa é<br />

um dos alimentos mais<br />

completos e balanceados para<br />

o consumo humano.


4 palavra


I Consenso Brasileiro de<br />

Nutrição e Disfagia em Idosos<br />

Hospitalizados<br />

A disfagia é definida<br />

como qualquer<br />

dificuldade na efetiva<br />

condução do alimento,<br />

da boca até o estômago,<br />

por meio das fases que<br />

se inter-relacionam,<br />

comandadas por um<br />

complexo mecanismo<br />

neuromotor [1] .<br />

palavra<br />

entrevista_Maria Fernanda Elias Llanos<br />

https://www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/<br />

O distúrbio pode ser decorrente de acidente vascular encefálico (AVE), doenças<br />

neuromusculares degenerativas, demências, encefalopatias e traumas ou cânceres<br />

de cabeça e pescoço [2].<br />

Segundo estatísticas mundiais, a disfagia orofaríngea atinge 60% dos idosos acometidos<br />

por doenças degenerativas. Nos casos de sequelas decorrentes de acidente<br />

vascular cerebral (AVC), a prevalência oscila entre 30% e 50% [3,4].<br />

Via de regra, a dificuldade para deglutir determina perda da satisfação em comer.<br />

Pode resultar, ainda, na entrada de alimento pela traqueia, causando tosse, asfixia<br />

e, até mesmo, pneumonia por aspiração [4].<br />

De maneira geral, a disfagia está diretamente associada a um comprometimento<br />

das condições nutricionais e de hidratação [4]. Isso é particularmente relevante<br />

em indivíduos idosos, para os quais é inequívoca a importância da alimentação na<br />

evolução das principais doenças que os acometem [5].<br />

Identificar pacientes em risco de des<strong>nutrição</strong> e intervir de maneira adequada e<br />

precoce requer uma equipe multidisciplinar de médicos, nutricionistas e fonoaudiólogos.<br />

Tal prática é fundamental para prevenir complicações e, também, proporcionar<br />

um envelhecimento o mais ativo possível [6].


6 palavra<br />

Com o objetivo de padronizar condutas de avaliação<br />

e tratamento, a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia<br />

(SBGG), em parceria com a <strong>Nestlé</strong>, produziu<br />

este ano o I Consenso de Nutrição e Disfagia em<br />

Idosos Hospitalizados [7].<br />

O documento foi lançado durante o XVII Congresso Brasileiro<br />

de Geriatria e Gerontologia, sediado em Belo Horizonte.<br />

Atendendo ao convite da <strong>Nestlé</strong>.Bio, a nutricionista<br />

Myrian Najas, idealizadora e coordenadora-geral<br />

do projeto, compartilha sua experiência conosco.<br />

Com que frequência a disfagia e a des<strong>nutrição</strong><br />

atingem idosos hospitalizados no Brasil?<br />

Em um estudo populacional com seguimento de um<br />

ano, a incidência de disfagia em pacientes internados<br />

por acidente vascular encefálico (AVE) foi de 76,5%,<br />

quando avaliados clinicamente. Entretanto, este percentual<br />

se elevou para 91,0% quando a avaliação<br />

dos indivíduos foi realizada por videofluoroscopia.<br />

A frequên cia de des<strong>nutrição</strong> proteico-calórica é comum,<br />

podendo variar de 35% a 65%. Com essas estatísticas<br />

em mente, o objetivo do I Consenso Brasileiro de Nutrição<br />

e Disfagia em Idosos Hospitalizados (CBND) é o de<br />

orientar para a identificação precoce do risco de disfagia<br />

e des<strong>nutrição</strong>, sistematizar a avaliação fonoaudiológica<br />

e nutricional e indicar o tratamento adequado,<br />

por meio de uma abordagem interdisciplinar durante o<br />

período de internação e após a alta hospitalar.<br />

Como surgiu a iniciativa do I Consenso Brasileiro de<br />

Nutrição e Disfagia em Idosos Hospitalizados?<br />

Quando assumi a presidência do Departamento de<br />

Gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria e<br />

Gerontologia, tinha como proposta desenvolver projetos<br />

que respondessem aos grandes temas da equipe<br />

multidisciplinar que compõe nossa Sociedade. Nesse<br />

sentido, firmamos uma parceria corporativa entre a<br />

SBGG e a <strong>Nestlé</strong> para viabilizar o Consenso. Eu diria<br />

que foi um casamento que deu certo.<br />

Além da <strong>Nestlé</strong>, o projeto contou com o apoio de<br />

outras instituições?<br />

Sim, ao todo foram 34 profissionais representantes<br />

de 20 instituições públicas e privadas de todo o país.<br />

Dentre elas: Hospital das Clínicas (SP), Hospital São<br />

Paulo (SP), Hospital Beneficência Portuguesa (PE),<br />

Secretaria de Saúde de Salvador (BA), Santa Casa<br />

(RJ), Hospital Santa Catarina de Blumenau (SC), Hospital<br />

da Restauração (PE), Hospital Barão de Lucena<br />

(PE), ILP Abrigo Cristo Redentor (RJ), Hospital Ipanema<br />

Plus (RJ), Hospital Sírio-Libanês (SP), Hospital<br />

Alemão Oswaldo Cruz (SP), Hospital São Luiz (SP),<br />

Hospital do Coração (SP), Hospital Regional do Tatuapé<br />

(SP), Hospital Cajuru (PR) e Hospital da PUC (RS).<br />

O que deve ser considerado na determinação do<br />

estado nutricional do paciente idoso?<br />

Uma complexa rede de fatores deve ser observada,<br />

como o isolamento social, a solidão, as doenças crônicas,<br />

as incapacidades e as alterações fisiológicas<br />

próprias do processo de envelhecimento. Além disso,<br />

devem-se conhecer as mudanças corpóreas normais<br />

que ocorrem durante o processo de envelhecimento,<br />

tais como a progressiva diminuição da massa corporal<br />

magra e de líquidos corpóreos, o aumento da quantidade<br />

de tecido gorduroso, a diminuição de vários<br />

órgãos (como rins, fígado e pulmões) e, sobretudo,<br />

uma grande perda de músculos esqueléticos. A dieta<br />

também deve ser avaliada, ou seja, o número de refeições<br />

realizadas, o intervalo entre elas, a consistência<br />

e a quantidade dos alimentos ingeridos, assim como<br />

a ingestão de líquidos. Durante a triagem, podemos


identificar se o individuo tem ou não o risco para des-<br />

<strong>nutrição</strong>. Caso o risco esteja presente, a avaliação<br />

completa deverá ser realizada para que se possa fazer<br />

a intervenção adequada. Uma equipe multiprofissional,<br />

composta por nutricionista, médico, enfermeiro e<br />

fonoaudiólogo, deve ser considerada para a realização<br />

dessa triagem.<br />

As medidas antropométricas são utilizadas?<br />

Sim, a antropometria é indicada para avaliar o estado<br />

nutricional de idosos porque permite predizer, de<br />

forma operacional, a quantidade de tecido adiposo e<br />

de muscular, que são os responsáveis pelas reservas<br />

calóricas e proteicas. A medida de força de preensão<br />

palmar (FPP) pode ser utilizada para a avaliação da<br />

capacidade funcional do indivíduo.<br />

E os exames bioquímicos?<br />

Os principais marcadores bioquímicos do estado nutricional<br />

são a pré-albumina, a albumina, a transferrina<br />

e o colesterol total. Entretanto, as doenças crônicas,<br />

o estresse e as medicações podem comprometer a<br />

fidedignidade da avaliação por meio desses exames.<br />

Sugere-se considerar, na interpretação, as doenças<br />

de base e marcadores inflamatórios, como proteína<br />

c-reativa e velocidade de hemossedimentação.<br />

Seguindo diretrizes de associações de saúde internacionais,<br />

o CBND preconiza a Miniavaliação Nutricional<br />

(MAN) como instrumento de eleição para triagem<br />

de idosos. No que consiste essa ferramenta e<br />

quais as vantagens da sua aplicação?<br />

A MAN é um dos melhores instrumentos para se avaliar<br />

o estado nutricional de idosos. Consiste em 18<br />

questões, subdivididas em 4 domínios: antropometria,<br />

dietética, avaliação global e autoavaliação. Cada<br />

questão possui um valor numérico que varia de 0 a 3<br />

e contribui para o escore final, que atinge pontuação<br />

máxima de 30. A interpretação é baseada no escore<br />

total: MAN < 17,0 — des<strong>nutrição</strong>; MAN 17,0-23,5 —<br />

risco nutricional; MAN >24 — eutrofia. Uma das vantagens<br />

de sua utilização é a de não exigir uma equipe<br />

especializada para aplicação, podendo ser realizada<br />

por qualquer profissional treinado. É um teste simples,<br />

não invasivo, fácil de ser aplicado (cerca de 10 a 15<br />

minutos), não oneroso, altamente específico (98,0%)<br />

e sensível (96,0%), e com boa reprodutibilidade.<br />

A versão reduzida da MAN também pode ser utilizada?<br />

A Mini Nutritional Assessment – Short Form (MNA-SF)<br />

deve ser sempre aplicada para todos os idosos e em<br />

todos os níveis de assistência à saúde. Ela deve fazer<br />

parte da Avaliação Geriátrica Ampla (AGA). A ferramenta<br />

é composta por 6 questões que correspondem<br />

à parte inicial do instrumento, sendo estes itens de<br />

maior sensibilidade para a detecção da condição de<br />

risco nutricional em idosos.<br />

Que fatores devem ser considerados no planejamento<br />

da intervenção nutricional?<br />

Ao se prescrever uma dieta para o paciente disfágico e<br />

desnutrido devem ser observados o grau de disfagia, o<br />

estado cognitivo, a capacidade de incorporar manobras<br />

compensatórias, o grau de independência alimentar, a<br />

severidade da des<strong>nutrição</strong>, a aceitação e as preferências<br />

alimentares, a disponibilidade de supervisão profissional<br />

e familiar para a oferta dos alimentos, como<br />

também as condições socioeconômicas.<br />

palavra 7


8 palavra<br />

E com relação aos nutrientes?<br />

O Consenso destaca a atenção para as vitaminas B6,<br />

B12, D e para o mineral cálcio. A deficiência na ingestão<br />

ou as dificuldades de absorção desses nutrientes<br />

estão diretamente relacionadas a problemas muito<br />

prevalentes na população idosa como, por exemplo,<br />

doença vascular, prejuízo neurológico, disfunção cerebral<br />

e osteoporose. No caso da vitamina A, o problema<br />

é contrário, uma vez que devemos nos preocupar<br />

com o excesso, que antagoniza a vitamina D e o cálcio,<br />

aumentando o risco de fraturas.<br />

Em que momento a terapia nutricional é indicada?<br />

A terapia deve ser iniciada quando há des<strong>nutrição</strong> ou<br />

risco de desenvolvê-la, ingestão oral da oferta alimentar<br />

inferior a 75%, disfagia, doenças catabólicas e/ou<br />

perda de peso involuntária superior a 5% em três meses<br />

ou maior que 10% em seis meses. A indicação<br />

correta do tipo de dieta, a aplicação, a via de administração<br />

e o tipo de fórmula são os principais fatores a<br />

serem considerados na administração da terapia enteral.<br />

O profissional deve estar atento às intercorrências<br />

comuns, dentre elas: aumento do resíduo gástrico,<br />

distensão abdominal, diarreia, obstipação, vômitos<br />

e regurgitação da dieta. O fonoaudiólogo tem papel<br />

fundamental nesse processo, pois, juntamente com o<br />

nutricionista, realiza toda a adaptação dos graus de<br />

consistências dos alimentos e a reabilitação da ingestão<br />

de forma segura para o controle da disfagia.<br />

A terapia nutricional oral (TNO) é suficiente?<br />

A terapia oral tem efeito positivo no estado nutricional,<br />

com ganho de peso, redução do tempo de permanência<br />

hospitalar e redução da mortalidade. Uma metaanálise<br />

com 55 estudos e 9.187 indivíduos concluiu<br />

que a TNO melhorou o estado nutricional e diminuiu<br />

a mortalidade e as complicações em idosos desnutridos<br />

[8]. Stratton e colaboradores acompanharam 50<br />

pacientes idosos com fratura de fêmur e diagnóstico<br />

de des<strong>nutrição</strong>. Eles observaram maiores ganhos energéticos-proteicos<br />

e de vitaminas hidrossolúveis no grupo<br />

de pacientes em TNO durante o pós-operatório. [9].<br />

A gravidade da disfagia influencia a prescrição?<br />

A consistência da dieta deve ser determinada com<br />

base nas escalas de severidade de disfagia e de<br />

evolução do Functional Oral Intake Scale (Fois).<br />

A disfagia grau I requer uma dieta pastosa homogênea<br />

(os alimentos são cozidos, batidos, coados e peneirados);<br />

na disfagia grau II, é indicada a dieta pastosa<br />

(alimentos bem cozidos, em pedaços ou não,<br />

que requerem pouca habilidade de mastigação);<br />

para disfagia grau III, prescreve-se a dieta branda<br />

(alimentos macios que requerem certa habilidade de<br />

mastigação. Excluem-se os alimentos que tendem a<br />

se dispersar na cavidade oral e as misturas de consistências);<br />

a disfagia grau IV permite uma dieta geral<br />

(inclui todos os alimentos e texturas).<br />

As terapias enteral e parenteral costumam ser<br />

utilizadas?<br />

A TNE deve ser designada quando a ingestão alimentar<br />

não atinge as necessidades nutricionais e houver<br />

perda de peso e/ou presença de doenças ou cirurgias<br />

que impossibilitem a alimentação via oral. O trato gastrintestinal<br />

deverá estar íntegro ou parcialmente funcionante.<br />

No caso de pacientes impossibilitados de se


alimentar com quantidades adequadas por via oral,<br />

deve-se ter como primeira escolha a via enteral, uma<br />

vez que a presença de nutrientes no trato digestivo é<br />

essencial para a manutenção do crescimento e a função<br />

da mucosa gastrintestinal. A TNE deve ser iniciada<br />

somente se for mantida por um período mínimo de<br />

5 a 7 dias. Quando houver uso de sonda nasoenteral<br />

por mais de 4 semanas, há indicação da realização<br />

de gastrostomia endoscópica percutânea. Sobre a<br />

TNP, existem vários casos de indicações, dentre eles<br />

a ocorrência de vômitos incoercíveis ou intratáveis,<br />

mucosite e esofagite, ainda como terapia nutricional<br />

total ou para suplementar outro tipo de <strong>nutrição</strong> que<br />

não atinja as necessidades calóricas diárias totais.<br />

Vários estudos em pacientes com disfagia que não<br />

atingem as necessidades demonstram que o uso de<br />

TNP é indicado e auxilia na redução do tempo de recuperação<br />

do estado nutricional e no retorno à terapia<br />

oral individualizada.<br />

Quais são os principais cuidados na alta hospitalar?<br />

Uma das principais preocupações é a de que o idoso<br />

e/ou seu cuidador recebam informações práticas e<br />

compatíveis com seu nível socioeconômico, cultural,<br />

educacional e cognitivo. No caso de alimentação via<br />

oral, os profissionais devem estar seguros de que as<br />

pessoas estejam aptas a realizar ou garantir a deglutição<br />

eficiente, que mantenha e/ou melhore o estado<br />

nutricional e a hidratação, e diminua o risco de aspiração.<br />

Em situação de <strong>nutrição</strong> enteral, devem ser<br />

rEFErêNCIAS<br />

ressaltados os cuidados com a higiene (pessoal e de<br />

utensílios), segurança alimentar (preparo, armazenamento),<br />

precauções em relação a sonda, ostomia e<br />

possíveis intercorrências com o paciente. O Consenso<br />

apresenta um documento anexo no qual são descritas<br />

detalhadamente todas as orientações pertinentes à<br />

alta hospitalar com dieta por via enteral.<br />

De que maneira o Consenso será divulgado no Brasil?<br />

O CBND está sendo distribuído em aproximadamente<br />

1.300 hospitais, públicos e privados, em todo o país.<br />

Simultaneamente, estamos lançando um compromisso<br />

aos responsáveis por esses locais para aplicarem<br />

as orientações que constam do documento. Em 2011,<br />

será realizado um levantamento para que se verifique<br />

o empenho nesse sentido.<br />

Qual é a sua expectativa após a implementação das<br />

condutas?<br />

Não tenho nenhuma dúvida quanto aos benefícios<br />

que o Consenso trará para a melhoria da qualidade de<br />

vida de idosos que apresentam disfagia, um problema<br />

tão pouco difundido em nosso meio. Será possível reduzir<br />

muito o risco de broncopneumonias aspirativas,<br />

que levam a hospitalizações e, consequentemente, à<br />

des<strong>nutrição</strong> nessa população.<br />

[1] Filho ED M. Conceitos e fisiologia aplicada da deglutição. In: Filho EDM et al. Disfagia: abordagem multidisciplinar. São<br />

Paulo: Frôntis, 1999. cap. 1, p. 3-8. [2] Padovani AR, Moraes DP, Mangili LD, Andrade CRF. Protocolo Fonoaudiológico de<br />

Avaliação do Risco para Disfagia (PARD). Rev. Soc. Bras. Fonoaudiol. 2007;12(3):199-205. [3] Clavé P, Arreola V, Romea<br />

M et al. Accuracy of the volume-viscosity swallow teste for clinical screening of oropharyngeal dysphagia and aspiration.<br />

European Society for Clinical Nutrition and metabolism. 2008; 806-815. [4] Fraga LM, Calvitti SV, Lima MC, Leitão MC.<br />

Nutrição na Maturidade: Aspectos da Disfagia. <strong>Nestlé</strong> Nutrition. Disponível em: http://www.nestle-nutricaodomiciliar.com.br/<br />

downloads/aspectosdisfagia.pdf [26 out 2010]. [5] Filho WJ. Nutrição e Envelhecimento. Revista <strong>Nestlé</strong>.Bio, Ano 1, no.2, p.<br />

26. [6] Najas M, Pereira FA. Nutrição. In: Freitas EV, Py L, Cançado FAX, Gorzoni ML, Doll J. Tratado de geriatria e gerontologia.<br />

2.ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2006. [7] Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. I Consenso de Nutrição<br />

e Disfagia em Idosos Hospitalizados. 1ª Ed. Manole, 2011. Disponível em http://www.sbgg.org.br/admin/arquivo/Consenso_<br />

Brasileiro_de_Nutricao.pdf [26 out 2010] [8] Milne AC, Potter J, Avenell A. Protein and energy supplementation in elderly<br />

people at risk from malnutrition. Cochrane Database Syst Rev 2005; 18(2). [9] Stratton RJ, Bowyer G, Elia M. Food snacks<br />

or liquid oral nutritional supplements as a first line treatment for malnutritionin post-operative patients? Proceedingof the<br />

Nutrition Society 2006; 65:4A.<br />

palavra 9


calendário<br />

jan.<br />

Clinical Nutrition Week 2011 >> 29 jan. a 01 fev.<br />

A cidade de Vancouver, no Canadá, sedia este evento promovido<br />

pela American Society for Parenteral and Enteral Nutrition<br />

(A.S.P.E.N.). A programação completa e os detalhes para<br />

inscrição podem ser obtidos no endereço www.nutritioncare.org/<br />

ClinicalNutritionWeek/index.aspx?id=2784<br />

abr.<br />

9º Congresso Brasileiro Pediátrico de<br />

Endocrinologia e Metabologia >> 17 a 20<br />

Em 2011, este tradicional encontro ocorre no Centro<br />

de Artes e Convenções da Universidade Federal de<br />

Ouro Preto (MG). O programa científico preliminar já<br />

está disponível no site www.cobrapem2011.com.br<br />

V Congresso Brasileiro de Ciências Sociais<br />

e Humanas Aplicadas à Saúde >> 17 a 20<br />

O Lugar das Ciências Sociais e Humanas no Campo<br />

da Saúde Coletiva. Este é o tema do encontro que<br />

abordará os desafios teóricos e práticos das duas<br />

áreas na atualidade. O congresso terá sede no câmpus<br />

da Cidade Universitária da Universidade de São Paulo<br />

(USP). Mais informações no site<br />

www.cienciassociaisesaude2011.com.br/index.php<br />

>> Ao patrocinar e divulgar encontros científicos na área de Nutrição, a <strong>Nestlé</strong><br />

espera contribuir para que os profissionais de saúde possam debater e<br />

compartilhar suas experiências a partir da produção acadêmica mais<br />

recente. Confira alguns dos principais eventos focados em <strong>nutrição</strong> e saúde<br />

que vão ocorrer no primeiro semestre de 2011.<br />

mai.<br />

6º Congresso<br />

Paulista de Nutrição<br />

>> 12 a 14<br />

Tendo como tema<br />

central Nutrição: Saúde,<br />

prazer e emoção – Os<br />

desafios da década, o<br />

Congresso deste ano<br />

traz, como novidade, o<br />

Título de Especialista<br />

pela Associação<br />

Brasileira de Nutrição.<br />

Para mais informações,<br />

www.apanutri.com.<br />

br/2008/asp/home.asp<br />

mar.<br />

VII Congreso Internacional de nutrición, alimentación<br />

y dietética >> 31 mar. a 01 abr.<br />

A Sociedad Española de Dietética y Ciencias de la Alimentación<br />

(SEDCA) convida para o evento que ocorre na cidade de Madrid,<br />

na Espanha, e aborda desde questões clínicas até as políticas<br />

públicas nutricionais. Mais informações no site www.nutricion.org<br />

jun.<br />

IV Congresso Brasileiro de Nutrição Integrada<br />

e GANEPÃO >> 15 a 18<br />

Simultaneamente, ocorrem ainda o XXXIV Curso Internacional<br />

de Nutrição Parenteral e Enteral e o XIII Fórum Paulista de<br />

Pesquisa em Nutrição Clínica e Experimental. O tradicional<br />

encontro ocorre no Centro Fecomercio de Eventos, em São<br />

Paulo, e apresenta como tema central: Caminhando para o<br />

Equilíbrio Nutricional. www.ganep.com.br/ganepao/<br />

11º Congresso Nacional da Sociedade Brasileira<br />

de Alimentação e Nutrição >> 20 a 23<br />

Nutrição Baseada em Evidência será o tema desta nova edição<br />

do congresso. O assunto será discutido por meio de debates,<br />

colóquios e votação eletrônica. A Praia de Iracema, em<br />

Fortaleza (CE), foi escolhida para abrigar o evento. As normas<br />

para envio de trabalhos e outras informações podem ser<br />

obtidas em www.sban.org.br/congresso2011/home.asp


Associação entre consumo e<br />

reserva de ferro com dano ao DNA<br />

A anemia ferropriva, situação de carência grave<br />

de ferro, está associada a cansaço, redução da imunidade<br />

e atraso no desenvolvimento neurológico, no<br />

último caso para crianças.<br />

As recomendações nutricionais de ferro para<br />

prevenir a anemia, conforme as Dietary Reference Intakes<br />

(DRI) do Instituto de Medicina (EUA), variam<br />

de 8 mg/dia (homens e mulheres pós-menopausa) a<br />

27 mg/dia (gestantes), tendo níveis intermediários<br />

para adolescentes, dependendo do sexo.<br />

O excesso de ferro tem sido associado ao risco<br />

de doenças cardiovasculares e de câncer, como no<br />

caso da hemocromatose (desequilíbrio hereditário no<br />

metabolismo de ferro). E as DRI recomendam que<br />

pessoas saudáveis não devem ingerir mais do que<br />

45 mg/dia de ferro (Upper Level), para evitar distúrbios<br />

gastrintestinais.<br />

A era pós-genômica está trazendo alguns avanços<br />

do entendimento da inter-relação das vitaminas e<br />

minerais com genoma humano. Tem-se reconhecido<br />

que perturbações na estabilidade do genoma estão associadas<br />

ao envelhecimento e ao risco de doenças degenerativas,<br />

como o câncer. Reconhece-se, também,<br />

que o balanço nutricional possa aumentar a estabilidade<br />

do genoma, reduzindo o risco dessas doenças.<br />

Não obstante, as recomendações nutricionais para a<br />

maioria dos nutrientes ainda não incorporaram este<br />

aspecto [1]. Com efeito, desenvolveu-se um estudo<br />

de revisão bibliográfica para levantar possíveis associações<br />

entre o risco de câncer no trato gastrintestinal<br />

e a ingestão de ferro [2]. Os resultados deste<br />

estudo, obtidos a despeito do reduzidíssimo número<br />

de trabalhos sobre o assunto, apontaram indícios de<br />

que tanto baixas quanto elevadas ingestões de ferro<br />

possam aumentar o risco de câncer no intestino,<br />

e uma ingestão de cerca de 20 mg/dia de ferro poderia<br />

estar associada a um menor risco em idosos.<br />

No mesmo trabalho, levantaram-se evidências de que<br />

tanto a carência como o excesso de ferro podem estar<br />

associados ao aumento do estresse oxidativo, isto<br />

é, ao desequilíbrio entre a produção e a eliminação<br />

de espécies reativas de oxigênio. O estresse oxidativo,<br />

em associação a outros mecanismos,<br />

também desregulados pela carência de<br />

ferro (p.ex., resposta imunológica contra<br />

células malignas, metabolização de<br />

compostos tóxicos e síntese e reparo do<br />

DNA), é fator etiológico para o câncer e<br />

o envelhecimento.<br />

Em outro estudo, no qual foram avaliadas<br />

crianças e adolescentes com um padrão geral de má<br />

alimentação e alta incidência de verminoses, observou-se<br />

baixa prevalência de anemia, possivelmente<br />

pela ingestão considerável de vísceras [3]. Ademais,<br />

uma ingestão de aproximadamente 15 mg ferro/dia<br />

associou-se a um nível significativamente menor de<br />

danos no DNA no grupo.<br />

Diante da natureza preliminar dos dados e da<br />

raridade de estudos sobre o tema, há necessidade de<br />

desenvolver estudos adicionais. As informações geradas<br />

poderiam ser incorporadas às recomendações nutricionais,<br />

pois estas não são focadas em deficiências<br />

nutricionais sutis e crônicas e tampouco levam em<br />

conta a estabilidade do genoma. É importante ressaltar<br />

que a melhor maneira de manter a estabilidade<br />

genômica é uma alimentação equilibrada, e que os<br />

presentes dados não devem ser utilizados como indicativo<br />

para suplementações com o nutriente. Cabe<br />

lembrar que as necessidades nutricionais de indivíduos<br />

podem variar bastante de acordo com a própria<br />

reserva fisiológica e que muitos são portadores de variantes<br />

genéticas associadas a uma sobrecarga de ferro<br />

(hemocromatose), para os quais a suplementação<br />

pode trazer riscos.<br />

ponto de vista<br />

DANIEL PRá 1,2<br />

SILVIA ISABEL RECH FRANKE1<br />

JOãO ANTONIO PêGAS HERNIQUES 3<br />

1 PPG em Promoção da Saúde,<br />

UNISC, Santa Cruz do Sul, RS<br />

2 PPG em Saúde e<br />

Comportamento, UCPEL,<br />

Pelotas, RS<br />

3 Instituto de Biotecnologia,<br />

UCS, Caxias do Sul, RS<br />

rEFErêNCIAS<br />

[1] M Fenech. Recommended dietary<br />

allowances (RDAs) for genomic<br />

stability, Mutat Res 480-481 (2001)<br />

51-54.<br />

[2] D Prá, SIR. Franke, JAP Henriques,<br />

M Fenech. A possible link between<br />

iron deficiency and gastrointestinal<br />

carcinogenesis, Nutr Cancer 61 (2009)<br />

415-426.<br />

[3] D Prá, A Bortoluzzi, LL Müller, L Hermes,<br />

JA Horta, SW Malul, JAP. Henriques,<br />

M Fenech, SIR Franke. Iron intake,<br />

red cell indicators of iron status and<br />

DNA damage in young subjects,<br />

Nutrition (no prelo), doi:10.1016/j.<br />

nut.2010.1002.1001.


foco<br />

Por_João Luiz Guimarães<br />

Bonitas, nutritivas,<br />

saborosas e pouco calóricas<br />

– as flores comestíveis são<br />

uma festa para o paladar<br />

A força das flores<br />

Há muitas primaveras — muitas mesmo —, o cravo tem insistido em brigar com a rosa na famosa canção infantil.<br />

O resultado dessa violência botânica gratuita? Um ferido, a outra despedaçada e crianças impressionadas. Quer dar<br />

um melhor destino para as pétalas de ambos? Comece decorando uma boa salada!<br />

Isso mesmo. Mas só se as duas espécies forem de procedência orgânica, livres de pesticidas e outros tipos de<br />

contaminantes tóxicos. Os cravos túnicos (Tagetes patula ou Tagetes erecta) darão um leve toque de amargor, além<br />

de emprestar beleza ao conjunto, com suas pétalas rugosas e de coloração amarelo-limão ou tangerina. No caso das<br />

rosas (Rosa spp), despreze apenas a base esbranquiçada de cada pétala, lave-as suavemente e salpique sobre uma<br />

salada de folhas verdes. Sua consistência aveludada, aliada a um sabor adocicado e levemente perfumado, vai adicionar<br />

um toque de sofisticação ao seu prato. Figurinha carimbada da culinária oriental — especialmente da cozinha<br />

árabe —, a rosa foi muito popular na Inglaterra vitoriana do século 19. Suas pétalas podiam ser desidratadas para<br />

aromatizar o chá da rainha, ser conservadas em vinagre para dar mais sabor às saladas ou até mesmo ser glaceadas<br />

com claras de ovos e açúcar para enfeitar e emprestar perfume a doces variados.


Primavera no prato<br />

Muitos ainda se surpreendem com as embalagens de plástico trans-<br />

parente, repletas de flores coloridas, em meio às gôndolas refrigeradas de<br />

verduras e legumes dos supermercados brasileiros — retrato contemporâneo<br />

que faz parte de uma longa tradição gastronômico-floral da humanidade<br />

que remonta, no mínimo, aos antigos egípcios. Por outro lado, há aqueles<br />

que não se dão conta de terem, por muitas vezes, saboreado flores<br />

em sua dieta habitual.<br />

Isto porque, alcaparras, por exemplo, são botões da flor<br />

Capparis spinosa. A alcachofra, o brócolis e a couve-flor, só para<br />

ficar em três notórios frequentadores de nossas mesas,<br />

também são flores. Em nome da precisão botânica,<br />

seriam, na realidade, inflorescências — nomenclatura<br />

que define estruturas que reúnem mais<br />

de uma flor em um mesmo pedúnculo. Descomplicando:<br />

cada um ao seu modo, seriam pequenos<br />

“ramalhetes” naturais.<br />

Mas ninguém em sã consciência presentearia alguém<br />

com um buquê de brócolis, ou enfeitaria um vaso na<br />

sala com couve-flor. Logo, a muita gente causa maior estranheza<br />

se imaginar mastigando pétalas e sépalas de flores coloridas e<br />

de beleza ornamental, como rosas, violetas, begônias, calêndulas, crisântemos,<br />

tulipas, alfazemas e amores-perfeitos. Mas elas têm frequentado com<br />

cada vez maior assiduidade os cardápios dos restaurantes, acompanhando<br />

saladas, sopas, doces, sorvetes, no interior de cubos de gelo das bebidas, e<br />

foco 13<br />

onde mais a imaginação permitir. “Algumas espécies<br />

menos conhecidas do grande público, como as cravinas<br />

e as verbenas, também começam a marcar presença”,<br />

afirma Giulio Cesare Stancato, pesquisador<br />

do Centro de Horticultura do Instituto Agronômico,<br />

vinculado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento<br />

do Estado de São Paulo. Stancato frisa que é muito importante<br />

buscar produtores especializados e confiáveis<br />

e que se deve evitar a ingestão aleatória de flores<br />

sem a devida orientação. “Existem flores que possuem<br />

princípios tóxicos em sua estrutura fitoquímica e não<br />

devem ser usadas na alimentação humana de forma<br />

alguma”, alerta o pesquisador, “como algumas flores<br />

ornamentais populares como lírio, copo-de-leite, violeta-africana,<br />

bico-de-papagaio e azaleia, entre outras”.<br />

Floresce um novo mercado<br />

Embora ainda responda por um parcela ínfima<br />

do total da produção de flores de corte e de flores envasadas<br />

do país, voltadas para a aplicação<br />

ornamental e para a indústria de<br />

essências aromáticas, o mercado<br />

de flores comestíveis orgânicas<br />

tem-se desenvolvido muito


14 foco<br />

na última década e promete desabrochar em variedade<br />

e importância econômica nos próximos anos. “Elas<br />

têm um valor agregado significativo”, explica Deborah<br />

Orr, proprietária de uma produtora orgânica situada<br />

em Cerquilho, no interior de São Paulo, especializada<br />

na venda de flores comestíveis, ervas finas frescas e<br />

brotos para restaurantes refinados da Capital. Entre<br />

as flores comestíveis que cultiva, destacam-se não<br />

apenas flores de beleza ornamental, como crisântemo,<br />

borago, capuchinha, amor-perfeito, mas também<br />

flores de legumes como a flor-de-abóbora – também<br />

conhecida como cambuquira – ou de ervas, como a<br />

flor-de-coentro e a flor-de-manjericão.<br />

Além disso, Deborah destaca que<br />

alguns brotos de flores também<br />

são muito apreciados<br />

pelos chefs "como os brotos de<br />

girassol, que são ótimos acompanhantes<br />

para saladas”. Os paulistas<br />

lideram a produção nacional<br />

de flores orgânicas<br />

comestíveis, seguidos<br />

pelos mineiros.<br />

Beleza que nutre<br />

Mas, além da beleza das cores, do perfume e das sutis nuances de sa-<br />

bor, será que as flores comestíveis são, de fato, nutritivas? Ainda há poucas<br />

pesquisas científicas dedicadas ao setor, mas elas parecem indicar resultados<br />

muito positivos quanto ao aspecto nutricional das flores, como as constatações<br />

presentes na dissertação de mestrado de Patrícia Yuasa Niisu, defendida<br />

junto à Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp. Sua pesquisa<br />

revelou que uma das flores comestíveis mais consumidas, a capuchinha ou<br />

nastúrcio (Tropaeolum majus), é rica em luteína, carotenoide associado<br />

à prevenção de problemas oftamológicos como<br />

a catarata e a degeneração macular — principal causa<br />

de cegueira entre indivíduos com mais de 55 anos<br />

de idade. “Carotenoides são pigmentos amplamente<br />

distribuídos na natureza, responsáveis pelas cores<br />

laranja, amarela e vermelha de diversos<br />

tecidos. Embora não haja uma recomendação<br />

formal quanto à quantidade<br />

a ser ingerida, alguns estudos apontam<br />

que o consumo prudente dessas substâncias<br />

pode auxiliar no fortalecimento do<br />

sistema imunológico e na redução de doenças<br />

degenerativas”, afirma a pesquisadora.<br />

Flores de fé<br />

Embora o amor-perfeito seja considerado por muitos espíritos mais<br />

religiosos como um representante da Santíssima Trindade por causa da sua<br />

pigmentação tricolor, poucas plantas arrastam em seu nome tanta devoção<br />

religiosa quanto a ora-pro-nobis. Muito apreciada na culinária mineira, principalmente<br />

por suas folhas, a ora-pro-nobis recebe este nome do latim (que significa<br />

“orai-por-nós” em português) em razão de uma lenda. Nela, a planta faria<br />

parte do jardim de um padre que vivia rezando em voz alta, enquanto vizinhos


aproveitavam sua distração para colher escondidos<br />

as folhas da planta e adicioná-las a suas refeições. As<br />

folhas da ora-pro-nobis são seu carro-chefe, mas se<br />

engana quem pensa que suas delicadas e brancas flores<br />

não podem ser aproveitadas na culinária. O apicultor<br />

e pesquisador paulista de origem grega Nikolaos<br />

Mitiotis, que se dedicava ao estudo da ora-pro-nobis<br />

(Pereskia aculeata) aplicada à apicultura, acabou se<br />

rendendo — assim como as abelhas que estudava —<br />

ao sabor levemente adocicado de suas flores. Segundo<br />

ele, as saladas floridas assumem dois valores nutritivos<br />

distintos conforme a hora da colheita. “Se forem colhidas<br />

nas primeiras horas da manhã, antes de serem<br />

visitadas por abelhas e demais insetos polinizadores, a<br />

salada resultante terá maior concentração proteica. Afinal,<br />

cada flor carrega em si cerca de 15 a 20 miligramas<br />

de néctar e pólen — e o pólen é quase proteína pura”.<br />

Mitiotis aconselha temperar a salada com limão-cravo<br />

ou vinagre de maçã, além de adicionar à mistura algumas<br />

folhas de rúcula, a fim de dar um sabor mais picante<br />

ao conjunto.<br />

Biologia e simbolismo<br />

"Sempre haverá aqueles que creditam valores afrodisíacos ao consumo<br />

de flores (algo não amparado pela ciência). Em termos estritamente botânicos,<br />

contudo, as flores são os órgãos reprodutivos dos diversos integrantes<br />

de uma subdivisão do reino vegetal batizada de angiospermas". Nas flores,<br />

encontram-se as estruturas masculinas (estame ou androceu) e femininas<br />

(pistilo ou gineceu). Enquanto as sépalas formam o cálice na base da flor e<br />

protegem as estruturas mais internas como o ovário, as pétalas têm a função<br />

de atrair insetos polinizadores e, em alguns casos, paladares humanos.<br />

Do ponto de vista simbólico, flores foram associadas ao longo da história humana<br />

ao renascimento e à transcendência. No pensamento místico oriental<br />

— principalmente no budismo —, isso fica muito claro no exemplo da florde-lótus<br />

(Nelumbo nucifera), que nasce e desabrocha no meio do lodo dos<br />

pântanos. E, embora possa parecer um pouco sacrílego, também podemos<br />

comer suas pétalas brancas ou levemente rosadas — bem como suas folhas,<br />

sementes e rizomas.<br />

Nos anos 1970, jovens de diversas partes do mundo pediram que usássemos<br />

flores nos cabelos. Transformadas em ícone do movimento hippie, as<br />

flores eram quase onipresentes nas estampas psicodélicas da contracultura,<br />

como um gesto de paz em oposição à violência do sistema, das armas e das<br />

guerras que ceifavam as vidas de jovens inocentes.<br />

Seja emprestando beleza, perfume, sabor ou transcendência, uma coisa<br />

parece ser certa: as flores, com sua delicadeza, serão sempre poderosos<br />

lembretes da efemeridade da vida e da possibilidade infinita de transformação<br />

da natureza.<br />

foco 15


16 foco<br />

Primavera no prato<br />

De um modo geral, o valor nutricional da maioria das flores comestíveis mais populares se sustenta<br />

em, além de água, traços de vitaminas, fibras e sais minerais. Confira o perfil de algumas delas.<br />

Capuchinha ou Nastúrcio (Tropaeolum majus): nativa<br />

da América do Sul, principalmente dos altiplanos peruanos,<br />

bolivianos e colombianos, possui flores formadas por<br />

cinco pétalas, geralmente laranja-avermelhadas. É rica em<br />

vitamina C e sais minerais, como potássio, fósforo, flúor,<br />

iodo e enxofre. Muito usada em saladas, possui um sabor<br />

levemente picante e acre, assemelhado ao gosto do agrião.<br />

Isso se deve a um composto sulfuroso também presente<br />

na hortaliça, que não por acaso recebe o nome científico<br />

Nasturtium officinale. As sementes da capuchinha também<br />

são comestíveis e lembram o sabor de alcaparras (que também<br />

são flores em botão).<br />

Calêndula (Calendula officinalis): originária da<br />

Região Mediterrânea, hoje se espalha por todo o globo.<br />

Há registros de seu uso em sopas e cozidos preparados<br />

por egípcios e por romanos da Antiguidade. Supõe-se<br />

que seu nome derive da palavra latina calendae (mês),<br />

a mesma que deu origem a calendário. Suas pétalas se<br />

distinguem por acentuada coloração amarelo-alaranjada.<br />

Sua composição nutricional inclui iodo, carotenoides e<br />

manganês. Também contém licopeno. Seu uso culinário<br />

deve-se mais à sua coloração do que ao seu gosto, levemente<br />

aparentado com o do açafrão.<br />

Borragem, Borago ou Flor-estrela (Borago officinalis):<br />

originária da Síria e demais regiões da ásia Menor,<br />

seu nome deriva de suas cinco pétalas, estreitas,<br />

pontudas e triangulares, formando o desenho de uma<br />

estrela de cor azul-arroxeada (embora algumas espécies<br />

brancas também estejam sendo cultivadas). Seu<br />

sabor lembra um pouco o gosto fresco de um pepino.<br />

A flor também é rica em um alcaloide não tóxico<br />

chamado tesinina, flavonoides e ácidos graxos<br />

poli-insaturados. Além do uso in natura em<br />

saladas, uma opção diferente é degustar<br />

a borragem levemente cozida e salteada<br />

junto com alho e batatas.


Amor-perfeito (Viola tricolor):<br />

surgida simultaneamente na Europa<br />

e na ásia Ocidental, também já se espalhou<br />

pelo mundo inteiro. Sua principal característica é a de<br />

ser formada por delicadas pétalas de três cores. Aparentada<br />

com as violetas, o aroma suave desta flor a habilita<br />

a ser muito usada em xaropes doces e licores. Também<br />

costuma ser mergulhada em vinagre de vinho branco,<br />

acentuando o buquê aromático deste tempero. Sua composição<br />

nutricional inclui vitamina C e E, ácido salicílico,<br />

carotenoides e glicosídeos como rutina.<br />

Hibisco (Hibiscus sabdariffa): bela flor de pétalas<br />

brancas e cálices cor de vinho, também é conhecida no<br />

Nordeste brasileiro como vinagreira ou azedinha, e suas<br />

folhas são usadas no preparo do “cuxá”, muito usado na<br />

culinária maranhense. Não confundir com o hibisco ornamental<br />

(Hibiscus rosa-sinensis), de pétalas rosadas e<br />

muito usado como “cerca-viva” em jardins. Esta variedade<br />

costuma fazer a alegria da criançada, que chupa o néctar<br />

adocicado como mel que brota de sua base quando a flor<br />

é arrancada de seu cálice. Aliás, no caso da primeira flor, é<br />

justamente esta estrutura, o cálice ou bráctea, que é usada.<br />

Ela tem coloração avermelhada e gosto ácido, ótimo<br />

para o preparo de geleias e doces. Seus teores de vitamina<br />

C são maiores do que os encontrados na laranja e na manga.<br />

Os cálices do hibisco também concentram uma grande<br />

variedade de flavonoides antioxidantes, como as antocianinas,<br />

além de serem ricos em cálcio, magnésio, ferro e<br />

fibras como a pectina.<br />

rEFErêNCIAS<br />

Mandamentos florais<br />

foco 17<br />

Pessoas com tendências alérgicas devem evitar ingerir a parte central<br />

das flores, onde há presença de pólen.<br />

Não substitua refeições por flores ou use-as com objetivo de emagreci-<br />

mento. Sua função primordial é a de acrescentar beleza, aroma e sabor<br />

aos pratos.<br />

Não tempere em excesso as saladas florais, pois acabará mascarando<br />

as delicadas notas aromáticas das flores.<br />

Nunca utilize flores de floricultura nem as colha na beira das estradas<br />

para fins gastronômicos. As primeiras recebem pesticidas e outros defensivos<br />

agrícolas e as segundas podem reter poluentes dos automóveis<br />

e caminhões.<br />

Depois de colhidas, as flores comestíveis devem ficar refrigeradas e ser<br />

consumidas in natura em no máximo uma semana. Algumas podem<br />

ser preservadas em azeite ou vinagre.<br />

Cheque sempre a procedência do produtor na embalagem do produto.<br />

Flores comestíveis são sempre produtos com selo orgânico.<br />

Compre livros confiáveis sobre o tema ou procure sites especializados<br />

em receitas criativas com flores na internet.<br />

Cubos de gelo com pequenas flores comestíveis em seu interior podem<br />

ser uma maneira criativa de decorar e perfumar uma bebida alcoólica<br />

ou um suco de frutas. Invente outras.<br />

(1) Department of Horticultural Science, College of Agriculture & Life Sciences, North Carolina State University, Edible Flowers, 2008. (2) Panizza, S. Plantas que curam. 28 ed. São<br />

Paulo, SP: IBRASA, 1997. (3) Ferri, M.G.; Menezes, N.L. de; Monteiro-Scanavacca, W.R. Glossário Ilustrado de Botânica. 1 ed. São Paulo, SP: Nobel, 1981. (4) Yuasa Niizu, Patrícia.<br />

Fonte de Carotenoides Importantes para a Saúde Humana. Unicamp Orientador: Delia Rodriguez Amaya. Data da defesa: 22/08/2003. (5) Sangalli, Andréia; Scallon, Silvana de Paula<br />

Quintão and Carvalho, José Carlos Lopes de. Perda de massa de flores de capuchinha após armazenamento. Hortic. Bras. [online]. 2007, vol.25, n.3 [cited 2010-09-26], pp. 471-<br />

474 . SciElo. (6) Huxley, A., Ed.(1992) New RHS Dictionary of Gardening. Macmillan ISBN 0-333-47494-5. (7) Peterson, Lee Allen. Edible Wild Plants. New York, NY: Houghton Mifflin<br />

Company, 1977. (8) Claire Clifton, Claire. Edible Flowers. Highstown, NJ: McGraw-Hill Publishing Co., 1984. (9) Creasy, Rosalind. The Edible Flower Garden. Boston, MA: Periplus Editions,<br />

2000. (10) Wilkinson Barash, Cathy. Edible Flowers From Garden To Palate. Golden, Colorado: Fulcrum Publishing, 1993. (11) Tenebaum, Frances (ed.) Taylor’s 50 Best Herbs and<br />

Edible Flowers. New York, NY: Houghton Mifflin Company, 1999. (12) Morse, Kitty. Edible Flowers: A Kitchen Companion with Recipes. Berkeley, Calif.: Ten Speed Press, 1995.


conhecer<br />

por_Claudio Galperin<br />

https://www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/<br />

<strong>Epigenética</strong><br />

e Nutrição<br />

Desafiando a noção de que nosso destino é governado pelos<br />

O cenário é recente. Ao redor de uma mesa, pesquisadores<br />

discutem apaixonadamente projetos de pesquisa que disputam financiamento<br />

para sua continuidade.<br />

No centro desta mesa há um frasco. É pouco provável que<br />

tenha escapado aos olhos de qualquer um, embora ninguém faça<br />

menção a ele. E, no fim do encontro, um dos presentes toma-o<br />

nas mãos e dispara: Este frasco contém DNA. Está sentado aqui<br />

há dois dias. Sabem o que ele fez? Nada!<br />

Quem conta, e se diverte com a história, é randy Jirtle, laureado<br />

professor da Duke University e um dos maiores expoentes<br />

no campo da epigenética.<br />

Para ele, assim como um computador, o genoma é impotente<br />

sem um software para lhe dizer como e no quê trabalhar.<br />

E, com os olhos brilhando, arremata que, coletivamente, o<br />

software dentro de cada um de nós é o que chama de epigenoma<br />

— elementos reguladores situados no topo (-epi) do DNA.<br />

Em uma era em que os genes possuem status de celebridade,<br />

Jirtle faz parte de um grupo cada vez maior de pesquisadores<br />

que desloca o DNA do centro das atenções para eleger o epigenoma<br />

como protagonista de um fascinante enredo.<br />

nossos genes<br />

Uma maior vulnerabilidade a influências ambientais faria<br />

do epigenoma o responsável por um contingente muito maior de<br />

doenças do que aquele provocado por alterações do DNA em si.<br />

Esta tese está dirigida àquela que, possivelmente, seja a mais<br />

relevante questão em ciências biológicas no presente: por que exibimos<br />

tamanha diferença em termos de susceptibilidade às doenças?<br />

Irmanada a ela há, ainda, uma segunda pergunta, transformada<br />

em argumento por epigeneticistas: como gêmeos idênticos<br />

podem exibir diferente susceptibilidade a doenças se a única<br />

variável é o código genético?<br />

Para esses profissionais, a resposta apoia-se na inferência<br />

de que, ao contrário do genoma, o epigenoma desses<br />

gêmeos não é idêntico.<br />

Argumentam que, mesmo dentro do útero, o epigenoma de<br />

um e de outro poderia sofrer influências ambientais distintas como,<br />

por exemplo, fluxo sanguineo placentário desigual. O que, em última<br />

análise, poderia levar a um diferente aporte de nutrientes.<br />

Existem bases sólidas para sustentar este raciocínio?


A origem fetal da susceptibilidade às doenças<br />

Muitos estudos realizados em modelos animais apoiam o<br />

conceito de que a susceptibilidade a inúmeras doenças não começa<br />

na vida adulta, mas cedo no desenvolvimento. A história<br />

contemporânea da humanidade é pródiga em exemplos sobre<br />

isso também.<br />

No inverno de 1944-1945, ao final da Segunda Guerra Mundial,<br />

a combinação do embargo imposto pelas tropas alemãs com<br />

a severidade do inverno provocou a morte de cerca de 20.000<br />

pessoas no evento conhecido como a “Fome Holandesa”.<br />

O acompanhamento de um grupo de sobreviventes nascidos<br />

naquele período revelou uma incidência muitas vezes maior do<br />

que a esperada de doença cardiovascular, diabetes, obesidade e,<br />

sobretudo, de esquizofrenia, na vida adulta.<br />

Anos mais tarde, entre 1959 e 1961, a “Fome Chinesa”, causada<br />

por mudanças climáticas adversas e, principalmente, equivocadas<br />

políticas econômicas, deixou um saldo trágico de 20 milhões<br />

a 40 milhões de pessoas mortas.<br />

Neste exemplo, também, o desenvolvimento de esquizofrenia<br />

entre os adultos nascidos naquela época variou entre duas e<br />

três vezes o esperado.<br />

A ideia, incipiente à época, de que a saúde de cada indivíduo,<br />

na idade adulta, poderia ser influenciada pela dieta da mãe<br />

durante a gestação provocou reflexões no campo da biologia, da<br />

<strong>nutrição</strong>, da ética e da saúde pública.<br />

A revelação de maior impacto, contudo, de que gerações<br />

para além dos filhos também poderiam ser influenciadas, ainda<br />

estava por vir...<br />

Herança epigenética transgeracional<br />

Entre os dias 27 e 29 de outubro de 2010, a cidade de Lau-<br />

sanne, na Suíça, abrigou o Sétimo Simpósio Internacional <strong>Nestlé</strong><br />

de Nutrição, tendo como tema central Nutrição e <strong>Epigenética</strong>.<br />

Curiosamente, três mil quilômetros ao norte dali, o pequeno,<br />

gelado, desconhecido e pouco habitado Condado de Norrbotten, em<br />

território sueco, detém uma das chaves mais interessantes para<br />

se compreender o tema do encontro.<br />

Para tomá-la nas mãos, no entanto, é preciso, antes, empreender<br />

uma viagem no tempo: século 19, quando, por conta do isolamento<br />

e da severidade do inverno, um período de colheita ruim<br />

condenava, invariavelmente, a população do Condado à fome.<br />

Assim, enquanto os anos de 1800, 1812, 1821, 1836 e<br />

1856 foram marcados por uma total perda das plantações, em<br />

1801, 1822, 1828, 1844 e 1863 a abundância da colheita fez<br />

com que o sofrimento extremo de invernos anteriores cedesse<br />

lugar a mesas fartas por meses.<br />

Foi este cenário que chamou a atenção de Lars Olov Bygren,<br />

médico especialista em saúde preventiva, do Karolinska<br />

Institute de Estocolmo.<br />

No início dos anos 1980, incendiava sua curiosidade descobrir<br />

o que havia acontecido com as crianças nascidas naqueles<br />

períodos e, o que é mais intrigante, com seus filhos e netos.<br />

Para isso, Bygren selecionou uma amostra de indivíduos<br />

nascidos no Condado de Norrbotten em 1905 e iniciou meticulosa<br />

análise de registros históricos para estimar a quantidade de<br />

alimento disponível para seus pais e avós quando jovens.<br />

Surpreendentemente, verificou que adolescentes de ambos<br />

os sexos que vivenciaram os raros invernos de abundância e que,<br />

no curto período de uma única estação, passaram de privação alimentar<br />

para alimentação excessiva produziram filhos e netos com<br />

sobrevida inferior em até três décadas quando comparados aos<br />

descendentes daqueles que, quando jovens, foram submetidos<br />

apenas à privação de alimento.<br />

Trabalhos subsequentes de cohort, levando em conta<br />

os necessários ajustes socioconômicos das amostras,<br />

confirmaram os achados iniciais de Bygren e seus colaboradores,<br />

publicados em 2001 [1].<br />

Sétimo Simpósio Internacional <strong>Nestlé</strong> de Nutrição realizado<br />

entre os dias 27 e 29 de outubro de 2010 em Lausanne, Suíça.<br />

Durante este encontro, a relação entre epigenética, <strong>nutrição</strong> e<br />

saúde foi debatida por mais de 100 pesquisadores.<br />

conhecer 19


20 conhecer<br />

No início do século 21,<br />

aprendemos que o processo de<br />

hereditariedade envolve bem<br />

mais do que a estrutura do DNA<br />

Assim, do terreno pouco fértil de Norrbotten, brotava a ideia,<br />

absurda à época, que viria apunhalar a corrente de pensamento<br />

conhecida como Síntese Moderna Evolutiva: que combina a teoria<br />

Darwinista da evolução das espécies por meio de seleção natural,<br />

a genética Mendeliana como base para a herança biológica e<br />

a genética populacional.<br />

Segundo o paradigma construído entre os anos 1930 e<br />

1940, e dominante nas últimas seis décadas, os efeitos da exposição<br />

ao meio ambiente não poderiam ocorrer tão rapidamente. Qual<br />

de nós não aprendeu na escola que as alterações evolucionárias<br />

precisam de alguns milhões de anos para se manifestarem?<br />

Seria esta, com atraso de mais de um século, a “carta na<br />

manga” de um desacreditado Jean-Baptiste Lamarck — defensor<br />

de que a evolução ocorreria no espaço de uma geração ou duas<br />

— contra Charles Darwin?<br />

Ou, em outras palavras, poderiam experiências vividas pelos<br />

pais em sua juventude, como situações limite de fome, deixarem<br />

marcas no material genético do óvulo ou do espermatozoide e serem<br />

transmitidas de alguma forma para suas próximas gerações?<br />

Mudança de paradigma<br />

Até o fim do século 20, a chamada Síntese Moderna ditava,<br />

de maneira hegemônica, que este atalho evolucionário não poderia<br />

ocorrer. E que a hereditariedade só se manifesta por meio da<br />

transmissão de genes de células de linhagem germinativa.<br />

No início do século 21, porém, um conjunto consistente de dados<br />

ajudou a construir o argumento de que a hereditariedade envolve<br />

mais do que a sequência de pares de base que compõem o DNA.<br />

Eva Jablonka, do Cohn Institute for the History and Philosophy<br />

of Science and Ideas de Israel, é uma das pesquisadoras<br />

mais ativas no ramo da epigenética. Em um trabalho de 2009,<br />

publicado no The Quarterly Review of Biology, ela aponta 100 casos<br />

bem documentados de herança epigenética entre gerações<br />

de organismos [2].<br />

Para citar apenas um exemplo, quando a mosca-da-fruta é<br />

exposta a geldanamicina, antibiótico inibidor da proteína de choque<br />

térmico HSP 90, pelo menos 13 gerações de seus descendentes<br />

nascem com uma pronunciada alteração ocular.<br />

Neste, e em todos os demais exemplos expostos por<br />

Jablonka, não houve qualquer alteração na estrutura do DNA.<br />

O que nos leva à próxima pergunta. Como isso acontece?<br />

Abrindo a caixa-preta<br />

Pense, por um instante, nas células do pâncreas e da re-<br />

tina. Ambas possuem funções absolutamente distintas, certo?<br />

Apesar disso, contêm, exatamente, o mesmo DNA.<br />

Diante disso, é fácil inferir a existência de um mecanismo regulador,<br />

independente do DNA, que diz, por exemplo, às células beta<br />

do pâncreas para produzirem insulina e às da retina que não. E para<br />

que ambas permaneçam da mesma maneira ao se dividirem.<br />

Desde a década de 1970, sabemos que as células alcançam<br />

sua necessária diferenciação quando um processo epigenético<br />

ativa ou desativa os genes, corretamente, no útero.<br />

Mas, apenas recentemente, ganhamos conhecimento de que<br />

este mesmo processo pode explicar, também, diferentes susceptibilidades<br />

a doenças de um modo que a genética tradicional não pode.<br />

Entre os diversos mecanismos propostos, o mais estudado<br />

é aquele que envolve a metilação do DNA — uma simples ligação<br />

de um carbono ligado a três átomos de hidrogênio a uma região<br />

específica de um gene.<br />

Em 2003, um dos mais elegantes experimentos abordando esta<br />

tese mudaria para sempre o rumo das pesquisas em epigenética. E<br />

a vida de um pesquisador que, assumidamente, não é fã de acordar<br />

cedo e que confia em boas doses de cafeína para começar o dia.<br />

Estamos falando, uma vez mais, de Randy Jirtle e da mudança<br />

radical em seu laboratório, originalmente voltado para as<br />

áreas de radiologia e oncologia.<br />

Jirtle e Robert Waterland, seu estudante de pós-doutorado<br />

à época, elegeram como modelo experimental camundongos regulados<br />

pelo gene Agouti, que não apenas confere uma pelagem<br />

amarela a eles como, também, os torna mais propensos ao desenvolvimento<br />

de obesidade, diabetes e câncer [3]<br />

O experimento consistia em alimentar dois grupos de<br />

fêmeas idênticas e grávidas com rações distintas: uma normal e<br />

outra suplementada por “doadores” de grupos metil, como ácido<br />

fólico e vitamina B12.


No fim do estudo, verificaram que estes grupos metil se<br />

ligavam a marcadores epigenéticos sobre o gene<br />

Agouti, no útero, silenciando sua expressão. Ou,<br />

como preferem alguns, desligando este gene.<br />

Dessa maneira, sem causar alteração alguma<br />

na estrutura do DNA, por meio apenas da suplementação de vitaminas<br />

do complexo B, Jirtle e seus colaboradores conseguiram que<br />

fêmeas Agouti produzissem gerações de fillhotes de pelagem castanha,<br />

sem propensão a obesidade, diabetes ou câncer.<br />

Pela primeira vez, defrontávamo-nos com algo, até então,<br />

impensável: um modelo experimental no qual doenças crônicas<br />

podiam ser prevenidas por várias gerações por meio de uma modulação<br />

epigenética mediada pela <strong>nutrição</strong>.<br />

Para se compreender com maior detalhe como se dá esta<br />

herança transgeracional, é preciso rever mais alguns conceitos<br />

em genética.<br />

Imprint genômico<br />

A primeira demonstração de que o genoma materno e o pa-<br />

terno não são equivalentes do ponto de vista funcional foi feita<br />

por um par de estudos independentes publicados em 1984 nas<br />

revistas Nature e Cell [4,5].<br />

Até então, acreditava-se que os genes autossômicos fossem<br />

todos eles expressos de maneira igual, independentemente<br />

de sua origem.<br />

De maneira geral, é verdade, a expressão desses genes é<br />

bialélica. Existem raras, porém importantes exceções, em que<br />

apenas o alelo, da mãe ou do pai, é expresso.<br />

O processo fisiológico que condiciona esta expressão monoalélica,<br />

conhecido como imprinting genômico, é mediado por um mecanismo<br />

epigenético. Ou seja, ocorre quando um grupo metil se liga<br />

à cromatina do gene, determinando que ele não seja expresso.<br />

Dessa forma, ao nocautear o gene de um alelo, apenas o<br />

gene do outro alelo é expresso.<br />

Na placenta, por exemplo, existem genes funcionais de origem<br />

exclusivamente paterna que são fundamentais para o desenvolvimento<br />

placentário normal. Ao mesmo tempo, há outros,<br />

de origem unicamente materna, que são críticos para o crescimento<br />

e o desenvolvimento embrionário.<br />

É necessário, portanto, que haja o encontro de dois alelos<br />

parentais na fertilização, um metilado, outro não, para que haja<br />

um desenvolvimento embrionário normal.<br />

conhecer 21<br />

Erros nesse processo podem causar abortamento e desenvolvimento<br />

de tumores placentários como mola hidatiforme e coriocarcinoma.<br />

Além da placenta, o cérebro também carrega considerável<br />

quantidade de “genes imprintados” que, sabe-se hoje, não são<br />

distribuídos de maneira aleatória.<br />

Enquanto os de origem materna estão concentrados no<br />

neocórtex, aqueles de origem paterna parecem mais agrupados<br />

na região da amígdala [6].<br />

A expressão balanceada desses genes estaria, segundo<br />

pesquisadores como o londrino Christopher Bradcock e o canadense<br />

Bernard Crespi, associada a um desenvolvimento cerebral<br />

normal. Por outro lado, teorizam eles, uma expressão anormalmente<br />

aumentada de genes paternos estaria ligada a um maior<br />

risco de autismo e uma predominância de genes de origem materna<br />

estaria associada à esquizofrenia [6].<br />

Um dos locus mais estudados na associação entre<br />

imprinting e câncer é o H19/IGF2 [7]. Acredita-se que o H19 seja<br />

um gene supressor de tumor. Em condições normais, apenas seu<br />

alelo materno costuma ser expresso. Já o IGF2 codifica um fator<br />

de crescimento e somente sua cópia paterna é expressa.<br />

Especula-se que tanto uma hipometilação de IGF2 (que causa<br />

aumento de sua transcrição) quanto uma hipermetilação de<br />

H19 (que promove sua menor transcrição) possam estar associadas<br />

a um risco aumentado de neoplasias, como câncer colorretal,<br />

de testículo e tumor de Wilms.<br />

Há outros genes humanos imprintados, cuja descoberta<br />

data de apenas meses ou semana atrás, como é o caso da associação<br />

entre DLGAP2 e autismo [8].<br />

Embora o mapeamento de genes que sofrem imprinting ainda<br />

seja incipiente, há pelo menos duas síndromes bem definidas associadas<br />

diretamente a eles, mediadas por mecanismo epigenético.<br />

Erros de imprint na banda 11 do cromosomo 15 estão<br />

associados, por exemplo, à Síndrome de Prader-Willi, caracterizada<br />

por hipotonia, retardo mental, características dismórficas,<br />

A expressão monoalélica de<br />

genes autossômicos de origem<br />

materna e paterna é conhecida<br />

como imprinting genômico


22 conhecer<br />

hiperfagia e compulsão alimentar, e à Síndrome de Angelman,<br />

marcada por baixa estatura, retardo mental severo, convulsões e<br />

uma característica fácies de “boneco feliz”.<br />

Durante anos, os genes foram considerados a única maneira<br />

para que características biológicas fossem transmitidas de<br />

uma geração para outra. Não mais...<br />

Desafiando nossa herança genética<br />

O aumento do número de publicações que tratam de epigené-<br />

tica é revelador da dimensão que este emergente ramo da ciência<br />

alcançou. Se entre 1990 e 2008 havia 55.000 trabalhos publicados<br />

sobre o tema, em 2009 apenas, tal número passava de 20.000.<br />

E, diante do fato de que é possível manipular marcadores<br />

epigenéticos em laboratório, novos programas passaram a ser<br />

financiados por institutos governamentais, principalmente nos<br />

EUA e na Europa.<br />

Com volume de investimento ainda tímido, quando comparado<br />

ao que já foi gasto com o Projeto Genoma, estas iniciativas<br />

começam a gerar seus primeiros frutos. Como o mapeamento de<br />

parte do epigenoma de células-tronco embrionárias e de fibroblastos,<br />

realizado pelo San Diego Epigenome Center em conjunto<br />

com o Salk Institute, ambos nos Estado Unidos, com verbas do<br />

National Institutes of Health (NIH).<br />

Sim, há pelo menos mais 208 linhagens de células do corpo<br />

humano esperando na fila, mas é um início. Da mesma forma,<br />

começam a surgir as primeiras drogas que parecem silenciar genes<br />

associados a doenças, como é o caso da azacitidina, usada<br />

no tratamento de pacientes com síndromes mielodisplásicas.<br />

Finalmente, o desenvolvimento de estratégias nutricionais para<br />

modular a expressão desses genes começa a ocupar papel de<br />

destaque na agenda das pesquisas em epigenética também.<br />

Um elefante na sala<br />

A crise econômica que atravessamos revela, como uma fra-<br />

tura exposta, o enorme grau de endividamento público acumulado,<br />

sobretudo pelos países industrializados do mundo.<br />

A respeito disso, há um tema subjacente, sobre o qual menos<br />

se fala, mas cujas consequências se anunciam cada vez<br />

mais desastrosas.<br />

O elefante na sala responde pelo binômio envelhecimento<br />

da população e custo progressivamente maior dos sistemas previdenciário<br />

e de saúde.<br />

Um sistema de saúde focado<br />

no tratamento de pessoas<br />

doentes precisa ser repensado<br />

em favor da prevenção<br />

Neste cenário, doenças crônicas, incluindo as que afetam<br />

o sistema cardiovascular, obesidade e diabetes, ocupam um perverso<br />

papel de destaque. São responsáveis por 60% de todos os<br />

óbitos, no Brasil e no mundo, com uma aceleração prevista para<br />

adicionais 17% nos próximos anos.<br />

De acordo com a consultoria PricewaterhouseCoopers, os gastos<br />

com o Sistema de Saúde nos Estados Unidos, em 2015, se elevarão<br />

de 15% para astronômicos 29% do Produto Interno Bruto (PIB).<br />

O cenário para países ditos emergentes não é diverso. Estima-se<br />

que nos próximos cinco anos os custos com o Sistema de<br />

Saúde atingirão a cifra de 500 bilhões de dólares na China, 300<br />

bilhões de dólares na Rússia e 200 bilhões de dólares na Índia.<br />

Em 2007, segundo dados do IBGE, este custo no Brasil já era de<br />

221 bilhões de reais.<br />

Em seu conjunto, estes dados nos confrontam com uma realidade<br />

tão incômoda quanto premente: um Sistema de Saúde focado<br />

no tratamento de pessoas doentes não é sustentável e precisa<br />

ser repensado drasticamente em favor de ações preventivas.<br />

Diante disso, não apenas as políticas de saúde pública devem<br />

passar por mudanças. Alguns conceitos que regem a indústria<br />

também.<br />

Necessidades específicas<br />

O cuidado personalizado de <strong>nutrição</strong> deve ser o primeiro<br />

passo para o desenvolvimento de uma efetiva política de prevenção.<br />

As palavras são de Peter Brabeck-Letmathe, Chairman da<br />

<strong>Nestlé</strong>, sublinhando aquela que é hoje uma das maiores prioridades<br />

da companhia: desenvolver produtos nutricionais que, de<br />

maneira customizada, impactem positivamente a história natural<br />

das doenças.


Nesse sentido, a <strong>Nestlé</strong> já detém um extenso curriculum.<br />

Pacientes portadores de disfagia, por exemplo, têm risco de pneumonia<br />

aspirativa diminuído com o uso de um produto que modifica a<br />

consistência dos alimentos (Resource® Thicken Up).<br />

O mapeamento de populações com deficiências nutricionais<br />

específicas levou a companhia a fortificar setorialmente alguns de<br />

seus produtos, em certos países do Continente Africano, por exemplo,<br />

com ferro, zinco, vitamina A e iodo.<br />

Há, ainda, o caso de pacientes renais crônicos, para os quais<br />

a <strong>Nestlé</strong>, por meio da CM&D Pharma Limited, testa um novo produto<br />

nutricional para diminuir seus elevados níveis de fosfato e,<br />

consequentemente, o risco de infarto agudo do miocárdio.<br />

Diante das recentes descobertas em ciência da <strong>nutrição</strong>,<br />

incluindo, naturalmente, aquelas que a vinculam à epigenética, a<br />

<strong>Nestlé</strong> decidiu ampliar sua visão estratégica para ocupar, e moldar,<br />

um novo espaço situado entre a indústria farmacêutica e a<br />

indústria de alimentos.<br />

Para isso, a companhia inaugurou, no dia 1° de janeiro de<br />

2011, seu mais moderno centro de pesquisa: o <strong>Nestlé</strong> Institute<br />

of Health Sciences.<br />

Assim como suas cadeiras de “Energia e Metabolismo” e de<br />

“Desenvolvimento Cerebral e Plasticidade”, seu novo instituto terá<br />

sede na École Polytechnique Fédérale de Lausanne, considerada um<br />

dos maiores centros de tecnologia do mundo.<br />

Além de estreitar a colaboração entre as duas instituições,<br />

o <strong>Nestlé</strong> Institute of Health Sciences será parte integrante da<br />

rede de pesquisa e desenvolvimento da companhia, que inclui o<br />

<strong>Nestlé</strong> Research Center e sua rede externa de colaboradores.<br />

O objetivo do novo Instituto reside em aprofundar a investigação<br />

dos mecanismos envolvidos em doenças crônicas como<br />

obesidade, diabetes, Alzheimer e aterosclerose, em nível molecular.<br />

E, a partir desse conhecimento, conceber estratégias e produtos<br />

nutricionais para sua prevenção.<br />

Segundo Peter Brabeck, o pioneirismo da <strong>Nestlé</strong> nesta área<br />

se dá pela posição singular que a companhia ocupa no cenário<br />

rEFErêNCIAS<br />

conhecer 23<br />

mundial: “Temos expertise, ciência, recursos e organização para<br />

encontrar soluções alternativas e eficientes, de bom custo-benefício,<br />

para contribuir para a prevenção e o tratamento de doenças<br />

agudas e crônicas no século 21.”<br />

Uma nova era<br />

Arrisco dizer que, em meados de 1990, eu tenha passado<br />

mais horas diante de um sequenciador de DNA do Departamento<br />

de Imunologia da Universidade da Califórnia do que junto da família<br />

e dos amigos.<br />

Entretido até o pescoço com enzimas de restrição e bibliotecas<br />

de RNA mensageiro, o sonho de clonar genes que conferissem<br />

maior susceptibilidade a doenças autoimunes acabava, sim, por<br />

me roubar o sono.<br />

Hoje, ao escrever este artigo, uma pergunta inevitável me<br />

toma de assalto. Estive eu, durante quatro anos, buscando respostas<br />

no lugar errado? Tudo indica que sim.<br />

Uma década depois de finalizado o Projeto Genoma Humano<br />

– com seus 25.000 genes mapeados ao custo de US$ 3 bilhões –<br />

é forçoso admitir que nosso destino não esteja imobilizado dentro<br />

de uma camisa de força urdida por duplas hélices de DNA.<br />

O Projeto Epigenoma Humano já está em curso [9] e, com<br />

ele, a perspectiva concreta de que é possível modular a expressão<br />

de genes imprintados.<br />

Há um árduo trabalho pela frente e novas questões deverão<br />

surgir. Uma coisa, porém, é certa: a epigenética é uma realidade.<br />

E nunca, em qualquer outro momento da história, o pensamento<br />

atribuído a Hipócrates de que somos o que comemos<br />

fez tanto sentido. Com um pequeno complemento<br />

apenas: somos o que nossos<br />

avós e nossos pais comeram<br />

também.<br />

[1] Bygren LO, Kaati G, Edvinsson S. Longevity determined by paternal ancestorsí nutrition during their slow growth period. Acta Biotheor. 2001;49(1):53-9. [2] Jablonka E, Raz G.<br />

Transgenerational epigenetic inheritance: prevalence, mechanisms, and implications for the study of heredity and evolution. Q Rev Biol. 2009;84(2):131-76. [3] Waterland RA, Jirtle RL.<br />

Transposable elements: targets for early nutritional effects on epigenetic gene regulation. Mol Cell Biol. 2003;23(15):5293-300. [4] Barton SC, Surani MA, Norris ML. Role of paternal<br />

and maternal genomes in mouse development. Nature. 1984;311(5984):374. [5] McGrath J, Solter D. Completion of mouse embryogenesis requires both the maternal and paternal<br />

genomes. Cell. 1984;37(1):179-83. [6] Badcock C, Crespi B. Battle of the sexes may set the brain. Nature. 2008;454(7208):1054-5. [7] Ideraabdullah FY, Vigneau S, Bartolomei MS.<br />

Genomic imprinting mechanisms in mammals. Mutat Res. 2008;647(1-2):77-85. [8] Pinto D, Pagnamenta AT, Klei L et al. Functional impact of global rare copy number variation in<br />

autism spectrum disorders. Nature. 2010;466(7304):368-72. [9] http://www.epigenome.org/index.php?page=pilotproject


<strong>nutrição</strong> e cultura<br />

por_Teodoro Holck<br />

https://www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/<br />

Músicos da Vegetable<br />

Orchestra de Viena, juntos<br />

há 12 anos<br />

Com todos os sentidos<br />

Quando viaja em turnê, a Vegetable Orchestra de Viena não tem bagagem. Tam-<br />

bém não é nenhum exagero dizer que a música que faz tem sabor local, nem questão<br />

de interpretação afirmar que depende muito de gosto. São canções, sem nenhum trocadilho,<br />

dotadas do maior frescor possível, únicas porque são feitas de matéria que<br />

depois desaparece numa grande sopa servida ao público.<br />

A orquestra de vegetais, como diz o nome traduzido, vai à feira cada vez que chega<br />

a uma cidade para tocar. Seus músicos chacoalham berinjelas, despejam feijões e<br />

grãos para testar o potencial sonoro. Buscam os exemplares mais frescos no mercado<br />

para fabricar seus instrumentos. Abóboras são cavadas com furadeiras improvisadas,<br />

brocas sensíveis às dimensões de raízes e tubérculos. Depois testam o som oco<br />

dessas verduras, fazem uma espécie de mil-folhas de berinjela, que agitam em tapas<br />

sonoros. Na hora, cenouras viram flautas, pimentões viram cornetas, abóboras viram<br />

vários tipos de tambor.


Juntos há 12 anos, esses dez austríacos, entre eles músicos, artistas plásticos,<br />

arquitetos, designers, criadores multimídia, escritores e poetas, decidiram seguir os<br />

preceitos da gastronomia contemporânea, pautada pelas misturas e reduções, e fundir,<br />

para além do plano culinário, a cozinha com a produção musical. Nisso, extraem de<br />

folhas, raízes, cascas e caules uma sonoridade experimental.<br />

Numa primeira audição, parecem barulhinhos orgânicos, um gotejar ancestral<br />

intercalado por zunidos molhados, estalos cristalinos, isso quando a verdura ainda<br />

está fresca. Mas, nos trabalhos mais recentes, atingem uma complexidade sonora tão<br />

grande que é quase impossível imaginar que toda essa potência acústica, de volteios<br />

eletrônicos e arroubos jazzísticos, possa partir de um monte de cenouras, beterrabas,<br />

acelgas e alho-poró. No site do grupo, já garantem que a exploração e o aperfeiçoamento<br />

da performance de música vegetal é parte central dessa busca estética.<br />

Descobriram na elasticidade das fibras uma chance de desdobrar aquele ramerame<br />

do princípio em free jazz, música contemporânea, eletrônica e dub. Da horta no<br />

quintal acaba brotando uma sonoridade semelhante aos ecos e batidas dos sintetizadores,<br />

numa espécie de elo transcendental entre a música guardada nas sementes do<br />

mundo e aquilo que a humanidade aprendeu a fabricar com cordas, madeira, metal e<br />

circuitos eletrônicos.<br />

Sonoridade<br />

que brota da<br />

elasticidade<br />

das fibras<br />

Quando viaja em<br />

turnê, a Vegetable<br />

Orchestra de<br />

Viena não tem<br />

bagagem. Também<br />

não é nenhum<br />

exagero dizer que<br />

a música que faz<br />

tem sabor local<br />

Desde que inventou a moda de fazer música com verduras, frutas e legumes, a<br />

Vegetable Orchestra já gravou três discos. No primeiro deles, Gemise, não negava as<br />

origens, ou melhor, raízes naturais da empreitada. Esse disco traz até uma faixa com<br />

nome em português, Ambiente Verde, que parece um galinheiro ensandecido, com pios<br />

um tanto dolorosos, oscilando entre o cacarejo de galos e galinhas em acasalamento e<br />

macacos à beira do delírio em cipós de uma floresta psicodélica.<br />

Mas uma faixa nesse primeiro disco já apontava uma nova direção. Letscho74 esboça<br />

uma espécie de jazz, mas se estilhaça em frangalhos galináceos ainda bizarros,<br />

um grunhir de ratazanas vegetais. É com o passar do tempo que a música da orquestra<br />

se torna mais fina, depurada, ou mesmo fresca, mas sem jamais deixar de lado a pegada<br />

terrestre, com verniz de terra molhada, que torna inconfundível o som desse grupo.<br />

<strong>nutrição</strong> e cultura 25


26 <strong>nutrição</strong> e cultura<br />

Ou quase inconfundível. Quando decidiram gravar covers do Kraftwerk, pioneiros<br />

da música eletrônica, confundiram até os mais veteranos conhecedores do grupo ale-<br />

mão. Faixas como Stoik, Prelay e Sinus 440 usam os mesmos vegetais do disco anterior<br />

para tecer melodias instrumentais do alto teor sintético. Zumbidos metálicos, raspas<br />

cibernéticas e cuícas da era espacial se juntam em sinfonias indefiníveis, que desarmam<br />

quem descobre que tudo partiu de uma brincadeira bem afinada na cozinha.<br />

Por trás do novo som, estava uma nova receita. Não seria possível criar as tessituras<br />

sonoras tão próximas da estética eletrônica sem incorporar ao arsenal de instrumentos<br />

verdes a estrela desse disco, uma marimba de rabanetes. Também usaram<br />

nas gravações esses mesmos rabanetes mergulhados na água e os mais tradicionais<br />

instrumentos da orquestra, o saxofone de pepino e o clarinete de cenoura.<br />

Zumbidos metálicos, raspas cibernéticas e cuícas da era espacial<br />

se juntam em sinfonias indefiníveis, que desarmam quem descobre<br />

que tudo partiu de uma brincadeira bem afinada na cozinha<br />

Criatividade que deu<br />

origem a 22 instrumentos<br />

catalogados<br />

Na composição oficial do conjunto, já existem 22 instrumentos vegetais catalogados,<br />

entre eles duas variedades de tambor de abóbora, um com baquetas de berinjela e<br />

outro com hastes de cenoura. Completam a ala da percussão um chocalho de salsinha,<br />

um pandeiro de berinjela, um reco-reco de cenoura e um triângulo de miniabóbora. Nos<br />

sopros, há cornetas de pimentão, trompetes e saxofones de pepino e flautas e clarinetes<br />

de cenoura e rabanete. Cordas chegam com violinos de alho-poró e um violão de aipo.<br />

Não é preciso fazer muito esforço para ver que cenouras e suas primas são as vedetes<br />

da orquestra. Em geral, verduras cilíndricas, pela semelhança na forma, se prestam<br />

mais à função de instrumento musical. Perfurados com precisão numa estranha<br />

linha de montagem, que faz até voar restos de verdura pelos ares, cenouras, nabos,<br />

cabaças e pepinos são capazes de emitir uma vasta gama de sons. Mas não há muitas<br />

regras nem limites impostos à criatividade do conjunto.


Por onde andam,<br />

estão dispostos a<br />

incorporar sons,<br />

ou exemplares<br />

da flora local, ao<br />

repertório<br />

<strong>nutrição</strong> e cultura 27<br />

“Depende da música tocada e também da técnica do músico”, disse uma vez o ar-<br />

tista plástico fundador da Vegetable Orchestra, Nikolaus Gansterer, a um site austríaco.<br />

“Mas basicamente cenouras são verduras flexíveis e versáteis. Para sons de baixa frequência,<br />

algumas abóboras oferecem uma gama enorme de graves, enquanto a pele do<br />

alho-poró é muito útil para os agudos. Cada vegetal tem enorme potencial acústico.”<br />

Esse potencial aparece com toda a potência no mais recente trabalho da orquestra,<br />

o disco Onionoise, junção das palavras inglesas para cebola e barulho. Na gravação<br />

desse terceiro disco, integrantes do conjunto mostram um ar de cientista maluco, nerds<br />

naturebas e músicos experimentais de primeira linha. Regem esse barulho das cebolas<br />

como arquitetos de um som orgânico bizarro, aliando a precisão dos germânicos a um<br />

humor macarrônico que só italianos, espanhóis e latinos teriam na cozinha.<br />

Mas não tem passaporte essa música. Por onde andam, estão dispostos a incorporar<br />

sons, ou exemplares da flora local, ao repertório. Talvez por isso consigam atingir<br />

resultados tão universais na música que fazem. Buscam um som cheio de vontade<br />

natural, encadeando vibrações sonoras aborígenes, como se desvelassem uma nova<br />

ancestralidade na música da natureza, seus apitos e assobios.<br />

Não fosse a sonoridade estranha da Vegetable Orchestra e o aspecto bonachão<br />

desses músicos com a cara enfiada nos vegetais, toda a empreitada seria um eco no<br />

tempo, guardadas as diferenças, da arte conceitual do alemão Joseph Beuys e do argentino<br />

Victor Grippo. Eles usaram a energia de batatas e limões para produzir se não<br />

música, eletricidade, numa crença da potência primordial regenerativa da natureza.<br />

Essa herança fica ainda mais evidente levando em conta o fato de um bando de artistas<br />

plásticos emprestarem seus dotes de músico ao grupo.


28 <strong>nutrição</strong> e cultura<br />

Em tempos de surto ecológico diante do aquecimento global e do esfacelamento<br />

generalizado do planeta, essa música verde ganha até ares de militância política. Re-<br />

vela o enorme potencial do banal na música, aquilo que está ao alcance de qualquer<br />

jardineiro ou dona de casa mais ociosa. Se é fato que não é a primeira vez que a comida<br />

entra nas pautas musicais, já que sempre esteve presente na sonoplastia de filmes, a<br />

Vegetable Orchestra mostra que salada verde e o tempero podem agradar também aos<br />

ouvidos, indo muito além da entrada, sem medo de ser o prato principal.<br />

Muito conscientes disso, integrantes do grupo agora também se esforçam para<br />

transformar seus concertos em experiências imersivas, que apelam para todos os sentidos.<br />

Se é tradição cozinhar os instrumentos e servir uma enorme sopa de verduras e<br />

legumes ao público no fim de cada apresentação, agora incorporam câmeras e inserções<br />

de vídeo ao vivo nas performances, dando dimensão imagética ao caldo-verde sonoro.<br />

“Estamos tocando com as espécies que conhecemos. Daqui a dez anos,<br />

ainda vamos estar explorando as possibilidades da música vegetal”<br />

Cada vegetal<br />

possui um enorme<br />

potencial acústico<br />

Críticos que já se encantaram com a gama de sons que podem ser criados a partir<br />

de uma horta surpreendente e única e viagens sonoras abstratas dos primeiros momentos<br />

da Vegetable Orchestra agora já saboreiam outras paragens gastromusicais.<br />

Alardeiam deliciados os novos shows do conjunto, chamando atenção para o uso incrível<br />

de materiais naturais à disposição deles e nomeando tudo de banquete para todos<br />

os sentidos.<br />

“Estamos trabalhando em novos programas no momento, que vão falar sobre as<br />

relações complexas entre natureza, humanidade e cultura”, resume Nikolaus Gansterer.<br />

“O projeto está num estado constante de desenvolvimento. Há plantas com que ainda<br />

não tocamos. Se pensarmos nas florestas tropicais ou nas novas promessas da ciência,<br />

o futuro da música vegetal pode ser muito desafiador e imprevisível, estamos tocando<br />

com as espécies que conhecemos. Daqui a dez anos, ainda vamos estar explorando as<br />

possibilidades da música vegetal.”


FLAVIA BArIA<br />

Nutricionista.<br />

Mestre em Nutrição<br />

e Doutoranda em<br />

Ciências pelo Programa<br />

de Pós-Graduação<br />

em Nutrição da<br />

Universidade Federal de<br />

São Paulo - UNIFESP<br />

LILIAN CUPPArI<br />

Nutricionista. Professora<br />

Afiliada da Disciplina<br />

de Nefrologia da<br />

Universidade Federal de<br />

São Paulo – UNIFESP.<br />

Supervisora de<br />

Nutrição da Fundação<br />

Oswaldo Ramos,<br />

órgão suplementar da<br />

UNIFESP<br />

NOTA DO EDITOr<br />

3. Terapia Nutricional<br />

dossiê bio<br />

TERAPIA<br />

NUTRICIONAL<br />

na doença<br />

renal crônica<br />

3.1 Energia<br />

3.1.1 Fase pré-dialítica<br />

Estudos mostram que pacientes na fase de tratamento conservador, mesmo quando submetidos<br />

à restrição proteica, apresentam necessidades energéticas muito semelhantes àquelas de indivíduos<br />

saudáveis com atividade física leve (35 kcal/kg/dia). Pacientes obesos ou com mais de 60 anos de idade<br />

podem receber uma quantidade menor de energia na dieta (~30 kcal/kg/dia) em razão do menor<br />

nível de atividade física. Já para os pacientes que apresentam piora da condição nutricional ou que já<br />

desenvolveram des<strong>nutrição</strong> energético-proteica (DEP), a oferta de energia na dieta deve ser superior<br />

a 35 kcal/kg/dia. Como as necessidades energéticas variam de acordo com a idade, nível de atividade<br />

física, estado nutricional, presença de distúrbios metabólicos e comorbidades, essas recomendações<br />

devem ser utilizadas apenas como um guia inicial para o planejamento da dieta. Deve-se realizar o<br />

monitoramento do estado nutricional para avaliar se a necessidade energética estimada está adequada<br />

ao paciente e realizar os ajustes apropriados quando necessário.<br />

A primeira parte deste artigo — Terapia nutricional na doença renal crônica — foi publicada na edição de número 12 da <strong>Nestlé</strong>.Bio.


30 dossiê bio<br />

3.1.2 Fase dialítica<br />

Estudos de balanço metabólico demonstram<br />

que pacientes estáveis em diálise, com atividade física<br />

leve e com ingestão proteica adequada, alcançam<br />

balanço nitrogenado neutro quando ingerem ao<br />

redor de 35 kcal/kg/dia. Para pacientes com mais de<br />

60 anos, uma ingestão de energia de 30 kcal/kg/dia<br />

parece ser suficiente.<br />

Para pacientes em diálise peritoneal, é necessário<br />

observar a oferta de energia proveniente da absorção<br />

da glicose contida na solução de diálise. Isso<br />

representa uma fonte de energia involuntária que<br />

deve ser considerada na elaboração do plano alimentar,<br />

principalmente para pacientes com sobrepeso/<br />

obesidade. Apesar de a energia referente à glicose<br />

absorvida ser de grande utilidade na elaboração de<br />

dieta hipercalórica, para pacientes com algum grau<br />

de DEP a absorção constante de glicose pode ter um<br />

efeito negativo no apetite.<br />

A ingestão energética reduzida causada pela diminuição<br />

de apetite é comum nos pacientes em tratamento<br />

dialítico. Esta condição é muitas vezes um<br />

desafio para a equipe multiprofissional e, enquanto<br />

esforços são feitos para identificar as causas da anorexia,<br />

um aconselhamento dietético intensivo deve ser<br />

realizado. A prescrição de uma dieta menos restritiva,<br />

considerando-se as preferências alimentares do paciente,<br />

pode ser útil para melhorar a ingestão alimentar.<br />

Além disso, deve-se fornecer receitas elaboradas<br />

com alimentos de elevada densidade energética. Se<br />

essas estratégias não forem efetivas, a utilização de<br />

suplementos orais específicos ou dieta enteral deve<br />

ser considerada.<br />

3.2 Proteína<br />

3.2.1 Fase pré-dialítica<br />

A restrição proteica é a manipulação dietética mais comum no tratamento<br />

conservador, e o objetivo dessa conduta é retardar a entrada do paciente em diálise.<br />

Apesar das controvérsias sobre o papel da restrição de proteínas em retardar a<br />

progressão da DRC, os benefícios da manipulação dietética na prevenção ou atenuação<br />

do acúmulo de compostos nitrogenados tóxicos, distúrbios metabólicos e<br />

hormonais (acidose, intolerância à glicose e hiperparatireoidismo) e proteinúria<br />

são inquestionáveis. Além disso, há evidências de que dietas bem planejadas por<br />

nutricionistas qualificadas e seguidas por pacientes aderentes e motivados são<br />

eficazes e não têm efeitos adversos sobre as condições nutricionais.<br />

A quantidade de proteína recomendada no tratamento conservador depende<br />

do nível de função renal. Para pacientes com taxa de filtração glomerular<br />

(TFG) ou clearance de creatinina acima de 70 ml/min/1,73 m2 recomenda-se<br />

uma ingestão de 0,8 g/kg/dia a 1,0 g/kg/dia, que é a quantidade recomendada<br />

para indivíduos sadios [10]. Quando a TFG está entre 70 ml/min/1,73 m2 e<br />

30 ml/min/1,73 m2 ou há evidência de progressão da doença, a dieta deve conter<br />

0,6 g/kg/dia de proteína, sendo pelo menos 50% de proteína de alto valor biológico,<br />

ou seja, aquelas proteínas que contêm todos os aminoácidos em proporções<br />

adequadas. Caso se observe muita dificuldade na adesão à restrição proteica, a<br />

dieta pode chegar até 0,75 g/kg/dia. No entanto, quando a TFG estiver abaixo de<br />

30 ml/min/1,73 m2 , recomenda-se 0,6 g/kg/dia de proteína, com ao menos 50%<br />

das proteínas sendo de alto valor biológico.<br />

3.2.2 Fase dialítica<br />

A orientação de proteína no tratamento dialítico é bem diferente daquela<br />

do tratamento conservador. A recomendação de proteína para pacientes em<br />

hemodiálise é de 1,2 g/kg/dia, e para aqueles em diálise peritoneal é de 1,2 g/<br />

kg/dia a 1,4 g/kg/dia. Em ambos os casos deve-se assegurar uma oferta de ao<br />

menos 50% de proteína de alto valor biológico. As razões para a recomendação<br />

de maior quantidade de proteína incluem o aumento do catabolismo proteico,<br />

que ocorre durante e até 2 horas após o término da hemodiálise, a perda de<br />

aminoácidos durante o procedimento da hemodiálise e a perda de aminoácidos<br />

e moléculas de proteína através do peritônio durante a diálise peritoneal. Em<br />

casos de hiperfosfatemia, a ingestão proteica poderá ser diminuída, mas não a<br />

valores menores do que 1,0 g/kg/dia.<br />

A ingestão proteica reduzida em razão da diminuição do apetite ou a aversão<br />

a alimentos proteicos é frequentemente observada nos pacientes submetidos


à hemodiálise e, por razões ainda desconhecidas, parece<br />

ser mais comum nos pacientes em diálise peritoneal.<br />

Nessa situação, o paciente deve ser orientado<br />

a escolher alimentos que em pequenas porções contenham<br />

elevado teor de proteína, como queijo, ovos<br />

e carnes magras. Suplemento oral, como os módulos<br />

de proteína, pode ser uma boa opção para aumentar<br />

a oferta proteica. É preciso também garantir uma ingestão<br />

adequada de energia para maximizar os efeitos<br />

benéficos da dieta hiperproteica.<br />

3.3 Sódio e líquidos<br />

3.3.1 Fase pré-dialítica<br />

Apesar da habilidade dos rins de excretar sódio<br />

ser usualmente mantida até a TFG de aproximadamente<br />

15 ml/min/1,73 m2 , uma restrição de sódio<br />

moderada é benéfica para um melhor controle da<br />

pressão arterial e para evitar a sobrecarga de líquidos,<br />

particularmente em pacientes com síndrome<br />

nefrótica, insuficiência cardíaca congestiva e ascite.<br />

A recomendação de sódio para pacientes com DRC<br />

é de 2.000 mg/dia, que corresponde a 5 g a 6 g de sal<br />

(NaCl). A ingestão de sódio pode ser estimada por<br />

meio da excreção de sódio na urina de 24 horas.<br />

Para alcançar um controle satisfatório da ingestão<br />

de sódio, os pacientes devem ser instruídos a<br />

restringir o sal de adição e o consumo de alimentos<br />

processados com alto teor de sódio, como embutidos,<br />

frios, temperos prontos, enlatados, carnes curadas,<br />

alimentos defumados, preparações congeladas, margarina<br />

com sal, queijos, oleaginosas torradas e salgadas.<br />

O uso de sal dietético é contraindicado para<br />

pacientes com DRC, pois contém cloreto de potássio<br />

dossiê bio 31<br />

em sua composição. A restrição hídrica raramente é orientada para pacientes em<br />

tratamento conservador, pois, na maioria dos casos, eles são capazes de manter<br />

o balanço hídrico.<br />

3.3.2 Fase dialítica<br />

A restrição de sódio e de líquidos é essencial para controlar a pressão arterial,<br />

o volume extracelular e para evitar o ganho excessivo de peso interdialítico<br />

dos pacientes em diálise. A ingestão de sódio deve ser menor do que 2.000 mg/<br />

dia (~5g a 6g de NaCl). Para pacientes em hemodiálise, a restrição de sódio<br />

contribui para a redução do ganho de peso interdialítico principalmente por diminuir<br />

a sede. O ganho de peso interdialítico se refere à diferença entre o peso<br />

pós-diálise da diálise sessão anterior e o peso pré-diálise da sessão seguinte.<br />

A restrição hídrica é mais empregada para pacientes em hemodiálise.<br />

Na diálise peritoneal, a restrição pode ser necessária caso se observe retenção<br />

hídrica ou edema clínico. Para pacientes em hemodiálise, a ingestão hídrica<br />

deve ser calculada somando-se 500 ml à diurese residual de 24 horas. Para<br />

pacientes anúricos em hemodiálise, orienta-se ingestão hídrica de, no máximo,<br />

1.000 ml/dia. O objetivo é manter o ganho de peso interdialítico entre 3% e<br />

4% do peso seco.<br />

3.4 Potássio<br />

Durante a progressão da DRC, os níveis séricos de potássio são mantidos<br />

na faixa de normalidade em razão do aumento da secreção tubular e aumento<br />

da excreção de potássio nas fezes. Já nos estágios mais avançados da doença, a<br />

hiperpotassemia é mais frequente e a restrição dietética de potássio se faz necessária.<br />

Pacientes em tratamento conservador com níveis séricos normais de<br />

potássio, mas com TFG abaixo de 20 ml/min/1,73 m2 , devem ser orientados a<br />

fazer restrição de alimentos ricos em potássio. A restrição dietética deve ser mais<br />

rigorosa para pacientes em hemodiálise, sobretudo os anúricos. Já pacientes em<br />

diálise peritoneal raramente apresentam hiperpotassemia. Apesar de a alimentação<br />

contribuir de forma significativa com os níveis séricos de potássio, outras<br />

condições como o uso de anti-hipertensivos inibidores da enzima conversora de<br />

angiotensina (IECA) ou de seus receptores, hipoaldosterolemia, constipação<br />

intestinal e acidose metabólica podem causar ou agravar a hiperpotassemia e<br />

devem ser tratados sempre que possível.<br />

Em geral, recomenda-se que a ingestão de potássio seja de 50 mEq/dia a<br />

70 mEq/dia. Hortaliças, frutas, leguminosas e oleaginosas apresentam elevado<br />

teor de potássio. O processo de cozimento em água das hortaliças e frutas (sendo


32 dossiê bio<br />

a água do cozimento descartada) promove perda de<br />

aproximadamente 60% do conteúdo de potássio do<br />

alimento, não havendo necessidade de submeter o<br />

alimento a mais de um cozimento [11]. Entretanto,<br />

não é necessário que o paciente seja orientado a consumir<br />

somente alimentos cozidos. Frutas e hortaliças<br />

com reduzido teor de potássio podem ser ingeridas<br />

em pequenas quantidades (Tabela 4).<br />

É importante ressaltar que a ingestão de carambola<br />

ou de seus produtos (sucos e doces) é proibida<br />

para pacientes com DRC, independentemente de<br />

seu teor de potássio. Isso se deve ao fato de que a<br />

carambola contém uma neurotoxina que é depurada<br />

somente pelos rins e, com a redução da função renal,<br />

essa substância tóxica não é totalmente depurada, podendo<br />

causar desde soluços e convulsões, até coma e<br />

morte em alguns casos [13].<br />

3.5 Fósforo<br />

3.5.1 Fase pré-dialítica<br />

Com o declínio da função renal, a habilidade<br />

para manter a homeostase do fósforo fica comprometida.<br />

O mecanismo compensatório inicial para manter<br />

os níveis de fósforo é uma diminuição na taxa de reabsorção<br />

tubular renal do fósforo, que é parcialmente<br />

mediada pelo hormônio da paratireoide (PTH). Este<br />

mecanismo geralmente permite a manutenção do<br />

fósforo sérico dentro da normalidade até uma TFG<br />

entre 20-25 ml/min/1,73 m2 . A partir desse ponto, a<br />

excreção de fósforo não consegue compensar a ingestão<br />

e ocorre o aumento do fósforo sérico. Segundo o<br />

guia norte-americano de doença e metabolismo ósseo<br />

Tabela 4. Teor de potássio em porções usuais de alguns alimentos [12]<br />

Alimentos com pequena e média quantidade de potássio (5,1 mEq/porção)<br />

1 banana nanica média 1 pires (chá) de acelga crua<br />

1 fatia média de melão 2 pires (chá) de couve crua<br />

1 laranja-lima média 3 colheres de sopa de beterraba crua<br />

1 laranja-pera média 1 pires (chá) de batata frita<br />

1 kiwi médio 2 colheres (sopa) de massa de tomate<br />

½ abacate médio 1 concha pequena de feijão<br />

1 mexerica média 1 concha pequena de lentilha<br />

½ copo de água de coco<br />

1 fatia média de mamão<br />

Demais hortaliças devem ser cozidas sem casca<br />

e a água do cozimento deve ser descartada.<br />

em nefrologia (NKF/DOQI – National Kidney Foundation/Guidelines for Bone<br />

Metabolism and Disease in Chronic Kidney Disease) [14], a ingestão de fósforo na<br />

dieta deve ser de 800 mg/dia a 1.000 mg/dia quando o fósforo sérico estiver acima<br />

de 4,6 mg/dL nos estágios 3 e 4 da DRC ou quando os níveis plasmáticos de<br />

PTH estiverem acima dos valores desejáveis. Se o controle dietético não trouxer<br />

resultados satisfatórios, quelantes de fósforo devem ser prescritos.<br />

O fósforo está presente em um grande número de alimentos, principalmente<br />

naqueles que são fontes de proteínas. A absorção intestinal do fósforo<br />

proveniente dos alimentos de origem animal como carnes, ovos e laticínios é bastante<br />

eficiente e varia entre 70% e 90%. Já nos alimentos de origem vegetal, uma<br />

quantidade significativa do fósforo encontra-se na forma de fitato, um composto<br />

não digerível, resultando em uma baixa biodisponibilidade do fósforo. Na vigência<br />

de hiperfosfatemia, além dos alimentos proteicos, outros alimentos fontes de<br />

fósforo, como cerveja, refrigerante à base de cola, chocolate, amendoim, castanhas<br />

e nozes, devem ser evitados. Recentemente, os alimentos industrializados<br />

(biscoitos, salgadinhos, queijos processados, embutidos, alimentos semiprepara-


dos, hambúrguer, massas congeladas etc.) têm sido<br />

identificados como uma importante fonte de fósforo<br />

em razão dos conservantes utilizados.<br />

Para os pacientes que estão nos estágios 3 e 4<br />

da DRC, a quantidade de fósforo recomendada é relativamente<br />

fácil de ser alcançada se o paciente for<br />

aderente à restrição proteica. No entanto, alimentos<br />

que não são fontes de proteína mas contêm grande<br />

quantidade de fósforo devem ser evitados.<br />

3.5.2 Fase dialítica<br />

Como os procedimentos dialíticos são pouco<br />

eficientes na remoção de fósforo, a hiperfosfatemia<br />

é bastante frequente nos pacientes em diálise.<br />

Estima-se que 800 mg a 1.000 mg de fósforo são<br />

eliminadas em cada sessão de diálise, o que representa<br />

uma excreção de 350 mg a 450 mg de fósforo,<br />

se extrapolarmos para 24 horas nos pacientes com<br />

mínima função renal residual. Uma quantidade similar<br />

de fósforo é removida diariamente na diálise<br />

Tabela 5. Principais alimentos fonte de fósforo e de proteína [15]<br />

dossiê bio 33<br />

peritoneal. Considerando a absorção intestinal de fósforo de aproximadamente<br />

60%, a ingestão máxima para atingir o equilíbrio com a remoção do fósforo<br />

pela diálise seria de aproximadamente 600 mg de fósforo. Esta baixa ingestão<br />

de fósforo é incompatível com a necessidade proteica da maioria dos pacientes<br />

em diálise. Portanto, a combinação de um plano alimentar bem elaborado com<br />

a utilização de quelantes de fósforo é frequentemente necessária para manter<br />

os níveis séricos de fósforos dentro de valores aceitáveis. Segundo o guia<br />

norte-americano de doença e metabolismo ósseo em nefrologia (NKF/DOQI<br />

– National Kidney Foundation/Guidelines for Bone Metabolism and Disease in<br />

Chronic Kidney Disease) [14], a concentração sérica de fósforo deve ficar entre<br />

3,5 mg/dL e 5,5 mg/dL, e a ingestão de fósforo deve variar entre 800 mg/dia e<br />

1.000 mg/dia. Além do fósforo ingerido, outros fatores como o uso de quelantes<br />

de fósforo e vitamina D, a adequação da diálise e a presença de doenças<br />

ósseas de baixa ou alta remodelação também podem levar à hiperfosfatemia.<br />

Para evitar o comprometimento da ingestão proteica em detrimento da restrição<br />

de fósforo, o primeiro passo no planejamento dietético é estimar a necessidade<br />

de proteína do paciente, garantindo um mínimo de 50% de proteínas de<br />

alto valor biológico e, em seguida, fazer os ajustes, optando por alimentos com<br />

menor relação fósforo/proteína (Tabela 5). Também tem sido demonstrado que<br />

o processo de cozimento permite uma redução significativa do teor de fósforo,<br />

preservando o teor de proteína da carne bovina e de aves.<br />

Alimento Quantidade (g) Medida caseira P (mg) Proteína (g) Relação P/Proteína (mg/g)<br />

Carne de frango 80 1 filé de peito médio 150 23 6,5<br />

Carne de porco 80 1 bisteca média 147 21,2 6,9<br />

Carne bovina 85 1 bife médio 209 26 8<br />

Pescada branca 84 1 filé médio 241 20,6 11,7<br />

Ovo inteiro 50 1 unidade 90 6 15<br />

Clara de ovo 30 1 unidade 4,3 3,3 1,3<br />

Fígado de boi 85 1 bife médio 404 22,7 17,8<br />

Sardinha 34 1 unidade 170 8,4 20,2<br />

Presunto 48 2 fatias médias 136 14 9,7<br />

Queijo prato 30 2 fatias finas 153 7,5 20,4<br />

Iogurte 120 1 pote pequeno 159 6,3 25,2<br />

Leite 150 1 copo americano 140 4,9 28,6<br />

Soja cozida 54 5 colheres de sopa 130 9 14,5<br />

Feijão cozido 154 1 concha média 133 6,9 19,3<br />

Amendoim 50 1 pacote pequeno 253 13 19,5<br />

Chocolate 40 1 barra pequena 92 3 30,7


34 dossiê bio<br />

O segundo passo é ajustar a dose do quelante<br />

de fósforo de acordo com a quantidade de fósforo<br />

em cada refeição ou lanche. Os quelantes contêm<br />

compostos que se ligam ao fósforo do alimento no<br />

intestino, reduzindo assim sua absorção. Os quelantes<br />

podem ser à base de cálcio (carbonato de cálcio<br />

e acetato de cálcio) e sem cálcio (cloridrato de sevelamer).<br />

O hidróxido de alumínio, também quelante<br />

de fósforo e isento de cálcio, não deve ser utilizado<br />

pela possibilidade de intoxicação por alumínio. Os<br />

quelantes devem ser ingeridos junto às refeições<br />

que contenham alimentos fontes de fósforo. Para<br />

pacientes com hipercalcemia, deve-se optar pelo<br />

quelante que não seja à base de cálcio, já que essa<br />

condição está associada a calcificações extraósseas,<br />

aumento do risco de doenças cardiovasculares e<br />

morte [15].<br />

Referências Bibliográficas<br />

[10] National Research Council. Recommended Dietary Allowances. 10ª ed. Washington:<br />

National Academy Press, 1989.<br />

[11] Cuppari L, Amancio OMS, Nobrega M. Preparo de vegetais para utilização em dieta<br />

restrita em potássio. Nutrire: Soc Bras Alim Nutr 2004;28:1-7.<br />

[12] Cuppari L, Avesani CM, Mendoca COG, et al. Doenças renais. In: Cuppari L,<br />

Schor N. Guias de medicina ambulatorial e hospitalar. Unifesp. Nutrição clínica no<br />

adulto. 2ª ed. Barueri: Manole, 2005. p.189-220.<br />

Apesar do aumento do conhecimento, do desenvolvimento de ferramentas<br />

relativamente eficientes e do esforço contínuo dos membros da equipe multidisciplinar,<br />

a prevenção e tratamento da hiperfosfatemia é ainda um desafio. Apesar<br />

de a hiperfosfatemia ser multifatorial, o abandono da dieta é uma das principais<br />

razões que levam ao aumento do fósforo sérico nos pacientes em diálise. Estudos<br />

mostram que existem várias causas para a falta de aderência do paciente à dieta.<br />

Entre elas estão à má compreensão da importância do controle do fósforo e da<br />

ação dos quelantes, a falta de conhecimento para reconhecer a diferença entre<br />

os componentes dos alimentos e a incapacidade funcional para preparar as refeições.<br />

Portanto, um aconselhamento dietético intensivo e individualizado, combinado<br />

com programas de educação continuada, tem resultado em uma maior<br />

motivação e sensibilização do paciente, com impacto positivo sobre a adesão ao<br />

plano alimentar e o controle do fósforo.<br />

4. Considerações finais<br />

O manejo nutricional de pacientes com DRC é complexo. O sucesso da<br />

intervenção dietética depende da adesão do paciente, que só pode ser conseguida<br />

por meio da utilização de instrumentos eficazes. Apesar da extensa e contínua<br />

expansão da literatura científica sobre a terapia nutricional para pacientes com<br />

DRC, existe ainda a necessidade de estudos bem desenhados, randomizados e<br />

controlados, que possam identificar estratégias de intervenção nutricional apropriadas<br />

para a implementação do cuidado nutricional global.<br />

[13] Netto MM, Da Costa JÁ, Garcia-Cairasco et al. Intoxication by star fruit (Averrhoa<br />

carambola) in 32 uraemic patients: treatment and outcome. Nephrol Dial Transplant<br />

2003;18:120-5.<br />

[14] NKF-K/DOQI Clinical practice guidelines for bone metabolism and disease in chronic<br />

kidney disease. Am J Kidney Dis 2003;42:S1-S200.<br />

[15] Carvalho AB, Barreto FC, Cuppari L. Hiperfosfatemia na doença renal crônica. In:<br />

Cruz J, Cruz HMM, Barros RT. Atualidades em nefrologia 9 ed. São Paulo: Sarvier,<br />

2006. p.277-85.


Abordagem nutricional na<br />

disfagia<br />

A dificuldade para deglutir, conhecida como disfagia,<br />

decorre de inúmeras doenças de base que podem<br />

acometer qualquer parte do trato digestório, desde<br />

a boca até o estômago (Tabela I).<br />

Quando envolve o início da deglutição — fases<br />

oral (voluntária) e faríngea (involuntária e reflexa) —<br />

é chamada de disfagia orofaríngea; quando compromete<br />

o direcionamento do bolo alimentar do esôfago<br />

para o estômago, é denominada disfagia esofágica.<br />

Tabela I. Causas de disfagia<br />

qualidade<br />

https://www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/<br />

A diferenciação entre ambas é feita, primariamente,<br />

por meio de uma anamnese adequada. Pacientes com<br />

disfagia orofaríngea costumam apontar a região cervical<br />

como topografia do problema e referem-se, frequentemente,<br />

a sintomas associados como, por exemplo, regurgitação<br />

nasal, tosse, fala anasalada e disartria.<br />

O diagnóstico clínico é reforçado, ainda, pela<br />

presença simultânea de sinais de acidente vascular<br />

cerebral (AVC), de doenças como Parkinson (DP) e<br />

miastenia gravis (MG), e de comprometimento específico<br />

de nervos cranianos envolvidos na deglutição<br />

— como trigêmio (V), facial (VII), glossofaríngeo (IX),<br />

vago (X) e hipoglosso (XII).<br />

DISFAGIA OROFARÍNGEA<br />

Alterações mecânicas e obstrutivas<br />

• Infecção, tireomegalia, divertículo de Zenker, neoplasia de cabeça e pescoço.<br />

Doenças neuromusculares<br />

• Doenças do sistema nervoso central (ex., AVC, DP, EMa, ELAb).<br />

• Espasmo cricofaríngeo e MG.<br />

Outras<br />

• Dentição comprometida, xerostomia (envelhecimento, autoimunidade), úlceras orais<br />

DISFAGIA ESOFáGICA<br />

Doenças da mucosa<br />

• Estenose péptica, tumores, infecção, lesão cáustica e por radiação.<br />

Doenças mediastinais<br />

• Tumores (ex., câncer de pulmão e linfoma), infecções (ex., tuberculose e histoplasmose), compressão vascular.<br />

Condições que afetam a musculatura lisa e sua inervação<br />

• Envelhecimento, acalasia, esclerodermia.<br />

a Esclerose múltipla; b Esclerose lateral amiotrófica.


36 qualidade<br />

Pacientes com disfagia esofágica, via de regra,<br />

referem-se a desconforto na região distal do esôfago.<br />

Quando este ocorre igualmente para sólidos e líquidos,<br />

reforça-se a hipótese de dismotilidade esofágica; sobretudo<br />

quando há intermitência do sintoma com dor<br />

torácica associada. A presença de disfagia progressiva,<br />

por outro lado, exclusivamente para alimentos sólidos,<br />

aponta para a possibilidade de obstrução mecânica de<br />

etiologia péptica ou neoplásica.<br />

Além da anamnese e propedêutica clínica, a investigação<br />

diagnóstica da disfagia conta com valiosos<br />

exames complementares como videofluoroscopia, nasolaringofibroscopia,<br />

endoscopia, esofagograma com<br />

bário e manometria esofágica.<br />

Tratamento<br />

Enquanto a disfagia esofagiana conta com uma<br />

série de medidas terapêuticas, invasivas ou não, existem<br />

poucas opções para o tratamento da disfagia orofaríngea.<br />

Com exceções como a DP e a MG, a maioria<br />

dos distúrbios neuromusculares e neurológicos subjacentes<br />

são raramente corrigidos por medidas clínicas<br />

ou cirúrgicas.<br />

Este contexto revela a importância cardinal da<br />

triagem nos grupos de risco para disfagia (como indivíduos<br />

idosos e vítimas de AVC), diagnóstico precoce<br />

e prevenção de pneumonia aspirativa e des<strong>nutrição</strong>.<br />

Cabe a uma equipe multidisciplinar traçar estratégias<br />

individualizadas que levem em conta o grau de dificuldade<br />

para deglutição, o potencial de recuperação por<br />

meio de técnicas de reeducação, a função cognitiva e<br />

adesão do paciente.<br />

Prevalência<br />

Doença de<br />

ALZHEIMER 1<br />

84%<br />

Doença de<br />

PARKINSON 2<br />

até<br />

70%<br />

Principais consequências<br />

Pacientes<br />

pós-AVC 10<br />

até<br />

60%<br />

Pacientes<br />

internados<br />

em casas de<br />

repouso 11<br />

até<br />

40%<br />

Des<strong>nutrição</strong> e desidratação:<br />

• 50% dos pacientes com disfagia são desnutridos 3<br />

• 32% dos pacientes com disfagia apresentam desidratação 4<br />

Pneumonia Aspirativa: 5,6,7<br />

• 25% a 30% dos pacientes com disfagia<br />

Desafios nutricionais<br />

Os principais objetivos do tratamento nutricional<br />

incluem (i) prevenir aspiração do alimento e,<br />

consequentemente, sufocamento e pneumonia aspirativa;<br />

(ii) facilitar a deglutição, promovendo maior<br />

segurança e independência para o paciente e (iii)<br />

manter ou recuperar seu estado nutricional, evitando<br />

e corrigindo estados de desidratação e des<strong>nutrição</strong>.<br />

Para isso, é fundamental compreender a relevância<br />

da textura para elaboração das dietas, uma vez que<br />

elas influenciam de modo crítico a aceitação e deglutição<br />

do alimento.<br />

Os alimentos devem ser modificados, conferindo<br />

maciez, como aquela encontrada em purês, mingaus<br />

e preparações liquidificadas, de acordo com a capacidade<br />

de deglutição do paciente e seu diagnóstico.<br />

Ao mesmo tempo, devem ser atraentes como uma refeição<br />

normal e nutricionalmente completa.<br />

Pacientes<br />

internados em<br />

hospitais 11<br />

mais de<br />

25%


As modificações de textura e viscosidade<br />

de alimentos e líquidos são importantes e<br />

significativas para os pacientes disfágicos: 1,8,9<br />

• Previnem a aspiração ou sufocação<br />

• Facilitam a alimentação segura e independente<br />

• Mantêm ou recuperam o estado nutricional e<br />

hidratação<br />

A dieta com textura modificada garante o<br />

aumento da ingestão de calorias, proteínas e<br />

ganho de peso em pacientes disfágicos: 2<br />

• 30% de aumento na ingestão calórica<br />

• 55% de aumento na ingestão proteica<br />

Líquidos<br />

Os líquidos são o maior desafio no tratamento da<br />

disfagia, pois dificultam a deglutição de pacientes que<br />

apresentam um controle oral reduzido, podendo escorrer<br />

para a faringe e atingir as vias aéreas. Daí a necessidade<br />

de serem engrossados com espessantes. A modificação<br />

de sua textura é particularmente importante para<br />

garantir hidratação adequada. Os sucos podem substituir<br />

a água e melhorar o paladar, além de fornecer mais<br />

nutrientes e calorias. Os caldos e molhos lubrificam os<br />

alimentos, facilitando a deglutição e podem ajudar em<br />

sua fragmentação dentro da cavidade oral.<br />

Sólidos<br />

A National Dysphagia Diet (NDD) especifica a consistência<br />

da dieta para alimentos sólidos, semissólidos<br />

e líquidos (líquidos espessados e sólidos modificados),<br />

categorizando-os em 7 níveis, de acordo com a viscosidade<br />

adequada para proteção das vias aéreas e o grau<br />

da disfagia. Se houver risco elevado de aspiração ou se<br />

rEFErêNCIAS<br />

a ingestão oral for insuficiente para manter<br />

o bom estado nutricional, então devese<br />

considerar a possibilidade de suporte<br />

nutricional alternativo por via enteral.<br />

Para um tratamento nutricional adequado a idosos<br />

disfágicos, há necessidade, não só de alterar a textura<br />

de alimentos sólidos e líquidos, como também de<br />

garantir o aporte calórico-proteico, fornecendo alimentos<br />

com textura modificada e de alto valor nutricional.<br />

Sob essa perspectiva, pode-se enriquecer as preparações<br />

com módulos proteicos e/ou calóricos; ou oferecer<br />

alimentos pré-preparados de alto teor proteico, ou<br />

suplementos nutricionais orais hipercalóricos e hiperproteicos<br />

e, em situações mais graves, conjugar com<br />

suporte nutricional enteral — cumprindo o objetivo de<br />

prevenir ou tratar estados de des<strong>nutrição</strong>.<br />

Para contribuir com o tratamento nutricional de<br />

pacientes disfágicos, a <strong>Nestlé</strong> desenvolveu Resource®<br />

Thicken Up. Um espessante instantâneo que modifica as<br />

características de consistência dos alimentos líquidos e<br />

semissólidos, quentes ou frios, permitindo uma deglutição<br />

mais segura por minimizar os riscos de aspiração.<br />

O produto é isento de sacarose, lactose e glúten.<br />

Informações Nutricionais<br />

Quantidade por porção 15 G 100G<br />

Valor energético 18 kcal 356 kcal<br />

Carboidratos 4,5 g 89 g<br />

Proteínas 0 g 0 g<br />

Gorduras totais 0 g 0 g<br />

Gorduras saturadas 0 g 0 g<br />

Gorduras trans 0 g 0 g<br />

Fibra alimentar 0 g 0 g<br />

Sódio 11 mg 222 mg<br />

qualidade 37<br />

[1] AHRQ Evidence reports and summaries: Diagnosis and treatment of swallowing disorders (dysphagia) in acute care stroke patients. Appendix B. Burden of Illness of Dysphagia<br />

and Its Complications in Neurologic Diseases 2001. [2] deLuis D et al. Utilidad de productos deshidratados en dietas de textura modi_cadas en pacientes ancianos ambulatorios. Med<br />

Clin (Barc) 2006; 127 (10) 374-5. [3] Finestone H et al. Malnutrition in stroke patients on the rehabilitation service and at follow-up: prevalence and predictors. Arch Phys Med Rehabil<br />

1995;76:310-6. [4] Botella T and Ferrero L. Management of dysphagia in the institutionalized elderly patient: current situation. Nutr Hosp. 2002 May-June;17(3):168-174. [5] Garon<br />

B et al. Silent aspiration: results of 1000 video_uroscopic swallow evaluations. J Neurol Rehabil 1996;10:121-126. [6] Leder S et al. Fiberoptic endoscopic evaluation of dysphagia<br />

to identify silent aspiration. Dysphagia 1998;13:19-21. [7] Smith C et al. Incidence and patient characteristics associated with silent aspiration in the acute care setting. Dysphagia<br />

1999;14:1-7. [8] National Dysphagia Diet Task Force, American Dietetic Association. National Dysphagia Diet: Standardization for Optimal Care. American Dietetic Association 2002.<br />

[9] Germain et al. A novel dysphagia diet improves the nutrient intake of institutionalized elders. JADA 2006;106(10):1614-23. [10] National Stroke Association, NSA, Publication<br />

Committee, 2006. [11] AGA Technical Review on Management of Oropharyngeal Dysphagia. Gastroenterology. 1999; 116: 455-478. [11] Fraga LM, et al. Nutrição na maturidade.<br />

Aspectos da disfagia. Educação continuada - <strong>Nestlé</strong> disponível em: https://www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/ [11] National Dysphagia Diet Task Force, American Dietetic<br />

Association. National Dysphagia Diet: Standardization for Optimal Care. American Dietetic Association 2002. 30. Stump, S.E., Mahan L.K. Alimentos, Nutrição


esultado<br />

fotos_Fernanda Preto e Shutterstock<br />

https://www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/<br />

Em diferentes condições clínicas, o emprego de<br />

dietas enterais e fórmulas infantis específicas desempenha<br />

um papel terapêutico central ou coadjuvante<br />

que equivale à ação de medicamentos, sendo essencial<br />

para evitar problemas como a des<strong>nutrição</strong> e suas<br />

graves complicações. No entanto, a desinformação e o<br />

elevado custo desses produtos conspiram, juntos, para<br />

que um enorme contingente de pacientes não receba a<br />

melhor atenção à saúde de que necessita.<br />

Cientes das dificuldades enfrentadas por pacientes<br />

com necessidades nutricionais específicas no país,<br />

um grupo de médicos, nutricionistas e advogados fundou,<br />

em 2005, o Instituto Girassol — uma organização<br />

não governamental (ONG) dedicada a facilitar o acesso à<br />

terapia nutricional de qualidade e, também, ao fomento<br />

à pesquisa e disseminação de conhecimento.<br />

A teoria na prática<br />

Adotando um modelo que foge ao assistencia-<br />

lismo baseado em doações, o Instituto fornece toda a<br />

orientação jurídica para que os pacientes consigam os<br />

produtos de que precisam nas Secretarias de Saúde.<br />

Desse modo, pressiona por essas gestões para que uma<br />

política pública seja criada para a área.<br />

No Estado de São Paulo, a ação do Instituto já<br />

obteve uma grande vitória: em 2007 foi publicada uma<br />

portaria que prevê a entrega desses alimentos para pacientes<br />

com necessidades nutricionais específicas. Até<br />

então, eles precisavam entrar com ações na Justiça,<br />

Instituto<br />

Girassol<br />

Desenvolvimento<br />

de pesquisas<br />

e promoção do<br />

conhecimento<br />

sobre terapia<br />

nutricional<br />

para a população<br />

em geral<br />

individuais ou movidas pelo Ministério Público, para<br />

conseguirem os produtos.<br />

Outro foco de atuação do Instituto é o do desenvolvimento<br />

de pesquisas e da promoção do conhecimento sobre<br />

terapia nutricional para a população em geral. Afinal,<br />

além de acesso aos insumos, é preciso saber usá-los.<br />

Nesse aspecto, o Instituto Girassol também atua<br />

junto a profissionais de saúde, concientizando-os sobre<br />

a importância da terapia nutricional para inúmeras<br />

enfermidades — seja como tratamento primário, no<br />

caso das alergias alimentares, por exemplo, seja como<br />

coadjuvante em doenças que levam a um comprometimento<br />

do estado nutricional.


Conquistas e desafios<br />

“Nosso trabalho visa garantir alimento para<br />

crianças com alergias alimentares, principalmen-<br />

te ao leite, e pacientes que precisam de terapia<br />

nutricional, como pessoas com alguns tipos de<br />

câncer, transplantados e idosos que usam sondas”,<br />

explica a médica Roseli Oselka Saccardo<br />

Sarni — docente da Faculdade de Medicina do ABC<br />

e da Unifesp e presidente do Instituto Girassol.<br />

“Começamos em 2005 com muitas ações na<br />

Justiça, diálogo com o Ministério Público, a Defensoria<br />

Pública e a Secretaria da Saúde. Dois anos<br />

depois, conseguimos ajudar na edição de uma portaria<br />

que determinava que todas as crianças com<br />

alergia alimentar têm direito a receber alimento”,<br />

complementa ela.<br />

Alergia ao leite de vaca<br />

resultado 39<br />

A alergia ao leite de vaca acomete cerca<br />

de 2% a 6% dos lactentes. A única forma de tratamento<br />

conhecida atualmente é a exclusão<br />

da proteína causadora da hipersensibilidade<br />

da alimentação por determinado período de<br />

tempo. Em crianças portadoras de alergia ao<br />

leite de vaca, nas quais o aleitamento materno<br />

foi interrompido, há necessidade de introdução<br />

de fórmula infantil especial substituta<br />

(proteína isolada de soja, extensamente hidrolisada<br />

ou à base de aminoácidos). A prescrição<br />

dessas fórmulas vai depender do tipo<br />

de alergia e dos seus sintomas.


40 resultado<br />

O relevante avanço não significa,<br />

contudo, que o problema esteja resolvido.<br />

Com base na prevalência da hipersensibilidade ao<br />

leite, descrita na literatura, estima-se que milhares de<br />

crianças, apenas no Estado de São Paulo, não estejam<br />

sendo alimentadas de maneira adequada.<br />

“Ainda estamos aquém. Falta acesso e informação<br />

para muitas famílias, principalmente as que moram no<br />

interior e em regiões mais afastadas, já que os postos<br />

de entrega estão mais centralizados na Capital. E ainda<br />

sofremos, de tempos em tempos, com a falta do produto”,<br />

diz Roseli.<br />

Por outro lado, há bons sinais no horizonte. Além de<br />

São Paulo, o Rio de Janeiro, Minas Gerais e a Bahia instituíram<br />

algum tipo de programa para fornecer esse alimento<br />

— em alguns casos no escopo municipal, em outros por<br />

meio de políticas estaduais, de maior abrangência.<br />

“Nosso próximo passo é intensificar os contatos<br />

com o Ministério da Saúde e reafirmar a importância do<br />

alimento para pacientes com necessidades nutricionais<br />

específicas. Nosso objetivo é o de que haja uma política<br />

pública nacional”, conta Roseli.<br />

Ela explica que o ministério chegou a editar uma<br />

portaria que previa a formação de um grupo de trabalho<br />

técnico para definir uma política pública para fornecer<br />

esses alimentos. No entanto, o projeto, por falta de alocação<br />

de recursos, ficou parado no órgão federal.<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

Todas essas ações do Instituto são possíveis graças a uma<br />

parceria com o Instituto Pro Bono, ONG que reúne advogados que<br />

dedicam um pouco de seu tempo a quem não pode pagar pelo serviço.<br />

São eles que fornecem a assessoria jurídica necessária para<br />

que as ações sejam ajuizadas, e ajudam pacientes a levantar documentos<br />

necessários para fazer os pedidos administrativos.<br />

O saldo dessa união de forças é bastante positivo: desde a<br />

sua fundação até hoje, o Instituto Girassol orientou mais de 5 mil<br />

profissionais da área de saúde, familiares e pacientes, além de<br />

cadastrar e auxiliar diretamente 6 mil portadores de necessidades<br />

nutricionais especiais, em todo o Brasil, por meio de seu site<br />

(www.girassolinstituto.org.br).<br />

Ferramentas e publicações<br />

Uma vez garantido o alimento, é necessário saber a manei-<br />

ra mais adequada de usá-lo, evitando desperdícios e até mesmo<br />

danos à saúde dos pacientes. Para isso, o Instituto Girassol constituiu<br />

um centro de pesquisas e disseminação de conhecimentos<br />

em convênio com o Curso de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública<br />

da Universidade de São Paulo.<br />

Todos os anos, o Instituto recebe oito estagiários do 5º ano de<br />

graduação para ajudar a equipe do Girassol a desenvolver projetos.<br />

“Para os alunos, o tempo no Instituto conta como estágio obrigatório<br />

oficial do curso. Para nós, é uma possibilidade rica de ajuda, troca e<br />

intercâmbio de novas informações”, explica Roseli. Dessas colaborações,<br />

e com o apoio institucional ou o patrocínio de algumas empresas,<br />

já foi publicado um manual de <strong>nutrição</strong> enteral para pacientes<br />

e profissionais de saúde e foram desenvolvidos cardápios para alimentação<br />

saudável de lactentes e pré-escolares.<br />

Outra publicação, disponível no site do Instituto e distribuída<br />

em algumas unidades hospitalares para famílias de pacientes, foi<br />

o livro Receitas culinárias para crianças com alergia alimentar —<br />

Fascículo Festas.<br />

O material, que contou, entre outras empresas, com apoio da<br />

<strong>Nestlé</strong>, traz receitas alternativas de brigadeiro, beijinho, bolos, salgadinhos,<br />

tortas, sorvetes e outros docinhos obrigatórios em qualquer<br />

festa de aniversário infantil. Com ele, as mães aprendem, de maneira<br />

simples, com produtos vendidos na maioria dos supermercados, a<br />

transformar a rotina das crianças com alergias alimentares.


As receitas substituem ovos, leite e, em alguns casos,<br />

trigo e soja. E, além de serem explicadas passo a passo, são<br />

acompanhadas por tabela nutricional com quantidade de<br />

energia, açúcares, gorduras, vitaminas e proteínas.<br />

“Certamente, com este livro de receitas, as preocupações<br />

com as dietas restritas serão amenizadas,<br />

permitindo <strong>nutrição</strong> adequada e manutenção do prazer<br />

das refeições, trazendo o sorriso de volta a todos esses<br />

pacientes”, escreve na introdução Cristina Miuki Abe Jacob,<br />

professora do Departamento de Pediatria e Chefe da<br />

Unidade de Alergia e Imunologia da Faculdade de Medicina<br />

da Universidade de São Paulo.<br />

Para se ter uma ideia, o livro ensina as mães a prepararem<br />

um brigadeiro de duas maneiras: uma receita usa<br />

mandioca, açúcar refinado, chocolate em pó sem leite, óleo,<br />

água e chocolate granulado sem leite e sem soja. A outra,<br />

mais simples, conta com leite condensado de soja, margarina<br />

sem leite, chocolate em pó sem leite e o granulado também<br />

sem leite e soja. O modo de preparo, de maneira geral, é<br />

o mesmo do produto tradicional — assim como a aparência<br />

do doce. Uma maneira simples, com produtos atualmente<br />

vendidos na maioria dos supermercados, transforma a rotina<br />

das crianças com alergias alimentares.<br />

“Fizemos muita coisa, mas temos ainda muitas metas<br />

a serem atingidas”, diz Roseli. Os novos horizontes do<br />

Instituto incluem a ampliação do atendimento a pacientes<br />

residentes em outros estados, por meio da organização<br />

de eventos científicos fora de São Paulo, do contato<br />

mais próximo com promotores de outras localidades e<br />

aumento da capacidade do atendimento telefônico da<br />

equipe do Instituto. Afinal, pode parecer óbvio e simples,<br />

mas, como reforça a filosofia do Girassol, muitas vezes<br />

o alimento é tão importante, ou até mais importante, do<br />

que o próprio remédio. E todos que precisam merecem ter<br />

acesso a ele.<br />

rEFErêNCIAS<br />

(1) Av. Jacutinga, 96, São Paulo-SP (www.quitandagourmet.com.br). (2) Rua Professor Atílio Innocenti, 52, São Paulo-SP.<br />

(3) Rua Caros Steinen, 66, São Paulo-SP (www.nadeli.net). (4) Rua Dr. Renato Paes de Barros, 62, São Paulo-SP<br />

(www.valentinarestaurante.com.br). (5) www.nestle.com.br/portalnestle/nutrir<br />

resultado 41<br />

Os novos horizontes do Instituto<br />

incluem a ampliação do atendimento<br />

a pacientes residentes em outros<br />

estados, por meio da organização de<br />

eventos científicos e outras ações<br />

Portadores de sondas ou estomias<br />

Outro grupo de pacientes que também necessita de dietas<br />

especiais é o de portadores de disfagia neurogênica ou obstrutiva<br />

que, por não conseguirem receber o alimento pela boca, o fazem<br />

por meio de sondas ou estomias. Nesse caso, uma dieta enteral<br />

adequada é crítica para evitar a des<strong>nutrição</strong> e todas as complicações<br />

associadas a ela.<br />

Se por um lado os pacientes têm garantido esse suporte nutricional<br />

durante a hospitalização, ao retornarem para casa acabam<br />

recebendo dietas artesanais com elevado risco de contaminação e<br />

inadequações nutricionais.<br />

Necessidades nutricionais elevadas<br />

Em algumas doenças há necessidade do uso de dietas ente-<br />

rais especializadas porque o paciente tem um gasto energético acima<br />

do que consegue ingerir de calorias normalmente por via oral.<br />

Neste grupo estão, por exemplo, pacientes portadores de tumores<br />

malignos, síndrome da imunodeficiência adquirida e transtornos<br />

psiquiátricos como anorexia nervosa.<br />

Há, ainda, um grupo de doenças que cursa com síndrome de<br />

má absorção, como no caso da retirada cirúrgica de grande parte<br />

do intestino delgado em recém-nascidos que apresentam malformações<br />

(atresias ou estenoses congênitas de intestino delgado).<br />

Nessas situações, pode haver necessidade de <strong>nutrição</strong> parenteral<br />

ou enteral no domicílio. Tal procedimento abrevia o tempo de hospitalização,<br />

que oferece riscos ao paciente e eleva significativamente<br />

os custos do tratamento.


42 sabor e saúde


o grão da vez<br />

As propriedades nutricionais da quinoa<br />

levaram a FAO a eleger o cereal como um dos<br />

alimentos mais completos e balanceados<br />

para consumo humano<br />

Considerada uma planta sagrada pelas culturas<br />

Inca e Pré-Inca, a quinoa (Chenopodium quinoa) é cultivada<br />

há mais de 7.000 anos na região Andina, principalmente<br />

no Peru e na Bolívia. Sua melhor produção<br />

se dá em uma altitude que varia de 2.500 a 3.800 metros,<br />

com temperatura média oscilando entre 5 e 14<br />

graus Celsius. Entretanto, registros históricos relataram<br />

o cultivo da quinoa desde o Norte da Colômbia até<br />

o Sul do Chile, onde a altitude varia do nível do mar até<br />

4.000 metros [1].<br />

O nome quinoa tem origem quéchua, o idioma<br />

Inca, e significa “Grão-Mãe” ou “Grão-de-Ouro”. A escolha<br />

do nome remete às propriedades nutricionais<br />

do vegetal, considerado pela FAO (Organização das<br />

Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) como<br />

um dos alimentos mais completos e balanceados para<br />

consumo humano. Os astronautas da NASA contam<br />

com os benefícios do “trigo dos incas” para compor<br />

suas dietas em missões de longa duração [2].<br />

A produção de quinoa, que foi reduzida bruscamente<br />

com a influência da cultura espanhola durante a conquista<br />

da Região Andina, é considerada mais do que uma atividade<br />

agrícola. Ela é reconhecida por misturar técnicas<br />

e tradições do passado pré-colombiano, que tem como<br />

base uma produção ecologicamente sustentável [3].<br />

Além de serem utilizados como alimentos, os<br />

produtos e subprodutos das folhas, talos e sementes<br />

da planta da quinoa constituem importante potencial<br />

econômico para os países que a cultivam. As folhas<br />

podem ser utilizadas para a extração de pigmentos,<br />

como as betacianinas, o talo é fonte de fibra para a<br />

produção de celulose e o grão fornece as saponinas,<br />

matéria-prima para a fabricação de cosméticos, itens<br />

de higiene, hormônios sintéticos, pesticidas, antibióticos,<br />

pasta de dente, entre outros [1].<br />

A EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa<br />

Agropecuária) tem conduzido uma série de experimentos<br />

com o objetivo de adaptar a quinoa para a produção<br />

no Cerrado brasileiro. O trabalho foi iniciado em 1990 e<br />

a primeira colheita ocorreu em 2004, no projeto piloto<br />

realizado em Planaltina (DF). Em 2010, a EMBRAPA iniciou<br />

uma nova etapa do programa de melhoramento da<br />

quinoa com o objetivo de lançar cultivares com maior<br />

produtividade, características alimentares diferenciadas<br />

e com capacidade de plantio para diferentes épocas<br />

do ano [4].<br />

sabor e saúde<br />

por_Maria Fernanda Elias Llanos


44 sabor e saúde<br />

Variedades<br />

Para os botânicos, a quinoa (Chenopodium quinoa)<br />

é classificada como um pseudocereal, em razão<br />

do seu conteúdo elevado de amido [2,6]. Contudo,<br />

para fins nutricionais, ela compõe a base da pirâmide<br />

dos alimentos, juntamente com o arroz, o trigo, a cevada,<br />

o milho e outros cereais.<br />

A quinoa Real, variedade com maior demanda no<br />

mundo, apresenta grãos mais volumosos e mais claros,<br />

além de conteúdo proteico mais expressivo. Ela é<br />

cultivada no sul do altiplano boliviano, onde sobrevive<br />

às duras condições de clima e solo, e sua colheita ocorre<br />

apenas uma vez ao ano, o que justifica o preço de<br />

mercado elevado [7].<br />

Características nutricionais e uso culinário<br />

Sob o ponto de vista nutricional, a quinoa ganha<br />

destaque em relacão a muitos cereais por ser considerada<br />

importante fonte de proteínas. Sua composição<br />

centesimal exibe variação de 10% a 18% de proteína;<br />

5% a 9% de gordura total; 54% a 64% de carboidratos e<br />

2% a 5% de fibra total [3].<br />

Tabela 1: Comparação do teor de aminoácidos em diferentes alimentos.<br />

Aminoácidos<br />

g/100 g de alimento<br />

Ovo<br />

cru<br />

Leite<br />

de vaca, integral<br />

Carne<br />

de boi, crua<br />

Quinoa<br />

Chenopodium quinoa<br />

Willd.<br />

Trigo<br />

Triticum durum Desf.<br />

Soja<br />

Glycine max<br />

Triptofano 0,125 0,073 0,049 0,167 0,176 0,159<br />

Treonina 0,449 0,140 0,533 0,421 0,366 0,503<br />

Isoleucina 0,661 0,161 0,645 0,504 0,533 0,580<br />

Leucina 1,016 0,260 1,119 0,840 0,934 0,938<br />

Lisina 0,806 0,137 1,174 0,766 0,303 0,752<br />

Metionina 0,399 0,073 0,351 0,309 0,221 0,138<br />

Cistina 0,287 0,016 0,140 0,203 0,286 0,157<br />

Fenilalanina 0,686 0,144 0,577 0,593 0,681 0,641<br />

Tisosina 0,457 0,148 0,422 0,267 0,357 0,477<br />

Valina 0,809 0,188 0,709 0,594 0,594 0,620<br />

Arginina 0,648 0,073 0,985 1,091 0,483 0,905<br />

Histidina 0,290 0,073 0,442 0,407 0,322 0,348<br />

Alanina 0,704 0,101 0,958 0,588 0,427 0,549<br />

ácido aspártico 1,220 0,232 1,286 1,134 0,617 1,774<br />

ácido glutâmico 1,550 0,634 2,110 1,865 4,743 1,966<br />

Glicina 0,413 0,073 1,187 0,694 0,495 0,503<br />

Prolina 0,435 0,334 0,858 0,773 1,459 0,674<br />

Serina 0,798 0,104 0,600 0,567 0,667 0,651<br />

Fonte: USDA National Nutrient Database for Standard Reference, Release 23 (2010)<br />

A boa digestibilidade da quinoa, assim como o<br />

equilíbrio de aminoácidos essenciais, torna seu conteúdo<br />

proteico similar ao do leite de vaca. O alto teor de lisina<br />

também chama a atenção dos pesquisadores, já que<br />

a presença deste aminoácido em cereais é limitada [8].<br />

O grão de quinoa fornece importante quantidade<br />

de vitaminas e minerais, sobretudo vitamina E, ferro e<br />

cálcio. A composição de gorduras é similar à do óleo de<br />

soja, sendo que 83% correspondem a ácidos graxos insaturados,<br />

fundamentais para a prevenção e a terapia<br />

de doenças cardiovasculares. A combinação natural<br />

com a vitamina E torna a gordura estável aos efeitos<br />

oxidantes [9].<br />

A quinoa possui ainda quantidades significativas<br />

de substâncias bioativas, como polifenóis, que<br />

podem contribuir como agentes antimicrobianos e<br />

antioxidantes [9].<br />

Em razão da ausência de glúten, os portadores de<br />

doença celíaca são os grandes beneficiados da utilização<br />

da quinoa como ingrediente nas mais diversas preparações.<br />

Os grãos, por exemplo, podem ser incorporados a<br />

saladas ou cozidos como substituto do arroz; a quinoa em<br />

flocos pode ser polvilhada sobre frutas e iogurtes; a farinha<br />

é a melhor opção na hora de preparar massas, pães,<br />

bolos, tortas e biscoitos [10]. Vale ressaltar que, em razão<br />

da presença de componentes antinutricionais, como as<br />

saponinas, orienta-se que os grãos de quinoa sejam lavados<br />

em água corrente antes do consumo [7].<br />

Para demonstrar as várias possibilidades culinárias<br />

da quinoa, o premiado chef Laurent Saudeau nos<br />

presenteia com uma criativa e ousada preparação. De<br />

origem francesa, Laurent chegou ao Brasil em 1980 e se<br />

apaixonou pelas riquezas, variedade de cores, aromas e<br />

sabores do país. Atualmente, o Chef concentra sua alta<br />

gastronomia no Espaço Cultural Laurent, em São Paulo,<br />

e é consultor do resort Ponta dos Ganchos (SC).


Legumes confit recheados<br />

com quinoa e siri<br />

Ingredientes<br />

2 unidades de miniberinjela<br />

2 unidades de miniabobrinha<br />

2 unidades de tomate italiano<br />

100 g de cebola picada finamente<br />

10 g de alho picado finamente<br />

100 g de cenoura cortada em<br />

pequenos cubos<br />

50 g de alho-poró cortado em<br />

pequenos cubos<br />

100 g de quinoa<br />

Valor Energético 988 kcal<br />

Carboidratos 33 g<br />

Proteínas 25 g<br />

Gorduras Totais 84 g<br />

Gorduras Saturadas 15,57 g<br />

Gorduras Monoinsaturadas 57,05 g<br />

Gorduras Poliinsaturadas 7,6 g<br />

Colesterol 105 mg<br />

rEFErêNCIAS<br />

80 ml de molho de tomate<br />

5 g de salsinha picada finamente<br />

5 g de tomilho<br />

400 g de carne de siri<br />

300 ml de azeite extravirgem<br />

100 ml de creme de leite batido<br />

em ponto de chantilly<br />

20 g de farinha de rosca<br />

Sal e pimenta-do-reino a gosto<br />

Alfaces, folhas de manjericão,<br />

flores capuchinha diversas a gosto<br />

INFORMAÇãO NUTRICIONAL - Quantidade por porção<br />

Fibra alimentar 6 g<br />

Cálcio 453,23 mg<br />

Ferro 5,95 mg<br />

Sódio 488,98 mg<br />

Magnésio 127,91 mg<br />

Fósforo 344,24 mg<br />

Potássio 886,76 mg<br />

Zinco 6,96 mg<br />

sabor e saúde 45<br />

Modo de Preparo<br />

Tire a pele do tomate e corte-o ao meio. Retire as sementes.<br />

Limpe e corte ao meio a berinjela e a abobrinha.<br />

Retire parte da polpa. Tempere os legumes com sal<br />

e deixe descansar por 24 horas sob refrigeração. Marine<br />

os legumes com tomilho e 50 ml de azeite. Leve os legumes<br />

ao forno a 80°C pelo tempo que for necessário<br />

para confitá-los.<br />

Em uma panela, coloque a quinoa para cozinhar em<br />

água e sal. Quando estiver cozida, escorra e reserve.<br />

Em um frigideira, aqueça 80 ml de azeite. Salteie metade<br />

da cebola, a cenoura e o alho-poró. Junte a quinoa<br />

cozida e corrija o tempero com sal e pimenta. Reserve.<br />

Em outra frigideira, aqueça 80 ml de azeite e salteie o<br />

alho e o restante da cebola. Acrescente a carne de siri e<br />

o molho de tomate. Salteie até secar. Tempere com sal<br />

e pimenta. Ao final, acrescente a salsinha. Reserve.<br />

Recheie metade da cavidade dos legumes com a quinoa<br />

e o restante com a carne de siri. Cubra o recheio<br />

com uma fina camada de creme batido e polvilhe a farinha<br />

de rosca. Leve para gratinar. Distribua um legume<br />

em cada prato e monte um buquê com as folhas para<br />

cada um deles. Distribua as folhas de manjericão e as<br />

pétalas das flores. Regue com o restante do azeite.<br />

Rendimento: 4 porções<br />

Cobre 1,04 mg<br />

Manganês 1,38 mg<br />

Iodo 0,5 mg<br />

Selênio 5,58 mg<br />

Vitamina A 767,67 mcg (RE)<br />

Tiamina 0,28 mg<br />

Riboflavina 0,5 mg<br />

Niacina 6,12 mg<br />

ácido pantotênico 0,44 mg<br />

Vitamina B6 0,26 mg<br />

Folato 46,75 mcg<br />

Vitamina B12 0 mcg<br />

Vitamina C 28,11 mg<br />

Vitamina D 0,02 mcg<br />

Vitamina E 2,48 mg<br />

Umidade 271,76 g<br />

[1] Mujica, A. Descriptores para la caracterización de quinua (Chenopodium quinoa Willd.) pp.121-136 En: Memorias del Seminario- Taller Nacional sobre Caracterización de los Cultivos<br />

Nativos y sus Parientes Silvestres en el Perú. INIA, PNUD-Proyecto In situ. Chosica, 2004, Lima. [2] Fleming, J. E. and Galwey, N. W. Quinoa (Chenopodium quinoa). In J. T. Williams (Ed.),<br />

Cereals and pseudocereals . 2004; pp. 3-73. London, UK: Chapman & Hall. [3] FAO. 1992 . Manual sobre utilización de los Cultivos Andinos subexplotados en la alimentación. Oficina<br />

Regional de la FAO para América Latina y el Caribe. Organización de las Naciones Unidas para la Agricultura y la Alimentación, Santiago de Chile, Chile.pp.35. [4] EMBRAPA. Produção<br />

de quinoa no Brasil conta com o reforço da Embrapa Cerrados. Brasília, 2010 [acesso em 10 out 2010]. Disponível em http://www.cpac.embrapa.br/noticias/noticia_completa/203.<br />

[5] Wilson HD. Quinua and Relatives (Chenopodium sect.Chenopodium subsect.Celluloid). Economic Botany. Volume 44, Supplement 3, 92-110. [6] Lopes CO, Dessimoni GV, Silva<br />

MC et al. Aproveitamento, composição nutricional e antinutricional da farinha de quinoa (Chenopodium quinoa). Alim. Nutr. 2009; v.20, n.4, p. 669-675. [7] MUJICA AS et al. Quinua<br />

(Chenopodium Quinoa Willd) ancestral cultivo andino, alimento del presente y futuro. Santiago: Organización de las Naciones Unidas para la Agricultura y la Alimentacion, 2001. [8]<br />

Ayala G, Ortega L, Moron C. Valor nutritivo y usos de la quinua. En Mujica A, Jacobsen SE, Izquierdo J et al. Quinua (Chenopodium quinoa Willd.). Ancestral cultivo andino, alimento del<br />

presente y futuro. Santiago: Organización de las Naciones Unidas para la Agricultura y la Alimentacion, 2001. [9] Gewehr MF. Desenvolvimento de pão de forma com adição de quinoa.<br />

Porto Alegre, 2010 [acesso em 10 out 2010]. Disponível em http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/24809/000749081.pdf?sequence=1. [10] Almeida SG, Sá WAC.<br />

Amaranto (Amaranthus SSP) e Quinoa (Quenopodium Quinoa): alimentos alternativos para doentes celíacos. Ensaios e Ciência, 2009; vol.13, nº 1.


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troca de experiências entre pesquisadores e clínicos<br />

ao redor do mundo.<br />

De acordo com os dados publicados pela empresa<br />

Google em junho de 2009, a internet já<br />

é reconhecida como o veículo preferido pelos<br />

profissionais norte-americanos para pesquisas<br />

sobre medicina e saúde.<br />

A crescente utilização da rede com esta finalidade,<br />

por meio de computadores pessoais ou telefonia<br />

móvel, é realidade, também, no Brasil — onde<br />

o interesse pela tecnologia coloca o país entre as<br />

cinco nações com maior acesso à internet.<br />

As mesmas pesquisas registram, no entanto,<br />

que tal avanço impõe consideráveis desafios.<br />

Entre eles, a falta de tempo e treinamento para<br />

navegar um número excessivo de sites para encontrar<br />

as informações desejadas e, sobretudo,<br />

para checar a qualidade dos dados.<br />

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