Caballeros Solitários Rumo do Sol Poente
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Cap. I - Donde lentamente adentramos o bosque e especulamos<br />
sobre nossos próprios demônios<br />
Não havia sequer um cão despluma<strong>do</strong> e lazarento a lamber a bocarra <strong>do</strong> cavaleiro<br />
solitário. A dentição mais parecia uma espiga de milho atacada pelos famintos pássaros <strong>do</strong><br />
bosque escuro.<br />
Se o ilustríssimo Satã se fazia presente, pouco sabemos, não havia nada de<br />
extraordinário que o entregasse àquela altura. Muito menos algum pacto secreto.<br />
É evidente que o cavaleiro gostava de contar para os desalma<strong>do</strong>s da taberna <strong>do</strong> sr. Knut<br />
a história de O Mestre e Margarida(1), na qual o diabo se apossa, elegantemente, de todas as<br />
freguesias e criaturas daquele pueblo mui distante, mui gela<strong>do</strong>...<br />
Até o gato preto <strong>do</strong> sr. Knut miava como se cantasse um indecifrável blues nessa hora,<br />
de maneira a assombrar mais ainda aqueles refugos bêba<strong>do</strong>s na taberna da chance alguma.<br />
Os desalma<strong>do</strong>s ouviam gargalhadas nervosas, mas tinham dúvidas se lhes<br />
pertenciam tais gargalhadas.<br />
Ali sobravam apenas ecos de gargalhadas antigas guarda<strong>do</strong>s entre o destampar e outra<br />
das pingas que comem fíga<strong>do</strong>s e memórias como burgueses franceses devoram foie-gras.<br />
As cobras <strong>do</strong>s garrafões de envelhecidas bagaceiras faziam daquele antro um pesadelo<br />
desenha<strong>do</strong> sob encomenda, antes <strong>do</strong> sono impossível.<br />
Quem estivesse encosta<strong>do</strong> às paredes ouvia vozes com sotaque típico de quem voltou ao<br />
mun<strong>do</strong>, mas ainda vaga sem corpo por esse vale de lágrimas <strong>do</strong>ravante conheci<strong>do</strong> como<br />
Baixada <strong>do</strong> Glicério y arre<strong>do</strong>res.<br />
O diabo, porém, não estava por perto, aquelas almas não mais lhe interessavam, melhor<br />
comprar seus fajutos faustos, como se gabava o aliteratoso elemento, nas baciadas <strong>do</strong> exército<br />
de reserva das filas de segunda ou na Bolsa de Merca<strong>do</strong>rias & Futuro.<br />
(1) “Il Maestro e Margherita”, como preferia traduzir o cavaleiro, trata-se de um romance <strong>do</strong> ucraniano Mikhail<br />
Afanasievich Bulgakov (1891-1940).<br />
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