Anais do II Simpósio Nacional de Musicologia - EMAC - UFG
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Parliament. O groove e seu caráter circular, <strong>de</strong> retorno, faz com que o funk favoreça uma percepção <strong>de</strong><br />
não-linearida<strong>de</strong>, semelhante à <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> Kramer. A ênfase no ritmo e numa concepção temporal nãolinear<br />
traz à tona uma questão muito importante - o mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> escuta envolvi<strong>do</strong>.<br />
Danielsen afirma que o funk propicia uma experiência diferenciada na relação com a música<br />
- um esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> estar na música (state of being in music). Ela contrapõe <strong>do</strong>is tipos <strong>de</strong> escuta: um, mais<br />
comum, liga<strong>do</strong> a canções, com expectativa <strong>de</strong> uma relação clara <strong>de</strong> tensão e relaxamento; outro, liga<strong>do</strong><br />
a músicas com ênfase no ritmo, e não na melodia, que permitiria uma integração com a música, dan<strong>do</strong> a<br />
perceber um movimento que é vivi<strong>do</strong> pelo ouvinte também.<br />
O groove daria uma sensação <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r continuar in<strong>de</strong>finidamente; e o receptor, se estiver<br />
num mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> recepção aberto a isso, po<strong>de</strong>ria experimentar essa sensação <strong>de</strong> integração com a música e<br />
com uma experiência <strong>de</strong> neutralização <strong>do</strong> tempo.<br />
Clifton (1983) aponta a continuida<strong>de</strong> como uma conexão entre eventos passa<strong>do</strong>s, presentes<br />
e futuros. A continuida<strong>de</strong> não seria algo que passivamente recebemos como informação, mas como<br />
percepção. A interpretação fenomenológica da continuida<strong>de</strong>, segun<strong>do</strong> o autor, proporia uma relação<br />
recíproca entre a continuida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s atos e a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um horizonte relevante.<br />
Dahlhaus é outro autor que aborda o tempo musical com referencial teórico semelhante: “A<br />
percepção musical que vai além <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s acústicos isola<strong>do</strong>s seria impensável, se não se preservasse o<br />
imediatamente passa<strong>do</strong> - Husserl <strong>de</strong>signava o ato <strong>de</strong> fixar como ‘retenção’ e o seu oposto complementar,<br />
a expectação e antecipação <strong>do</strong> futuro, como ‘protenção’. (DAHLHAUS, 2003, p.111) Sobre a retenção,<br />
o autor acrescenta: “Graças à ‘retenção’, surge, por assim dizer, um presente amplia<strong>do</strong> [...].” (ibi<strong>de</strong>m,<br />
p.111-112)<br />
Estabelece-se assim uma conexão entre passa<strong>do</strong>, presente e futuro, que mantêm uma relação<br />
entre si. O tempo, aborda<strong>do</strong> <strong>de</strong>ssa maneira, sempre permitira uma atualização e a realização <strong>de</strong> novas<br />
possibilida<strong>de</strong>s. Essa concepção temporal parece bastante significativa para uma discussão <strong>do</strong> tempo<br />
musical e das possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> interpretação <strong>de</strong> uma obra.<br />
2. Sobre tempo e silêncio<br />
Sobre o silêncio, Messiaen (1994) afirma que este seria quase uma or<strong>de</strong>m rítmica negativa.<br />
Para o autor, haveria três tipos <strong>de</strong> silêncio no curso <strong>de</strong> uma obra musical: 1) silêncio <strong>de</strong> prolongamentoque<br />
seria o mais comum, representa<strong>do</strong> por uma duração sonora seguida por uma duração silenciosa,<br />
com a sensação <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> <strong>do</strong> som no silêncio que o segue; 2) silêncio <strong>de</strong> preparação- seria uma<br />
sensação <strong>de</strong> espera motivada pelo contexto prece<strong>de</strong>nte- como na interrupção <strong>de</strong> uma melodia já escutada<br />
antes e que é reapresentada e interrompida; 3) silêncio vazio- quan<strong>do</strong> este não prepara, nem interrompe<br />
algo, não produz uma expectativa.<br />
Clifton (1976) afirma que o silêncio não seria um nada. “O silêncio é experiencia<strong>do</strong> tanto<br />
como significante quanto como a<strong>de</strong>ri<strong>do</strong> à porção sonora <strong>do</strong> objeto musical. O silêncio é experimenta<strong>do</strong><br />
como substância ou ativida<strong>de</strong> personificada.” (CLIFTON, 1976, p.163) Essa característica <strong>do</strong> silêncio<br />
teria uma implicação expressiva: “Isso sugere que o silêncio participa na apresentação <strong>do</strong> tempo, <strong>do</strong><br />
espaço e <strong>do</strong> gesto musicais.” (ibi<strong>de</strong>m, p.163)<br />
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