Chicos 47 21.12.2016
e-zine literária de Cataguases - MG
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<strong>Chicos</strong> <strong>47</strong><br />
José Antonio Pereira<br />
Nasceu em Cataguases MG, é coautor de A casa<br />
da Rua Alferes e outras crônicas (2006) e autor de<br />
Fantasias de Meia Pataca (2013).<br />
Nem soberana nem vidente, apenas Miriã a sorridente<br />
Lá pelo mês de maio, na semana em<br />
que passou em branco a abolição, atendi uma<br />
jovem mulata risonha e amável. Chamava-se Miriã.<br />
– Mas é assim mesmo que se escreve? Fui<br />
perguntando. Com um sorriso inocente ela simplesmente,<br />
– Sim, com tiI! Minha avó fala que<br />
Miriã era profetisa e irmã mais velha de Moisés.<br />
Bem-humorada, continuou: – Pode um trem destes?<br />
Eu, euzinha aqui, irmã mais velha do Moisés.<br />
E caiu num riso contido pela mão. Após<br />
concluir o atendimento me despedi da jovem e<br />
brinquei. – Juízo viu! Afinal, você é irmã de Moisés.<br />
Ela, abriu um largo sorriso, – Quem sabe ainda<br />
encontro com ele lá no terreiro que frequento.<br />
Sou umbandista. E foi-se com seu sorriso. Tempos<br />
depois explodiu no noticiário as confusões de<br />
um ex-presidente e outra Miriam, mas esta é com<br />
m e é jornalista.<br />
Na roda vespertina de sábado, lá no bar do Goiaba,<br />
o assunto era a amante do empavonado tucano.<br />
Lembrei-me e contei o episódio da jovem<br />
Miriã aos amigos. Enquanto eu falava das variações<br />
gráficas dos nomes, um deles, o poeta, só<br />
queria saber da mulata. Insistia na busca de detalhes<br />
sobre a mesma. – E como ela é? Eu a conheço?<br />
Sábado seguinte, voltamos ao assunto...<br />
– E a Miriã voltou a vê-la? – Claro que não. Retruquei.<br />
Enquanto saboreávamos o primeiro gole<br />
da cerveja, continuou o poeta, – Saibam que de<br />
tão curioso que fiquei, fiz uma pesquisa sobre o<br />
nome dela. Sabiam que Miriam é uma variante de<br />
Maria. Oriundo do hebraico, significa vidente ou<br />
senhora soberana. Um protocolar - É mesmo! do<br />
artista plástico denotava que o pessoal, estava<br />
mais afim de escarafunchar alguma coisa picante<br />
no noticiário sobre o caso da Miriam com o FHC.<br />
E a que era amante do Figueiredo? – Como?<br />
Indago incrédulo enquanto o poeta arregala os<br />
olhos. Mas a novidade, pelo menos para nós, é<br />
servida pelo artista plástico à mesa entre cervejas<br />
e torresmos. – Não sabiam que uma outra Myrian<br />
teve um caso com o Figueiredo? Continua com ar<br />
professoral e rindo de nossa ignorância a estes<br />
detalhes que fogem dos nossos velhos compêndios<br />
de história. Mas também já faz tempo que<br />
saímos da escola. É óbvio que o nosso imaginário,<br />
elucubrou um monte de segredos sujos e<br />
chulos dos podres poderes de Brasília nas alcovas<br />
mirianas. E o poeta insistia em saber da Miriã e<br />
em falar da sua pesquisa: – Mas nada da mulata<br />
mesmo? Outra versão sugere que Miriam teria<br />
surgido a partir das palavras assírias Yamo e Mariro,<br />
significando oceano azedo ou ácido no idioma<br />
aramaico assírio. Um quarto frequentador da<br />
mesa, até ali num silêncio boquiaberto, entra no<br />
papo: – Isto explica o azedume dela com o sociólogo,<br />
acho que tudo não passa de luta pela<br />
herança do espertalhão. – Já a outra..., continua<br />
com uma aura de vaidosa sabedoria o nosso amigo<br />
artista e agora, neo-historiador, ... a Myrian<br />
disse que em Brasília, ela se hospedava na casa<br />
de um ministro de Figueiredo, o mais importante<br />
representante civil nos governos militares. Quem<br />
será? – Acho que é o porca sem rabo. Retruca o<br />
poeta. – Mas voltando a etimologia, alguns estudiosos<br />
atribuem a origem ao termo egípcio mry<br />
que significa amada ou amor. Ao que prontamente<br />
o neo-historiador retruca. – Amor uma ova!<br />
Você acha que caras como FHC e Figueiredo tiveram<br />
estes casos por amor? É a velha conjugação<br />
de poder e sexo e nada mais que isto. – Já a<br />
Miriã em sua mulatice inocente e pura, como o<br />
branco das camélias, tem a ver o quê com todas<br />
estas Mirians? Indaga o poeta botando ponto<br />
final na conversa.