Seu - Geia Plural
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pintadas de verde-paris, toda aberta para o<br />
quintal onde, à mingua de sol, mirravam-se<br />
duas pitangueiras anêmicas e esgalhadas, e<br />
passeava solenemente um pavão da terra. As<br />
paredes, barradas de azulejos portugueses e<br />
forradas para cima de papel pintado, mostravam<br />
nos grupos repetidos de zuavos franceses<br />
e chins caricatos, alguns lugares sem tinta,<br />
cujas manchas brancas lembravam joelheiras<br />
de calças surradas. Em uma das paredes laterais<br />
um velho armário de jacarandá polido,<br />
bem cuidado, com as vidraças muito lustradas<br />
a cré, expunha as pratas e as porcelanas de<br />
gosto moderno; a um canto uma máquina de<br />
costura de Wilson, das primeiras que vieram<br />
ao Maranhão, dormia esquecida na sua caixa<br />
de pinho envernizado; nos intervalos das<br />
portas simetrizavam ridiculamente litografias<br />
vulgares representando estudos de Julien; em<br />
uma das cabeceiras da sala um relógio de armário<br />
pulsava monotonamente os segundos e<br />
apontava flegmaticamente duas horas da tarde.<br />
Sob a claridade reverberante que vinha do<br />
quintal, permaneciam ainda a louça do almoço,<br />
a garrafa oitavada com um resto de Colares e<br />
a toalha branca, cheia de côdeas de pão e pingos<br />
de chá, onde as moscas banqueteavam-se<br />
com grande zunido, prendendo-se nas facas<br />
sujas de manteiga.<br />
De uma gaiola pendurada chilrava um sabiá.<br />
Fazia preguiça estar ali – a viração do Bacanga<br />
refrescava o ar abafado da varanda e<br />
criava no ambiente um tom morno, que enervava<br />
os sentidos; sentia-se o quebranto dos dias<br />
inúteis, uma vontade de abrir a boca e esticar<br />
as pernas.<br />
Índice<br />
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