Conhece esta mulher? - Fonoteca Municipal de Lisboa
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Discos<br />
light” há um country-espacial,<br />
com melódica sob fundo <strong>de</strong> órgãos;<br />
em “Night hunter” proce<strong>de</strong>-se a uma<br />
<strong>de</strong>liciosa <strong>de</strong>sconstrução <strong>de</strong> ritmos<br />
afro-beat; enquanto o funk avariado<br />
<strong>de</strong> “Eat my beat”, com cítara e<br />
pan<strong>de</strong>ireta, tem contornos <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>clinação <strong>de</strong> Bollywood. Meio disco<br />
belo, meio disco inesperadamente<br />
amplo, exploratório e<br />
primorosamente melódico. Meia<br />
reinvenção, meio gran<strong>de</strong> disco.<br />
João Bonifácio<br />
Batida<br />
Dance Mwangolé<br />
Difference; distri. Farol<br />
mmmmn<br />
O que se ouve<br />
aqui, neste<br />
magnífico “Dance<br />
Mwangolé” do<br />
projecto Batida,<br />
não é o passado<br />
revisto pelos olhos do presente. Não<br />
são sembas transformados em<br />
kudurus, merengues a brincar com<br />
os graves do kwaito, não é<br />
brinca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> gente urbana a fingir<br />
pertencer ao musseque. “Dance<br />
Mwangolé” cruza tudo isso para<br />
celebrar o que permanece <strong>de</strong><br />
espírito criativo (que é, também, o<br />
espírito <strong>de</strong> uma vida, a angolana, a<br />
africana, a portuguesa que olha para<br />
Angola como emanação <strong>de</strong> uma<br />
cultura partilhada). “Dance<br />
Mwangolé”, gravado quando DJ<br />
Mpula, Beat La<strong>de</strong>n, da Rádio<br />
Fazuma, e Ikonoklasta, do Conjunto<br />
Ngonguenha, ace<strong>de</strong>ram aos arquivos<br />
angolanos das décadas <strong>de</strong> 1960 e<br />
1970 da Valentim <strong>de</strong> Carvalho, é uma<br />
convulsão rítmica que se<br />
complementa. São as guitarras<br />
cristalinas do semba <strong>de</strong> ontem<br />
engran<strong>de</strong>cidos com subgraves <strong>de</strong><br />
hoje, são os mágicos berimbaus e<br />
percussões do Grupo Folclórico <strong>de</strong><br />
Angola ecoando febrilmente entre os<br />
requebros rítmicos criados por<br />
Mpula e Beat La<strong>de</strong>n. “Dance<br />
Mwangolé” é um quadro musical<br />
vivo e vibrante. Música como<br />
espelho do real. Lá encontramos a<br />
“fabulosa história <strong>de</strong> Arlindo Bolota”<br />
e a sua “orquestra alcoólica, contada<br />
por Ikonoklasta, lá ouvimos o<br />
impressionante Sacerdote,<br />
directamente da Sambila, MC <strong>de</strong><br />
“flow” seco e torrencial, a falar do<br />
kuduro e <strong>de</strong> Angola para além do<br />
kuduro. Ali, enfim, <strong>de</strong>scobrimos<br />
uma bomba como “Bazuka” – o<br />
sample dos históricos Águias Reais,<br />
o reco-reco a “bombar”, os graves a<br />
entorpecer o corpo e aquele ritmo<br />
negro, suado: está encontrado<br />
sucessor <strong>de</strong> “Wegue wegue” e não<br />
haverá frio no Inverno enquanto<br />
houver Batida. Organizado como<br />
fluxo contínuo, on<strong>de</strong> a música e a<br />
voz da rua se intercalam, “Dance<br />
Mwangolé”, é um álbum que<br />
estilhaça a História: não quer saber<br />
<strong>de</strong> a ter organizadinha, bem<br />
32<br />
arranjada em arquivos <strong>esta</strong>nques.<br />
Tudo flui, tudo transborda. Toda<br />
<strong>esta</strong> música torna-se uma só. E é tão<br />
importante quanto irresistível.<br />
Mário Lopes<br />
Samba Touré<br />
Songhai Blues: Homage to Ali Farka<br />
Toure<br />
Riverboat, distri. Megamúsica<br />
mmmmn<br />
O título tem tanto<br />
<strong>de</strong> esclarecedor<br />
quanto <strong>de</strong><br />
equívoco. Sim,<br />
sem dúvida,<br />
Samba Touré foi<br />
um dos protegidos <strong>de</strong> Ali Farka<br />
Toure, que chegou a acompanhar<br />
em digressão em 1997. A música que<br />
produz o cantor e guitarrista mali<br />
agora com 41 anos não tem, <strong>de</strong> resto,<br />
outro nome – é o mesmo “blues do<br />
<strong>de</strong>serto” que o mestre inventou e só<br />
lhe fica bem assumir-lhe a<br />
<strong>de</strong>scendência. Acontece,<br />
porém, que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />
Toure <strong>de</strong>sapareceu se<br />
suce<strong>de</strong>m os discos <strong>de</strong><br />
tributo, todos muitos<br />
simpáticos, mas que<br />
pouco ou nada<br />
adiantam em<br />
relação à sua<br />
discografia.<br />
“Songhai<br />
Blues” está<br />
longe, porém,<br />
<strong>de</strong> ser apenas<br />
mais um <strong>de</strong>rivado<br />
e é aí que o título<br />
se revela<br />
equívoco, ou <strong>de</strong><br />
uma excessiva<br />
modéstia. Os riffs <strong>de</strong> guitarra po<strong>de</strong>m<br />
ser típicos do blues do <strong>de</strong>serto, mas<br />
estão longe <strong>de</strong> constituir a única<br />
atracção em cartaz. Na maior parte<br />
dos temas a guitarra toma por<br />
interlocutor, ou ce<strong>de</strong> por completo o<br />
protagonismo ao sokou (rabeca<br />
mali) <strong>de</strong> Zoumana Tereta e ao seu<br />
som ru<strong>de</strong> e frenético, contracenando<br />
com uma constante avalanche <strong>de</strong><br />
percussões acústicas. O próprio<br />
estilo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> Samba na<br />
guitarra é mais tenso e acelerado,<br />
por vezes com um “groove” próximo<br />
do funk, enquanto as suas<br />
vocalizações assentam em jogos <strong>de</strong><br />
parada e resposta com o coro, à<br />
maneira <strong>de</strong> ladainhas rituais,<br />
insistentemente repetidas até à<br />
exaustão (ou até ao transe?). Daí um<br />
disco certamente na cauda <strong>de</strong> Farka<br />
Toure, mas inflectindo numa via<br />
própria, que rejuvenesce o blues do<br />
<strong>de</strong>serto, na mesma medida em que<br />
lhe confere mais pulso e agilida<strong>de</strong>.<br />
Luís Maio<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
Espaço<br />
Público<br />
“Dance Mwangolé”<br />
é um álbum que estilhaça a História:<br />
Pearl Jam<br />
Backspacer<br />
Universal Music<br />
mmnnn<br />
Diz-se por aí que<br />
este é o álbum pop<br />
dos Pearl Jam. O<br />
que quer isso<br />
dizer realmente?<br />
Um mistério. Até<br />
porque tal<br />
<strong>de</strong>claração contém, implícita, a i<strong>de</strong>ia<br />
<strong>de</strong> que pop equivale a coisa <strong>de</strong><br />
segunda, a pecados trauteáveis para<br />
regozijo <strong>de</strong> “play-list”. Em 2009, tal<br />
i<strong>de</strong>ia representa um anacronismo<br />
<strong>de</strong>sfasado da realida<strong>de</strong>. Como se<br />
fizesse sentido a distinção entre o<br />
rock, tido como expressão marginal,<br />
anti-sistema ou o raio que o parta, e a<br />
perniciosa pop, excrescência<br />
“comercial” on<strong>de</strong> se expõe a<br />
<strong>de</strong>cadência da música “enquanto<br />
arte”. Pois bem, os<br />
Pearl Jam: álbum <strong>de</strong> veteranos a divertirem-se com a música que estão a gravar<br />
Este espaço vai ser<br />
seu. Que filme, peça <strong>de</strong><br />
teatro, livro, exposição,<br />
disco, álbum, canção,<br />
concerto, DVD viu e<br />
gostou tanto que lhe<br />
apeteceu escrever<br />
CATARINA LIMÃO<br />
sobre ele, concordando<br />
ou não concordando<br />
com o que escrevemos?<br />
Envie-nos uma nota até<br />
500 caracteres para<br />
ipsilon@publico.pt. E<br />
nós <strong>de</strong>pois publicamos.<br />
Green Day figuram nos topes e não<br />
encontramos por lá mestres pop<br />
como Richard Swift. Num cenário<br />
como o actual (e, <strong>de</strong> resto, em<br />
qualquer cenário) tais dicotomias<br />
(rock bom, pop má) são coisa<br />
tremendamente velha e ultrapassada.<br />
Ainda para mais quando se ouve<br />
“Backspacer” e se percebe que o<br />
“álbum pop” dos Pearl Jam é, no<br />
fundo, mais um álbum dos Pearl Jam,<br />
com a diferença <strong>de</strong> recorrerem mais<br />
regularmente a pianos e a inspiração<br />
Springsteeneana (“Speed of sound” e<br />
“Force of nature”) ou <strong>de</strong> arriscarem o<br />
acústico, reflexo do primeiro álbum a<br />
solo <strong>de</strong> Eddie Ved<strong>de</strong>r (a banda sonora<br />
<strong>de</strong> “Into The Wild”), numa “Just<br />
breathe” muito serena, muito<br />
bonitinha e discretamente soporífera<br />
(ainda assim, é tão boa como a<br />
maioria das canções <strong>de</strong> José<br />
Gonzalez, mas arriscamos que os fãs<br />
do sueco nunca o reconhecerão). A<br />
questão, portanto, não está na<br />
<strong>de</strong>scoberta da careca pop dos Pearl<br />
Jam em “Backspacer”. Está em<br />
“Backspacer” ele mesmo. Álbum<br />
curto e <strong>de</strong>spretensioso, álbum <strong>de</strong><br />
veteranos a divertirem-se com a<br />
música que estão a gravar. Tudo<br />
muito bem. Brincam aos Ramones e<br />
aos MC5 em “Supersonic”, mas não<br />
há ali qualquer intenção para além da<br />
brinca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> fã; inventam um<br />
single tenebroso, “The fixer”, e dão<br />
prova inequívoca <strong>de</strong><br />
contemporaneida<strong>de</strong>, infelizmente<br />
pelas razões erradas: este rock FM<br />
não é bem uma canção, antes uma<br />
melodia repetida exaustivamente -<br />
i<strong>de</strong>al, portanto, para estes tempos<br />
em que o slogan publicitário é senhor<br />
incont<strong>esta</strong>do do espaço público. Para<br />
além disso, o que havia antes,<br />
continua a existir. O apreço pelos riffs<br />
do rock clássico <strong>de</strong> 70 – Led Zeppelin<br />
à cabeça, seguido <strong>de</strong> perto pelos The<br />
Who -, <strong>de</strong>vidamente matizado pela<br />
própria história e tiques dos Pearl<br />
Jam, e a i<strong>de</strong>ia do rock como bálsamo<br />
escapista, não como ponto <strong>de</strong><br />
confronto olhando <strong>de</strong> frente o<br />
turbilhão. “Back Spacer” é um disco<br />
que, sem sobressaltos e sem<br />
inesperadas mudanças <strong>de</strong> rumo,<br />
seguro da sua natureza, preencherá<br />
os fãs da banda. Quanto ao resto do<br />
mundo, se estivesse minimamente<br />
preocupado, que não<br />
está, não saberia o<br />
que fazer <strong>de</strong>le<br />
neste ano da graça<br />
<strong>de</strong> 2009. M.L.