Dignidade e Autonomia Individual no Final da Vida - Emerj
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Trazendo o debate para o âmbito do sistema jurídico brasileiro,<br />
não parece possível adotar, de forma excludente, um ou outro<br />
viés <strong>da</strong> digni<strong>da</strong>de humana. Mas, tendo como ponto de parti<strong>da</strong><br />
a Constituição, afigura-se fora de dúvi<strong>da</strong> o predomínio <strong>da</strong> ideia de<br />
digni<strong>da</strong>de como auto<strong>no</strong>mia. Dentro de uma perspectiva histórica,<br />
a Carta de 1988 representou uma ruptura com o modelo ditatorial<br />
intervencionista, constituindo o marco inicial <strong>da</strong> reconstrução<br />
democrática do Brasil 73 . Daí a sua ênfase nas liber<strong>da</strong>des pessoais,<br />
parte essencial de um longo elenco de direitos individuais e garantias<br />
procedimentais. A digni<strong>da</strong>de como hetero<strong>no</strong>mia obteve me<strong>no</strong>s<br />
ênfase. Como visto, ela se move em tor<strong>no</strong> de conceitos indeterminados<br />
como “moral pública” e “bons costumes”, por exemplo, que<br />
nem figuram <strong>no</strong> texto constitucional brasileiro 74 . Outras locuções,<br />
como “interesse público” e “ordem pública” são mencionados <strong>no</strong><br />
texto para hipóteses bem conta<strong>da</strong>s e de aplicação específica, que<br />
não incluem – ao me<strong>no</strong>s expressamente – a restrição a direitos<br />
fun<strong>da</strong>mentais.<br />
As diferenças em relação a textos constitucionais anteriores,<br />
portanto, demarcam a superação de modelos inspirados na<br />
imposição de uma morali<strong>da</strong>de social unitária, carente de dialética<br />
e de pluralismo. Na história nacional, esta sempre foi a porta<br />
de entra<strong>da</strong> para o paternalismo, o perfeccionismo moral e para a<br />
intolerância, combustíveis para o arbítrio e o autoritarismo. Com<br />
proteção e à promoção <strong>da</strong> saúde. Sobre o termo mistanásia. NABARRO, Sonia Wendt. “Morte:<br />
dilemas éticos do morrer”. Arquivos do Conselho Federal de Medicina do Paraná.<br />
Curitiba: v. 23, nº 92. Out.Dez./2006, p. 185-244.<br />
73<br />
BARROSO, Luís Roberto (org.). A reconstrução democrática do direito público <strong>no</strong> Brasil.<br />
Rio de Janeiro: Re<strong>no</strong>var, 2007.<br />
74<br />
Na Constituição de 1967, as locuções ‘bons costumes’ e ‘ordem pública’ foram utiliza<strong>da</strong>s<br />
uma vez para autorizar expressamente a restrição <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de de culto (art.150, § 5º). Na<br />
Constituição de 1946, há dispositivo análogo ao mencionado, e, duas vezes, a ‘ordem pública’<br />
é o autorizador expresso para restrição de direitos, a reunião pacífica e a permanência<br />
de estrangeiro <strong>no</strong> território nacional (art.141, § 7º e § 11 respectivamente). A Constituição<br />
de 1937, por seu tur<strong>no</strong>, foi mais pródiga na utilização dos termos ‘moral pública’, ‘morali<strong>da</strong>de<br />
pública’, ‘bons costumes’ e ‘ordem pública’, para autorizar a restrição expressa de<br />
direitos, como: a) liber<strong>da</strong>de de manifestação do pensamento (art.15, b); b) a liber<strong>da</strong>de de<br />
culto (art.122, 4º); c) o direito de manifestação dos parlamentares (art.43) e d) como justificadores<br />
<strong>da</strong> instituição, por lei, <strong>da</strong> censura prévia (art.15, a) e <strong>da</strong> condução dos rumos <strong>da</strong><br />
educação (art.132). Do exposto, percebe-se que a Constituição de 1988 efetivamente<br />
50<br />
Revista <strong>da</strong> EMERJ, v. 13, nº 50, 2010