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Carl_Sagan_O_Mundo_Assombrado_pelos_Demonios

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Deus só permitiria que lembranças genuínas aflorassem nos seus devaneios.<br />

“Cara, é quase como se eu estivesse inventando”, disse Ingram, “só<br />

que não estou.” Ele sugeriu que um demônio seria o responsável por tudo.<br />

Sob o mesmo tipo de influências, com os boatos da Igreja fazendo circular os<br />

últimos horrores confessados por Ingram, e sob a pressão da polícia, os seus<br />

outros filhos e a sua mulher também começaram a se “lembrar”. Muitos<br />

cidadãos ilustres foram acusados de participar nos ritos orgiásticos. Os<br />

agentes da lei de outros lugares da América do Norte começaram a prestar<br />

atenção. Era apenas a ponta do iceberg, diziam alguns.<br />

Convidado pela acusação, Richard Ofshe, de Berkeley, realizou um<br />

experimento de controle. Foi um sopro de ar fresco. Sugerindo a Ingram que<br />

ele teria forçado o filho e a filha a cometer incesto, e pedindo-lhe que usasse a<br />

técnica de “recuperação de memória” que tinha aprendido, o psicólogo fez<br />

com que essa “lembrança” fosse imediatamente evocada. Não foi necessário<br />

pressão, nem intimidação – bastaram a sugestão e a técnica. Mas os supostos<br />

participantes, que tinham se “lembrado” de tantas outras coisas, negaram<br />

que o incesto tivesse acontecido. Confrontado com essa evidência, Ingram<br />

negou veementemente que estivesse inventando coisas ou sendo influenciado<br />

por outros. Sua lembrança desse incidente era tão clara e “real” quanto todas<br />

as suas outras recordações.<br />

Uma das filhas descreveu cicatrizes terríveis em seu corpo causadas<br />

por tortura e abortos forçados. Mas quando ela finalmente passou por um<br />

exame médico, não havia cicatrizes correspondentes à vista. A acusação não<br />

processou Ingram por abusos satânicos. Ingram contratou um advogado que<br />

nunca atuara num caso penal. A conselho de seu pastor, ele nem sequer leu o<br />

relatório de Ofshe: isso só o confundiria, foi o que lhe disseram. Ele se<br />

confessou culpado de seis acusações de estupro, e acabou sendo mandado<br />

para a prisão. Na cadeia, enquanto esperava a sentença, longe das filhas, dos<br />

colegas da polícia e de seu pastor, Ingram reconsiderou. Pediu que se<br />

retirasse a confissão de culpado. Suas lembranças tinham sido obtidas sob<br />

coerção. Não soubera distinguir as lembranças reais de uma espécie de<br />

fantasia. Seu pedido foi negado. Está cumprindo uma sentença de vinte anos.<br />

Se essa história não tivesse acontecido no século XX, mas no século XVI,<br />

talvez toda a família tivesse sido queimada na fogueira – junto com uma boa<br />

fração dos cidadãos influentes de Olympia, Washington.<br />

A existência de um relatório bastante cético do FBI sobre o tema<br />

geral de abusos satânicos (Kenneth V. Lanning, “Guia do investigador para<br />

alegações de abuso infantil em ‘rituais’ “, janeiro de 1992) é amplamente<br />

ignorada por aqueles que acreditam. Da mesma forma, um estudo de 1994,<br />

realizado pelo Departamento Britânico de Saúde, sobre as denúncias de<br />

abusos satânicos concluiu que, dos 84 supostos casos, nem um único resistiu

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