17.04.2013 Views

O Bruxo e o Rabugento primeira parte.indd - Livraria Martins Fontes

O Bruxo e o Rabugento primeira parte.indd - Livraria Martins Fontes

O Bruxo e o Rabugento primeira parte.indd - Livraria Martins Fontes

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

solenemente: “Antes de iniciar este livro, imaginei construí-lo<br />

pela divisão do trabalho.” Paulo Honório, o narrador, convoca<br />

diversos amigos para ajudá-lo a “contribuir para o desenvolvimento<br />

das letras nacionais”: Padre Silvestre fi caria com a<br />

<strong>parte</strong> moral e as citações latinas; João Nogueira, com a pontuação,<br />

a ortografi a e a sintaxe; Arquimedes, com a composição<br />

tipográfi ca; e Lúcio Gomes de Azevedo Gondim, jornalista<br />

de província, com a composição literária. Ele, Paulo Honório,<br />

com uma franqueza brutal e desrespeitosa, informa seu papel<br />

na empreitada: “Eu traçaria o plano, introduziria na história<br />

rudimentos de agricultura e pecuária, faria as despesas e poria<br />

o meu nome na capa.” Ao fi m da página, o projeto já tinha<br />

dado com os burros n´água: “João Nogueira queria o romance<br />

em língua de Camões, com períodos formados de trás para<br />

diante. Calculem.”<br />

Na opinião de alguns críticos, que aqui seguirei, essas irrupções<br />

um tanto acintosas do <strong>Bruxo</strong> e do <strong>Rabugento</strong> no texto<br />

não seriam simplesmente pirotecnias gratuitas de dois autores<br />

— tão diferentes no temperamento, aliás — brincando com<br />

seu público. Umas e outras fariam <strong>parte</strong> de um investimento<br />

no texto, com sutileza e intensidade por <strong>parte</strong> de dois escritores<br />

que teriam realizado, com sucesso, a conjunção de forma<br />

e conteúdo — aquela não sendo meramente uma expressão<br />

externa deste, mas sua expressão internalizada. 20 Ilustro esse<br />

movimento com a análise que Roberto Schwarz faz da obra<br />

de Machado, a qual adquiriu, entre nós, uma dimensão mais<br />

reluzente depois do trabalho de revisão por ele promovido.<br />

A matriz da reinterpretação de Machado que Schwarz imprimirá<br />

em suas pesquisas é o trabalho seminal já citado, cujo primeiro<br />

capítulo se chama, signifi cativamente, “As ideias fora do lugar”. Do<br />

que se trata? Trata-se do Brasil do século XIX e da “disparidade<br />

entre a sociedade brasileira, escravista, e as ideias do liberalismo<br />

europeu [...], referências para todos”. Está montada o<br />

que o autor chama de “comédia ideológica”. Schwarz, enquanto<br />

leitor de Marx, não se furta de observar que “a liberdade<br />

do trabalho, a igualdade perante a lei e, de modo geral, o uni-<br />

28 • O <strong>Bruxo</strong> e o <strong>Rabugento</strong> • Luciano Oliveira

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!