Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Pedro Soares<br />
BOAVIDA<br />
À mesa<br />
Arroz – alimento quase…<br />
quase perfeito<br />
O arroz é um extraordinário alimento, versátil, capaz de proporcionar energia de elevada qualidade, fácil<br />
digestão, diversas vitaminas e minerais, boa conservação e baixo preço. Razões mais do que<br />
suficientes para o conhecermos melhor e não o considerarmos um mero acompanhamento quando<br />
afinal, ele é, ou devia ser, a estrela principal de muitas das nossas refeições.<br />
Comecemos pelo principal.<br />
Apesar de o arroz ter<br />
origem no sueste asiático,<br />
os Portugueses são dos<br />
maiores “consumidores” de arroz<br />
da Europa (disponibilidade Kg/per<br />
capita/ano) sendo a região norte e<br />
centro a principal consumidora.<br />
Somos não só grandes consumidores<br />
de arroz, como somos,<br />
provavelmente, o país europeu que<br />
melhor trata o arroz do ponto de<br />
vista culinário. Tanto em qualidade<br />
como em diversidade.<br />
Não creio existir na Europa um<br />
país que tenha, ao mesmo tempo,<br />
uma das suas principais sopas à base<br />
de arroz (a canja), uma das suas<br />
mais emblemáticas sobremesas à<br />
base de arroz (o arroz doce) e<br />
dezenas de pratos onde o arroz é rei.<br />
Poderíamos enumerar por exemplo<br />
e de passagem, o Arroz de Lampreia<br />
de Monção, o Arroz de Sarrabulho<br />
de Ponte de Lima, o Arroz de<br />
Cabidela, o Arroz de Cabrito do<br />
Douro Litoral, o Arroz de Pato de<br />
Lafões, o Arroz de Ossos de Suã de<br />
Oliveira de Azeméis, o Arroz de<br />
Bucho do Ribatejo e o Arroz de<br />
Lingueirão da Praia de Faro. E para<br />
não falarmos de outros pratos<br />
emblemáticos do nosso património<br />
cultural, como as tripas à moda do<br />
Porto ou o cozido à Portuguesa,<br />
onde o arroz tem lugar marcado.<br />
68 TempoLivre <strong>Fevereiro</strong> <strong>2008</strong><br />
Esta presença constante do arroz<br />
à nossa mesa tem a ver com a extraordinária<br />
capacidade desta planta<br />
(a mais comum é a Orysa sativa L.)<br />
de fornecer energia de muito fácil<br />
digestão e aproveitamento pelo<br />
nosso organismo, para além de<br />
diversas vitaminas. Acresce ainda<br />
que o arroz é praticamente isento<br />
de gordura libertando glicose de<br />
uma forma lenta, permitindo um<br />
abastecimento energético aos<br />
órgãos vitais, como o cérebro, de<br />
uma forma constante e eficaz. O<br />
arroz comum não polido, possui<br />
ainda vitaminas no germe e escutelo,<br />
para além de abundantes minerais<br />
na aleurona. As partes externas<br />
do grão possuem também<br />
lenhinas, celulose e hemicelulose,<br />
substâncias essenciais ao bom funcionamento<br />
digestivo, que faziam<br />
deste alimento, a base da alimentação<br />
oriental. Actualmente, o polimento<br />
do arroz, para que este fique<br />
mais branco e de mais fácil cozedura,<br />
retira-lhe uma grande parte do<br />
seu valor vitamínico, mineral e conteúdo<br />
em fibra. Assim, deveremos<br />
preferir o arroz menos polido (também<br />
mais barato), mais escuro ou<br />
paraboiled, processo tecnológico<br />
que preserva parte das qualidades<br />
nutricionais do arroz.<br />
Por outro lado, o arroz pelas suas<br />
qualidades higroscópicas (absorve<br />
os sucos da cozedura) permite reter<br />
minerais que de outra forma se<br />
perderiam. O Arroz de Cabidela e o<br />
Arroz Malandro são exemplos desta<br />
arte antiga de aproveitar ao máximo<br />
os nutrimentos presentes nos sucos<br />
das cozeduras das carnes e hortícolas,<br />
coisa que, por exemplo, a batata<br />
ou o feijão não fazem.<br />
Contudo, o arroz está debaixo da<br />
pressão dos consumidores que cada<br />
vez mais o disputam e da competição<br />
do petróleo. A utilização dos<br />
cereais para a produção de bio-combustíveis,<br />
o aumento brutal dos custos<br />
de transporte e a procura crescente,<br />
levou a índia a proibir recentemente<br />
a quase totalidade das suas<br />
exportações. Desde 2004, houve um<br />
aumento de preços na UE entre 60%<br />
e 100%. De produto básico, o arroz<br />
tende a transformar-se num produto<br />
mais inacessível. Uma oportunidade<br />
para o arroz português das<br />
zonas de produção orizícola do<br />
Mondego, Tejo e Sado e uma<br />
chamada de atenção para os<br />
amantes deste nobre produto e para<br />
a sua protecção. ■