A Vida e a Arte de António Ramos de Almeida 64 Ao pretendermos descortinar alguns contextos editoriais e as dinâmicas sociais, culturais e políticas em que as obras de António Ramos de Almeida, editadas pela Livraria Latina Editora, foram concebidas e se desenvolveram, podemos concluir que a Latina, ao assumir-se desde o primeiro momento como chancela de mediação cultural, atuou como agente ativo na esfera das ideias. Através dos documentos apresentados, pertencentes ao espólio de Henrique Perdigão, afiguraram-se alguns aspetos que podem iluminar o papel da Livraria Latina Editora, permitindo-nos perspetivar o alcance das suas publicações, os canais de circulação das obras do autor, o vigor e a amplitude com que foram comercializadas a par da oferta estratégica das suas edições. Possibilitaram-nos ainda concluir que não se restringiram aos limites do círculo portuense, onde foram editadas, mas, pelo contrário, o processo acabou por ser necessariamente extensivo a todo o país. A Livraria Latina Editora procurou ter ao seu alcance formas diversas de levar o livro aos leitores. Prosseguiu deliberadamente um plano alicerçado em dispositivos estratégicos tentando estimular o público para a sua leitura e aquisição. A título de exemplo, a coleção Cadernos Azuis, à semelhança de outras coleções, configurou um padrão a partir da proposição de um modelo que unificou, gráfica e esteticamente, a relação dos seus números organizando simultaneamente os campos de conceção e produção. Com propósitos de inserção no tecido social e imbuída de mecanismos de intervenção editorial na cultura e na sua configuração, programática e estética, a Latina adotou diversas fórmulas de exponenciar a promoção e difusão das suas edições. A par da publicidade dos seus títulos, nos principais jornais nacionais, os comentários inseridos, sistemática e estrategicamente, nas contracapas e badanas refletem assíduas e repetidas alusões às suas obras publicadas ou a publicar, dando a conhecer o estatuto e a qualidade intrínseca da Livraria Editora, o mérito do autor e das suas obras. Os mecanismos de propagação da sua intervenção editorial na cultura estabeleceram-se ainda na base das relações da Latina com os meios de comunicação social. Na imprensa podemos encontrar, com diferentes narrativas e discursos, o impacto das obras de António Ramos de Almeida nas principais publicações periódicas portuguesas, de que se destacam O Comércio do Porto, O Primeiro de Janeiro, o Jornal de Notícias e a Gazeta Literária, do Porto; o Diário de Lisboa, o Diário Popular, o Jornal do Comércio, O Século Ilustrado, Brotéria e A Vida Mundial Ilustrada, de Lisboa; a Gazeta de Cantanhede; O Ilhavense, de Ílhavo; O Setubalense; a Estrela do Minho, de Vila Nova de Famalicão; a Gazeta de Coimbra; O Comércio da Póvoa de Varzim; O Figueirense, da Figueira da Foz, a Democracia do Sul, de Évora, a Semana Tirsense, de Santo Tirso e o Beira Vouga, de Albergaria-a-Velha. Atendendo a que uma parcela substantiva da história contemporânea emerge nas páginas da imprensa escrita, a compilação desses registos permitiu recolher a influência e a repercussão das obras de António Ramos de Almeida na imprensa na época em que foram editadas pela Livraria Latina Editora. Desde a credenciação editorial até às críticas acesas, conduzidas por visões
António Ramos de Almeida e a Livraria Latina Editora: contextos e dinâmicas | maria do rosário ramada pinho barbosa sustentadas, ou meras notas informativas, desprovidas de análise, podemos colher a notícia dos acontecimentos, a informação mais ou menos especializada e verificar o reflexo das e nas mentalidades. 65