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A interpretação das culturas - Identidades e Culturas

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A IDEOLOGIA COMO SISTEMA CULTURAL 119<br />

através do qual a linguagem, mesmo com um pequeno vocabulário, consegue abarcar uma multidão de<br />

coisas" — é bem vasta e, hoje em dia, conta com uma concordância razoável. 24 Na metáfora tem-se, sem<br />

dúvida, uma estratificação do significado, na qual uma incongruência de sentido num nível produz um<br />

influxo de significação em outro. Conforme apontou Percy, o aspecto da metáfora que mais incomodou os<br />

filósofos (e os cientistas, ele poderia ter acrescentado) é que ela é "errada". "Ela afirma sobre uma coisa que<br />

esta é outra completamente diferente." E, pior ainda, ela tende a ser mais efetiva quando é mais "errada". 25 O<br />

poder da metáfora origina-se precisamente da influência recíproca entre os significados discordantes que ela<br />

força, simbolicamente, num arcabouço conceptual unitário e do grau em que essa coerção consegue sucesso<br />

em superar a resistência psíquica que a tensão semântica gera inevitavelmente em qualquer um que esteja<br />

em posição de percebê-lo. Quando bem-sucedida, uma metáfora transforma uma falsa identificação (por<br />

exemplo, da política sindical do Partido Republicano e a dos bolcheviques) numa analogia adequada; quando<br />

ela falha, torna-se uma extravagância.<br />

O fato de que a imagem da "lei do trabalho escravo" foi apenas um fracasso para a maior parte <strong>das</strong> pessoas<br />

(e, portanto, nunca serviu com segurança como "um símbolo para levar à ação trabalhadores, eleitores e<br />

legisladores") parece bastante evidente e é esse fracasso, mais do que sua clara simplicidade, que parece<br />

torná-lo nada mais do que um cartoon. A tensão semântica entre a imagem de um Congresso conservador<br />

proibindo a loja fechada e a dos campos de prisioneiros da Sibéria foi — aparentemente — muito exagerada<br />

para ser resolvida numa concepção única, pelo menos por meio de um artifício estilístico tão rudimentar<br />

quanto o slogan. Exceto (talvez) por alguns entusiastas, a analogia não apareceu — a falsa identificação<br />

continuou falsa. Todavia, o fracasso não é inevitável, mesmo em nível tão elementar. Embora a exclamação<br />

de Sherman "A guerra é um inferno", um veredicto sem ambivalência, não seja uma proposição da ciência<br />

social, até mesmo Sutton e seus colegas não a veriam, provavelmente, nem como um exagero nem como<br />

uma caricatura.<br />

Entretanto, mais importante do que qualquer avaliação da adequação <strong>das</strong> duas metáforas como tais é o<br />

fato de que, como os significados que elas tentam acender uma contra a outra estão enraiza<strong>das</strong> socialmente,<br />

0 sucesso ou o fracasso da tentativa é relativo não apenas ao poder dos mecanismos estilísticos empregados,<br />

mas também às espécies de fatores sobre as quais se concentra a teoria da tensão. As tensões da Guerra Fria,<br />

os receios de um movimento sindical que só recentemente emergiu de uma luta amarga por sua existência e<br />

; o ameaçado eclipse do liberalismo do New Deal após duas déca<strong>das</strong> de dominação estabelecem o cenário<br />

j sócio-psicológico tanto para o aparecimento da figura do "trabalho escravo" como — quando ela provou ser<br />

: incapaz de levá-los a uma analogia convincente — para seu fracasso. Os militaristas do Japão de 1934 que<br />

j abriram seu panfleto sobre A Teoria Básica de Defesa Nacional e Sugestões para o Seu Fortalecimento<br />

\ fazendo ressoar a metáfora familiar "A guerra é o pai da criação e a mãe da cultura" achariam a máxima de<br />

j Sherman tão pouco convincente, sem dúvida, quanto ele acharia a deles. 26 Eles se estavam preparando enerí<br />

gicamente para uma guerra imperialista numa nação antiga que procurava fincar o pé no mundo moderno;<br />

Sherman, por sua vez, prosseguia extenuadamente uma guerra civil numa nação ainda não concretizada,<br />

1 dividida por ódios internos. Não é a verdade, portanto, que varia com os contextos social, psicológico e<br />

cultural, mas os símbolos que construímos em nossas tentativas, nem sempre efetivas, de apreendê-la. A<br />

f M Uma revisão excelente e bem recente pode ser encontrada em P. Henle, org., Language, Thought and Culture (Ann Arbor, 1958),<br />

jpp. 173-195. A citação é de Langer, Philosophy, p. 117.<br />

B W. Percy, "Metaphor as Mistake", The Sewanee Review, 66 (1958), pp. 79-99.<br />

PCitado in J. Crowley, "Japanese Army Factionalism in the Early 1930's", The Journal ofAsian Studies, 21 (1958): pp. 309-326.

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