Chicos 47 21.12.2016
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<strong>Chicos</strong> <strong>47</strong><br />
Muito esquisito, num tempo em que a Igreja,<br />
soleníssima, falava latim.<br />
As moçoilas que ficavam “faladas” tinham<br />
que se mandar de lá, se quisessem casar, e o padre<br />
só lhes dava meia hóstia, o que levou uma<br />
delas a se recusar a abrir a boca. Bailes aconteciam<br />
no salão da prefeitura, os negros dançando<br />
do lado de fora, feito no tempo da senzala. Num<br />
carnaval, suprema audácia, três moças bonitas e<br />
ricas fantasiaram-se de bailarinas, mostrando as<br />
pernas, com um chicotinho, para espantar a mocidade<br />
louca. Curti muito o cineminha do padre<br />
e mais ainda um circo, onde vi o drama Sansão<br />
e Dalila, e Heloísa, “a garota que tem o micróbio<br />
do samba”, um dos epítetos que pensaram<br />
para Carmem Miranda.<br />
Havia só um farmacêutico, que também<br />
fazia partos, e um curandeiro. Hoje tem hospital,<br />
colégio, rádio, heliporto, talvez até motel, porém,<br />
no fundo, continua tudo como dantes, pelo<br />
que pude observar, trinta anos depois: na piscina<br />
do clube, uma fêmea mais donairosa era alvo de<br />
intensas investigações sobre sua, putativa, libido<br />
descontrolada. Sobre adultério, nos velhos tempos,<br />
só sei de um senhor que ia todo dia a Leopoldina,<br />
de terno e chapéu. “Jogar no bicho”<br />
diziam. Na verdade, ver amante, soube depois.<br />
Quanto às duas famílias que brigaram, o<br />
pau comeu, mas vou deixá-las brigando em paz,<br />
se é que isso é possível. É, sim, ou era, na Laranjal<br />
muito acanhada, e não menos assanhada,<br />
de antanho.<br />
Cataguases, 20.07.2003