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O Bruxo e o Rabugento primeira parte.indd - Livraria Martins Fontes

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Graça como sendo “um panfl eto furioso contra a humanidade”.<br />

11 Roger Bastide não será menos terrível na sua avaliação:<br />

Os heróis de Graciliano Ramos são seres que se comem<br />

a eles mesmos, que se devoram por dentro;<br />

não têm outro objetivo que não o de se destruírem<br />

lentamente, completamente, e de continuar, num<br />

clima de febre, de suor quente, de tremor de músculos,<br />

a lenta desorganização de sua própria vida. 12<br />

A menção de Bastide a seres “que se devoram por dentro”<br />

até que poderia servir para um personagem como Brás Cubas,<br />

que dedica suas memórias “ao verme que primeiro roeu as<br />

frias carnes do meu cadáver”. De Cubas, afi nal — como de<br />

Rubião em Quincas Borba, como de Bento Santiago em Dom<br />

Casmurro —, pode-se dizer que passou a existência tecendo “a<br />

lenta desorganização de sua própria vida”. Mas, é importante<br />

ressaltar, o ambiente aveludado em que todos eles se movem<br />

não é, seguramente, o de “febre, de suor quente, de tremor de<br />

músculos”. Excetuados o “delírio” de Brás Cubas e a “agonia,<br />

que foi curta”, de Rubião, os heróis machadianos não têm febre,<br />

não exalam suor nem tremem os músculos em exaltações<br />

dostoievskianas. Nenhum deles é capaz da brutalidade de chicote<br />

na mão de um Paulo Honório (São Bernardo) ou do ódio<br />

homicida de um Luís da Silva (Angústia). São, antes, “oblíquos<br />

e dissimulados”, para usar a conhecida expressão. Obliquidade<br />

e dissimulação que, atribuídas a Capitu, parecem aplicáveis<br />

antes de tudo ao próprio Machado... Mas voltemos aos dois.<br />

Este ensaio é literalmente um ensaio — ou seja, uma tentativa<br />

de algumas aproximações entre Machado de Assis e<br />

Graciliano Ramos sugeridas por releituras dos dois em anos<br />

recentes. Essas releituras, por seu lado, benefi ciaram-se de leituras<br />

da fortuna crítica de ambos — que ora sugeriam insights,<br />

ora os “confi rmavam”. Como sempre, é difícil dizer quem nasce<br />

primeiro: se o ovo, se a galinha. Só para dar um exemplo.<br />

Em 2003, numa releitura que fi z de São Bernardo, deparei-me<br />

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