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esg no mkt<br />
Alê Oliveira<br />
Um país mestiço<br />
As cotas são políticas afirmativas que visam a<br />
minimizar a exclusão social, cultural e econômica<br />
Alexis Thuller Pagliarini<br />
Ah! Esse Brasil lindo e trigueiro, cantado em prosa<br />
e verso pela sua linda miscigenação. Um levantamento<br />
recente do IBGE corrobora a rica mestiçagem<br />
brasileira, com os auto<strong>de</strong>clarados pardos superando<br />
os brancos.<br />
Esta última medição, divulgada em <strong>de</strong>zembro do ano<br />
passado, revela, pela primeira vez, uma maioria <strong>de</strong> pardos<br />
no Brasil, alcançando 45,3%, superando os brancos,<br />
que agora representam 43,5% da população.<br />
É a primeira vez que isso acontece. E é natural que<br />
seja assim. À medida em que a população se miscigena,<br />
prevalecem matizes <strong>de</strong> cores que vão bem além do preto<br />
e branco.<br />
A propósito, os que se <strong>de</strong>claram pretos passaram <strong>de</strong><br />
7,6% para 10,2%. Na mesma medição, os que se <strong>de</strong>claram<br />
amarelos (<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> asiáticos) são apenas 0,4%<br />
(contra 1,1% do censo anterior).<br />
Com uma migração iniciada no início dos anos<br />
1900, os japoneses no Brasil são consi<strong>de</strong>rados a maior<br />
população nipônica fora do Japão. Mas muitos <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes<br />
já estão na terceira geração, com brasileiros<br />
<strong>de</strong> olhos amendoados, mas já adquirindo traços <strong>de</strong><br />
não asiáticos, por conta das múltiplas uniões com<br />
parceiros <strong>de</strong> outras etnias.<br />
Se, por um lado, esse fenômeno dá um colorido especial<br />
ao nosso país, por outro, gera uma certa confusão<br />
na hora <strong>de</strong> <strong>de</strong>finições mais precisas, principalmente nas<br />
ações afirmativas. Vejamos, por exemplo, a questão das<br />
cotas nas universida<strong>de</strong>s.<br />
Sabidamente, as escolas públicas são obrigadas a<br />
<strong>de</strong>stinar vagas para candidatos pretos, pardos, indígenas<br />
e PCDs. Tempos atrás, bastava a auto<strong>de</strong>claração para<br />
uma pessoa se apresentar como preta ou parda, justificando<br />
sua postulação a uma vaga especial.<br />
Com o tempo, foram observadas claras transgressões,<br />
com pessoas nitidamente brancas fazendo-se passar<br />
por pardas para facilitar seu acesso às universida<strong>de</strong>s.<br />
Ora, as cotas são políticas afirmativas que visam a<br />
minimizar a exclusão social, cultural e econômica <strong>de</strong><br />
indivíduos pertencentes a grupos que sofrem qualquer<br />
discriminação. Não era justo permitir que pessoas não<br />
condizentes com esse espectro se utilizassem in<strong>de</strong>vidamente<br />
do sistema <strong>de</strong> cotas para facilitar seu acesso à<br />
universida<strong>de</strong>.<br />
Agora, o candidato que preten<strong>de</strong>r inscrição em universida<strong>de</strong><br />
por meio das vagas <strong>de</strong> cotas (pretos e pardos),<br />
<strong>de</strong>ve se submeter à análise <strong>de</strong> uma comissão <strong>de</strong> heteroi<strong>de</strong>ntificação.<br />
A avaliação é feita em um primeiro momento silenciosa,<br />
em que o candidato põe-se à frente <strong>de</strong> três avaliadores<br />
(que <strong>de</strong>vem possuir pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> raças), é tirada<br />
uma foto, chegando-se assim ao resultado <strong>de</strong> pertinência,<br />
ou não, do direito à vaga.<br />
Por basear-se numa observação <strong>de</strong> terceiros, o processo<br />
é frágil e sujeito a contestações. O próprio sistema<br />
<strong>de</strong> cotas é questionado.<br />
E ao chegarmos à situação <strong>de</strong> maioria <strong>de</strong> pardos no Brasil,<br />
os críticos ganham mais argumentos para contestação.<br />
A simples questão <strong>de</strong> levar-se em conta um matiz<br />
<strong>de</strong> cor que induz a uma ancestralida<strong>de</strong> que remonta à<br />
época dos escravizados e ainda alijados dos privilégios<br />
inerentes àqueles <strong>de</strong> cor branca, por exemplo, po<strong>de</strong> se<br />
mostrar um critério questionável, quando esses pardos<br />
são maioria no país.<br />
Sempre foram tratados como minorias ou minorizados. E<br />
agora, que são maioria? Devemos <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r as ações afirmativas,<br />
que são necessárias para reverter anos <strong>de</strong> alijamento<br />
e falta <strong>de</strong> acesso <strong>de</strong> pessoas pretas a sistemas educacionais<br />
<strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> ou mesmo a vagas <strong>de</strong> emprego digno.<br />
Mas o crescimento da população parda, mestiça,<br />
<strong>de</strong>ve se intensificar na mesma medida em que acontece<br />
uma maior miscigenação no país, complicando ainda<br />
mais o estabelecimento <strong>de</strong> políticas afirmativas para<br />
esse público.<br />
In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong>ssas questões, nosso <strong>de</strong>sejo<br />
é que essa rica mistura potencialize um diferencial que<br />
já existe e nos coloca entre os povos mais belos e criativos<br />
do mundo.<br />
É o borogodó brasileiro, formado na mistura, na diversida<strong>de</strong><br />
e, admitamos, fruto também da adversida<strong>de</strong><br />
e necessida<strong>de</strong>.<br />
Alexis Thuller Pagliarini<br />
é sócio-fundador da ESG4<br />
alexis@criativista.com.br<br />
34 <strong>22</strong> <strong>de</strong> <strong>janeiro</strong> <strong>de</strong> <strong>2024</strong> - jornal propmark