07.05.2013 Views

ESTRATÉGIAS DE VIDA E DE MORTE - Departamento de História ...

ESTRATÉGIAS DE VIDA E DE MORTE - Departamento de História ...

ESTRATÉGIAS DE VIDA E DE MORTE - Departamento de História ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Assim, ser “lavrador” significava pelo menos ter uma casa, um cercado e uma<br />

roça, ou seja, ter seus próprios bens. Isto os diferenciava não somente dos escravos, mas<br />

também do homem móvel e <strong>de</strong>senraizado. Para Mattos, a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se mover se<br />

referia a um sentido específico <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong>, significando, fundamentalmente, liberda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> escolher e estabelecer novos laços <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong>, família ou patronagem, que<br />

conferissem ao homem livre um status específico numa dada comunida<strong>de</strong>. 21 Em uma<br />

socieda<strong>de</strong> marcada pelas relações pessoais, estabelecer laços era essencial para a<br />

obtenção <strong>de</strong> um lugar, por mais obscuro que fosse, na hierarquia social dos homens<br />

livres.<br />

Por exemplo, o conceito <strong>de</strong> “família patriarcal” <strong>de</strong> Gilberto Freyre, implica uma<br />

forma específica <strong>de</strong> organização do po<strong>de</strong>r e das funções familiares <strong>de</strong>ntro dos grupos <strong>de</strong><br />

elite, além <strong>de</strong> presumir que escravos e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes livres construiriam sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

familiar em relação à “casa-gran<strong>de</strong>”, eles próprios incapazes <strong>de</strong> formar e reproduzir<br />

culturalmente suas próprias famílias. É por isso que Mattos diz ser <strong>de</strong> extrema<br />

importância olhar para os significados culturais das associações familiares na socieda<strong>de</strong><br />

escravista e em seu papel central no estabelecimento das hierarquias e relações sociais.<br />

A autora, usando fartamente <strong>de</strong> processos cíveis e criminais e inventários das<br />

partes do Norte da província do Rio <strong>de</strong> Janeiro, traz a luz casos que exemplificam sua<br />

argumentação. Ela evi<strong>de</strong>ncia que um migrante, no século XVIII, podia lograr reinserir-<br />

se socialmente através do casamento ou <strong>de</strong> união consensual em uma família da nova<br />

região:“A relação familiar se torna, <strong>de</strong>ste modo, potencializadora da proprieda<strong>de</strong>, mesmo que apenas<br />

<strong>de</strong> uma situação (lavouras e benfeitorias) em terra alheia e sem escravos.” 22<br />

No caso das heranças, nos séculos XVIII e XIX, quando morriam os pais <strong>de</strong><br />

famílias, as mulheres solteiras e os filhos menores recebiam prioritariamente pagamento<br />

em dinheiro ou em bem móveis. As viúvas, como meeiras do casal, tendiam a manter o<br />

controle da situação agrícola, mas contavam, via <strong>de</strong> regra, com um segundo casamento<br />

ou apoio <strong>de</strong> um filho ou <strong>de</strong> um genro privilegiado. A maioria das mulheres amasiadas,<br />

mesmo com filhos, não se tornava her<strong>de</strong>ira legal ou co-proprietária dos bens do seu<br />

amásio. Os filhos naturais, e mesmo as mães solteiras, não se viam na prática excluídos<br />

do acesso à família legalmente constituída (casamento religioso/e do convívio social),<br />

entretanto, esses indivíduos podiam alcançar gran<strong>de</strong>s posições <strong>de</strong>ntro da hierarquia<br />

21 Ibi<strong>de</strong>m, p. 45<br />

22 Ibi<strong>de</strong>m, p. 57<br />

18

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!