Arte e Cultura - Instituto Votorantim
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Sem a experiência<br />
do prazer da arte,<br />
por parte de<br />
educadores e<br />
alunos, nenhuma<br />
teoria de<br />
arte-educação<br />
será reconstrutora<br />
Democracia e marketing<br />
É por essas e outras que as ONGs, com muito menos<br />
dinheiro do que os governos vêm gastando em Educação,<br />
conseguem educar melhor e combater muito mais eficientemente<br />
a exclusão e a violência. Sobretudo quando não se<br />
trata de marketing empresarial, mas de projeto comunitário<br />
mesmo, em que os participantes têm poder de decisão.<br />
É muito importante democratizar o poder nos projetos<br />
sociais. Que direito temos nós de decidir o que é mais<br />
importante para uma comunidade, se não fazemos parte<br />
dela? Dar voz aos oprimidos deveria ser o primeiro<br />
mandamento dos projetos ditos sociais. Decidir sem<br />
ouvir, o governo já faz continuamente. Para compensar,<br />
o poder do terceiro setor deveria ser mais dialogal.<br />
Há também artistas ditos voluntários (mas algumas<br />
vezes com gordas verbas de terceiros), que apenas exploram<br />
os participantes, fazendo-os trabalharem de graça<br />
em projetos totalmente definidos e controlados pelos<br />
próprios artistas. Muitas vezes, apesar das boas intenções,<br />
porque não sabem lidar com comunidade ou<br />
com aprendizagem de arte, voluntários e artistas acrescentam<br />
mais um nível de exploração aos já tão explorados.<br />
É necessário conhecer e analisar o processo de trabalho<br />
em comunidade para avaliar e julgar sua propriedade.<br />
Nos trabalhos desenvolvidos por Rachel Mason na<br />
Inglaterra e no programa Quietude da Terra, do Projeto<br />
Axé, de Salvador, por exemplo, os artistas trabalharam<br />
assistidos por arte-educadores, o que garantiu um processo<br />
realmente educacional a favor da inclusão.<br />
Lidar com os excluídos, levando-os a se verem como<br />
pessoas plenas, apesar da exclusão, não é tarefa fácil.<br />
Qualquer deslize potencializa a exclusão.<br />
O cineasta Sergio Bianchi, em entrevista acerca de seu<br />
último filme, “Quanto Vale ou É por Quilo?”, que enfoca o<br />
“marketing social”, lembrava que está se criando uma<br />
nova escravidão: a escravidão comandada pelo chamado<br />
terceiro setor que só quer propaganda. Realmente,<br />
para muitas organizações que desenvolvem<br />
“trabalho social”, o marketing<br />
da empresa vem em primeiro lugar.<br />
Outras instituições só apóiam economicamente<br />
projetos que possam se<br />
auto-sustentar em determinado prazo.<br />
Mas há práticas sociais, como o Majê<br />
Molê, grupo de dança da periferia pobre<br />
do Recife, que nunca poderão se financiar,<br />
a não ser que se comercializem,<br />
o que resulta sempre em exclusão dos<br />
menos dotados e talentosos, que também<br />
muito necessitam do contato<br />
reconstrutor com a arte.<br />
Mas, apesar de algumas vezes submetido<br />
a um certo marketing sanguessuga,<br />
o movimento de arte para a reconstrução<br />
social vem demonstrando<br />
a necessidade da arte para todos os<br />
seres humanos, por mais inumanas<br />
que tenham sido as condições que a<br />
vida lhes impôs.<br />
Ana Mae Barbosa é professora da<br />
Universidade de São Paulo, pioneira<br />
dos estudos de arte-educação no<br />
Brasil e autora de vários livros<br />
sobre o tema. Dirigiu o Museu de<br />
<strong>Arte</strong> Contemporânea da<br />
Universidade de São Paulo em 1987 e<br />
elaborou a proposta de arteeducação<br />
apoiada no tripé: ver arte,<br />
contextualizar o que se vê, e fazer<br />
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