100 R ELATÓRIO DE D ESENVOLVIMENTO H UMANO - BRASIL 2005 NOTAS 1 Entre 1998 e 2002, o crescimento das taxas de registros por 100 mil habitantes para o Brasil foi de 5,6%. 2 Os dados correspondem a 2002. Ipea. Diretoria de Estudos Sociais/Brasília 2005.“Radar Social”. 3 Soares 2002 e Cano 1997. 4 Em 20 Estados analisados, somente em um, no Paraná, a proporção de brancos assassinados é maior que a de negros assassinados. Note-se, no entanto, que no Paraná a proporção de pretos no total da população é de 24,7%.A população branca corresponderia a 74,3%. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, IBGE, 2003. 5 Esse valor é típico de regiões em conflito bélico. 6 Cardia 1999 e NEV 2001/2003. 7 Cardia 1999 e NEV 2001/2003. 8 A atuação do policial na rua, embora submetida obviamente à lei, apresenta um elevado grau de discricionariedade.A maioria dessas ações não é registrada, e aquelas que resultam em boletins de ocorrência não costumam conter informações suficientes e necessárias às investigações. Não há um sistema de controle voltado para sanar essas lacunas. 9 Realizada pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), da Universidade Candido Mendes, e pela Sociedade Científica da Escola Nacional de Ciências Estatísticas. 10 A revista corporal não é ilegal. A ilegalidade configura-se quando policiais, no exercício de suas funções, abusam desse procedimento como forma de intimidação ou mecanismo arbitrário de vigilância. No Brasil, são comuns as denúncias contra o uso indiscriminado dessa estratégia. 11 Boa parte dessas notificações foi classificada pela polícia carioca como “autos de resistência”. Esse é um recurso usado por diversas instituições policiais no Brasil para designar os casos em que um confronto armado com policiais resulta em vítimas, com o objetivo de não classificar tais casos como homicídios dolosos, apesar de ser essa sua tipificação legal. 12 A idéia desse tipo de comparação é que, se os presos pudessem ser considerados uma parcela dos criminosos em geral, qualquer diferença entre o perfil do fenótipo da população carcerária e o perfil dos mortos pela polícia indicaria possível preconceito na ação policial. Mas essa relação deve ser vista com ressalvas. Em primeiro lugar, porque os presos representam uma parcela muito pequena daqueles que se envolvem com crimes numa determinada sociedade; em segundo lugar, grande parte dos presos responde por crimes não-violentos, razão pela qual seu perfil não é necessariamente igual ao daqueles que entram em confronto armado com a polícia. 13 Vale, para esta análise, a mesma observação feita acerca dos óbitos registrados no sistema de saúde. Os dados sobre a cor da população são do Censo do IBGE e resultam da autoclassificação dos entrevistados. No sistema de Justiça Criminal, por outro lado, a informação sobre cor é preenchida pelos funcionários. De todo modo, as diferenças observadas entre brancos, pretos e pardos são de tal magnitude que não poderiam ser explicadas simplesmente em função de diferenças de metodologia. 14 Nos documentos judiciais, a cor/raça do réu não é identificada por ele próprio, mas por funcionários. Como esse procedimento é arbitrário, às vezes um mesmo réu é classificado de maneiras distintas ao longo do processo. A pesquisa detectou atribuições divergentes em 18% dos casos. Optou-se, assim, por registrar a raça/cor do réu não apenas em um, mas em todos os documentos incluídos no processo. Para sanar esse entrave metodológico, criou-se uma nova variável chamada de “cor predominante”. 15 Este capítulo usou o método criado pelo Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, que tem por base a análise dos setores censitários classificados pelo IBGE sob o título “Setor especial de penitenciárias, colônias penais, presídios, cadeias etc.”(CPS/FGV; Neri), e os dados oficiais do Ministério da Justiça. Nos dois casos, porém (mesmo no censo do IBGE), os dados baseiam-se nas listas e fichas fornecidas pelos diretores de prisões e cadeias. 16 Entenda-se por “população brasileira adulta”aquela com idade entre 18 e 70 anos – limites mínimo (conforme a legislação penal) e máximo (de acordo com o Estatuto do Idoso) para o encarceramento em delegacias de polícia ou no sistema penitenciário. 17 Talvez o exemplo mais radical de enfrentamento desse problema seja o da África do Sul, cuja Constituição, desde 1996, determina que o perfil dos operadores do sistema de justiça criminal, em todos os escalões, deve refletir a composição por cor e por sexo da população do país, na tentativa de quebrar a própria viga mestra do apartheid, um sistema judiciário e penal dominado por homens brancos (Dissel & Kollapen). 18 Esses grupos abrangem as várias ocupações da justiça criminal. Do setor privado foi incluído o grupo de guardas, vigias e vigilantes, pois, embora esses profissionais não integrem o sistema de justiça criminal, trabalham na área de segurança, muitas vezes armados, e freqüentemente influenciam o início de processos investigativos.Apesar de peças importantes no funcionamento desse sistema, não se incluíram advogados particulares porque eles atuam em uma enorme quantidade de áreas, dentre as quais a criminal provavelmente esteja longe de ser a mais numerosa. 19 Sansone 2002 e Ramos 2004. 20 Carvalho, Wood e Andrade 2004. 21 Cano 1977 e Ramos 2002. 101 22 CIDH, Relatório sobre a Situação dos Direitos Humanos no Brasil, Cap. IX,A, OEA/Ser.L/V/ii.97 Doc. 29 rev. 1, 29 de setembro de 1997. 23 Informação contida no livro Direitos Civis e Relações Raciais no Brasil, de Jorge Silva, Ed. Luam, 1994, p. 83. 24 Informação recebida na Audiência Geral sobre os direitos humanos dos afro-brasileiros, celebrada em 8 de março de 2002, na sede da CIDH, em seu 114° período de sessões. 25 CIDH, Relatório de Mérito nº 33/04, caso 11.634, Jailton Neri da Fonseca contra o Brasil. Nesse caso, a CIDH analisou a execução sumária do adolescente afro-brasileiro Jailton Néri por membros da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. 26 CIDH, Informe sobre la Situación de los Derechos Humanos en Brasil, septiembre de 1997, cap. III, Párr. 66 y 67. 27 Relatório de Mérito nº 33/04, caso 11.634, parágrafo 102, e também CIDH, Informe Anual 2000, Informe n° 55/01,Aluísio Cavalcanti y otros. Casos 11.286 y Otros (Brasil), párr. 153, e Tercero Informe sobre Colombia, ob. cit., párr. 17 y ss. 28 A Lei 9.299, de 7 de agosto de 1996, transferiu para a justiça criminal comum a competência para julgamento de crimes dolosos contra a vida praticados por policiais militares, mas estabeleceu que nos crimes dolosos contra a vida praticados contra civis a investigação ficará a cargo da Polícia Militar. 29 Relatório de Mérito nº 33/04, caso 11.634, parágrafo 117. 30 CIDH, Segundo Informe sobre la Situación de los Derechos Humanos en Perú, ob. cit., párr. 212. Notas bibliográficas Capítulo 3 recorre a Cano 1997; Cardia 1999; Cano e Meireles 2004; Carvalho, Wood e Andrade 2004; Ipea 2005; Sansone 2002; Soares 2002. Referências bibliográficas Cano, Ignácio. 1997. Letalidade da Ação Policial no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: ISER. Cano, Ignácio e Meireles, Elisabeth. 2004. "Análise de Viés Racial nas Sentenças Penais." UERJ. Mimeo. Cardia, Nancy (coord.). 1999. Atitudes, Normas Culturais e Valores em Relação à Violência. Brasília. Ministério da Justiça. Secretaria de Estado dos Direitos Humanos. Carvalho, J.A.M., Wood, C.H. e Andrade, F.C.D. 2004. "Estimating the Stability of Census-Based Racial/Ethnic Classifications:The case of Brazil.” Population Studies 58 (3): 331-43. Ipea. Diretoria de Estudos Sociais/Brasília 2005. Radar Social. Brasília: Ipea. Sansone, Lívio. 2002. “Fugindo para a Força: Cultura Corporativista e ‘Cor’ na Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro.”Rio de Janeiro: Estudos Afro-Asiáticos 24. Soares, Bárbara Musumeci (coord.). 2002. “Mulheres Policiais: Presença Feminina nas Polícias Militares Brasileiras.”Relatório de Pesquisa. Cesec/Ucam.
Movimento negro no Brasil O debate sobre a temática racial no Brasil só há bem pouco tempo deixou de ser realizado exclusivamente na academia, mesmo levando em consideração que é um tema de pouca expressão nesse espaço. O final dos anos 1970, ainda no período da ditadura militar, é o marco de entrada do movimento negro na cena política brasileira 1 .Na época, cerca de 600 organizações atuavam no país 2 ,em boa parte influenciadas pelas lutas dos afro-americanos por direitos civis e dos africanos por independência. Em vez de buscar a integração pura e simples, nos moldes de associações esportivas, religiosas e de lazer, elas passaram a reivindicar o direito de se inserir na sociedade brasileira sem a necessidade de desconsiderar os símbolos da negritude, ou seja, integração na diversidade cultural. Na década de 1980, com o retorno ao Brasil de lideranças políticas exiladas durante o regime militar, o movimento negro ganhou novo impulso. Em contato com a nova esquerda norte-americana e européia, essas personalidades desenvolveram percepções inovadoras a respeito do racismo no país e de como enfrentá-lo 3 .O impacto dessa contribuição no plano político foi a inclusão da questão racial na plataforma dos partidos de centro-esquerda. Quadro 1 • A expressão de um conceito amplo A expressão movimento negro,neste relatório,refere-se ao conjunto de organizações dedicadas a defender e a promover os direitos de mulheres e homens negros, no contexto da luta anti-racista. A inclusão nesse conceito das organizações tradicionais, como os terreiros e as casas das religiões de matriz africana,os blocos e os grêmios recreativos das escolas de samba e os grupos de capoeira,não é consensual.No entanto,uma articulação das entidades, mesmo que precária, parece indicar a conveniência do uso de uma concepção mais ampla de movimento negro,para abrigar a complexidade,a heterogeneidade e a multiplicidade das organizações que se encontram no campo racial.Desse modo,considera-se movimento negro um conjunto plural de entidades, incluindo as organizações não-governamentais anti-racistas,as instituições de base religiosa,as associações de empresários, os grupos culturais e de base comunitária, bem como o movimento hip-hop.