Arte e Cultura - Instituto Votorantim
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A IDÉIA DO ARTESANATO COMO BEM<br />
CULTURAL PODE DESENCADEAR A<br />
REFLEXÃO SOBRE O PAPEL DA<br />
CULTURA TAMBÉM NAS ESFERAS<br />
ECONÔMICA E POLÍTICA<br />
Convidada a escrever sobre essa conexão tão inspiradora e sempre discutida,<br />
que é a da arte, cultura e cidadania, considerei apropriado e atual incitar<br />
a reflexão, não sobre arte num sentido geral, mas sobre artesanato e sua<br />
possibilidade de fomentar toda a riqueza de identidades culturais Brasil afora<br />
e seu potencial como gerador de renda para artesãos pobres do país.<br />
A experiência do <strong>Arte</strong>sanato Solidário – programa social criado em 1998 no<br />
âmbito da Comunidade Solidária e desde 2002 uma organização da sociedade<br />
civil, sempre com o objetivo de geração de trabalho e renda por meio da<br />
revitalização do artesanato de tradição – leva-nos a discutir cotidianamente,<br />
nas esferas interna e pública, a necessidade de co-relacionar artesanato,<br />
desenvolvimento local e cultura.<br />
Não é de hoje a constatação de que a produção do artesanato de tradição<br />
é indissociável de seu contexto cultural, tampouco é assunto para círculos<br />
restritos ou especializados. A idéia do artesanato como bem cultural pode<br />
desencadear a reflexão sobre o papel da cultura nas esferas econômica e<br />
política, por exemplo.<br />
Pensando assim, podemos destacar três aspectos da relação entre artesanato<br />
e cultura:<br />
<strong>Cultura</strong> como modo de vida<br />
Este primeiro aspecto tem forte conteúdo antropológico: o artesanato de<br />
tradição faz parte do modo de vida das pessoas que o produzem, e se organiza<br />
a partir de relações de gênero, com base em valores e conhecimentos<br />
sobre a manutenção da vida, de regras que norteiam comportamentos na<br />
esfera pública e privada etc. Ele se orienta por padrões estéticos próprios e é<br />
transmitido espontaneamente, de geração a geração.<br />
A existência desse artesanato – em suas diversas técnicas e matérias-primas<br />
– e o seu reconhecimento como expressão da cultura são o ponto de partida de<br />
projetos voltados para o resgate das formas tradicionais de sua expressão e para<br />
a sua revitalização como um patrimônio comum daquela comunidade.<br />
Para resgatar e revitalizar de forma compartilhada o saber-fazer artesanal, promovem-se<br />
alguns diálogos, ou trocas. Duas são fundamentais: a primeira é a que<br />
se realiza entre os próprios artesãos, por meio de uma série planejada de oficinas<br />
com o objetivo de incentivar a transmissão do saber-fazer dos mestres aos mais<br />
jovens; desenvolver a organização do trabalho; estimular a formação de associações<br />
ou cooperativas; e incentivar formas de liderança e de gestão associativa. A<br />
segunda troca acontece entre os artesãos e seus produtos, por meio de oficinas<br />
de aprimoramento do produto e de formação de preço.<br />
texto _ Ruth Cardoso<br />
Ruth Cardoso é doutora em<br />
Antropologia, professora da Universidade<br />
de São Paulo, fundadora e presidente da<br />
organização não-governamental Comunitas,<br />
que coordena programas como<br />
Alfabetização Solidária, Capacitação<br />
Solidária e <strong>Arte</strong>sanato Solidário<br />
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